Administração Pública

Lixo milionário sob suspeição
foi denunciado aqui em 2013

DANIEL LIMA - 03/02/2017

O Diário do Grande ABC imprimiu na edição de hoje o que denunciamos há quase quatro anos nesta revista digital. Na edição de 15 de abril de 2013 alertamos sobre a usina de incineração de lixo no terreno que durante muitos anos serviu de lixão no Bairro de Alvarenga. O título daquela matéria que redigimos (“Lixo milionário de São Bernardo vai embalar candidato de Luiz Marinho”), só não se tornou realidade na prática porque houve contratempos ambientais e, principalmente, estourou a Operação Lava Jato como forças dissuasivas à cronologia imaginada.  

O Diário do Grande ABC deu manchetíssima (manchete das manchetes de primeira página) hoje com o seguinte enunciado: “CPI vai apurar contrato para lixo de R$ 4 bi em S. Bernardo”. Lanço mão sistematicamente da reprodução fiel e clara de textos de terceiros para fundamentar análises. Por isso, repasso na sequência o que no jargão jornalístico se trata de chamada de primeira página, ou seja, o texto que procura sintetizar na vitrine de jornal o que está reservado à página inteira. Leiam o que o Diário do Grande ABC publicou hoje sobre a usina de lixo: 

 Vereador governista em São Bernardo, Ary de Oliveira (PSDB) protocolou pedido de CPI para investigar a PPP (Parceria Público-Privada) que cuida da destinação do lixo no município. Segundo o tucano, a iniciativa já conta com a adesão de 19 vereadores e visa investigar contrato de R$ 4,3 bilhões, válido por 30 anos. Assinado em 2012 pelo ex-prefeito Luiz Marinho (PT), o acordo com o Consórcio ABC Valorização de Resíduos Revita e Lara previa implantação e gestão de usina para produção de energia a partir do lixo, que depende de autorização da Cetesb, recuperação do lixão do Alvarenga, coleta e limpeza da cidade. 

Explicando tudo 

Agora, leiam o que escrevi há quase quatro anos na primeira entre muitas matérias sobre a usina de lixo de São Bernardo. Entre as imensas diferenças que separam os dois textos – o do Diário do Grande ABC e o deste jornalista -- os leitores entenderão o principal: não ficamos a reboque de terceiros, geralmente interessadíssimos circunstanciais, para levar conhecimento agregado à sociedade. Reparem nos primeiros parágrafos da denúncia ainda sutil que fiz: 

 O secretário de Serviços Urbanos Tarcísio Secoli contará com a usina de incineração de lixo a instalar-se no megaterreno do desativado lixão do Alvarenga como uma das vitrines mais reluzentes e rentáveis para suceder Luiz Marinho na Prefeitura petista de São Bernardo em 2016. Aquela área de 35 mil metros quadrados conta com 50 metros de profundidade contaminadíssima de lixo doméstico e industrial depositado durante 40 anos às margens da Represa Billings, divisa com Diadema. Tarcísio Secoli espera recolher muitos dividendos eleitorais de uma empreitada anunciada como inédita, mas que deverá ser atropelada por outros municípios paulistas mais adiantados no processo de implantação. A usina de incineração de resíduos atenderá inicialmente 700 toneladas por dia. Já a geração de energia elétrica atenderia o equivalente a metade da população de São Bernardo. Usina de lixo é comum principalmente na Europa, mas ainda não conta com tecnologia suficientemente testada no Brasil. O consórcio que ganhou a exploração do lixo num processo licitatório ao qual foi dada baixíssima divulgação e sem que houvesse concorrentes já começou a comprar os equipamentos, a maior parte fabricada no Brasil. O anúncio foi feito recentemente pelo próprio secretário Tarcísio Secoli. O prazo para transformar o lixo de São Bernardo em energia elétrica e, principalmente em cinzas, já que ao final da queima restariam não mais que 10% de resíduos sólidos, é de 30 anos. 

Confiança do secretário 

Sigo com mais alguns trechos importantes sobre a obra anunciada pela então principal secretário da Administração Luiz Marinho: 

 Tarcísio Secoli já aparece em diferentes ambientes para propagar a inovação que São Bernardo pretende inaugurar às vésperas da eleição de 2016. Orçado em R$ 350 milhões, o equipamento teria capacidade para a totalidade dos resíduos sólidos de São Bernardo e, de lambuja, geraria energia elétrica que alimentaria uma parcela do consumo do Município. Programa-se também, a partir de 2016, a inclusão do lixo de Diadema como matéria-prima da usina de incineração e de energia. (...) Tarcísio Secoli garante que a obra começará no dia seguinte à autorização da Cetesb. Possivelmente no começo do ano que vem, segundo seus cálculos. Em 24 meses a usina estaria pronta para ser inaugurada sobre o antigo lixão do Alvarenga. “A obra vai ser uma referência para o resto do Brasil” – proclama Tarcísio Secoli do alto de uma perspectiva que vai muito além do estritamente administrativo. 

