Administração Pública

Olho fiscal cresce
em cima do ISS

WALTER VENTURINI - 05/09/2004

Vigilância cada vez maior sobre os tributos municipais foi a forma encontrada pelas prefeituras da região para fazer crescer o bolo da arrecadação sem aumentar impostos. A marcação cerrada sobre pagamento de obrigações como o ISS (Imposto Sobre Serviços) se dá por meio da informática e do controle de notas fiscais. A fórmula não agrada a todos e associações comerciais procuram questionar na Justiça os novos métodos. Para as prefeituras, a mudança tem o grande mérito de reduzir a sonegação e de compensar perdas históricas de repasse de ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) no vácuo da desindustrialização.


Os números são convincentes. Mauá conseguiu arrecadar R$ 12,4 milhões no ano passado com ISS, um aumento de 59% em relação a 2002. Para este ano a previsão é de que mais R$ 16 milhões entrem para o caixa da Prefeitura. Em Diadema, a expectativa é de que R$ 18 milhões em ISS sejam arrecadados este ano. Só nos primeiros seis meses o recolhimento foi de R$ 14,038 milhões, cerca de 40% a mais de igual período do ano passado.


Por trás desse crescimento de receita estão novos métodos de controle, como a declaração eletrônica do movimento das empresas feita pela internet nos mesmos moldes adotados pela maioria dos contribuintes brasileiros que preparam Imposto de Renda. A diferença é que a prestação de contas para o ISS é mensal. Em Diadema, a declaração eletrônica é feita desde maio do ano passado. 


Mauá apura controle


Em Mauá vai começar este mês, mas desde novembro de 2002 a Prefeitura passou a emitir todas as notas fiscais — um controle mais apurado com formulários contínuos, códigos de barra e numeração sequencial. Outra providência foi o recolhimento dos livros fiscais e notas emitidas nos últimos cinco anos para verificar se a declaração do ISS estava correta. Em São Bernardo e São Caetano também há controle do ISS pela internet.


O crescimento da arrecadação tributária chamou a atenção de outra Prefeitura da região. Em Santo André, a partir deste mês será obrigatória a declaração eletrônica via internet, o que determina a utilização de notas padronizadas. Até outubro todas as atividades estarão utilizando os novos talonários. Como em Mauá, notas e livros dos últimos cinco anos também foram recolhidos.


As mudanças, é claro, provocam reação das associações comerciais. “A Prefeitura tem de ter controle da arrecadação. O que questionamos é que o controle em Mauá foi terceirizado e isso é inconstitucional. Estamos discutindo administrativamente, mas nos preparamos para entrar com ação na Justiça” — protesta Marcos Soares, vice-presidente da Aciam (Associação Comercial e Industrial de Mauá). 


O gerenciamento do ISS era feito até o primeiro semestre deste ano pela Xerox do Brasil e passou para a Cobra Tecnologia, estatal ligada ao Banco do Brasil. Além do fato de dados fiscais serem acessados por terceiros, os críticos do novo controle questionam a contratação da Cobra sem licitação. A Prefeitura se defende alegando que utilizou a lei de licitação 8.666/93, que no artigo 24 prevê dispensa de licitação para serviços de empresas ligadas à administração pública como a Cobra.


Controles criticados 


A mesma contestação é feita em Santo André, onde a Cobra foi contratada para administrar a arrecadação. A centralização da nota fiscal pela Prefeitura e a declaração eletrônica são igualmente criticadas. “Não somos contra a evolução tecnológica, mas quando se vai alterar alguma coisa é necessário chamar os interessados para conversar se é viável” — afirma Humberto Batella, vice-presidente da Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André) e diretor do Sescon (Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis). 


Batella reclama que as mudanças foram anunciadas sem consultar quem recolhe ISS. A queixa mais frequente, porém, é quanto à possibilidade de quebra do sigilo fiscal. “Mesmo com todo o rigor, os dados da Receita Federal e da Junta Comercial frequentemente são vendidos em CD de forma ilegal. Não tenho garantia de que essas informações não vão sair da Prefeitura” — teme Batella.


Por conta das reclamações, a Prefeitura de Santo André adiou de agosto para setembro a obrigatoriedade de adesão ao novo sistema de controle do ISS. O secretário de Finanças, Walter Aparecido de Faria, avalia que o atraso de um mês vai implicar em arrecadação menor de ISS do que os R$ 90 milhões esperados para 2004. O risco de quebra de sigilo não existe para o secretário. “O próprio banco onde a empresa paga a guia de movimento tem acesso e nem por isso divulga informações. No caso do ISS, o contrato com a Cobra tem cláusula sobre sigilo fiscal” — tenta tranquilizar Walter de Faria. 


Tese contestada


Em Mauá, Valdirene Dardin, titular de Finanças, também rejeita a tese da quebra de sigilo fiscal. “Em 2002, a Justiça já entendeu que não há essa possibilidade” — garante a secretária, cuja Prefeitura é por enquanto a única que recolhe livros fiscais das empresas. Quando os controles foram checados, muitas irregularidades apareceram. “Descobrimos que muitas pessoas jurídicas não declaravam, encontramos livro fiscal que não havia passado pela fiscalização e flagramos documentos fiscais clonados” — afirma a secretária de Mauá, para quem a tendência do controle é diminuir a inconsistência dos cadastros.

