Administração Pública

Aperte o cinto.
Diadema vem aí

MALU MARCOCCIA - 05/01/2004

Engolida pela onda interminável de queda na arrecadação de seu principal imposto, o ICMS, Diadema vai calibrando caminhos próprios para dar conta de um dos calos mais dolorosos das administrações públicas: fermentar as receitas para irrigar o bolo crescente das demandas da população. As soluções são limitadas e passam pelo clássico caminho de tributar atividades e alcançar os devedores e sonegadores.  A isso o secretário de Finanças, Sérgio Trani, dá o nome de potencializar a arrecadação dentro de um universo já existente, sem que o sobrenome seja aumento de impostos.


São pelo menos três os caminhos em que Diadema passou a apostar as fichas. O primeiro é que a partir deste mês a Prefeitura põe em atividade um call center para cobrar contribuintes em débito. A idéia é resgatar  R$ 110 milhões dos R$ 140 milhões da dívida ativa, 60% na forma de ISS e IPTU de empresas que estão inadimplentes. A segunda frente de captação de recursos é o universo recém-ampliado de 100 para 193 setores abrangidos pelo ISS (Imposto Sobre Serviços), iniciativa que se soma ao GISS online, um eficiente cruzamento de dados de quem contratou e de quem prestou serviços na cidade. O encontro dessas duas pontas está sendo totalmente informatizado em Diadema e já se aproxima do grau de excelência que a Receita Federal pratica na checagem das declarações do Imposto de Renda, celebra o secretário de Finanças.


Por fim, um poderoso provedor de receitas está sendo vislumbrado no IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), seja a partir da idéia de estimular a produção em troca de abatimentos no imposto, seja pela atualização completa do cadastro imobiliário. A nova Planta Genérica de Valores, base do IPTU, está permitindo taxar quem existia mas não estava cadastrado e abre a perspectiva de regularizar as dezenas de ex-favelas que se transformaram em núcleos habitacionais. Já a variável-chave para fomentar a indústria será o VA (Valor Adicionado), que mede a transformação de riquezas de uma localidade e serve de base para os repasses do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) do Estado aos municípios.


Sobe a arrecadação


São propostas controvertidas. Sérgio Trani garante que está aumentando a arrecadação com base em contribuintes que já existem e que escapam das obrigações com o erário seja por sonegação ou por falhas na fiscalização do poder público. No caso do prêmio do IPTU para empresas que incrementarem o Valor Adicionado, Trani assegura que não se trata de renúncia fiscal, proibida pela moralizadora Lei de Responsabilidade Fiscal.


O secretário tem fé de que mais VA significará mais ICMS no horizonte municipal daqui algum tempo e, no fim, compensará eventual rebaixamento na rubrica do IPTU. As discussões estão em andamento com o Ciesp (Centro das Indústrias do Estado), que não se manifestou oficialmente mas sabe-se que apreciou a iniciativa por estimular a produção e por acabar com a batalha anual das atualizações do IPTU.


"Vamos colocar quatro faixas de corte. A cada patamar de Valor Adicionado que o contribuinte gerar de aumento na receita do ICMS, ganha créditos para compensar esse incremento no IPTU do ano seguinte"  -- explica o titular de Finanças, que não acredita estar promovendo guerra fiscal para tirar empresas de outras cidades. "É tão pontual que acho improvável atrair indústrias só por causa de VA" -- interpreta.


Alternativa pouco viável


Colocar a criação de empregos como outro pré-requisito para ganhar descontos no IPTU tornou-se alternativa pouco viável porque as modernas tecnologias aumentam a produção com cada vez menos mão-de-obra e isso poderia inibir os empresários. O Grande ABC tem em vigor uma inexequível LIS (Lei de Incentivos Seletivos), tratada no âmbito do Consórcio de Prefeitos e que não decola porque estabelece série de exigências produtivas, empregatícias, fiscais e ambientais.


Ao correr atrás de soluções mais imediatas, Diadema reage, na verdade, à situação de fundo do poço a que chegou o Grande ABC com a desindustrialização que desidrata sua economia na forma de evasão de empresas, fechamento de negócios e enxugamento de atividades. Somente em Valor Adicionado a região perdeu 39% nos anos exageradamente liberalizantes e recessivos do governo FHC, conforme mapeamento do IEME (Instituto de Estudos Metropolitanos), que estuda dados oficiais como os da Secretaria da Fazenda do Estado.


Em Diadema o Índice de Participação dos Municípios (que é composto em 76% pelo Valor Adicionado) vem sendo cravejado ano a ano: do auge nos anos 90 de 1,42% em 1996 desceu ao 1,09% de 2002 que vai basear os repasses deste 2004, já que os cálculos são feitos dois anos antes. Não se trata de pouca coisa. A diferença entre o 1,09% de Índice de Participação dos Municípios deste ano em relação ao 1,13% repassado em 2003 significa nada menos que R$ 15 milhões. "Resolveria meus precatórios do ano"  -- lamenta o secretário de Finanças, acossado por precatórios trabalhistas e de desapropriações que montam a R$ 180 milhões, mais da metade da previsão orçamentária municipal de R$ 347 milhões em 2004. No ano passado, apenas um precatório sequestrou R$ 7 milhões da Prefeitura.


