Os resultados do Datafolha sobre a corrida presidencial publicados nesta terça-feira reforçam uma possibilidade que parecia completamente fora de lugar ao final do primeiro turno: o PT pode conquistar o tetracampeonato de votos na Província do Grande ABC -- assim como no território nacional. Vamos tratar dos votos presidenciais na região que, por não ser um mundo à parte, tem semelhanças com os resultados em nível nacional.
A Província já foi mais avermelhada que o conjunto do País, mas, por conta de série de vetores, entre os quais um sindicalismo combativo voltado às grandes empresas e suas principais ramificações, além de uma classe política excessivamente gulosa, vem perdendo força para os azulados e assemelhados.
Faltam referenciais estatísticos atuais do segundo turno na Província do Grande ABC a permitir incursões com grau de confiança possível dentro da margem de erro de certezas que as pesquisas sugerem. O DataDiário, também conhecido por DGABC Pesquisas, não realizará rodada alguma de sondagem de votos nesta segunda etapa. Pelo menos não divulgou nada a respeito. Para aquele instituto que errou 48% dos resultados ao governo do Estado de São Paulo e à presidência da República na primeira rodada de votos, em cinco de outubro, o jogo regional pelo Palácio do Planalto não tem valor algum.
Dose exagerada
Por mais que o DataDiário não forneça a segurança de que a vontade real das urnas combinará com a intencionalidade dos entrevistados, deve-se reconhecer que seria um farol neste segundo turno. À falta do DataDiário, fico com o histórico de votação dos três segundos turnos presidenciais em combinação com os resultados gerais no País nos respectivos períodos. A conclusão é que, ao imaginar que 10 pontos seriam a diferença de votos favoráveis ao tucano Aécio Neves contra Dilma Rousseff no segundo turno na Província, com margem de erro de dois pontos para cima e para baixo, devo ter exagerado na dose.
Antes mesmo de Dilma Rousseff despontar na liderança numérica e quase fora da margem de erro em âmbito nacional já estava decidido a reformular a projeção, ante informações recolhidas aqui e acolá. O PT regional saiu às ruas com sofreguidão. Servidores públicos, comissionados, familiares, sindicalistas, tudo o mais botaram o bloco nas ruas. Há infinidade de modalidades de persuasão em campo. Ganhar do tucano Aécio Neves na região virou questão de honra vermelha. Houve certo comodismo dos vermelhinhos no primeiro turno na região, mas agora eles pegaram no breu.
Por isso será muito difícil um descolamento dos votos gerais de Dilma Rousseff e Aécio Neves no País e os votos que obterão entre os dois milhões de eleitores dos sete municípios da região. Se Dilma Rousseff vencer a disputa geral, também ganhará na região. Exceto se a diferença estiver na margem de erro de dois pontos para cima ou para baixo. Exemplificando: se Dilma Rousseff for reeleita com mais de 52% dos votos válidos, as possibilidades de superar Aécio Neves na Província serão substantivas. Quanto mais a petista alargar a diferença no Brasil, mais terá tido sucesso na região. Se a diferença for menor que a margem de erro, possivelmente Aécio Neves sairá vitorioso na Província. Viram como faz falta uma pesquisa confiável sobre como pretende votar o eleitorado regional? Faço essas projeções com base no passado de votos regionalmente consolidados e no presente de votos gerais especulados pelas pesquisas.
Goleada em 2002
Em 2002, com a economia nacional em frangalhos e a economia da Província destruída pelo governo Fernando Henrique Cardoso, o PT do candidato Lula da Silva obteve a maior vantagem sobre os tucanos na campanha do tricampeonato nacional. Lula da Silva obteve na região 67,13% dos votos, contra 32,87% de José Serra. No Brasil, Lula venceu por 61,38% a 38,72%. O petista ganhou em todos os municípios locais. Inclusive na antipetista São Caetano, aonde obteve 53% dos votos válidos contra 47% do tucano. Qualquer debate sobre a desastrada política econômica de FHC na região dispensaria legenda. Basta ver os números da disputa presidencial em São Caetano.
