Só faltava essa: o leitor acreditar que eu botaria a colher decisória no julgamento do caso envolvendo o Instituto de Pesquisas do Diário do Grande ABC e o candidato Paulo Skaf, que se engalfinham para decidir se será publicada ou não uma sondagem sobre as intenções de voto ao governo do Estado no eleitorado da Província do Grande ABC. Nem se tivesse todas as informações indispensáveis me meteria nesse negócio. Não sou Justiça Eleitoral, mas que a briga é interessante, não tenho dúvidas. E que vale a pena ser explorada, também.
Lendo como li as matérias publicadas ontem e hoje no Diário do Grande ABC e lendo como li uma matéria sobre o assunto hoje no Estadão, mais confuso fiquei sobre o que se passa de fato. O Diário não apresenta as mesmas informações do Estadão. Por conveniência ou outra coisa, o Diário do Grande ABC omite certas nuances que o Estadão aborda ouvindo o outro lado, o lado dos advogados de Paulo Skaf. E isso faz muita diferença. Um resumo da ação judicial do candidato do PMDB poderia ter sido levado aos leitores do Diário do Grande ABC porque, se inconsistente, seria naturalmente bombardeado.
Diz o recurso do candidato Paulo Skaf que a sondagem do DGABC Pesquisas, como é chamado o instituto do Diário do Grande ABC, teria suposta abrangência estadual quando, de fato, se limita a poucas cidades. Diz também que o total de entrevistados por Município não é proporcional e que a ordem dos questionamentos poderia induzir a resposta dos entrevistados. Dizem também os advogados de Skaf, segundo o Estadão, que “por ser feita em uma região onde tradicionalmente são fortemente votados os candidatos do Partido dos Trabalhadores, ela não poderia ser apresentada como levantamento estadual”.
Identidades distintas
Se tudo isso for de fato verdade (e não acredito que não o seja porque as informações não seriam descuidadamente repassadas pelo Estadão), a Justiça Eleitoral pode mesmo complicar a atuação do Instituto Diário. A concessão de liminar pelo juiz Marcelo Coutinho Gordo suspendendo a divulgação da pesquisa foi sensatamente seguida de determinação para que o levantamento continue a ser feito. Vamos ver o resultado que vai dar. Há dois pontos que não podem ser excluídos de qualquer análise isenta.
O primeiro é que não se pode confundir a identidade do Diário do Grande ABC com a do Instituto de Pesquisas Diário do Grande ABC, embora o segundo pegue carona no primeiro. Separando-se um do outro, a aplicação do conceito de censura não resiste ao peso diferenciado da legislação eleitoral. Portanto, nem pode ser estendida à condição inalienável de liberdade de imprensa, que, no caso, se subordina à legislação específica sobre pesquisas eleitorais. Se a candidatura do ex-presidente da Fiesp provar que há buracos negros na metodologia utilizada pelo Instituto DGABC, não restaria outra saída senão atirar ao lixo o calhamaço de entrevistas.
O segundo ponto é que essa divisão de pesquisas do Diário do Grande ABC, ao contrário do que afirmou o jornal no editorial da edição de ontem, é uma aberração como instrumento de medição de qualquer coisa séria, principalmente no campo eleitoral. Os resultados das disputas municipais de 2012 na Província do Grande ABC, disponíveis em forma de análise no acervo desta revista digital, foram uma sucessão de estilingadas erráticas.
Mais: quem se aventurar a buscar nas páginas do próprio jornal algo que elucide dúvidas sobre qualquer informação que remeta à estrutura de recursos humanos entre outras questões importantes do Instituto DGABC, perderá tempo e paciência. Ou seja: se a realidade de 2012, transposta a outra sondagem no ano passado, tiver sido mantida, a pesquisa sob suspeição provavelmente apresentaria resultados muito distantes da consistência de outros institutos. Daí a argumentação da defesa de Paulo Skaf estar correta é outra coisa, embora também possa ser mesmo a mesma coisa.
Eficiência mistificada
O diretor de redação do Diário do Grande ABC, Sérgio Vieira, que mistifica a eficiência de resultados do Instituto DGABC, também se equivocou na defesa da publicação da pesquisa ao, no editorial de ontem, afirmar que não condiz com a verdade uma das alegações dos advogados de Skaf -- de que a Província é um fortíssimo reduto petista.
Pura bobagem: se no âmbito estadual as candidaturas petistas não conseguiram decolar nas últimas disputas ao Palácio dos Bandeirantes na Província do Grande ABC, embora obtivessem volume maior de votos do que a média paulista, nas disputas presidenciais de segundo turno tanto Lula da Silva quanto Dilma Rousseff chegaram em primeiro lugar. O argumento dos defensores de Paulo Skaf, de que se pretende extrapolar para o Estado os resultados das sondagens na Província do Grande ABC para favorecer candidaturas petistas, é estatisticamente inexpugnável.
A Justiça Eleitoral certamente contaria com mais elementos informativos e comprobatórios para decidir a questão. De qualquer modo, quem mais vai ganhar com tudo isso, por mais paradoxal que pareça, será o Diário do Grande ABC. Emprestar o nome a um instituto de pesquisas sazonal, nada transparente e com metodologias comprovadamente inapropriadas em rodadas anteriores, é uma grande roubada.
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19/11/2024 PESQUISAS ELEITORAIS ALÉM DOS NÚMEROS (24)