Puxadinhos -- Profissional do primeiro time de Diadema, Sérgio Trani foi desafiado em 2001 pelo prefeito petista José de Filippi Júnior a estudar um modo de fazer receitas sem ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal, que proíbe abrir mão de impostos ou contrair dívidas sem especificar fontes de compensação para tal. Diante da torneira estreita dos repasses estaduais e federais, a saída foi trabalhar com o cenário local e o primeiro passo consistiu em rever alíquotas de ISS, ITBI e a PGV (Planta Genérica de Valores) -- a grande matriz do IPTU e do cadastro imobiliário renovado,  que está permitindo a Diadema conhecer todo seu patrimônio físico. "Nosso cadastro era de 1983. Imaginem quantos puxadinhos em imóveis surgiram desde então numa cidade com 360 mil moradores, a segunda maior densidade do País?" -- indaga o secretário.


A resposta não demorou: o recadastro mostrou que os imóveis subiram de 65 mil para 90 mil, mas há muito mais. É que cerca de 30 favelas que estão se tornando núcleos habitacionais urbanizados precisam passar por regularização fundiária antes de ser cadastradas e receberem carnês de IPTU. Muitos terrenos são invadidos e constam como lotes únicos, quando na verdade foram subdivididos em dezenas de propriedades.


Foi o recadastramento imobiliário integral e agora informatizado que permitiu a Diadema ter um mapa da cidade real nas mãos. "A partir da nova PGV tenho cadastros separados por imóveis residenciais, industriais, de comércio e serviços. Em 2004 vamos ter no computador a planta aerofotogramétrica da cidade, o que me permitirá entrar virtualmente nas propriedades para conhecer as benfeitorias e cobrar impostos justos" -- antecipa Sérgio Trani, dizendo que o cadastro imobiliário atualizado está permitindo manter estável a arrecadação do IPTU e evita aumentos excessivos. Para 2004 o reajuste será de 8%. Em 2001 o IPTU representou 13,8% do orçamento municipal, repetiu o número em 2002 e até outubro do ano passado havia subido ligeiramente, para 14,6% de participação no bolo de receitas da cidade.


Descontos parametrizados


Foi a nova PGV que também parametrizou as negociações com o Ciesp para potencializar a produção e aplicar descontos no IPTU. O novo cadastro revelou que Diadema tem duas mil indústrias. Sérgio Trani cruzou o VA de cada uma em 2000 e trouxe para valores de 2002. Por essa comparação, Trani acredita que Diadema abriria mão de R$ 1,5 milhão de IPTU em 2005 caso a troca por VA comece a ser implantada este ano. Ainda não sabe quanto de ICMS Diadema ganhará, mas põe fé num incremento. O Estado repassa aos municípios 25% do que recolhe de ICMS, que já significou 70% dos recursos de Diadema nos anos 80 e representou apenas 39,5% de janeiro a outubro de 2003. Isso  confirma a tendência histórica de queda, já que significou 43,8% um ano antes, entre janeiro e outubro de 2002.


O cadastro atualizado das empresas foi referência também para as novas atividades que Diadema passa a tributar em 2004 com Imposto Sobre Serviços e para a prestação eletrônica de contas do ISS, em que é possível cruzar informações do tomador e do prestador de serviços fornecidas na guia GISS. A informatização de todos os contribuintes deve estar concluída em dois anos, o que vai permitir à Prefeitura ter relatórios gerenciais por empresas.


"O fiscal não vai sair mais aleatoriamente, nem checar só por ramo de atividade ou por rua. Vou ter um histórico de cada contribuinte e de seu setor como um todo. Se o setor vai bem e a receita de determinado contribuinte não acompanha, ou ele está sonegando ou quebrando mesmo. Isso vai permitir à Prefeitura conversar com os contribuintes e até elaborar políticas públicas de incentivo a quem realmente precisa"  -- imagina Trani.


O secretário atribui à eficiência da GISS o crescimento na arrecadação de ISS, que chegou a R$ 17 milhões em 2003 e deve atingir R$ 27 milhões em 2004. O salto é aguardado mesmo com a redução pela metade dos estratosféricos 10% de ISS para os bancos que o prefeito José de Filippi sapecou logo no primeiro ano do mandato, mas que precisou ser adequado à banda entre 2% e 5% fixados pela nova legislação do imposto. A nova lei federal estabeleceu piso e teto para o ISS a fim de evitar a guerra fiscal entre cidades e Estados. Para conciliar perdas e ganhos, permitiu aos municípios incluir novos serviços na base de tributação e Diadema elegeu novos 93, entre os quais movimentações bancárias diversas, academias e mesmo atividades que fazem serviços no Município mas têm a sede fora.


Alô, alô -- Diadema também quer fazer as pazes com os devedores, quase dois terços representados por empresas que não honram IPTU e ISS. Um call center está sendo montado no Centro, fora da Prefeitura, reunindo metade de funcionários públicos e outra metade terceirizada para empresa do ramo. Pretende-se fazer um telemarketing profissional, com praça de atendimento ambientada e serviço personalizado com hora marcada. "Dívida ativa só diminui quando é bem cobrada"  -- acredita Trani, seguindo o que já faz a Prefeitura de São Bernardo.


Pelo histórico online já preparado por Diadema, cada contribuinte vai ser abordado por telefone com a proposta de renegociação. Serão três tentativas, obedecendo ao dia e horário da conveniência do devedor, além de sua capacidade de pagamento. Se não houver acordo, o débito vai para a Justiça. Sérgio Trani acredita que a iniciativa terá receptividade e espera  recuperar este ano R$ 23 milhões em dívida ativa, contra R$ 10 milhões resgatados em 2003. Essa rubrica soma R$ 140 milhões no total, mas R$ 30 milhões a Prefeitura considera irrecuperáveis por conta de empresas que se foram ou fecharam.


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