O segundo mandato de Lula da Silva é marcado pelos efeitos deletérios do mensalão, que explodiu em 2005, e também pelo crescimento econômico embalado pela riqueza das commodities e pelo consumismo financiador de uma classe emergente que muitos chamam malandramente de classe média. Os efeitos econômicos que se refletiram na Província do Grande ABC, com o avanço do setor automotivo, nossa alma, pernas, coração e tudo o mais, amorteceram os estragos na imagem do PT supostamente impenetrável à corrupção.
Dessa forma, os resultados locais e os resultados nacionais praticamente ficaram na margem de erro: o PT de Lula da Silva obteve 57,41% dos votos válidos no segundo turno enquanto os tucanos de Geraldo Alckmin ficaram com 42,59% na Província do Grande ABC. No plano nacional, o PT ganhou por 60,83% a 39,17%.
Veio então a disputa de 2010, com Dilma Rousseff ungida por Lula da Silva e os tucanos de novo com José Serra. O PIB nacional crescera 7,5% naquela temporada de votos. Uma oportunidade de ouro para Lula da Silva ser reverenciado como gênio político ao transformar um poste em presidente. Foram 56,05% dos votos válidos no Brasil para a candidata petista, ante 43,95% a José Serra. Na Província do Grande ABC, mais uma vez a margem de erro foi respeitada em relação ao resultado geral: Dilma Rousseff somou 54,05% e José Serra 45,95%.
Província à brasileira
Cada vez mais, portanto, a Província age nas urnas de forma semelhante à do Brasil como um todo. Nada que surpreenda, porque economicamente, com base em pesquisas de potencial de consumo que definem subformações de classes, a Província está cada vez mais à brasileira. O que é uma tristeza porque significa queda contínua de mobilidade social, em contraposição ao crescimento médio do País.
Para quem aprecia conceito estúpido de igualdade, nada melhor. Quem diria, a Província do Grande ABC, outrora triunfalista “Grande ABC”, está se tornando um Brasil bem brasileiro, sétima economia do mundo apenas para quem gosta de manipular conceitos e qualidade de vida.
Qualquer resultado eleitoral que coloque a Província do Grande ABC em situação consistentemente diferente do resultado nacional seria uma surpresa quando forem apurados os votos neste domingo. Entretanto, tenho leve desconfiança sobre a possibilidade de abertura de uma fronteira diferenciada, que consistiria na quebra do capital eleitoral do PT na Província em relação à média do País além da margem de erro das pesquisas.
Vou explicar esse sentimento respaldo por números. Se isso ocorrer, acredito que os resultados não deverão ser catalogados como ocasionais e, portanto, sem base de avaliações. Diria que, se for concretizado esse vácuo Região-País, o PT regional terá de se mobilizar para procurar encontrar o encaixe que impeça o aprofundamento da ruptura. Mas aí já é outra história.
Além da margem
Então, vamos à explicação para uma possibilidade de resultado regional além da margem de erro do resultado nacional, num processo inverso ao que ocorreu na primeira eleição de Lula da Silva, em 2002. Trata-se de observação atenta à linha do tempo eleitoral da conquista do tricampeonato regional (e também nacional) do PT.
Em nível Brasil, houve oscilações praticamente imperceptíveis nas vitórias petistas: Lula da Silva contabilizou 61,38% dos votos em 2002, caiu para 60,38% em 2006 e elegeu Dilma com 56,05% em 2010. Tudo praticamente na margem de erro. Na Província do Grande ABC houve uma queda pronunciada no mesmo período: de 67,13% em 2002 para 57,41% em 2006 e 54,05% em 2010. Entre uma ponta e outra, desprezando a eleição de 2006, o PT emagreceu na região nada menos que 13,08 pontos percentuais, ou 19,48%. Já em âmbito nacional, entre uma ponta e outra, e de novo descartando 2006, o PT perdeu apenas 5,33 pontos percentuais, ou 8,68%.
Será que a diferença de velocidade de perda do eleitorado do PT na Província e no País vai continuar nesta temporada? Esta seria uma explicação sustentável à possível diferença além da margem de erro nos resultados desta temporada em relação às duas últimas eleições. Por isso não está fora de cogitação tanto a possibilidade de Dilma Rousseff perder nos dois espaços territoriais analisados quanto ganhar em nível nacional e perder em nível regional. O que teremos domingo?
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