Administração Pública

Paço abafa aumento do IPTU
com uso de OAB e Agência

DANIEL LIMA - 16/01/2018

Só faltava essa para que o conceito de regionalidade seja atirado de vez na lata de lixo da politização: a indicação do advogado Fábio Picarelli para comandar a Agência de Desenvolvimento Econômico Regional, substituindo o técnico e competente (embora desvalorizado e solitário) Giovanni Rocco. A costura faz parte de articulação política que pretende fortalecer o tucanato e aliados na região após a hecatombe petista nas eleições municipais de 2016.

O ensaio geral para a indicação de Fábio Picarelli (filiado ao DEM) com as digitais do prefeito Paulinho Serra, presidente da Agência, talvez seja desativado. Há rumores de que parte substantiva do Conselho Deliberativo daquela instituição, sobretudo relacionada aos sindicatos de trabalhadores, explodiria a iniciativa. Entretanto, mesmo com a discordância dos sindicatos, a Agência poderia ter votos suficientes para eleger Picarelli. O dia seguinte seria infernal. 

A intimidade de Fabio Picarelli com a economia e a regionalidade no sentido mais amplo da expressão é semelhante aos dotes diplomáticos de Donald Trump nas relações com o ditador da Coréia do Norte. Por isso mesmo o ex-dirigente da OAB, ainda com influência naquela instituição, pretenderia usufruir as vantagens de aproximar-se do Paço Municipal para promover triangulações que envolveriam interesses do prefeito Paulinho Serra. OAB, Agência e Prefeitura estariam no mesmo barco de objetividades políticas e institucionais. Contariam com autoproteção geral como um dos pressupostos. 

Perdendo o pudor 

Jamais se pretendeu neste espaço jornalístico ignorar que o mundo gira e a lusitana roda ao sabor de interesses políticos, principalmente. Não existe puritanismo deste lado, embora também o conceito editorial esteja bem distante de bordeis com vitrines de interesses sociais que seduzem ingenuidades e prostituições éticas. O que se lamenta é que as prospecções meramente político-eleitorais sufocam, quando não esquartejam, prioridades sociais, sobretudo derivadas do campo do desenvolvimento econômico. 

Quem acompanha o nascedouro da Agência e do Clube dos Prefeitos, sob a liderança de Celso Daniel, sabe que existia de fato e para valer uma grandeza de regionalidade econômica e social a embalar as duas entidades. Não que a política partidária fosse desprezada. Havia uma crosta de mais pudor e de responsabilidade coletiva.

Não falta quem coloque no mesmo saco de interesses nada republicanos uma jogada que supostamente seria de mestre, mas que, desmascarada, poderia se tornar patética. Fontes diversas bem estabelecidas entre mandachuvas e mandachuvinhas de Santo André asseguram que, em troca de eventual selo de aprovação da OAB de Santo André no caso do IPTU lançado por Paulinho Serra, o prefeito de Santo André e seu grupo político teriam espaço ampliado naquela entidade que, por sua vez, com Fábio Picarelli, teria na Agência suposto manancial de marketing para explorar rumo a alguma candidatura sempre pretendida, mas ainda não viabilizada. 

Sindicalismo opositor 

Tomando-se por base o comportamento da OAB até agora no caso do IPTU, e levando-se em conta o afastamento de Giovanni Rocco da Agência de Desenvolvimento Econômico, bem como o desgaste monumental de um Paulinho Serra patético ao usar a tecla tão repetitiva quando inócua de que a Planta Genérica de Valores estaria congelada há mais de uma década, o encontro das águas para fazer do limão de uma degringolada administrativa limonada de um salto rumo ao futuro tem ampla conectividade, embora baixa sustentabilidade. 

Afinal, falta combinar tudo isso com os russos do sindicalismo regional, praticamente todos de esquerda, e também com o Fabio Palacio, secretário-geral do Clube dos Prefeitos, indicado pelo prefeito Orlando Morando com a promessa de apoio nas pretensões eleitorais de chegar à Assembleia Legislativa. Sim, quem inaugurou o projeto de politização político-eleitoral nas fontes que deveriam servir de base para ações econômicas na região foi Orlando Morando. Palacio não gostaria de dividir os holofotes com Fábio Picarelli no mesmo nicho institucional. Agência e Clube dos Prefeitos são irmãos siameses. 

Fabio Palacio também não sabe distinguir regionalismo de provincianismo. É um político sem passado nas esferas de inteligência estratégica do desenvolvimento econômico. No ano passado foi colhido em flagrante escorregão. Vazou nas redes sociais uma frase de bastidores em que trata regionalidade com ar de deboche, apenas como fonte de interesses eleitorais. 

Interesses cruzados 

Esse embaralhamento institucional é o retrato acabado do grau de interesses cruzados que juntam adversários e inimigos do passado (as relações entre Paulinho Serra e Fábio Picarelli jamais foram de parceiros) em decisões que podem gerar idiossincrasias onde supostamente reinaria a paz. 

