Caso Celso Daniel

Um novo capítulo de
ataque a Sérgio Gomes

DANIEL LIMA - 07/10/2005

Quem tiver dúvidas sobre o unilateralismo da Imprensa na cobertura do caso Celso Daniel em suas duas vertentes -- a criminal e a política -- basta ler os jornais de hoje. A presença do segundo irmão, Bruno Daniel Filho, ontem à tarde na CPI dos Bingos, onde relatou versão mais que conhecida dos acontecimentos, ocupou generosíssimos espaços nos diários de hoje. 


Um massacre quando comparado, por exemplo, à pífia repercussão do depoimento do deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh, respeitadíssimo defensor dos Direitos Humanos, que, semana passada, também esteve frente a frente com os senadores. Para dizer o mínimo do mínimo do mínimo, é uma desavergonhada operação de metralhamento do empresário Sérgio Gomes da Silva, inocentado pela Polícia Civil e pela Polícia Federal nas investigações e incriminado pelo Ministério Público, do qual, sem tirar nem por, Bruno Daniel foi ontem porta-voz. 


Reproduzo, por isso, na sequência, o editorial da revista Livre Mercado, assinado por este jornalista, e que se refere à "Reportagem de Capa" sobre o caso Celso Daniel. A íntegra da matéria propriamente dita seguirá na semana que vem aos leitores desta newsletter. Não achamos justo que se coloque de imediato o texto no circuito. Primeiro porque os leitores de papel precisam ser respeitados com a reportagem na forma original. Aliás, não só os leitores, mas também os anunciantes, que pagam inserções com base na atratividade de ineditismo do conteúdo da publicação. Semana que vem, leitura de papel pressupostamente consumada, introduziremos aquele trabalho neste espaço virtual. 


Atenção total 


Sem esticar a conversa, chamo a atenção para o conceito base da Reportagem de Capa. O espaço reservado ao "Editorial" da revista é escasso para incursões explicativas mais profundas. Daí o desafio de utilizar cada verbete com o máximo de atenção, cuidado, ciência e foco. Confesso que não foi fácil exprimir no "Editorial" um ponto de vista muito particular sobre a inocência de Sérgio Gomes. Se a matéria evita essa pessoalidade, porque é do desenho intestinal da publicação, o "Editorial" vai pela raia de intimismo já tradicional. 


Ou seja: a revista Livre Mercado, através de seu diretor de Redação, assume publicamente posição que o jornalista Daniel Lima tem sustentado desde que o caso Celso Daniel saiu do compartimento de crime comum e ganhou espaços conturbados no labirinto de crime político, tão ao gosto, por exemplo, dos senadores da República que se opõem ao problemático governo Lula da Silva. E por que tomamos aquela iniciativa já lá atrás e a transportamos para a publicação sobre a qual somos o responsável editorial?


Porque os elementos de suposta culpabilidade do empresário Sérgio Gomes no incidente em si, no sequestro e assassinato de Celso Daniel, juntados pelo Ministério Público, não nos convencem de que tanto a Polícia Civil, com as divisões do DHPP e do DEIC, e a Polícia Federal, com força-tarefa designada pelo então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, tenham se enganado. 


Sem autofagismo


Acreditem os leitores que, apesar da diferença de linguagem entre o "Editorial" e a "Reportagem de Capa", a revista Livre Mercado não digladia consigo mesma, como muitas publicações desastradamente dirigidas o fazem, quando juntam no ringue da mesma edição versões conflitantes entre o "Editorial" e a "Reportagem". O "Editorial" é escravo dos relatos. Se há dissonância entre um e outro, é sinal de que a abordagem está mal aparada. Não foram poucas as vezes que acompanhamos editorialistas negarem o noticiário publicado na mesma edição, por despreparo ou indigência na apuração. 


No caso específico da "Reportagem de Capa" de Livre Mercado deste mês, o eixo principal não é necessariamente dinamitar a suposta culpabilidade de Sérgio Gomes. O que a publicação coloca em debate, depois de posicionar-se afirmativamente contra a péssima e enviesada cobertura da mídia, é a unilateralidade das informações que reduzem a pó praticamente tudo que se refere ao lado da questão que não seja enfiar goela abaixo a criminalização de Sérgio Gomes. 


