Finalmente a classe política tão escorraçada nas ruas por razões mais que justas, porque faz do Estado gato e sapato, encontrou um exemplar de dignidade: a ex-secretária especial da Administração de José Auricchio, em São Caetano, Regina Maura Zetone, candidata derrotada à Prefeitura em outubro passado, recusou publicamente ingressar no PMDB. As declarações dessa médica que foi vítima de uma campanha sórdida durante as eleições municipais do ano passado são um primor de sinceridade e de coerência. Ela simplesmente não quer pousar no mesmo ninho do prefeito de São Caetano, Paulo Pinheiro, a quem fez duras críticas durante a campanha eleitoral. “Aliar minha imagem ao partido seria como me aliar ao prefeito e eu não quero isso. O índice de rejeição é muito grande” – declarou Regina Maura ao Repórter Diário.
Sei lá se o povo de São Caetano já se arrependeu ou irá se arrepender por não ter votado em Regina Maura para comandar o Paço Municipal, até porque isso não é o mais importante agora e tampouco está em discussão. O que sei e digo que sei é que Regina Maura não surpreende quem a conhece como gestora pública. Muito mais como gestora pública do que como agente política, já que não é de seu feitio a falsa amabilidade programada para seduzir o eleitorado a qualquer custo.
Quais são os limites?
Também não sei nem quero saber e tenho raiva de quem sabe quais seriam os limites éticos para Regina Maura manter-se com viabilidade na política, porque não têm vida longa quem ousa enfrentar os desafios sem ceder espaços aos encantos das urnas. Transigir para viabilizar-se eleitoralmente é uma arte que nem todos dominam, alguns poucos têm consciência de que é complicado dominar e apenas alguns privilegiados por sortilégios sabem encontrar o encaixe perfeito de modo a não vender a alma. Sentar no sofá da oportunidade que passa é o mais comum. Tanto quanto sentar no sofá ao imaginar o sofá que se apresenta, o que nem sempre corresponde à realidade dos fatos. O mundo da política permite e estimula tantas subjetividades que apenas os que se acham deuses têm certezas absolutas.
Sei lá também como está o espírito de Regina Maura após a derrota para Paulo Pinheiro em São Caetano. Uma derrota integralmente fora do script político-eleitoral, porque até que a disputa se efetivasse de verdade, não se encontrava alguém que pudesse acreditar que a indicada de José Auricchio Júnior sucumbiria nas urnas. Afinal, entre outras razões, José Auricchio gozava de grande prestígio popular, monitorado que sempre foi por um instituto de pesquisa especializado não só em registrar resultados da temperatura administrativa em São Caetano, mas também em indicar os passos mais seguros.
Quem é de São Caetano é testemunha da antecipação de um processo de liquidação da reputação e da imagem de uma administração pública sob dos efeitos das redes sociais. Sim, muito antes dos meninos e das meninas começarem a ocupar a Avenida Paulista em São Paulo e provocarem, na sequência, uma revolução de inconformismo gerada na plataforma de tecnologia digital, São Caetano já se utilizara desse ferramental para espalhar um certo terrorismo político. Regina Maura e a Administração José Auricchio Júnior demoraram a se dar conta de que o Facebook estava a fazer estragos. Quando acordaram, os antídotos já não estancaram a hemorragia, principalmente de cunho moralista.
Carruagem de conveniência
Nem mesmo o fato cada vez mais comprovado de que o PT estava e continua por trás da candidatura e da gestão de Paulo Pinheiro alterou o rumo dos acontecimentos. Por mais que São Caetano fosse e agora provavelmente seja muito mais indigesta ao Partido dos Trabalhadores, havia se consolidada uma rejeição brutal à candidatura dessa médica definida por José Auricchio Júnior como o melhor quadro entre os secretários de que dispunha. Apenas os engenheiros de obras feitas crucificaram o prefeito pela escolha pessoal da concorrente situacionista, priorizando eventuais pecadilhos da candidata em vez de analisar com atenção o contexto político-tecnológico que cercou a disputa fora das mídias convencionais.
Seguisse a carruagem de conveniências que é lugar comum na política nacional – e os fartos exemplos ou contraexemplos regionais estão aí para confirmar – Regina Maura poderia ter se acertado com o PMDB para concorrer ao parlamento paulista nas próximas eleições. Provavelmente a decisão não provocaria grandes comoções, porque quando se acostuma com uma dor de dente a rotina não se altera. Mas Regina Maura resolveu contrariar a farra geral partidária e disse não aos propositores da transferência de agremiação.
Entre o imediatismo oportunista e a coerência política, Regina Maura preferiu o que em suma é o respeito aos eleitores. Uma atitude que, nestes tempos em que os políticos são praticamente declarados inimigos número um do povo brasileiro, como asseguram pesquisas de institutos idôneos, ganha a forma de um sopro de esperança de que nem tudo está perdido.
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19/11/2024 PESQUISAS ELEITORAIS ALÉM DOS NÚMEROS (24)