A Província dos Sete Anões, outrora Grande ABC, jamais patrocinou classe política e entorno cujos objetivos fossem inabalavelmente republicanos. Entretanto, chega-se ao fundo do poço neste período de ambiente nacional lavajatense, cujos estilhaços ainda são escassos na região entre outras razões porque cada vez mais esse território é menos importante para o conjunto do País. 

O que menos interessa aos mandachuvas e mandachuvinhas nesta altura do campeonato é a definição de projetos e ações em instâncias regionais cujas propostas tracem a perspectiva de resolução de problemas graves da competitividade regional. Joga-se predominantemente com cartas viciadas, individualistas e de suporte a grupos específicos. A constatação de que o interesse público está em terceiro plano na região conduz dirigentes políticos e institucionais a articulações desconectadas da sociedade desorganizada. 

Jamais se viveu na região um período de tanto deboche e descaso. Os mandachuvas e mandachuvinhas perderam definitivamente o receio do ridículo. Estão livres, leves e soltos. Deitam e rolam. Contam, para tanto, inclusive, com parte da mídia submissa e omissa. 

Improdutividade jornalística 

A superficialidade do noticiário, estrategicamente neutro, esconde propósitos não necessariamente nobres. O jornalismo puramente declaratório não é diferente do encontrado na maioria das regiões brasileiras dominadas por caciques políticos e econômicos. Nada surpreendente quando nas grandes empresas de comunicação encontra-se gente escalada para defender determinadas posições em conflito brutal com os fatos. Nada, claro, que se rivalize com o provincianismo regional. 

Sindicalistas da região não são flores que se cheirem quando se trata de regionalismo oficial no Clube dos Prefeitos e na Agência de Desenvolvimento Econômico. Há exceções que confirmam a regra. O período petista à frente das duas instituições, sobretudo durante a gestão de Luiz Marinho e suas pretensões de chegar ao governo do Estado, foi direcionado ao controle da direção e da pauta de ações. 

A diferença em relação aos tucanos que chegaram ao poder regional no ano passado é que o corporativismo cedeu lugar ao politiquismo sem engenho e, mais que isso, sem nenhum compromisso com o legado institucional de Celso Daniel. O soneto da regionalidade herdada de Luiz Marinho, quem diria, ganha de barbada da emenda dos tucanos. 

Passado instigador 

A desconfiança generalizada entre profissionais do ramo de Direito que se opõem à influência de Fábio Picarelli na Ordem dos Advogados do Brasil em Santo André, depois de dois mandatos e de a muito custo eleger o sucessor, não pode ser desqualificada como jogo de intrigas. Em novembro do ano passado, integrantes da Comissão de Direito Tributário e Defesa do Contribuinte da entidade declararam ao jornal Repórter Diário que entrariam com ação popular contra a gestão de Paulinho Serra por conta do aumento do IPTU.

Escreveu o jornal que o presidente da comissão da OAB (Leandro Machado) disse que a aprovação da Planta Genérica de Valores, em junho do ano passado, estava carregada de inconstitucionalidades. Entre as ilegalidades, afirmou o jornal, “o especialista aponta que as novas regras não atenderam requisitos legais como, por exemplo, a função social e a depreciação da construção do imóvel na composição do valor venal”.

O jornal Repórter Diário também relatou naquela reportagem de novembro do ano passado que “além do advogado, o vice-presidente da comissão, Ricardo Chamma Ribeiro e o membro do grupo Marcelo Marques Junior também se reuniram com o presidente da subseção (...) Roberto Gonçalves, para entregar o parecer pela inconstitucionalidade da legislação. Pedimos para que houvesse uma conversa amigável com o prefeito, a fim de sanar algumas inconstitucionalidades”, apontou Machado.

Picarelli em dois tempos 

A reportagem do Repórter Diário relata as medidas do prefeito Paulinho Serra na aprovação da Planta Genérica de Valores cujos resultados contrariaram a legalidade. Escreveu também: “Além dos pedidos de correções às alterações inconstitucionais no IPTU, a comissão de OAB sugere que, após a adequação dos métodos de cálculo da PGV, o governo dilua o aumento no tributo em geral para os próximos quatro anos, além das correções anuais da inflação conforme o Fator Monetário Padrão”.

Três dias antes da reportagem do Repórter Diário com representantes da comissão da OAB, o ex-presidente Fabio Picarelli, agora indicado por Paulinho Serra para a Agência de Desenvolvimento Econômico, declarou ao mesmo jornal, mais especificamente à versão web televisiva, que considerava o momento delicado para se pensar em aumento tributário. “É uma medida arriscada e terá um impacto. Santo André já tem um histórico de 2002, quando houve mudança no IPTU e a cidade se movimentou, gerando uma avalanche de ações judiciais questionando imposto”, disse Picarelli.

Há quase dois meses nada mais se publicou sobre o assalto fiscal da Prefeitura de Santo André. Paço, OAB e Agência parecem ter construído um acordão de objetivos político-eleitorais monolíticos. A Província dos Sete Anões, outrora Grande ABC, seguirá a rotina de cair pelas tabelas na geração de riqueza nacional. Desde 1970 foram 59,30% para o ralo. 



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