 

Para Valdirene Dardin, a polêmica está ligada ao impacto da novidade e à mudança de cultura fiscal. “As pessoas estão acostumadas que a administração pública chega depois do fato ocorrido. Se pegar na hora, corrige imediatamente. Não fica com pendências de longo prazo, com juros e correções” — argumenta a secretária, que contabiliza queda do índice de inadimplência de 45% para 10% entre 2002 e este ano. 


Fenômeno semelhante pode ocorrer nos próximos meses em Santo André, onde o secretário Walter de Faria descobriu que cerca de sete mil dos 16 mil contribuintes de ISS não declararam nada à Prefeitura em 2003. “Não sabemos se isso é sonegação ou empresas que simplesmente não tiveram movimento. Mas com a declaração eletrônica, me antecipo ao problema” — aposta o executivo público.


Embora a emissão de notas fiscais pelas prefeituras de Mauá e Santo André seja criticada, principalmente pelas gráficas que podem perder um nicho até agora garantido, o controle pode ser mais uma ferramenta contra a sonegação. “Nota fiscal é hoje documento meio desacreditado. Na nota que a Prefeitura passa a emitir tem papel de segurança, controle de código de barra, sistema anticópia e validade por 90 dias” — argumenta Walter de Faria, secretário de Finanças de Santo André.


Exclusão aliviadora


Prestadores de serviço não podem reclamar de mudança feita pela Prefeitura de São Caetano, que desde agosto exclui do cálculo da tributação do ISS os reembolsos de salários e encargos sociais. Assim, as empresas pagam apenas pelo lucro e não sobre valores repassados aos funcionários. Empresários já haviam entrado com várias ações na Justiça para questionar a cobrança. 


Em Diadema, a Prefeitura optou por não centralizar a emissão de nota fiscal e lançou em maio do ano passado o GISS, programa da empresa Eicon, também adotado pela Prefeitura de São Caetano. O GISS permite controlar a arrecadação em tempo real por meio da declaração eletrônica do movimento econômico. Os atritos com empresários e associações comerciais foram minimizados porque não houve recolhimento dos livros fiscais. Só em olhar a tela do computador o secretário de Finanças de Diadema, Sérgio Trani, tem condições de determinar fiscalização mais eficiente do que qualquer ação de controle da época pré-informática.


“Muitas ações de averiguação não tinham resultado. A Prefeitura tinha de optar por focar um ramo da economia, uma rua ou uma denúncia. Hoje tenho mais claro qual setor está com problemas. Pela média, posso fiscalizar uma empresa específica que apresenta resultado diferente” — conta o secretário, cuja possibilidade de cruzar dados de tomadores e prestadores de serviço permite à Diadema reduzir a sonegação e ter melhor acompanhamento dos fiscais. 


O aumento de 40% na arrecadação do ISS no primeiro semestre deste ano é outro bom resultado atribuído pelo secretário ao GISS Online, ao lado da reformulação do Código Tributário Municipal e do treinamento da equipe. “Este ano estamos oferecendo cursos de pós-graduação para alguns fiscais na Fundação Getúlio Vargas” — destaca Sérgio Trani.


Big Brother 


Diadema contou com recursos do Pnafm (Programa Nacional de Apoio à Gestão Administrativa e Fiscal dos Municípios Brasileiros) para modernizar a área tributária e vários outros setores da administração — um investimento de R$ 7 milhões principalmente na atualização da rede interna de computadores. São programas que exigem controle mais apurado. Se a Prefeitura, por exemplo, percebe que determinada empresa registra queda na emissão de notas e aumento nos serviços prestados, pode enviar um fiscal que saberá exatamente o que deverá ser investigado. “Há condições de diminuir a carga tributária com melhor cobrança. Temos só de fazer a empresa e o contador se acostumarem a abrir a internet. Saímos da Idade da Pedra” — acredita Trani.


Diadema é exemplo de resultados com modernização da máquina administrativa. Em 2001, o orçamento chegou a R$ 209 milhões. Este ano o secretário acredita que feche o orçamento em R$ 360 milhões e para 2005 a previsão é de R$ 400 milhões, praticamente o dobro de 2001. Aumento real da carga tributária é inexistente, a não ser a adoção da progressividade no IPTU em 2001. Em um quadro de redução real do ICMS, o crescimento de tributos municipais é a salvação da lavoura para as prefeituras. 


No ano passado, Diadema obteve 1,13% do repasse total do imposto aos municípios paulistas e este ano ficou com 1,09%. Com o ICMS estabilizado, Sérgio Trani saúda o fato de ter fermentado a arrecadação a partir da modernização tributária e administrativa. “Estamos crescendo no recurso próprio e não na transferência” — confia o secretário.  


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