Administração Pública

Sem Aeroportozão e Kombi, Marinho
festeja fábrica de estrutura do Gripen

DANIEL LIMA - 19/12/2013

A última quarta-feira útil de 2013 confirmou derrotas acachapantes da Administração Luiz Marinho, mas também reservou motivo de festa que, certamente, será ampliada além da conta. Num mesmo dia, ontem, o prefeito de São Bernardo apanhou duas vezes da lógica que insiste em afrontar: a Kombi está definitivamente aposentada, por invalidez tecnológica que o ex-sindicalista pretendia adiar, e o Aeroportozão anunciado em outubro de 2011 está definitivamente sepultado. Restou uma notícia que deverá ser festejada além da conta do desenvolvimentismo a ser alardeado: uma espécie de galpão para a produção de estruturas físicas do Gripen, caça padrão escolhido pela FAB (Força Aérea Brasileira). Trata-se de um projeto sobre o qual o petista se lançou com determinação assombrosa jamais direcionada à regionalidade institucional, porque provavelmente os valores são outros.

 

Modular o impacto das três decisões é o que indica o bom senso. E bom senso implica afastamento de contaminação ideológica, partidária e política, quando não eleitoral. O prefeito Luiz Marinho é muito ruim de marketing e por certo tentará capitalizar sem a adequada competência uma vitória importante no campo da indústria de defesa. Marinho não sabe se conduzir nas adversidades e tampouco nas vitórias. Não por acaso perdeu-se nas disputas de bastidores para virar candidato do partido ao governo do Estado, embora venda aos ingênuos a ideia de que jamais pensou no assunto.

 

Primeiro, a Kombi

 

A desativação da linha de produção da Kombi, veículo completamente fora de espectros mínimos de segurança veicular, foi decretada ontem pelo Contran (Conselho Nacional de Trânsito) em reunião realizada em Brasília. Luiz Marinho contava com forte aliado no governo federal, o ministro da Fazenda Guido Mantega, na tentativa de prorrogar o prazo de validade desse trambolho que a Alemanha descartou há quase 40 anos e o México também há bom tempo.

 

Foi uma derrota fragorosa da tese do prefeito de São Bernardo, como enfatizou à Folha de S. Paulo o ministro das Cidades, Agnaldo Silva: “Seria um retrocesso a revogação da resolução, que tem como preocupação elevar o padrão dos carros. A decisão teve como pressuposto a garantia da segurança das pessoas” – afirmou.

 

A tentativa de sensibilizar o xerife da segurança de trânsito foi um fracasso. O argumento de que milhares de demissões na planta de São Bernardo da Volkswagen do Brasil seriam inevitáveis, bem como de fornecedores de autopeças, não colou. Colocaram-se estatísticas furadas, amplamente divulgadas por Luiz Marinho. Seriam perto de quatro mil postos de trabalho decepados. O número foi considerado exagerado pelos conselheiros do Contran, tendo-se como base os licenciamentos dos últimos anos: 22.521 unidades da Kombi em 2013, ante 26.165 em 2010. Não se conhece uma divisão automotiva com relação tão despropositada entre trabalhadores e produção. Os sindicalistas e os empresários têm a péssima mania de concorrer com os políticos na manipulação numérica. E acadêmicos também são especialistas no assunto, contando com o resguardo de títulos universitários indutores de credibilidade nem sempre confirmada.

 

Segundo, o Aeroportozão

 

Em encontro com jornalistas em Brasília a presidente Dilma Rousseff garantiu que autorizará a construção de um novo aeroporto internacional privado para atender ao crescimento da aviação comercial, segundo relato do jornal Valor Econômico. O Município contemplado é Caieiras, na Região Metropolitana de São Paulo, não São Bernardo, como pretendia e anunciou a Administração Luiz Marinho há dois anos num rasgo de megalomania. O projeto está orçado em R$ 5,3 bilhões e foi criado pelas construtoras Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. O empreendimento terá duas pistas independentes e capacidade para 48 milhões de passageiros – equivalente, segundo o jornal, à atual movimentação dos aeroportos de Guarulhos e de Congonhas juntos. O Aeroportozão de Caieiras, que Marinho sonhou instalar nos mananciais de São Bernardo, vai ocupar nove milhões de metros quadrados. Imagine tamanho impacto no verde já desbotado da paisagem periférica da cidade comandada pelo petista.

