Deu no G1, portal de notícias das Organizações Globo, que o Ministério Público Federal abriu procedimento preparatório para investigar possíveis irregularidades na compra de 36 caças Gripen NG (New Generation) pela Força Aérea Brasileira no valor de US$ 5,4 bilhões (cerca de 16,8 bilhões, atualmente). Sugere-se que o MPF estenda as investigações às entranhas que determinaram a opção pela compra dos caças suecos. O prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, e um advogado lobista, Edson Asarias, da equipe paralela de gestão no mínimo obscura, participaram ativamente das negociações. Há muita sombra que deveria receber holofotes republicanos no mínimo para retirar da cabeça do petista a espada da desconfiança de que a operação tenha seguido manuais de gestão que conflitam com a ética e a moralidade. Em outros termos, que não seja um manancial de maracutaias.
Segundo a Procuradoria da República do Distrito Federal, a investigação teve inicio em 19 de fevereiro, após a representação de um procurador solicitando a apuração de “possíveis irregularidades no aumento do valor da aquisição dos caças Gripen nos contratos firmados com a empresa Saab”. O governo assinou em outubro de 2014 o contrato com a empresa sueca para a aquisição das aeronaves militares que só começam a chegar em 2019. O valor final que será pago é US$ 900 milhões superior ao previsto na proposta inicial apresentada pela fabricante.
Ainda segundo o G1, essa fase de investigação, conduzida pela procuradora Eliane Pires Rocha, consiste em uma parte burocrática em que estão sendo coletadas informações iniciais e em que serão feitas diligências. A partir de elementos coletados o MPF optará ou não pela abertura de um inquérito para apurar as suspeitas. “As investigações estão na fase inicial e foram feitos alguns pedidos de informação, mas ainda não há uma posição do MPF”, informou a Procuradoria.
Pedido do cliente
Em entrevista ao G1 na Suécia em novembro passado, o CEO e presidente da Saab, Hakan Buskne, alegou que “basicamente o preço subiu devido aos pedidos do cliente”. E completou: “Nós oferecemos algo e eles fizeram novos pedidos, como o Vide Area Display (WAD, um display panorâmico)”. O display não existe em nenhuma das versões do jato que a companhia sueca desenvolve desde 1980 e foi um pedido especial da FAB para o caça brasileiro. A Aeronáutica também diz que o valor final aumentou devido às exigências brasileiras. A FAB disse que não foi comunicada oficialmente da investigação.
Segundo o G1, o modelo atual do Gripen possui três visores, que fornecem informações diferenciadas. Para ter uma ideia do que o display panorâmico representa apenas um avião de combate no mundo, o norte-americano F-35 Lightning II, possui uma tela como a exigida pelo Brasil, e que será desenvolvida pela empresa AEL Sistema, no Rio Grande do Sul. Ainda segundo o G1, pilotos da Força Aérea sueca afirmam que não confiam nesse tipo de tela, devido à possibilidade de perder informações. A aeronáutica sueca, que também encomendou unidades do Gripen NG, ainda em desenvolvimento, quer todos os seus aviões com três painéis, e não o único painel optado pelo Brasil.
Mais complicações
Depois de ver desmoronar o projeto do pré-sal em São Bernardo, praticamente destruído na esteira da Operação Lava Jato que colheu duramente a Petrobras, não está fora do horizonte outro desfalque nos planos do prefeito Luiz Marinho. Se as investigações sobre a compra dos caças forem adiante e com preocupação de utilizar lupas de rigor e transparência, possivelmente o desassossego do petista seria ainda maior nestes tempos em que os rescaldos da Petrobras fazem estragos na Capital Econômica da região.
A condução das negociações pelo próprio prefeito, que, inclusive, viajou à Suécia e fez um passeio fotografado a bordo de uma das versões do Gripen, obedeceu a um ritual típico do período de trevas informativas de ex-sindicalista que acredita ainda estar representando uma corporação, no caso político-partidária, não a sociedade como um todo.
