Administração Pública

Clube dos Prefeitos seria um novo
monstro da regionalidade mansa?

DANIEL LIMA - 04/06/2014

A vinculação de duas notícias publicadas ontem no Diário do Grande ABC com o histórico da Fundação do ABC e com o contexto de liberalidades das instâncias oficiais da Província do Grande ABC não deixa dúvidas de que corremos o risco de estar criando um novo monstro devorador de dinheiro público: o Clube dos Prefeitos, também conhecido por Consórcio Intermunicipal de Prefeitos.


 


A notícia de que a entidade prepara a contratação de 33 agentes públicos e a informação de que pretende contratar 55 obras viárias com recursos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) que totalizam R$ 385 milhões, incrementam perspectiva desastrosa: a enigmática Fundação do ABC, que pretensamente cuidaria da saúde de vários municípios locais, ganhará forte concorrente em obscuridades ditadas pela aproximação incestuosa de supostos adversários políticos. O dinheiro tem falado mais alto do que as idiossincrasias partidárias nas instâncias regionais.


 


A pedagogia do malabarismo orçamentário e operacional da Fundação do ABC, organização sem controle social independente, será muito útil à nova etapa do Clube dos Prefeitos, liberado desde algum tempo para lidar com dinheiro grosso. Haverá queima de etapas de como lidar com dinheiro público sem dar a mínima satisfação à sociedade morta e enterrada. As forças de pressão com que a comunidade poderia contar são forças de pressão de araque. Fingem que se incomodam e que reagem. Tudo para passar um atestado de democracia e idoneidade aos movimentos subterrâneos.


 


Não é pouca coisa transferir todo o conhecimento gelatinoso acumulado pela Fundação do ABC, que passa de geração a geração de políticos, para o Clube dos Prefeitos. Será um curso de pós-graduação, por assim dizer. O Ministério Público, quando decidir ir ao fundo do poço de maus tratos orçamentários, vai levar longo tempo até decifrar a mecânica administrativa que rege a Fundação do ABC e regerá o Clube dos Prefeitos.


 


Que Conselho Consultivo?


 


Rio sem parar, para não ter de chorar, quando leio o que li ontem no Diário do Grande ABC sobre a existência de um Conselho Consultivo no Clube dos Prefeitos, como se a instância significasse algo que pudesse ser catalogado como bloqueio a eventuais tentativas de abusos. É mais provável que seja o contrário. O Conselho Consultivo do Clube dos Prefeitos é formado por não que mais que quatro supostos representantes da sociedade. Todos são muito próximos dos atuais mandachuvas e mandachuvinhas que decidem o pobre destino regional. Uma peneirada avaliativa poderia instalá-los nesse bloco de descompromissados com o amanhã regional porque se integram aquela instituição e não movem uma palha crítica sequer, é claro que estão dominados. Ou então é a sétima maravilha do mundo.


 


Como desgraça pouca é bobagem, agora se estuda acrescentar novos convidados no Conselho Consultivo. Adivinhem quem vem para o jantar de mesuras e outras extravagâncias? Dois vereadores entre os legisladores (legisladores?) da região. É desnecessário dizer que não passarão de paus mandados dos Executivos aos quais estão atrelados porque se não estiveram durante as eleições se tornaram aliados com a composição das bancadas nos primeiros dias de novas legislaturas. Nenhum prefeito vai colocar no seio do Clube dos Prefeitos um adversário político para estragar a festa da unanimidade burra e interesseira.


 


É esse joguinho sórdido de falsa democracia, de falsa transparência, de falsa legitimidade, é tudo isso que se desdobra da inação da sociedade porque a sociedade está pessimamente representada por instâncias formais. O que esperar de Acisas, OABs, Ciesps e tudo o mais se há uma engrenagem de compadrios a acumpliciá-los com os centros de podres poderes oficiais da região?


 


Herança sucateada


 


O Clube dos Prefeitos do Grande ABC é uma das heranças de regionalidade do então prefeito Celso Daniel. Uma ideia fabulosa que não prescindia de representatividade crítica da comunidade. Controlar o autoritarismo, o materialismo e o ideologismo de mandatários políticos do calibre de um Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo e do Clube dos Prefeitos, não seria abordagem opcional inserida no estatuto daquela entidade, mas cláusulas pétreas a ser respeitadas, definindo-se sem semânticas o que tudo se traduz em forma de legitimidade ética.


 


Quem garante, com base em apetrechado diagnóstico que leve em conta manuais de boa administração, que o Clube dos Prefeitos precisa desse batalhão de novos servidores para desenvolver ações técnica?


 


Seria essa decisão uma lambança com dinheiro dos contribuintes quando se sabe que há tendência à contratação de consultorias especializadas no setor público?


 


Quando desenhou e lançou o projeto Eixo Tamanduatehy, Celso Daniel buscou inspiração e pilares técnicos em urbanistas de reconhecida experiência e talento. Os servidores da Prefeitura de Santo André trabalharam em conjunto na execução do projeto. O Clube dos Prefeitos poderia adotar medidas semelhantes. Não faltam operadores nos quadros das prefeituras locais, mas escasseiam talentos com visão global do movimento das pedras. Falta ao Clube dos Prefeitos inteligência técnica para, antes de qualquer iniciativa, definir os caminhos do desenvolvimento econômico de uma região cada vez menos competitiva no cenário estadual e nacional.


 


Consultores especializados, com visão do mundo, seriam muito mais produtivos e por isso mesmo economicamente mais rentáveis do que concursados que mal ouviram falar em regionalidade, quanto mais em especificidades de regionalidades. Se a mão de obra já é escassa no mundo das consultorias convencionais, como se tem provado com a escassez de projetas para obtenção de recursos financeiros do PAC, o que imaginar então em gente que entende de desenvolvimento econômico obrigatoriamente de medidas transversais?


 


Mas quem disse que o prefeito Luiz Marinho, dono do rebanho de prefeitos da região, escorado no poder econômico e político que detém, está preocupado com essas filigranas quando se sabe que a mover-lhe os neurônios estão os objetivos políticos atrelados ao aparelhamento de instituições públicas?


 


Talento ao desperdício


 


O que impressiona quem observa a cena regional com um mínimo de discernimento, independência e coragem é que as instâncias oficiais continuam a exercitar capacidade aparentemente infinita de desperdiçar tempo e dinheiro, embora tanto uma coisa quanto a outra não signifiquem que vantagens espúrias não sejam programadas com esmero. E impressiona também o alheamento geral e irrestrito de agentes que, no passado, pareciam menos condescendentes com os indícios de mandraquismos, quanto mais com as mais que evidentes escorregadelas de malandrismos.


 


O Clube dos Prefeitos inspira-se portanto na regionalidade mais que matreira da Fundação do ABC. Todos os sistemas de freios e contra freios que a política partidária sempre enunciou, ou seja, a disputa por espaços tendo como combustível de desgastes múltiplos a denúncia de irregularidades, parece terem-se se ajeitado na banda larga de um conluio de silêncio e concertos lesivos aos interesses públicos.


 


Vivemos sob as trevas de um regionalismo manso, que vem a ser a forma mais danosa de manipulação dos recursos públicos porque blinda por conveniência e safadeza qualquer possibilidade de contraposições que redundem na perspectiva de que possíveis desvios sejam detectados e apurados.


 


Afinal, se houvesse interesse para valer de tratar o dinheiro público com zelo e respeito, além de responsabilidade, por que se operariam esquemas prestidigitadores, feitos de encomenda para parecer o que não é e que por não ser o que pretende ser mostra despudoramente o que é? 


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