Administração Pública

Caso IPTU: Carta Aberta
ao prefeito de Santo André

DANIEL LIMA - 25/01/2018

Caro prefeito Paulinho Serra: preste atenção aos movimentos publicamente discretos que se espalham nos aplicativos de celulares. O senhor subestima o futuro próximo depois de atear fogo no presente e no passado recente. O aumento extorsivo do IPTU, generalizado em Santo André, configura-se como cadafalso. Os lambe-lambes que o cercam tentam convencê-lo do contrário. Transformaram-no em Alice. No fundo da alma de político que não é bobo nem nada o senhor sabe que a situação está para lá de complicada. 

Não sei onde estava quando manifestantes decidiram fazer-lhe visita de surpresa à frente de sua residência.  Isso pouco interessa. Ficou claro que ninguém sai de graça às ruas numa cidade moribunda em cidadania. A passividade que caminha de braços dados com o esfacelamento econômico de Santo André morreu de morte matada pelo senhor. O IPTU é um confisco tão sistêmico quanto agressivo, para não dizer covarde. Quem lhe transmite informações de que os estragos estão confinados a pontos dispersos são péssimos conselheiros.  Serão os primeiros a abandonar o barco.

Caro Paulinho Serra: o senhor sabe que não sou jornalista de partido político. Uma coisa não pode se dar bem com a outra a tiracolo. Ou seja: quem é jornalista deve vestir a camisa da sociedade, não de agremiações. Quando se mistura uma coisa à outra, perde-se a capacidade de raciocinar sem vieses. Cada macaco no respectivo galho. Conheço jornalistas que se danaram como alavanca partidária. Nada, entretanto, necessariamente contra políticos em eventuais incursões anti- IPTU. Democracia é isso mesmo. Só espero que o senhor não desclassifique o movimento por conta dessa eventualidade. Quem mandou ressuscitar nocauteados?

Cuidado com quem andas

Então, estamos combinados e o senhor sabe bem disso: trato política como objeto de informação e de análise, não de compadrio. Aqueles que estão a lhe bajular como integrantes de entidades de classe de baixa representatividade, embora respeitáveis historicamente, esses estão a destruir o patrimônio que lhe resta de votos amealhados em outubro de 2016. Sem contar, claro, a credibilidade em mergulho profundo.  

Caro Paulinho Serra: o senhor sabe que resisti à onda de mudança do seu nome. Sempre considerei legítimas suas ambições políticas em contraste com o provincianismo do nome no diminutivo. Paulinho é coisa de menino mimado, de filho único. O senhor perdeu tempo. Deixou que Paulinho Serra se consolidasse como marca política. Mudar o tratamento não me pareceu algo de que poderia me orgulhar como jornalista. Como eventual assessor de Imprensa ou marqueteiro, teria lhe sugerido a nova identidade, porque não faltaria quem a adotasse jornalisticamente. Prefiro não pertencer à turma que lhe dá guarida em vários campos. Uma guarida que, no campo de assalto à mão armada fiscal, é abraço de urso. 

Tentando ajudar 

Caro prefeito Paulinho Serra: o senhor saber que tentei lhe ajudar para contornar a crise mais que anunciada e já emergente. Era o segundo semestre do ano passado. Agora a crise está aí nas ruas, nos bares, nos lares e em todos os cantos. Prometem, grupos de assaltados, manifestação-monstro por estes dias. 

O senhor se recorda que estive pessoalmente duas vezes na Prefeitura, ano passado? Levei-lhe voluntariamente, de forma transparente narrada nesta revista digital, duas ações em favor de Santo André. Uma do Empreendedor Participativo. Outra de correção imediata da barbeiragem consumada em junho com a aprovação do escandaloso IPTU. Levei-lhe um profissional do campo de potencial de consumo. Escrevi ontem sobre o assunto. A ideia de juntar potencial de consumo e IPTU é minha e vem de longe. Mas ninguém melhor que o pesquisador Marcos Pazzini, detentor de todos os estudos, para contribuir com sua Administração e, principalmente, com a sociedade desorganizada que o senhor está a desafiar.