Sempre acompanhado do advogado Edson Asarias, com quem mantém relações estranhas, o peso político de Luiz Marinho, filho dileto do ex-presidente Lula da Silva, contribuiu imensamente para a escolha dos suecos. Franceses e norte-americanos pareciam mais adiante na corrida de negociação, mas foram superados na reta de chegada. Entretanto, uma versão que poderia soar conspiratória quando se despreza o potencial tático e estratégico do PT dá conta de que tudo não teria passado de jogo de cena diplomático para dar suposta competitividade à escolha. As relações de Luiz Marinho com a Saab, que conta com fábrica de caminhões em São Bernardo, são antigas e inclusive ultrapassaram os limites estritamente econômicos, de sindicalista que virou prefeito, com uma empresa multinacional que gera riqueza na região.
Advogado próspero
Há muitas questões que o prefeito Luiz Marinho poderia responder no eventual inquérito do Ministério Público Federal. Por exemplo: quem o advogado Edson Asarias representava nas viagens à Suécia? Ao que consta, embora não desgrude das tetas da Prefeitura de São Bernardo, Edson Asarias não é funcionário público municipal. Também não seria enviado especial do governo federal, porque também não teria vínculo de representação oficial.
Certo mesmo é que mantém contrato com a Inbra, empresa sediada em Mauá que, vejam só, se associou à Saab para construir fábrica em São Bernardo. Uma unidade que produzirá exclusivamente a estrutura metálica dos caças, a qual, transposta a Gavião Peixoto, Interior do Estado, receberá recheios tecnológicos e se transformará em aeronave.
Toda a logística diplomática-negocial traduzida no contrato com a Saab se desenvolveu ao longo de três, quatro anos, sem que qualquer constrangimento fosse apontado. Ou será que é normal um prefeito de qualquer que seja a cidade, mesmo uma São Bernardo reconhecidamente poderosa, deslocar-se alegre e saltitante com o acompanhamento de um assessor não oficial e quase sempre omitido nas informações, em busca de investimentos que vão custar os tubos para os cofres federais?
O modelo de luzes apagadas à curiosidade pública patrocinado pelo prefeito Luiz Marinho não é diferente do que o governo federal, sobretudo nas estatais, institucionalizou como norma a ser seguida. O escândalo da Petrobras não é obra do acaso, como também não o são os escândalos potenciais que possivelmente sairão de outros corredores do Estado em que o dinheiro público e o modus operandi de uma gigantesca máquina construída para manter o poder político estavam azeitadíssimos até a força-tarefa da Lava Jato aparecer.
O advogado Edson Asarias fez fortuna desde que emergiu nos escaninhos do Poder Público de São Bernardo. Tanto que incomoda os próprios petistas pela volúpia com que desenvolve ações paralelas de suporte ao prefeito Luiz Marinho.
Gênio ou trapalhão?
Conhecer em detalhes o apetrechamento intelectual desse advogado não custaria nada às autoridades públicas interessadas em retirar eventuais pontos de interrogação que apareçam nas investigações. Afinal, ele pode ser consagrado como um negociador extraordinário, a merecer até o titulo de Cidadão de São Bernardo, ou estaria metido numa enrascada que provocaria estragos terríveis ao entorno mais graduado que lhe dá sustentação.
O preço sobressalente dos caças Gripen pode, portanto, tornar-se café pequeno ante o potencial bombástico de esclarecimento muito mais profundo de pontos intrigantes da operação que uniu São Bernardo e Saab. Inclusive com o agregado de um Centro Tecnológico ao custo inicial de US$ 50 milhões, cuja cronologia de instalação de infraestrutura e utilização didática seguindo os pressupostos acordados está muito aquém do esperado. Sem contar que a instituição proposta conflita com o escopo industrial da fábrica prometida para São Bernardo, refratária a investimentos cerebrais porque seria apenas e tão somente uma carcaça de aço sem recheio de riqueza intelectual.
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15/10/2024 SÃO BERNARDO DÁ UMA SURRA EM SANTO ANDRÉ