Administração Pública

Luiz Marinho consegue perder
gol regional debaixo da trave

DANIEL LIMA - 14/10/2016

Escrevi de passagem aqui na semana passada (e já escrevera antes também de passagem e de forma menos enfática) que Luiz Marinho é tecnicamente um dos prefeitos menos qualificados que já passou por São Bernardo. Seria natural que houvesse chiadeira. Faz parte do jogo. Mas esse jogo pode ser resumido da seguinte maneira jornalística: Luiz Marinho teve a oportunidade única de marcar um gol numa bola que quicou a sua frente debaixo da trave. Inacreditavelmente, chutou por cima. Celso Daniel, a 40 metros de distância e cercado de adversários, marcou vários tentos. 

Há quem meça o tamanho de um administrador público exclusivamente pelas obras físicas que deixou, mesmo que muito aquém do prometido. A esses só posso responder que não cometeria tamanha bobagem avaliativa. 

Principalmente porque o dinheiro investido, em larga escala, foi fruto de relacionamento especialíssimo com a cúpula do governo federal dócil e participativo. E mesmo diante de condições tão favoráveis Luiz Marinho brilhou apenas durante uma parte dos dois mandatos. Não se ganha um jogo decisivo jogando apenas um tempo. 

Marinho sonhava com a disputa do governo do Estado em 2018. Pretendia sair consagrado de São Bernardo. Termina o mandato sem fazer sucessor e possivelmente sofrerá nova derrota ao ver o candidato tucano Orlando Morando no Paço Municipal a partir de janeiro próximo. Ou seja: nem com candidatura adotada, no caso de Alex Manente, Marinho sustentaria rebarbas da Prefeitura. 

Por série de razões Luiz Marinho é um prefeito medíocre, no sentido lato do verbete. Vou elencar alguns macro-quesitos para matar a curiosidade de leitores que cobram explicações sobre o que me levou a esquadrinhar o petista muito aquém do esperado, do desejado ou do imaginado. Veja os pontos principais sobre os quais me debruço ao analisar qualquer gestor público que pretenda ficar para a posteridade. Como Celso Daniel ficou:

a) Vocação desenvolvimentista.

b) Vocação regionalista.

c) Vocação estruturalista.

d) Vocação inconformista. 

Talvez estes pontos sejam suficientes para escrever o que pretendo mas, insisto, trata-se de texto preliminar, quase pronto-socorrista. Foi produzido na esteira do enunciado do começo de semana com feriado a interromper o circuito natural de elaboração desta revista digital. Quando se afirma que um prefeito é medíocre não há como sugerir que a cobrança não chegue. Nada a preocupar quem já se preparara à demanda explicativa.  

Vou esmiuçar esses quatro pontos nucleares de forma sucinta, rápida, breve. Espero que seja suficiente para o entendimento geral de que há mais que justificativas a definição que atribui ao titular do Paço Municipal de São Bernardo.  

Oportunidade histórica  

Antes, porém, é indispensável lembrar que os quatro macropontos comportam invólucro contextual de relevância histórica. Trata-se do seguinte: Luiz Marinho fracassou como prefeito de São Bernardo não somente porque deixou de executar com algum brilho os quatro pontos cardeais mencionados acima e destrinchados abaixo. Marinho decepcionou porque desperdiçou um contexto excepcionalmente favorável. O PT de Lula da Silva, seu primeiro amigo e protetor, simplesmente governou o País durante 13,5 anos. Tempo mais que suficiente para Luiz Marinho ter sido mais gestor que político.  

Em larga dimensão Luiz Marinho contou com o suporte do privilegiadíssimo protetor para tornar São Bernardo modelo de revolução organizacional com repercussão regional fantástica. O ex-sindicalista e seus assessores se esmeraram para valer na competência de ganhar duas eleições municipais seguidas. O outro lado da moeda que realmente interessava à região, de projetos e ações no campo de desenvolvimento econômico, foi retumbante fracasso.  

Vamos aos pontos principais da Administração Luiz Marinho. Não é de meu feitio estabelecer juízo de valor supostamente depreciativo (na verdade é puramente crítico) sem embasamento. Os leitores haverão de confirmar esse pressuposto. 

a) Vocação desenvolvimentista. 

Luiz Marinho vendeu a ideia bem orquestrada por marqueteiros de plantão de que colocaria São Bernardo no topo do desenvolvimento econômico da região, com crescimento suficiente para expansão sobre o tecido regional. Tudo o que planejou foi para o beleléu por falta de talento, equipe de trabalho e, principalmente, determinação. Quando se procrastina um objetivo em nome de outros afazeres, o resultado escapa ao controle.  

A indústria automotiva que Luiz Marinho prometeu fortalecer num simpósio realizado antes que fechasse o primeiro semestre do primeiro mandato virou o que todos sabem – um palco a dinheirama do Estado para socorrer os desempregados em potencial e uma perda contínua de competitividade nacional.  

