Somente recrutas zero em matéria de preparo intelectual e técnico são capazes de acreditar que é rei quem tem apenas um olho em terra de cegos tributários. Haverá sempre alguém capaz de desmascarar análises rasas e caolhas. O caso dos reajustes do IPTU no Grande ABC é emblemático pela sistemática abordagem monocórdia do comportamento errático, mas nem por isso desqualificado, da Prefeitura de Santo André.
Ao circunscreverem críticas superficiais e facciosas ao caso de Santo André, os recrutas zero de plantão, em vez de contribuírem para colocar a casa do debate em ordem, apenas se afundam. Trapalhões, daí serem chamados de recrutas zero, desprezam não só a regionalidade na avaliação dos valores cobrados, mas também tantos outros vetores. Negam informações substantivas para sustentarem argumentos gelatinosos.
O principal vetor, para que o entendimento seja minimamente estabelecido, é que o avanço dos valores do IPTU na carteira de custos tributários dos contribuintes do Grande ABC -- como de resto de grande parcela dos municípios brasileiros -- tem origem na implantação do Plano Real e do fim da inflação desmiolada. Com isso, o Poder Público perdeu a moleza dos ganhos inflacionários que, em larga escala, indexavam as receitas e desgastavam monetariamente as despesas.
Não bastasse isso, o Grande ABC, para tristeza dos cenaristas do tudo cor-de-rosa, entrou em parafuso econômico depois do boom consumista do Plano Real. Tanto que FHC deveria receber o troféu intransitório de KJ Eterno. O que significa isso? Simples: KJ é o contrário de JK, que, como se sabe, descobriu a indústria automobilística que tanta riqueza -- e problemas também -- fez surgir na região. FHC simplesmente arrasou a economia do Grande ABC.
Mas voltemos aos recrutas zero que só enxergam Santo André em suas lambanças interpretativas, auxiliados por uma Administração Pública que acelera demais a velocidade da recomposição de valores evidentemente defasados: estudo sucinto que fiz com base em dados oficiais, da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, chega à seguinte constatação:
Entre 1997 e 2002, o Grande ABC saltou de R$ 91,5 milhões para R$ 230,2 milhões, em termos nominais, na arrecadação do IPTU. Reajuste nominal de 151,4% no período.
Ribeirão Pires da prefeita Maria Inês Soares, do PT, quietinha, quietinha, sem pressão de ninguém, aumentou a receita com o IPTU em 269,30%, isto é, de R$ 1,9 milhão para R$ 7,1 milhões.
Mauá, também do PT de Oswaldo Dias, está em segundo lugar no ranking de aumentos nominais, atingindo em sete anos total de 249,04% -- saiu de R$ 6 milhões para R$ 21,1 milhões.
Quem acha que Santo André aparece em terceiro lugar, caiu do cavalo. Quem fica com a posição é São Bernardo, que reajustou os valores em 215,54% no período de sete anos, passando de R$ 31,7 milhões para R$ 100,1 milhões.
Errou de novo quem acha que Santo André aparece em quarto lugar. O posto é de São Caetano, que elevou em 154,7%, em valores nominais, a receita com o IPTU -- de R$ 7,1 milhões para R$ 18,1 milhões.
Santo André, sempre perseguida, aparece em quinto lugar com acréscimo de 99,70% em valores nominais, saltando de receita de R$ 26,4 milhões para R$ 52,8 milhões no ano passado.
Diadema vem em sexto lugar com 70,12% de reajuste do IPTU, passando de R$ 17,8 milhões para R$ 30,4 milhões.
A pequenina Rio Grande da Serra, por ter pífia receita própria e, como a maioria dos pequenos municípios brasileiros, nutrir-se de transferências estaduais e federais, acresceu em apenas 5,26% nominais os valores do IPTU.
A dose cavalar em alguns casos que Santo André vem aplicando no IPTU que será pago neste ano -- outros municípios foram menos profundos nos reajustes porque puxaram a corda com mais força nos anos anteriores --, deverá recolocá-la num patamar de receita per capita média próxima de São Bernardo, São Caetano e Diadema, que lhe estão à frente.
Já escrevemos muito sobre o IPTU e variantes de análise, mas voltaremos ao assunto que, também, terá capítulo especial no livro Meias Verdades, Como Usar a Mídia para Vender Ilusão, que lançarei provocativamente no Dia da Mentira, 1º de abril. Há principiantes tributários e desclassificados ético-jornalísticos que não poderão ser esquecidos nessa obra.
Um livro sob encomenda para jornalistas ruins de economia, para economistas ruins de leitura e também para leitores em geral usados como massa tanto de manobra de fontes de informações indecentes como de jornalistas graduadamente incompetentes.
Para completar: o amigo e especialista Ary Silveira Bueno, da ASPR Auditoria e Consultoria, de Santo André, atende-me com rapidez e faz os cálculos da inflação pelo IGP-M de 1º de janeiro de 1997 a 31 de dezembro do ano passado: o resultado é 100,28%. Desta forma, apenas Santo André, Diadema e Rio Grande da Serra apresentam receita do IPTU abaixo da inflação do período.
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15/10/2024 SÃO BERNARDO DÁ UMA SURRA EM SANTO ANDRÉ