Caro prefeito Paulinho Serra: acho que devo lhe dizer com todas as letras que a sociedade desorganizada de Santo André (e da região como um todo) saiu de um sono profundo com a explosão do IPTU. São patéticas as ponderações do caro prefeito de que não se corrigia a Planta Genérica de Valores desde 2002. Não vou repetir aqui o que publicamos em outras edições como reparo à estupidez desse raciocínio fiscalista, defensivista e suicida. 

Caro prefeito Paulinho Serra: ainda há tempo de reconhecer que o senhor está encalacrado. Insistir nessa disputa será cada vez mais danoso. Mande seus falsos amigos do peito às favas. Eles fazem coro de aprovação às inconsistências que senhor repete à exaustão como se quisesse convencer-se. O autoengano é letal quanto se torna massivamente público. 

Baixa representatividade 

Sem ofender, mas já esclarecendo, o senhor sabe, caro prefeito Paulinho Serra, que essas entidades que estão a lhe dar suposto respaldo, embora de forma matreira, não têm a representatividade de uma sociedade mesmo que desorganizada. Preciso esclarecer o matreira do parágrafo anterior. Trata-se, e o senhor sabe disso, de falsas tentativas de obstar os passos da insanidade fiscal. Encaminharem-se recursos inconsistentes ao Judiciário. Essas iniciativas viciadas consistem em produzir levezas interpretativas que jamais terão repercussão anunciada. Ou seja: os meritíssimos receberam peças supostamente opositoras ao aumento do IPTU. Trocando em miúdos: não passavam de jogo de cena. 

Sei caro prefeito Paulinho Serra que há assessores e voluntários infiltrados nos movimentos contrário ao IPTU. Participam principalmente de redes sociais. Supostamente lhe transmitem a temperatura do momento. Se esses aliados em postos avançados dos inimigos relatarem a verdade, o senhor já está com orelhas em chamas. 

Acredite prefeito Paulinho Serra: o bicho está pegando e vai pegar mais ainda. O senhor despertou o que chamo de cidadania monetária em Santo André. Já é um bom começo para quem como eu quer muito mais. Quero capital social. Que é outra coisa. Algo que procuramos honrar aqui. 

Caro prefeito Paulinho Serra: dizem que escrevo com certa porção de, digamos, elegância nem sempre ao gosto de fregueses pouco letrados ou que apenas correm os olhos nas plataformas digitais, quando leitura boa de verdade é mastigada, digerida. É verdade que determinados temas assim o exigem, porque, do contrário, estaria tratando questões complexas com a simplicidade dos incultos. Esta Carta Aberta é uma maneira de dizer ao senhor que também sei escrever com fortes cores do povo. Duvido que alguém deixará de compreender estas linhas. Nem o senhor, claro. 

Debandada legislativa 

Caro prefeito Paulinho Serra: o senhor sabe que está metido numa encrenca histórica, da qual para se livrar precisará sobretudo de humildade. Os vereadores, inclusive situacionistas, já tiram o time de campo. O senhor já não conta com o apoio irrestrito que imaginava. Está difícil segurar a barra. Os mensageiros que o senhor também tem no Legislativo não sabem da missa um terço. Muitos dos vereadores sabem que existe uma única saída para se livrarem do abacaxi, e por isso mesmo já reagem. Eles dizem que foram enganados pelo seu secretário de articulações na aprovação do projeto. Prometeram aos vereadores uma reforma inovadora e o que assinaram a toque de caixa foi um presente de grego para a população. E também para eles. Não espere deles que assumam a porção de responsabilidade, engabelados que foram com a garantia de que parte da montanha do dinheiro do IPTU seria destinada às chamadas emendas parlamentares. 

