Administração Pública

Bom em política, Morando
deixa a desejar em economia

DANIEL LIMA - 22/11/2017

O prefeito Orlando Morando é bom de política e ruim de economia. Não se trata de constatação descabida ou precipitada. É estruturada em fatos. Basta comparar declarações do titular do Paço de São Bernardo. Ele flutua no paraíso quando constrói sentenças e reflexões sobre política em geral e a política partidária tucana, em particular. Já se o assunto é economia doméstica ou macroeconomia, o desastre é completo. Morando vai direto ao inferno. 

Sorte de Orlando Morando estar acompanhadíssimo no mercado de administradores públicos da região. Não existe um único exemplar regional (tanto agora quanto neste século) que tenha intimidade com essa que é a base de qualquer atividade humana. É por essas e outras que a Província dos Sete Anões, outrora Grande ABC, é um festival de improdutividades sobrepostas a cada nova troca de comando nos paços. 

Economia não consta do cardápio dos gestores públicos entre outros motivos porque a mídia regional também é analfabeta na especialidade. Tão analfabeta que qualquer espertalhão público ou privado vende mentiras o tempo todo, durante anos a fio. Caso de Milton Bigucci à frente do Clube dos Construtores. Ou como um agente público durante a Administração do prefeito Aidan Ravin que anunciou projeção de crescimento de 17% do PIB de Santo André em 2011, sem qualquer contestação, exceto aqui. O PIB esperado foi negativo.  Ou então o prefeito Luiz Marinho que anunciou um aeroporto internacional em São Bernardo sem combinar, entre outros, com os russos da proteção dos mananciais. Qualquer absurdo é tomado como verdade cristalina e insofismável. 

Celso Daniel é exceção 

A bem da verdade o único prefeito da região com o qual convivi nos últimos 30 anos (entenda-se “convivi” como relação estritamente profissional, sem aproximações que me retirassem a sensibilidade crítica) foi Celso Daniel. O petista entendia do riscado macroeconômico e também regional. Era um show de bola a quem pretendesse desbravar culturas econômicas. E tinha humildade de contar com assessores especializados na arte de enxergar o cenário regional, nacional e mesmo internacional. 

No campo externo o professor Jeroen Klink foi um parceiro de muita massa encefálica. Hoje está na Universidade Federal do Grande ABC. A instituição excessivamente dogmática, quando não partidária, o transformou em letra morta em regionalidade. 

A Província está numa penúria total quando os referenciais são economia e sociedade entre outras razões porque temos políticos demais e gestores econômicos de menos. A retórica dos desprovidos de apetrechos tangíveis mais sólidos é uma orquestração enfadonha monitorada o tempo todo por marqueteiros que surfam no gataboralheirismo regional. Aqui se vendem com facilidades quinquilharias políticas.  

Entrevistas esclarecedoras 

O que me remeteu a separar Orlando Morando político do Orlando Morando econômico foram duas entrevistas. A primeira, nesta semana, quando o prefeito de São Bernardo e prefeito dos prefeitos do Clube dos Prefeitos foi ouvido pelo Diário do Grande ABC. Mais uma vez o jornal levantou-lhe a bola para marcar sucessivos gols. Nada que contrariasse o entrevistado, claro. Mais abaixo vou citar um exemplo de buraco no questionamento. 

Entretanto, sem juízo de valor mais aprofundado sobre as respostas de Orlando Morando, o que tivemos foi um dirigente público bem articulado sobre nuances não só do PSDB rumo à disputa da presidência da República, mas questões intestinas do próprio partido. 

Já a entrevista que resume o despreparo de Orlando Morando para questionamentos no campo econômico foi publicada recentemente nesta revista digital. O vácuo provocado pelas perguntas causou decepção total.   

Motivos não faltariam 

Ainda hoje estou em dúvida sobre os motivos que teriam levado Orlando Morando à atuação de perna de pau. Desinteresse? Desrespeito? Despreparo? Retaliação? Tudo isso combinado seria a melhor resposta. 

