Não exagero nem um tiquinho ao afirmar como afirmei de passagem num texto de ontem que os prefeitos da Província do Grande ABC são gigolôs econômicos, a viver de orçamentos herdados, os quais exploram com sofreguidão entre outras rubricas com empreguismo exacerbado e desperdícios de variados matizes. Só faltou dizer, para ser justo, que a constatação vem de longe e que comporta poucas exceções ou quase exceções, como Celso Daniel.
Chega a ser abusiva, quando não irresponsável, a negligência histórica dos administradores públicos da região em lidar com a economia e mais precisamente com o setor industrial, nossa galinha dos ovos de ouro. Eles estão fazendo de tudo, nessa trajetória suicida, para aniquilar a sociedade. As incursões sociais, em infraestrutura que não dá conta das demandas, e em assistencialismo, que é um enxugar de gelo, são a forma preferida para tapear o distinto público.
Ainda há tempo, embora não acredite que possa haver algo que poderia ser chamado de reviravolta, para o prefeito petista Luiz Marinho reduzir a carga de frustração daqueles que, como este jornalista, ousaram acreditar que, mesmo com perfil diferente e menos rebuscado, pudesse seguir os passos de regionalidade de Celso Daniel.
Luiz Marinho seria a liderança apropriada a uma retomada econômica da região, mas depois de quase cinco anos de mandatos, perdeu-se nas brumas políticas e partidárias e numa parafernália de projetos de baixa praticidade. Dá mais valor ao partido que representa e no qual costura série infindável de coligações com vista às disputas estadual e federal, do que à geoeconomia em que está inserido. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) que não consegue deslanchar também na região é o mantra gerencial de Luiz Marinho. Valor Adicionado, medida de produção industrial, talvez não conste do léxico administrativo, exceto à captura de impostos.
Motivos abundantes
Motivos não faltam para Luiz Marinho atuar no campo econômico com dedicação plena. São Bernardo perdeu nada menos que 44,65% de participação relativa na distribuição do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de 1976 até 2012. É dinheiro para caramba e, ao contrário do que afirmam sem provas, sem lenço e sem documentos os arautos da insensibilidade, perda de participação relativa nesse caso tem estreita relação com perda de participação absoluta, como provamos nos últimos dias com matérias sobre a quebra do ICMS na região no período entre 1994 e 2011.
Há em comum entre os prefeitos da Província do Grande ABC de hoje e do passado um escandaloso despreparo à dinamização econômica. Até parece que não existe concorrência no mercado e que os valores monetários arrecadados com impostos e empregos serão perenes e intocáveis. Mesmo Celso Daniel, exceção à regra geral, não alcançou o grau desejado de comprometimento com o setor industrial, entre outras razões também porque a comichão da carreira política o levou a outras prioridades. Sem contar que sentiu na pele a apatia, quando não a inveja generalizada dos demais prefeitos. Celso Daniel dançava na economia a dança dos solitários. Pior: os prefeitos que lhe foram contemporâneos só se mexeram para valer e com dedicação plena ao estabelecer guerra fiscal interna no setor de serviços. Chegaram bem atrasados em relação a concorrentes da Região Metropolitana de São Paulo, como Barueri e Santana de Parnaíba, entre outros endereços.
Se continuar a ignorar a dependência profunda do setor de transformação industrial, mesmo com a curva descendente das últimas décadas, a Província do Grande ABC chegará a um ponto de exaustão socioeconômica. As fragilidades sociais estão aí não como fantasia de jornalista cético, mas como realidade nua e crua que diversos indicadores esfregam em nossas narinas.
Empobrecimento irreversível
Seria mesmo impossível manter o padrão geral de qualidade de vida do passado ante o encolhimento sistemático de receitas orçamentárias dilapidadas pelo estreitamento dos recursos gerados por repasses do ICMS relacionados ao setor industrial. Perdemos como região, entre 1976 e 2012, ou seja, em 36 anos, nada menos que 48,21% de repasse do principal recurso financeiro das prefeituras. Só Santo André, que, sob o comando de Carlos Grana, optou por colocar uma educadora na chefia da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, viu as receitas do ICMS encolherem 73,83%. Não há erro de digitação. São mesmo 73,83% de queda. Em meados da década dos anos 1970 Santo André contava com 4,70% de Índice de Participação e caiu, em 2012, a 1,23%. A participação geral da região era de 14,81% no bolo estadual, e caiu a 7,67% no período.
Uma boa pauta jornalística, muito melhor que alçar às manchetes a carreira pós-derrota de Aidan Ravin, por exemplo, principalmente porque as eleições do ano que vem estão ainda no ano que vem, seria mostrar a estrutura das secretarias de Desenvolvimento Econômico dos sete municípios da Província.
Sugeriria que, produzida a matéria, a edição tivesse patrocínio de oportunidade de uma indústria farmacêutica que mandasse anexo a cada exemplar uma amostra grátis de antidepressivo, tal o efeito que a matéria provocaria. Constatar, como se constataria, que os administradores públicos locais não dão a mínima pelota ao Desenvolvimento Econômico, seria um choque.
Por essa e por tantas outras razões de quem carrega o DNA do inconformismo é que, por mais que tenha até o passado recente estabelecido laços de amizade com alguns dos protagonistas da cena política da região, então no banco de reservas de expectativa de mudanças, não hesito em provocar rompimentos por conta do dever profissional.
Tenho um compromisso com o poderoso no sentido de que, se for para cair na gandaia geral de lustrar egos que não fazem nada ou fazem muito pouco para merecer elogios, seria preferível que me encaminhasse a outro destino. Os racionalistas jamais vão entender essa premissa, porque só pensam e agem com o respaldo de critérios pragmáticos e materialistas, quando não extrativistas. O que posso fazer se há certos compromissos profissionais que não me arredam pé?
A premissa de gestão econômica dos administradores municipais da Província do Grande ABC está moldada em pressupostos de gigolôs. A fonte está secando, mas eles não se incomodam porque querem usufruir o poder enquanto são o poder. O Observatório de Promessas e Lorotas que estamos preparando vai ser ferramenta muito importante para exemplificar, entre outras áreas, como o setor econômico da Província é vitima sistemática de falsificadores da realidade e cenaristas de ficcionais.
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15/10/2024 SÃO BERNARDO DÁ UMA SURRA EM SANTO ANDRÉ