O Polo de Gás e Petróleo ruiu com o escândalo da Petrobras. E mesmo sem aquele estrago nada indicava que sobreviveria, tantas foram as deficiências de planejamento. Não existe nada que se iguale a uma força-tarefa de especialistas para reconfigurar ou ativar um determinado setor produtivo. Luiz Marinho não teve essa percepção.  

Os chamados APLs -- Arranjos Produtivos Locais -- só existem na cabeça e nas tintas triunfalistas de assessores desprovidos de conhecimento prático do que sejam esses encadeamentos de potencialidades e complementaridades do tecido industrial, principalmente. Alguns ensaios foram tomados como regra e deram com os burros nágua.  

A debandada industrial de São Bernardo teve continuidade porque Luiz Marinho não tem peito para chamar os sindicalistas e colocar em ordem a mansão de privilégios do setor automotivo, Doença Holandesa da região, mas mais pronunciadamente de São Bernardo.  

O Aeroportozão (como denominei o projeto de um Aeroporto Internacional na área dos mananciais e que depois de muito esforço virou aeroportozinho com finalidade a voos executivos) foi uma grande anedota.  

Tudo o mais que se pensou e se levou ao público sobre novas matrizes econômicas, inclusive o polo da indústria de defesa, virou pesadelo, quando não frustração. Luiz Marinho está para gestor econômico assim como Dilma Rousseff para gestão fiscal – deixa um rastro de desiludidos. Mas carregou a vantagem de que a enxurrada de equívocos não lhe custou o mandato próprio, mas do pretenso sucessor.  

b) Vocação regionalista.  

Luiz Marinho sempre colocou São Bernardo no topo de preocupações administrativas municipais e partidárias regionais. A Província do Grande ABC sempre foi vista sob o ponto de vista de eventual complementaridade.  

O aparato político-eleitoral que moldou a atuação do PT na região, sob o controle do prefeito de São Bernardo, foi a única regionalidade sobre a qual se dedicou o titular do Paço Municipal.  

Marinho levou quatro anos para, enfim, assumir a presidência do Clube dos Prefeitos, já no segundo mandato. Não se conhece nenhuma ação substantiva que contribua para a mudança de rumos da região cuja origem se situe nos mandatos que comandou.  

As grandes questões regionais no campo da mobilidade urbana, da reestruturação espacial pelo mercado imobiliário, das fraturas expostas dos impostos municipais incentivadores de guerra fiscal interna, entre tantos temas, foram simplesmente descartadas. Marinho é regionalista apenas na defesa dos interesses do PT e dos sindicalistas.

c) Vocação estruturalista. 

O prefeito de São Bernardo pouco se lixou à relevância de dotar a Província do Grande ABC de modelo institucional estruturalista. Floresce e se perpetua o individualismo de grupelhos que convergem em direção aos poderes públicos.   

Entenda-se por modelo estruturalista a aproximação e a multiplicação de esforços e ideias tendo como parceiros de jornada organizações locais de empresários, de entidades sociais e sindicais. O peso de um prefeito da maior cidade da região e durante muito tempo prestigiadíssimo pelo governo federal, da mesma patente partidária, foi lamentavelmente jogado às traças.  

A Província não teve competência, durante os anos de Luiz Marinho, de organizar-se internamente de maneira a fortalecer as relações com o governo estadual e o governo federal.  

Tudo porque Luiz Marinho sempre agiu partidariamente. Perdeu-se, com isso, imensa janela de oportunidades. Inclusive para desmontar a farsa curricular e pedagógica da dispendiosa e pouco útil Universidade Federal do Grande ABC (UFABC), refratária a qualquer compromisso com o desenvolvimento econômico da região. 

d) Vocação inconformista. 

O prefeito de São Bernardo, chefe geral da administração pública da Província do Grande ABC durante pelo menos oito anos, jamais foi sequer sombra do sindicalista que durante mais de uma década manteve o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo como símbolo de combatividade.  

Como gestor público com influência latente em toda a região, Luiz Marinho associou passividade e desprezo à agenda econômica regional. Prevaleceu o partidarismo arraigado e acrítico de interesses mútuos a interpor-se entre Marinho e o governo federal.  

E, mais que isso, havia a certeza supostamente inabalável de que não conviria mexer num cardápio que pudesse provocar estragos, porque é impossível alterar os rumos dos acontecimentos na região sem tocar na ferida trabalhista que lhe é tão cara. O inconformismo – ou a rebeldia -- de Luiz Marinho é um jogo de cartas não só marcadas como também direcionadas a agentes estabelecidos e, portanto, em conflito com conjunto da sociedade da região.  

Sem contar com o aparato contextual de Luiz Marinho – muito pelo contrário, porque quem estava no poder eram os tucanos com políticas econômicas que feriram fundo a indústria da região – o então prefeito Celso Daniel deixou lições na plataforma de quatro bases de sustentação expostas acima. Por isso se destacou como o maior – até porque único -- gestor público no campo da regionalidade de que se tem noticia na Província. Celso Daniel fazia jus à grandiloquência de “Grande ABC”. Luiz Marinho é a autenticidade nua e crua de “Província”. 



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