Agora, mais incisivo 

Quatro meses depois, na edição e 13 de agosto de 2013, fui muito mais incisivo e menos hermético ao colocar a usina de incineração de lixo prevista para São Bernardo na marca do pênalti de desconfiança, enquanto a Imprensa regional mantinha-se em silêncio. Leiam os principais trechos do artigo sob o título “Dilma torna suspeita usina de lixo em São Bernardo. Como sair dessa?”: 

 Potencial candidato à sucessão do prefeito Luiz Marinho em São Bernardo, o supersecretário Luiz Fernando Teixeira poderá ter dificuldades ante uma mídia independente se escarafuncharem os trâmites legais e extralegais que lastrearam o leilão da milionária usina de incineração de lixo prevista para a área do desativado Lixão do Alvarenga. O modelo licitatório gera suspeitas de favorecimento. O próprio PT autoriza desconfiança. Bastar ler o noticiário de hoje. O leilão do trem-bala foi adiado pela presidente Dilma Rousseff por contar com apenas um provável concorrente. A usina de lixo de São Bernardo teve apenas um competidor. (...) O que mais os petistas de São Bernardo temem caso Luiz Fernando Teixeira vire candidato do Paço Municipal são os excessivos pontos de interrogação que supostamente deixaria no rastro das atividades de supersecretário. LFT, como é tratado entre os próximos que o amam e os próximos que o odeiam, é um animal político mil léguas adiante de Tarcísio Secoli, Secretário de Obras e Vias Públicas, ex-secretário de governo, também cotado para suceder o ex-ministro da Previdência Social na Capital Econômica da região. (...) Acontece que nem mesmo essa defesa, a defesa de que a Administração Luiz Marinho procedeu ao ritual do leilão no ano passado, longe portanto do burburinho das ruas, serve de blindagem.  A participação de uma única empresa é sim tecnicamente suspeitíssima e politicamente desastrosa. Foi sob essa ótica, a ótica da moralidade, que o governo Lula da Silva, já em 2010, suspendeu o leilão do trem-bala exatamente porque só havia um competidor inscrito. Eram os coreanos que pretendiam expor nos trilhos todos os conhecimentos técnicos para unir as duas metrópoles mais importantes do País. (...).A participação de uma única empresa é sim tecnicamente suspeitíssima e politicamente desastrosa. (...) Se fosse possível dar nota de zero a 10 à transparência dos trâmites que balizaram aquele leilão, a Administração Luiz Marinho se rivalizaria às ações que encaminharam os contratos do metrô paulistano às manchetes. No caso da usina de São Bernardo, o processo supostamente teria sido o inverso: a participação de um só competidor sugere que os demais interessados teriam acordado porque seriam igualmente beneficiados em competições semelhantes, em outros territórios. Alguém é capaz de sustentar sem risco que esse ritual está completamente fora do contexto de usos e costumes entre Poder Público e iniciativa privada?

Reforço importantíssimo 

Para completar, trago o reforço de outra matéria que produzi, agora em 27 de julho de 2015, sob o título “Luiz Marinho treme com delação premiada da OAS”: 

 Já escrevi algumas vezes e repito sem pestanejar: não acredito na idoneidade da gestão petista em São Bernardo por muitas razões que não podem ser comprovadas materialmente ou com testemunhas, mas por uma razão específica tão escandalosa quanto escabrosa, além de à prova de contestações: a parceria ainda impune com Milton Bigucci, quadrilheiro que arrematou o terreno público em que constrói o empreendimento Marco Zero da Vergonha. A gestão Luiz Marinho assentou naquele caso as bases de desconfiança deste jornalista que vai muito além da suspeição, porque está respaldada por fatos, documentos e trambiques administrativos de paus mandados que fecharam os olhos àquela roubalheira. Sem contar que Luiz Marinho mantém o Legislativo encabrestado, condicionando vantagens da chamada base aliada ao distanciamento de qualquer mexida de palha contra aquele empresário metido em irregularidades diversas. (...) A gestão de Luiz Marinho é uma das coisas mais torturantes em matéria de transparência de que se tem notícia porque não se limita às lambanças éticas, morais e financeiras com o empresário Milton Bigucci. Há tantos outros pontos que passaram batidos por gente que não tem por profissão o questionamento sério e responsável. O Aeroportozão pretendido na região dos mananciais e seus intrigantes acionistas mantidos a sete chaves por Luiz Marinho, a usina de incineração de lixo no Alvarenga, de cujo destino ninguém mais fala mas que tem a participação de uma das empreiteiras denunciadas no Petrolão, e o malfadado projeto do Gripen, que supostamente geraria polo da indústria de defesa em São Bernardo, são alguns dos deslizes patrocinados pelo petista protegido do ex-presidente Lula da Silva. Uma relação tão próxima e fraternal que de bônus administrativo pode virar encrenca pura. 

Seletividade é pouco 

Torço com espírito de pateta que sou. Se não o fosse, não estaria a acreditar em mudanças significativas nos usos e costumes políticos e sociais da região. Espero que o mesmo vereador que anuncia rastrear tudo sobre a usina de lixo em São Bernardo também se apresente para acabar com a farra da impunidade do empreendimento Marco Zero da Vergonha, do empresário Milton Bigucci, assentado em terreno que pertencia à Prefeitura, ou seja, aos contribuintes. 

Investigações seletivas são importantes, mas carregam agravante típico de politicagem retaliatória. Principalmente quando ocorrem quando os poderosos de plantão já não são mais tão poderosos e muito menos estão de plantão. 



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