Administração Pública

Terceiro Mandamento: nota dois
para Marinho e 10 para Celso Daniel

DANIEL LIMA - 18/11/2013

O terceiro capítulo da série “10 Mandamentos do Gerenciamento Público Municipal” aumenta a diferença de qualidade de gestão entre o prefeito Celso Daniel, que comandou Santo André durante 10 anos até ser assassinado em janeiro de 2002, e o atual prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, que está completando o quinto ano de dois mandatos. Ambos petistas mas gerenciadores públicos em contextos completamente diferentes: a Província do Grande ABC de Celso Daniel vivia o inferno da desindustrialização e de antagonismo declarado ao governo federal tucano, enquanto a Província do Grande ABC de Luiz Marinho conta com costas largas do governo federal e também com a febre consumista que tem no setor de veículos um dos porta-bandeiras de gastança. Nada melhor para uma região construída sobrerrodadas.


 


O Terceiro Mandamento (“Guardar a responsabilidade social e o meio ambiente”) não está descolado de outros. Há natural imbricamento entre os enunciados formulados por este jornalista numa reportagem publicada em 2007 na revista LivreMercado.


 


Luiz Marinho recebe nota dois e Celso Daniel nota 10 no Terceiro Mandamento -- o que aprofunda a distância entre eles. Nos dois primeiros mandamentos já destrinchados, Celso Daniel também obteve nota máxima. Luiz Marinho não saiu do zero. Quem sabe nos próximos três anos o comandante da Prefeitura de maiores recursos orçamentários da Província do Grande ABC diminua a diferença?


 


A nota zero a Luiz Marinho tem o peso preponderante explícito de um absurdo divulgado com a seriedade de um laudo técnico: ele anunciou em outubro de 2011 que São Bernardo preparava projeto técnico para construir um aeroporto internacional. Como não existe área supostamente compatível com o empreendimento que, no mínimo, ocuparia 15 milhões de metros quadrados, como o Aeroporto de Cumbica, a única alternativa seria invadir os mananciais que tomam mais da metade do território de São Bernardo.


 


Aeroportozão virou terminalzinho


 


O tempo desclassificou a patética arremetida do prefeito de São Bernardo, que, mesmo assim, insiste em algo de menores dimensões. Em vez de um aeroportozão seria construído um terminalzinho de voos executivos, cargas e descargas. Nada que não estimule a ocupação do entorno e coloque ainda mais em risco a saúde ambiental da região.


 


A extravagante proposta de Luiz Marinho se deu mais de duas décadas após Celso Daniel, em primeira gestão como prefeito de Santo André, liderar movimento que culminou na criação do Clube dos Prefeitos, chamado oficialmente de Consórcio Intermunicipal. A vocação principal da instituição estava direcionada à qualificação do meio ambiente, com investimentos em saneamento e na recuperação hídrica de uma região açodadamente atingida pela industrialização sem critérios seguida da ocupação demográfica impiedosamente invasora da periferia desprotegida.


 


Uma iniciativa de cunho reparador do ambiente e uma empreitada mercantil que subestima entraves que vão além da já incontornável riqueza ambiental sinalizam sem risco de equívoco um divisor de águas entre um prefeito vocacionado a tornar-se referência histórica e um prefeito que, por mais que faça, dá indicações de que não superará a barreira de manchetes limitadas aos mandatos que ocupar. A permanência de Celso Daniel como simbologia de gestor público é proporcionalmente tão sustentável quanto a premissa de que Luiz Marinho será uma nuvem passageira, como a maioria dos antecessores.


 


Embora com certo atraso e sem qualquer garantia de que sairá da teoria à prática, Luiz Marinho anunciou na semana passada que pretende tornar o Parque Estoril, no Riacho Grande, unidade de conservação. Luiz Marinho espera facilitar a manutenção da vegetação nativa e evitar construções na área preservada da Represa Billings. O decreto congela espaços de edificações, enquanto potencializa o uso em áreas já cristalizada, referindo-se às obras para construção de restaurante, quiosque e píer. Uma ação que não exige mais que disciplina e determinação, porque está restrita a uma pequena faixa de espaço da Represa Billings.


 


O secretário de Gestão Ambiental, João Ricardo Guimarães Caetano, egresso da equipe de Celso Daniel, explicou que o decreto altera a forma de gestão do Parque Estoril. “Quando se cria uma unidade de conservação, o passo seguinte é fazer um plano de manejo, com estudo de território. O objetivo é estabelecer que, em alguns locais, possa haver uso mais intenso e, em outros, restrição. Nessas partes só serão permitidas atividades compatíveis, como caminho e observação da mata e dos animais” – afirmou ao Diário do Grande ABC.


 


Entorno da Billings esquecido


 


As intervenções no Parque Estoril estão longe de contrapor-se à decepção administrativa de um prefeito que, como os antecessores, não se empenhou no planejamento estratégico que tornasse a Represa Billings aliada de desenvolvimento econômico. São Bernardo, mais que qualquer outro Município da região banhada pela Billings, reúne potencialidade para juntar ambiental e econômico de forma sustentável, incrementando o turismo de negócios.


 



Entretanto, nenhum projeto que contasse com parceiros da iniciativa privada saiu do forno da expectativa de novos tempos daquele espaço. É muito mais simples e interessante deixar-se levar por investidores que pretendem manchar ainda mais os espaços físicos dos mananciais que nem o trecho sul do Rodoanel ousou abusar.


