As digitais de protecionismo e privilégios às logomarcas mais reluzentes do setor imobiliário já aparecem na Administração do prefeito Carlos Grana. E podem provocar grandes estragos econômicos e sociais. Pequenos construtores, universo insondável mas que teria pelo menos 200 representações e milhares de postos de trabalho, estão em pé de guerra contra alguns pontos da revisão da Lei de Uso, Ocupação e Parcelamento do Solo (Luops), emaranhado que supostamente ordenaria e controlaria a qualidade de vida urbana.
Há acusações duras contra o secretário de Desenvolvimento Urbano, Paulo Piagentini, notório ponta de lança de grandes construtoras que atuam na Província do Grande ABC. Ele é o instrumento que favorece os grandes negócios imobiliários e age com rigor exacerbado contra os pequenos.
Quando recém-eleito o prefeito Carlos Grana anunciou Paulo Piagentini para o comando da pasta. Um gestor público que desconsiderasse a influência contaminadora de interesses localizados normalmente entregaria a pasta a um profissional qualificado em destrinchar os nós urbanos de uma região metropolitana. A indicação de Paulo Piagentini sinalizou que as grandes empresas seriam beneficiadas.
O setor imobiliário é um dos principais financiadores de campanhas eleitorais no País. Os tentáculos são imensos. Escândalos são abafados ou apurados com lentidão paquidérmica. Até agora as irregularidades no Semasa, denunciadas durante a gestão do prefeito Aidan Ravin, não atingiram nenhum representante do Poder Público e dos empresários beneficiados. A novidade no caso não é propriamente a demora na apuração. A novidade foi o estouro do escândalo. Normalmente, tudo é abafado, negociado, chantageado e resolvido. O prefeito Aidan Ravin descuidou-se e deu no deu.
São Paulo avança
Na Capital tão próxima, o escândalo da chamada Máfia dos Fiscais foi denunciado depois do caso do Semasa. O crime contra os cofres públicos contou com o envolvimento de mais de cinco dezenas de empresas, entre as quais a MBigucci de São Bernardo. O Ministério Público avançou nas investigações e já solicitou a prisão de um grupo de beneficiários das falcatruas, no que foi atendido pelo Judiciário. As empresas envolvidas estão sendo autuadas duramente porque se locupletaram com o rebaixamento corrupto dos valores do ISS e do IPTU. Calculou-se que mais de R$ 500 milhões foram surrupiados da Prefeitura de São Paulo no período de quatro anos, durante a Administração de Gilberto Kassab. O montante provavelmente está subestimado.
A nova legislação que se pretende enfiar goela abaixo dos pequenos construtores de Santo André é prova de que a indicação de Paulo Piagentini obedece à lógica de privilégios aos grandes empresários. As chamadas consultas populares para definir os rumos da ocupação do solo em Santo André, anunciadas em peças publicitárias diversas, inclusive em outdoors espalhados por ruas e avenidas, são apenas uma falsa roupagem de democracia participativa. Há denúncias de que os encontros não foram pautados pelo contraditório construtivo. Prevaleceram o mandonismo e o autoritarismo do secretário Paulo Piagentini. Sem contar que os pontos centrais das mudanças são atirados na mesma vala comum de questões sem a maior importância, colocadas apenas para engrossar o caldo burocrático e com isso deslocar as atenções.
A nova legislação de uso e ocupação do solo atinge em cheio os interesses dos construtores de menor porte em Santo André ao restringir os pequenos lotes de terrenos. Onde pela legislação atual podem ser construídos quatro apartamentos, em terreno de cinco metros de frente por 25 de fundo, só poderão ser erguidos dois. O efeito prático da medida é que imóveis vendidos hoje a R$ 190 mil, e que se encaixam no projeto Minha Casa Minha Vida, do governo federal, serão economicamente inviabilizados.
Em contrapartida, os grandes empreendimentos serão favorecidos fortemente. O limite de 199 unidades habitacionais que os retira da condição de grande impacto urbano e que, portanto, dispensa contrapartidas, ganhou elasticidade. Com a nova legislação, estará isento de custos adicionais quem construir até 299 apartamentos em terrenos com no mínimo cinco mil metros quadrados.
Como a Prefeitura vai justificar as restrições à ocupação de terreno dos pequenos construtores se na outra ponta, na ponta que mais interessa ao secretário da pasta, o caminho é completamente inverso? Essa é a pergunta que mais fazem as lideranças dos pequenos construtores. Eles contam com o apoio de empresários do setor de venda e locação de imóveis e também do entorno da construção civil, sobretudo lojas de material, além de trabalhadores.
Exército invisível
Os pequenos construtores são um exército invisível. Disperso, sem uma logomarca reconhecida, aparentemente autofágico porque concorreriam entre si, esse agrupamento resolveu se unir contra o que chamam de autoritarismo e contradição do Paço Municipal.
Um argumento aparentemente irrebatível contra a pregação do secretário Paulo Piagentini, de que as limitações ao uso de pequenos lotes possibilitarão maior fluidez do tráfego, entre outros supostos custos urbanos provocados pelos pequenos construtores, é desclassificado pelas lideranças do movimento. Eles argumentam que os conjuntos habitacionais que mais prevalecem no nicho em que atuam se localizam distantes dos eixos viários mais concorridos. Ou seja: ajudam a retirar veículos de áreas mais valorizados e por isso mesmo preferenciais de investimentos das grandes construtoras.
Também ressaltam o que chamam de viés discriminador do secretário Paulo Piagentini ao afirmarem que a geografia de Santo André é prova provada de que são os grandes empreendimentos os únicos responsáveis pelo caos da mobilidade urbana ao erguerem o que chamam de monstros verticais.
A tropa de choque da Administração Carlos Grana já está mobilizada para reduzir os custos políticos das medidas prestes a ser tomadas. Há emissários informais que procuram contatos com lideranças identificadas do movimento. Não faltam interlocutores menos diplomáticos.
Os pequenos construtores sabem que a disputa é indigesta, mas estão prontos ao combate. Eles têm-se reunido com a bancada de oposição do prefeito Carlos Grana no Legislativo de Santo André. E também procuram alternativas para chegar a vereadores que apoia a gestão petista. O apelo social é forte. Os pequenos construtores reúnem alguns milhares de trabalhadores que, por conta de estrutura mais enxuta das empresas, obtém salários mais robustos em relação aos grandes empreendimentos do setor. A proximidade entre empregador e empregado é mais intensa também. Há mais empatia entre os trabalhadores da construção civil vinculados aos pequenos construtores do que entre os trabalhadores e os grandes players do setor.
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