Política

Código de Ética para vereadores
não passa de encenação abusiva

DANIEL LIMA - 14/08/2015

Essa história ordinária de que vereadores de Santo André pretendem normatizar as atividades que exercem com o chamado Código de Ética que dormita nos escaninhos da burocracia interna há um tempão não deve ser levada a sério. Tudo não passa de jogo de cena nestes tempos de crise econômica e de desvarios políticos. Eles querem mesmo é marcar posição. Eles acredita que a sociedade não passa de conjunto de otários.


 


Escrevo nestes termos porque é assim que vereadores merecem ser descritos. Com raras exceções que confirmam a regra geral dos Legislativos, linha de extensão dos Executivos, não acredito na ação de vereadores em Santo André ou em qualquer outro Município da região. Simplesmente porque está tudo dominado.


 


Poderia simplesmente silenciar sobre o projeto de resolução que pretende regulamentar o Código de Ética protocolado pelos integrantes da mesa-diretora na sessão da última terça-feira. Mas como dizem que quem cala consente, decidi exteriorizar ostensiva objeção ao padrão de comportamento dos vereadores. Essa turma, sempre com exceções, não está nem aí de verdade com os quesitos de moralidade e ética. Quem vive os bastidores da política sabe disso. Houvesse espécie de Petrolão dos Legislativos, poucos escapariam.


 


Código já existe


 


Essa farsa institucional não pode permanecer intocável. Está na hora do jornalismo em geral – e seria ótimo se começasse por aqui – botar a mão na massa da desconfiança de modo a produzir novo tipo de cobertura dos Legislativos. Ninguém melhor que a Imprensa independente para organizar Código de Ética compreendido e respeitado pela sociedade. Esse instrumento já existe e se refere ao exercício competente da profissão.


 


Fico estupefato ao acompanhar alguns nomes que saltam do Legislativo de Santo André em defesa de comportamento ilibado de seus pares, sendo eles no mínimo falseadores por conta de atuações mais que suspeitas.


 


Querem um exemplo: três escândalos imobiliários afloraram em Santo André nos últimos anos, mas jamais foram levados a sério pelo Legislativo, embora algumas encenações se tenham dado exatamente para enganar o distinto público e valorizar o passe dos que se apresentaram como defensores do povo.


 


Primeiro: a Cidade Pirelli virou pó mas beneficiou tremendamente aquela multinacional e parceiras de negócios que dividiram as áreas turbinadas por readaptações de uso e ocupação do solo. Segundo: o Residencial Ventura, conjunto de 320 apartamentos no Bairro Jardim, denunciado por este jornalista por série de irregularidades agora confirmadas pelo Ministério Público do Meio Ambiente, jamais constou da pauta de um vereador sequer. Terceiro: o que falar da Máfia do Semasa, que, num primeiro momento, chamou a atenção do Legislativo que, em seguida, por conta de contas que não sei ou perdi a conta, emudeceu.


 


Conversa mole


 


Tenham a santa paciência, senhores vereadores espertíssimos. Parem com essa bobagem de Código de Ética. Isso é conversa mole para boi dormir. Quem der importância às manobras e acreditar que estamos próximos a um modelo que faria escola nos Legislativos do Brasil varonil não passará de arrematado estúpido.


 


O Legislativo de Santo André se apresenta com esquema de marketing agressivo, de alguém maquiavelicamente plantado na assessoria dos parlamentares. Ainda outro dia apareceram dois vereadores mais que experientes, para ser generoso, com a proposta tão espontânea quanto uma delação premiada, de alterar as normas eleitorais para consagrar a função de ouvidor do Município. A palavra final seria entregue ao prefeito Carlos Grana.


 


Ou seja: do ponto de vista prático, comprometido com a sociedade, o que teríamos seria um novo regramento que lembraria a burrice de alguém que, ao sentir dores estomacais, opta por sair do mato para acertar no meio da rua  as contas com o ponteiro biológico. Ou seja de novo: se a ouvidoria de Santo André é uma indecência em todos os sentidos, se todos os sentidos caminharem para a seriedade do cargo em termos de representação de demandas dos contribuintes, não penduricalhos sem peso administrativo para valer, o que seria então sob o domínio unilateral do chefe do Executivo?


 


Perdido no tempo


 


É esse Legislativo omisso em questões decisivas à qualidade de vida --  como é o mercado imobiliário dominado por malfeitores esquecidos nas investigações da Máfia do Semasa -- que se pretende autoproclamar imune a desvios ao adotar  um Código de Ética cantado em verso e prosa como prova de que novos tempos estariam reservados aos contribuintes. Tudo balela.


 


Quem apostar um tostão sequer na seriedade operacional da proposta dos vereadores de Santo André é candidatíssimo ao troféu de babaca da temporada. Ou estou enganado quando se sabe que, desde a aprovação do projeto, há quatro anos, nunca se nomearam os integrantes da comissão disciplinar? 


 


Já se passaram duas legislaturas e ninguém levou adiante a eleição e posse dos componentes do colegiado responsável pela fiscalização dos parceiros de jornadas e dos próprios passos que dariam. Ninguém quer colocar no próprio pescoço o guizo de medidas que poderiam determinar inclusive a cassação de mandatos.


 


São poucos os vereadores de Santo André que aceitam ser fiscalizados pelos próprios companheiros e principalmente pelos contribuintes que, segundo o projeto, teriam direito a apresentar denúncias. O jogo de interesses internos, entre os vereadores, e sobretudo externo, nos entornos dos mesmos vereadores, transformaria o Código de Ética em festival de apontamentos escabrosos ou, o que é mais provável, em nova modalidade de aplicação de panos quentes nos bastidores, com injunções inimagináveis. A emenda da introdução do Código de Ética, portanto, ficaria pior que o soneto da não regulamentação.


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