 


Por mais absurdo que pareça, o anúncio de um aeroportozão seguido de terminalzinho sempre será mais interessante como ferramenta de marketing do que contratar especialistas e preparar o terreno de ocupação desenvolvimentista do entorno da Represa Billings. Por mais, também, que a chamada rota do frango com polenta, a rota dos motéis, o Riacho Grande, o próprio Parque Estoril e tantos outros endereços públicos e privados esfreguem no rosto dos gestores públicos que o potencial de investimentos poderia ser consistentemente sensibilizador.


 


Enquanto a Administração Luiz Marinho está de olhos arregalados e sequiosos por investimentos contraproducentes ao meio ambiente, o secretário de Gestão Ambiental faz o possível para tentar propagar ideais de responsabilidade social na Billings. Tanto que mandou espalhar meia dezena de placas de advertência sobre ocupação irregular dos mananciais. Um paliativo ante o histórico corrosivo de casas morro acima e morro abaixo em conflito flagrante com critérios de segurança, atendimento básico de saneamento e preservação da natureza.


 


Mais que mananciais


 


“Guardar a responsabilidade social e o meio ambiente” é uma premissa de “Os 10 Mandamentos do Gerenciamento Público Municipal” que não se limita aos mananciais. Também sob esse aspecto o prefeito de São Bernardo perde feio para Celso Daniel.


 


Tão flagrantemente contrastante entre o protagonismo da criação do Clube dos Prefeitos e do idealizador do aeroportozão na área de mananciais é o legado de Celso Daniel do Eixo Tamanduatehy e da Cidade Pirelli que os sucessores não levaram a sério, e as generosas facilidades a investimentos imobiliários que Luiz Marinho tornou prática de governo.


 


O Eixo Tamanduatehy e a Cidade Pirelli tinham entre outros objetivos harmonizar o uso e a ocupação do solo. Tanto que o Eixo Tamanduatehy comportou alguns investimentos que contaram com contrapartida de investidores. O Shopping Plaza, os hotéis que o cercam e o alargamento da Avenida Industrial naquela área provam de que a Administração Celso Daniel não se descuidava da mobilidade urbana, expressão completamente desconhecida à época.


 


Já o prefeito Luiz Marinho fez dos investimentos imobiliários a farra do boi.  Os interesses particulares suplantam largamente o interesse público. Tanto que, sem transparência alguma, a Prefeitura aprovou novo megaempreendimento imobiliário num pedaço do espaço em que funcionava o estacionamento térreo do Shopping Metrópole. É um verdadeiro atentado à paciência dos motoristas ao agravar ainda mais a superação dos gargalos do trânsito naquela área. Não há nenhuma contrapartida à vista. Tanto quanto não houve na Administração William Dib, que antecedeu a Luiz Marinho, na aprovação do conjunto de apartamentos e escritórios comerciais na área colada ao shopping, onde durante décadas uma tecelagem, a Tognato, manteve produção industrial. Centenas de imóveis ocupam aquele espaço que só não entrou em colapso total de trânsito porque o empreendimento se converteu em mico imobiliário. Apartamentos e salas comerciais esperam por compradores arredios.


 


A prometida chegada de um ramal do monotrilho, passando justamente ao lado do empreendimento imobiliário destinado à classe média-média, vai provocar furor dos moradores ante o flagrante incômodo provocado por esse sistema de transporte anunciado equivocadamente como metrô. Como se sabe ou deveria saber, metrô é subterrâneo, não a 15 metros de altura sobre escandalosa estrutura de cimento, caso do monotrilho.


 


O que esperar da mobilidade urbana no cada vez mais tumultuado entorno do Paço Municipal quando o pouco mais de um quilômetro da Avenida Aldino Pinotti, que liga a Avenida Lauro Gomes ao Shopping Metrópole, terá o monotrilho como componente da paisagem urbana a limitar os corredores dos veículos de passeio?


 


Como se tudo isso e outros investimentos imobiliários fossem pouco, também a Rua Jurubatuba, síntese do estrangulamento viário de São Bernardo, ganhará novo empreendimento, agora de escritórios. Serão quatro centenas de salas comerciais e nove lojas de conveniência a impactar uma área em que a disputa por espaço físico entre veículos de passeio, ônibus e caminhões é insanidade completa. Tudo feito sem a menor transparência e ao arrepio do Estatuto das Cidades.


 


Nada diferente, aliás, do empreendimento Marco Zero, na esquina da Avenida Kennedy com a Avenida Senador Vergueiro, igualmente dinamitador da fluência do tráfego porque potencializa o caos destes dias tendo como vizinhança dois supermercados.


 


Também na Avenida Kennedy, a chegada do Golden Square Shopping confirma que a política de liberação de negócios ganha conotação seletiva quando se trata de empreendimentos com logomarcas famosas. Nenhuma obra compensatória foi sequer cogitada como contrapartida àquela imensidão de concreto de quase duas centenas de lojistas.


 


Leiam também:


 




Primeiro Mandamento: nota zero para Marinho e 10 para Celso Daniel


 



Segundo Mandamento: nota dois para Marinho e 10 para Celso Daniel


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