Administração Pública

Preservação à
moda canadense

ANDRE MARCEL DE LIMA - 02/02/2005

Santo André foi buscar know-how internacional para encarar um desafio normalmente relegado a segundo plano por administradores públicos: o gerenciamento de áreas de mananciais que, no caso da cidade, cobrem 60% do território de 174 quilômetros quadrados. Os resultados da empreitada são animadores. Graças ao programa realizado em parceria com a Agência Canadense para o Desenvolvimento Internacional, CIDA na sigla em inglês, além de instituições como a universidade British Columbia, também do Canadá, Santo André se transformou em referência nacional no tema e ainda estabeleceu bases técnicas para implantação de indústrias não poluentes -- possibilidade de ouro que depende de mudanças na legislação estadual para virar realidade.


O Gepam (Gerenciamento Participativo de Áreas de Mananciais) foi concluído com seminário internacional no Centro Universitário Fundação Santo André. O evento reuniu especialistas do Canadá e técnicos da Prefeitura numa espécie de prestação de contas do programa iniciado em 1998.


Entre os resultados da iniciativa que tomou corpo durante o mandato do prefeito Celso Daniel estão a implantação de modelos de gestão e urbanismo que levaram mais dignidade aos moradores e sustentabilidade às áreas afetadas. "O programa nasceu para pôr fim a um impasse: a necessidade de levar melhorias e equipamentos públicos aos habitantes dos mananciais num contexto marcado pela proibição das ocupações por legislação estadual" -- observa João Ricardo Guimarães Caetano, subprefeito de Paranapiacaba e Parque Andreense. 


Espaço do Estado 


Essas regiões somam seis mil moradores em áreas de proteção ambiental, por isso se tornaram os principais alvos do programa. "O Gepam se encaixa na lacuna deixada pelo Estado, que proíbe ocupações sem fornecer instrumentos de gestão diante das necessidades práticas" -- completa Jeroen Klink, secretário de Desenvolvimento e Ação Regional.


A criação da subprefeitura de Paranapiacaba e Parque Andreense em 2001 foi um dos principais desdobramentos do Gepam e serviu como guarda-chuva para as ações do programa.


Na área de urbanismo, a subprefeitura providenciou infra-estrutura viária de acordo com critérios ecologicamente corretos. "Pavimentamos ruas e construímos escadas, mas mantivemos calçadas gramadas para não impermeabilizar o solo e afetar o escoamento das águas das chuvas" -- lembra João Ricardo, ex-diretor do Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental).


No setor educacional, a administração promoveu treinamento nas redes municipal e estadual para que professores transmitissem lições de preservação do meio ambiente. "Questões como deposição de lixo, esgoto e a peculiaridade de cada bairro se tornaram objeto de análise e estudo em sala de aula" -- comenta o subprefeito, que cita os cursos de capacitação profissional sob medida para os moradores como outro vértice do Gerenciamento Participativo de Áreas de Mananciais. Pelo menos 30% dos seis mil habitantes de Paranapiacaba e Parque Andreense passaram por programas de turismo, paisagismo e jardinagem, calcula João Ricardo.


Participação social


O mais importante, entretanto, é que as ações urbanísticas, educacionais e de profissionalização foram concebidas com participação das comunidades. Na esteira da descentralização administrativa, a subprefeitura promoveu sistema compartilhado de tomada de decisões para que moradores incorporassem o papel de protagonistas das mudanças em vez de meros espectadores. Eles foram estimulados a formar o Conselho de Representantes, responsável pela definição e acompanhamento de cronogramas de obras e atividades de cultura e lazer. 


A missão de promover interação social para modificar o ambiente comunitário não foi nada tranquila. Até um grupo internacional especializado em resolver conflitos em regiões conflagradas foi acionado pelo Gepam para mediar interesses antagônicos que despontam naturalmente em ambientes democráticos. 


Além disso, líderes comunitários viajaram em comitiva ao Canadá para comprovar na prática como aquela nação desenvolvida preserva áreas de importância ecológica. "Antes de interferir no ambiente físico era preciso atuar na mentalidade dos moradores. Eles passaram a se organizar e agir de forma coordenada no lugar da antiga postura meramente reivindicatória" -- constata Jeroen Klink. 


População participa 


O biomapa foi uma das ferramentas utilizadas para estimular a participação social. A atividade consistia em pedir que os próprios habitantes desenhassem o ambiente em que viviam com a liberalidade de incluir os equipamentos públicos desejados. Através dessa ferramenta a administração definiu pontos para implantação de praças, escolas e postos de saúde. E até mudou planos previamente concebidos com base no senso comum. "Em princípio imaginávamos que todas as comunidades queriam campos de futebol, mas descobrimos que muitas davam prioridade a playgrounds" -- exemplifica João Ricardo.


O maior mérito do programa lastreado por know-how canadense é a capacidade de olhar para a intrincada questão da preservação dos mananciais com realismo, sem radicalismos. Entre a impossibilidade prática de remover milhares de invasores e a comodidade de fazer vistas grossas ao problema, a administração resolveu trilhar caminho intermediário de responsabilidade ao levar benfeitorias aos moradores e buscar a preservação nos limites das condições pré-existentes. 


Ocupação industrial


A dimensão estritamente econômica do Gepam foi tratada por meio do mapeamento de áreas ambientalmente sensíveis, realizado com suporte do Centro de Assentamentos Humanos da universidade canadense British Columbia. O levantamento produzido com imagens de satélites detalha características físicas e biológicas e pode ser utilizado para consubstanciar tecnicamente os planos de ocupação industrial que a Prefeitura de Santo André pretende pôr em marcha. "O momento é favorável porque há uma lei em gestação no comitê de bacias que pretende transferir para os municípios prerrogativas hoje exclusivas do Estado. Quando a autonomia nos for outorgada, já estaremos embasados para atrair empresas" -- planeja Jeroen Klink, que não vê lógica no congelamento da lei estadual de proteção da década de 70. "As tecnologias produtivas passaram por verdadeira revolução nos últimos 30 anos, o que tornou perfeitamente possível harmonizar produção e preservação" -- observa.


Ao lado do Parque Andreense e da Vila de Paranapiacaba, a Favela do Pintassilgo também integrou o Gepam. A diferença é que as atividades relacionadas a esse núcleo de quatro mil moradores foram condensadas em um projeto de quase 60 páginas e ainda não implementado por questão básica de prioridade. "É preciso esperar porque o trecho sul do Rodoanel está projetado para passar naquela região" -- explica Jeroen Klink. 


Já experiência de seis anos na área de influência da subprefeitura de Paranapiacaba foi transformada em seis volumes impressos com tiragem de 500 exemplares.


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