O mais patético do depoimento de ontem do segundo irmão Bruno Daniel foi o comportamento do senador Eduardo Suplicy. A impressão que transmite é de estar obcecado pelo suposto mistério do pastor protestante que teria gravado as cenas do arrebatamento de Celso Daniel e, por isso, flutua como que perdido quando resolve intervir nos trabalhos. O suposto pastor, que a Polícia Federal constatou não existir pelo menos com o nome com que foi identificado -- repito o que escrevi segunda-feira com base numa fonte policial -- não passa de cortina de fumaça para jogar mais areia no ventilador das investigações. 


Farsa direcionada


Por razões político-partidárias, quanto mais versões que retirem o foco da inocência de Sérgio Gomes da Silva, assegurada pelas polícias Civil e Federal, mais interessará para o desgaste permanente do governo Lula da Silva. E a Imprensa participa dessa farsa com todo o empenho.

Quando o depoimento de um irmão ausente, como Bruno Daniel, vale muito mais para a mídia do que as informações prestadas por um advogado respeitado até por adversários políticos, como é o caso de Luiz Eduardo Greenhalgh, não é necessária sinalização adicional alguma para dizer por quem a mídia torce e distorce. Se os mesmos jornalistas que cobrem o caso se dessem ao trabalho, como eu, de mergulhar nos inquéritos, o contraditório estaria assegurado. Para satisfação dos leitores.


Agora, vamos ao "Editorial" de Livre Mercado de outubro, edição que já está nas bancas:


Fome de informar?


É complicadíssimo mexer no vespeiro do caso Celso Daniel, sobretudo nos pontos em que se instalam dúvidas e certezas sobre a autoria do assassinato. A persistência e o vigor com que o Ministério Público Estadual instalado em Santo André se coloca na tipificação de crime encomendado se assemelham à convicção e à irredutibilidade da Polícia Civil ao assegurar que tudo não passou de evento circunstancial. 


Seria exagero afirmar que temos no campo criminal espécie de Fla-Flu, que pressupõe subjetividades ditadas pelo emocionalismo típico do futebol. Entretanto, não faltam elementos nas versões policiais e promotoriais que jogam sim aqueles acontecimentos na rede de dúvidas e questionamentos típicos do chamado esporte-rei. Essa é a razão de termos produzido a Reportagem de Capa. 


Haverá sempre um leitor impertinente que, preso à literalidade e conservadorismo que imagina indestrutíveis no título desta publicação, questionará a razão de o caso Celso Daniel mais uma vez alcançar tanto destaque nestas páginas. A resposta é tão simples quanto é complicado o jogo de xadrez interpretativo do enredo que levou o então prefeito de Santo André à morte: LivreMercado há muito introduziu na linha editorial a dinâmica de fatos relevantes da comunidade regional, estejam ou não diretamente relacionados ao conceito para muitos estreito de economia. 


Tenho mergulhado fundo na investigação jornalística do caso Celso Daniel entre outros motivos porque acredito piamente na inocência de Sérgio Gomes. Aliás, essa certeza tem tanto peso profissional quanto a decisão de não arriscar uma unha sequer na possibilidade de a versão de irregularidades na Administração Celso Daniel ser fruto de imaginação. Mas faço também a providencial ressalta de que não arrisco a mesma unha na sustentação de que propinas jamais teriam existido no Paço de Santo André ou em qualquer outro endereço análogo, nacional ou internacional. 


O que a Reportagem de Capa pretende denunciar, de fato, é a incompetência generalizada da mídia nacional para tratar do assunto. A mediocrização da pauta jornalística e a subordinação acrítica às fontes de informação colocam a escanteio a importância de aprofundamento informativo. Por isso, independentemente de juízo de valor sobre a verdade do caso Celso Daniel, temos assistido ao persistente linchamento de Sérgio Gomes embora, nesse caso, as autoridades envolvidas na apuração mostrem-se férteis em argumentos e, por isso mesmo, instigantes ao jornalismo esclarecedor.


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