Desinteresse porque Orlando Morando sugeriria que só atende bem quem se dispõe a abaixar-se com subserviência para apanhar o sabonete de contrapartidas nem sempre apropriadas. 

Desrespeito porque Orlando Morando trataria os jornalistas de formas distintas, de acordo com peças que estariam em jogo, sobretudo interesses cruzados. 

Despreparo porque Orlando Morando jamais tratou de economia com alguma porção de conhecimento agregado a distinguir-se da quase totalidade de homens públicos avessos a pensar e a agir de acordo com a lógica do mundo que gira em torno dessa especialidade. 

Retaliação porque Orlando Morando, embora sempre educado e cortês, não seria gestor público de esquecer críticas por mais embasadas que sejam. Trataria jornalistas que não lhe estendem o tapete como inimigos ou adversários.

Candidatura marqueteira 

Para finalizar e voltando à entrevista ao Diário do Grande ABC, entre outras omissões detectadas sem qualquer esforço, os leitores gostariam de ter sido informados sobre os motivos que levaram Orlando Morando a tirar o time de campo de suposta indicação a concorrer ao governo do Estado. Sim, porque na entrevista Orlando Morando é tratado como alguém que jamais nem levemente pretendia disputar o Palácio dos Bandeirantes pelo PSDB. 

Tudo que o jornal publicou a respeito (e outros veículos de comunicação da região também o fizeram) integrava um mundo paralelo -- inclusive as pesquisas que procuraram dar substância à indicação. 

Orlando Morando deixaria de ser o político que é se passasse recibo de estupidez caso confirmasse pretensão de ser candidato em potencial apeado das conjecturas porque não tem lastro para tamanha disputa com gente mais influente no partido. 

A resposta de Orlando Morando incorporou o convencionalismo de que nada sabia, que ficou honrado com a projeção. Nada além disso. Deixou-se de dizer que desde o princípio a candidatura ao governo do Estado não passava de uma medida lançada para fortalecer a imagem do prefeito no reduto gataborralheiresco da política regional. Da mesma forma foi uma tática preparada para que, igualmente, se fortalecesse em instâncias tucanas, a ponto de ganhar espaço na cúpula nacional. A descentralização do Clube dos Prefeitos, com a Casa do Grande ABC, é extensão da iniciativa. 

Tática não funcionou 

Traduzindo: os marqueteiros de plantão entendiam que, ao projetarem um Orlando Morando governador, ficaria mais fácil convencer sobretudo o eleitorado de São Bernardo de que o tucano era um senhor prefeito. Entretanto, os índices de aprovação e reprovação da gestão Morando não expressaram essa idealização, diferenciando-o muito pouco dos demais prefeitos locais, igualmente pouco prestigiados num período em que os políticos em geral são vistos como bandidos sociais. 

Orlando Morando é um jovem político que, mesmo carregado de velharias, tem tudo para redirecionar o perfil que, bem ou mal, o colocou à frente de uma das principais prefeituras do País. Diria que Orlando Morando chegou cedo demais ao cargo máximo do Executivo, sobretudo quando se alinha esse cargo às pretensões a que tem direito, embora não tenha, ainda, competências. 

Não se vê sobremodo na gestão de Orlando Morando um quadro de colaboradores de primeira linha. Como contava Celso Daniel. E, goste ou não, Celso Daniel deveria ser referência obrigatória a todo gestor público na região. No campo técnico-administrativo, claro. Nos desvios tradicionais dos administradores públicos, não fugiu do padrão dos antecessores. 

Ou alguém tem dúvidas de que o esquema denunciado pelo Ministério Público e criminalizado pelo Judiciário vinha do passado tanto quanto as glórias do Tricolor Paulista? A diferença é que as glórias do Tricolor Paulista estão congeladas no passado, enquanto nem a Lava Jato coloca nos eixos as relações entre Poder Público e Transporte Coletivo. O caso do Rio de Janeiro é exceção à regra.



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