 

Terceiro, o caça sueco

 

Acreditar que uma Administração tão bem relacionada com o governo federal não belisque alguma lasquinha de sucesso em negócios de interesse partidário e político, entre outros, seria estultice. Por isso, o fornecimento de 36 caças Gripen NG da fabricante sueca Saab para a Força Aérea Brasileira (FAB) premiou o esforço redobrado de Luiz Marinho ao longo dos últimos anos.

 

É verdade que o petista deu sorte, indispensável em qualquer atividade, porque o Gripen não é lá essas coisas, mas foi beneficiado política e ideologicamente. A norte-americana Boeing caiu do andaime com a notícia de que a opção pelo Gripen tem vinculo muito estreito com o surgimento do escândalo de espionagem eletrônica pelos Estados Unidos. Um jogo que parecia ganho pelos norte-americanos, redundou em zebra favorável a São Bernardo de Luiz Marinho. Resta saber se essa é de fato a melhor alternativa para o Brasil, ou se a retaliação monetária foi além da conta.

 

Não se pode, entretanto, acreditar em possíveis exageros que já devem estar a circular na mídia avermelhada. O espaço reservado à gestão de Luiz Marinho está bem tipificado também no jornal Valor Econômico de hoje. Diz a publicação paulistana que toda a parte de estrutura do avião será produzida em uma nova fábrica que a Saab pretende construir em São Bernardo. O investimento previsto, segundo o jornal, é de R$ 150 milhões. A fábrica, batizada de São Bernardo Tecnologia Aeronáutica (SBTA) terá 60% de capital nacional e 40% de participação da Saab.

 

Nesse arranjo de indústrias para produzir o Gripen, sempre segundo o texto do Valor Econômico, a Inbra se responsabilizará pela produção de asas, tampa traseira do trem de pouso e uma seção da fuselagem traseira da aeronave. Inbra é uma empresa que tem como presidente Jairo Cândido, coordenador da cadeia produtiva da indústria de defesa na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). A Administração Luiz Marinho procurará festejar uma fábrica de estruturas, mas o projeto, em princípio, não ultrapassaria os limites de commodities.

 

A grande batalha que a Administração Luiz Marinho terá de agora em diante, já que a construção da fábrica de estruturas básicas do caça é dada como certa, seria romper o direcionamento natural de recursos ao Vale do Paraíba, geografia culturalmente mais preparada para absorver demandas de insumos mais qualificados à fabricação do Gripen. Uma disputa que se assemelharia à vitória de um time da Terceira Divisão sobre um adversário da Primeira. Possível, mas improvável. Talvez Marinho deva inspirar-se na vitória dos marroquinos ontem à tarde ante o Atlético Mineiro.

 

Espera-se apenas que o Gripen não seja um furo nágua, como algumas declarações insinuaram. Quem tem dúvidas sobre isso deveria ler e reler, e se possível grifar, como faço costumeiramente, as declarações do ministro da Defesa, Celso Amorim, ao reagir às críticas de que o Gripen é um avião que ainda está na planta e não existe: “O Gripen já existe sim, está voando e tem protótipo conceitual”, disse o ministro, que, então esclareceu: nas versões A, BC e D, o modelo já voa em países como Suécia, República Tcheca, Hungria, África do Sul, Tailândia e Reino Unido.

 

Descontando-se os interesses contrariados, as perdedoras Boeing e Dassault partiram para a briga crítica imediatamente após tomarem conhecimento da decisão da presidente Dilma Rousseff. O fabricante norte-americano, em tom lacônico, afirmou que o resultado foi decepcionante. Já a direção da francesa Dassault advertiu sobre as diferenças de desempenho entre as aeronaves: “O Gripen não é equivalente ao Rafale em termos de desempenho e, portanto, de preço. Esta lógica financeira não leva em conta nem a relação custo-benefício favorável ao Rafale, nem o nível de tecnologia oferecido pelo consórcio francês”, diz a nota da empresa que supostamente contava com o apoio do então presidente Lula da Silva.

 

Somente o tempo vai confirmar se o governo brasileiro fez uma escolha sensata, lastreada em abrangente estudo técnico, como a notícia sobre o enterro de um monte de lata obsoleta em forma de veículo defendido por Luiz Marinho e também sobre a confirmação de um Aeroportozão longe dos mananciais de São Bernardo -- contrariamente ao que pretendia o prefeito da cidade.

 

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