Caro prefeito Paulino Serra: não fique contando muito com os ovos da mídia no cesto da generosidade. Do jeito que a coisa está andando, o peso relativo da informação impressa e digital que subestima os estragos do IPTU escandaloso será cada vez menor. Ouso dizer, caro prefeito, que não é só o senhor que está a ver o prestigio enxurrada abaixo. As mídias que lhe dão suporte na estratégia de minimizar a roubalheira fiscal sofrerão enormes danos. Nenhuma embromação resiste à materialidade dos carnês que o senhor mandou emitir. Espero que o senhor entenda a contextualização de “roubalheira”. Quero dizer que tomar dos contribuintes na mão grande de um imposto eivado de irregulares técnicas é mesmo um roubo.  

Caro prefeito: insisto que não vou bater na tecla da teia de irregularidades que caracterizam o IPTU desastrado. Tudo isso publicamos aqui de forma independente, cristalina e incontestável. Inclusive com a colaboração de um especialista que preteriu manter-se anônimo. Essa Carta Aberta tem a finalidade exclusiva de tentar botar a Administração de Santo André no mundo real. A fantasia de que está tudo bem e que há apenas alguns focos de descontentes será rasgada de vez, pelo andar da carruagem, antes da chegada do Carnaval. 

Instrumento raro 

É muito raro, caro prefeito Paulinho Serra, que escreva Carta Aberta. Acho que esse é um recurso emergencial. Algo como o último suspiro ao bom senso. Posso estar enganado, mas a última vez que me meti a escrever algo do gênero já faz mais de 10 anos. Fiz uma Carta Aberta ao então presidente Lula da Silva. Alertei-o que a Universidade Federal do Grande ABC não teria nada a ver com o que ele andou propagando, vocacionada que seria ao desenvolvimento econômico da região. Me ferrei, caro prefeito, porque a UFABC é isso que está aí e que tanto apontei que seria, ou seja, uma escola superior que apenas está na região, mas não é da região. Situação muito bem definida por um especialista em Educação, Valmor Bolan. Somos barriga de aluguel.

Caro prefeito Paulinho Serra: gostaria de estar redondamente enganado, mas o senhor está derrotado quando se observa o horizonte próximo. Só algo muito extraordinário o colocará de novo como detentor de uma parte interessante da extraordinária votação de outubro de 2016. Todos sabem que não foram necessariamente virtudes que o alçaram ao sucesso eleitoral. Outros candidatos Brasil afora com o mesmo perfil do senhor obtiveram estrondosas votações por conta da demonização do PT. O que lhe resta é contornar o precipício do IPTU e iniciar trajetória de recuperação da imagem. Para isso, precisará começar a governar no mais amplo sentido do conceito. 

Caro prefeito Paulinho Serra: o senhor deixa explícito em cada tentativa de justificar o injustificável que pretendia fazer do dinheiro do IPTU financiamento de projetos supostamente em favor da cidade. Lamentavelmente, esqueceu que o IPTU tem limites de razoabilidade arrecadatória que Santo André, como provamos, há muito tempo já ultrapassou. Essa conversinha mole de congelamento é balela, como mostramos. Desde 2003 foram 337% de aumento de arrecadação com o imposto, contra 134% de inflação. Escrevemos muito sobre isso também. 

Grau de risco 

Caro prefeito Paulinho Serra: por fim torço para que se desvencilhe dos maus conselheiros que o rodeiam em larga margem e entenda que os movimentos populares sem partidarização ou mesmo com certo grau de partidarização já rebaixaram o prestígio que supostamente o senhor teria. Não diria que, analogamente, o senhor estaria na mesma situação do Brasil segundo as agências internacionais de riscos. A situação do senhor é bem pior que isso, caro prefeito. Cada carnê residencial, comercial, de serviços e industrial que chega aos contribuintes é um estrondo. “Eventuais distorções”, segundo os jornais, não passa de expressão anedótica. 

Caro prefeito Paulinho Serra, sebo nas canelas que a moçada está empenhadíssima em invadir as ruas de Santo André fisicamente. Metafisicamente o ambiente é de indignação coletiva. 



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