Política

Manente treina 100 metros
para disputar uma maratona

DANIEL LIMA - 12/07/2016

O deputado federal Alex Manente treina apressadamente 100 metros rasos para disputar uma maratona que, todos sabem, são mais de 42 quilômetros. Manente não é um atleta exemplar, a julgar pela última prova de 100 metros a que se submeteu. O que esperar quando chegar, se chegar, a prova das provas?

Vou traduzir a metáfora à vida real: ao ocupar uma página inteira de entrevista no Diário do Grande ABC expondo quase que exclusivamente a defesa da exploração do turismo na região, Alex Manente deixou ao abandono a maratona da crise econômica que atinge mais dura e particularmente esta Província. Como, aliás, está mais uma vez nos jornais de hoje. O Estadão publicou que a planta da Volkswagen do Brasil em São Bernardo exige 3,4 mil demissões para se tornar razoavelmente competitiva.

Há um tempo atrás escrevi que a crise econômica expunha um excedente de mão de obra nas montadoras locais de oito mil trabalhadores. Achavam que estava louco. Aliás, sempre acham que estou louco, porque fujo à rotina do marasmo dos aproveitadores de sempre.

Estou de olhos fixos nos candidatos a prefeito na região e Alex Manente, por ser um dos favoritos, juntamente com Orlando Morando, à sucessão do petista Luiz Marinho, em São Bernardo, merece faróis de milha. Alex Manente discursou na página inteira do Diário do Grande ABC sem dar ao leitor e eleitor mais exigentes um rasgo de segurança de que estaria preparado para algo do qual não soube cuidar o atual prefeito de São Bernardo – iniciar uma transformação econômica pautada pela racionalidade, pelo pragmatismo e pela imperiosidade dos tempos de aperto que já chegaram e não vão nos largar por muitas temporadas.

Mudança insignificante

Alguém precisa dizer a Alex Manente com franqueza, sinceridade e conhecimento que o setor de turismo na Província do Grande ABC é tão capaz de reverter o quadro de debacle econômica, isoladamente, como uma pista de pouso nos mananciais, como pretendia o prefeito Luiz Marinho após o fracasso do anúncio inicial de que construiria um aeroporto internacional, o tal aeroportozão sobre o qual nos referimos dezenas de vezes.

Alex Manente transmitiu a ideia de que é tão intimo do setor de turismo, apenas por participar da comissão temática na Câmara dos Deputados, quanto este jornalista dos jogos eletrônicos que levaram milhares de jovens ao Ginásio do Ibirapuera. Quem é do ramo usa até abusadamente a expressão “indústria do turismo”.  Manente não o fez uma única vez em toda a entrevista. Há uma diferença enorme entre as duas coisas. Turismo é um jogo de futebol em estádio quase vazio. Turismo industrial é uma final de Copa Europeia.

Mas isso é apenas um detalhe. O essencial é que nos anos 1990 esse assunto foi levado à ribalta de inquietações regionais tendo o então prefeito Celso Daniel à frente do Clube dos Prefeitos como principal protagonista. Não deu em nada entre outros motivos porque não temos agregado de valores tangíveis e intangíveis capaz de despertar atratividade. Troque “atratividade” por potencial de rentabilidade financeira e estamos acertados.

Gataborralheirismo atrapalha

Com a Capital aí do lado com série de atrativos, a indústria do turismo de negócios -- que poderia ser um complemento ou parte de nossas ações -- obtém resultados expressivos, embora pouco contabilizados. É impossível a Gata Borralheira, que somos nós, concorrer com a Cinderela, que é a Capital. São Paulo é a capital da indústria de negócios do País entre outros fatores porque coleciona vantagens comparativas em forma de gastronomia, cinema, teatro, shows e tudo o mais – além, é claro, de rede hoteleira que mal está a chegar à região e mesmo assim com um destino de vacância de vagas a espantar os investidores.

Se existe alguma possibilidade de criar uma rede de sensibilização ao turismo de negócios e ao turismo propriamente dito na região, nada melhor que especialistas no assunto ser contratados para um plano estratégico.

Ao longo de minha carreira não perdi a oportunidades de ouvir gente do ramo e nenhum executivo de qualquer empresa encontrou o fio condutor que poderia significar força relativamente satisfatória a ser explorada pela descoberta da indústria do turismo. Quando se transpõe essa equação para o regime de emergência econômica, então, é um desastre.

O deputado Alex Manente talvez consiga reverter, numa próxima oportunidade midiática, o mal-estar que causou a quem busca propostas e encaminhamentos compatíveis com a gravidade do quadro econômico regional.

Ninguém pode desprezar a determinação do deputado federal que até outro dia era uma lástima nos spots televisivos de seu partido, o PPS, ao desfilar falta de empatia e de sincronismo vocabular que o remetia ao arcaísmo jurássico de peças publicitárias. De repente, como num passe de mágica, eis que Alex Manente ressurge na telinha com postura mais determinada a verbalizar de forma mais segura e sem vícios caipiras sentenças propagandísticas mais agradáveis.

É claro que há um oceano a separar tamanha mudança midiática e um plano estratégico factível para retirar São Bernardo do encalacramento histórico da Doença Holandesa automotiva. Sei lá se Alex Manente sabe do que se trata a Doença Holandesa automotiva, expressão que cunhei neste espaço.

Melhor que Marinho?

O desenvolvimento econômico da região jamais foi assunto que o apetecesse, mas o nobre deputado federal precisa entender é que sem dominar o básico da matéria o mais provável é que quebraria a cara como prefeito.

Aliás, como tenho dito, qualquer pretendente a prefeito na região que revele um fosso de conhecimento entre as nuances politicas e as crônicas deficiências econômicas, poderá se dar muito mal se o destino lhe colocar à disposição o cargo desejado.

Luiz Marinho está aí para não me deixar mentir. O governo que está na reta de chegada se baseou fortemente em repasses federais e no boom automotivo. Deu com os burros nágua e entregou à sociedade um mundo de obras paralisadas ou inacabadas e um receituário de desenvolvimento econômico fora da realidade prática. Aeroportozão, Arranjos Produtos Locais, Polo de Óleo e Gás, Indústria de Defesa e tantas outras promessas viraram pó, embora não falte quem traduza tudo isso em realizações. O mundo da lua comporta exageros.

Talvez eleito e se conduzindo claramente numa escuridão econômica, a vantagem de Manente sobre Marinho seria apenas a constatação de que pelo menos não transformaria o horizonte róseo numa fita de chegada decepcionante. Manente simplesmente não ofereceria cenário propositivo algum. A salvação da pátria da indústria do turismo, expressão que, insisto jamais o deputado federal utilizou na entrevista, seria apenas uma falta de conhecimento do significado de desenvolvimento econômico sistêmico. Essa modalidade não tem força motriz suficiente para mudanças profundas no tecido regional.

Pecaria Manente pelo simplismo inconsistente, em contraste flagrante com o pecado de Marinho, adepto da complexidade improdutiva.



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