Administração Pública

Paulinho Serra foi alertado
muito antes sobre risco fiscal

DANIEL LIMA - 14/02/2018

Há três explicações nada lisonjeiras para a derrapada do prefeito Paulinho Serra ao tentar meter goela abaixo dos contribuintes o extorsivo aumento do IPTU finalmente suspenso: não contava com assessores minimamente competentes para traçar o caminho das pedras durante a campanha eleitoral e antes de assumir a Prefeitura em janeiro do ano passado; negligenciou o que encontrou ao tomar posse; e simplesmente deixou de priorizar a leitura desta publicação. Nas três situações o tucano foi desastrado. Jogou com a sorte e se deu mal. 

Houvesse espaço no Fantástico para três gols contra da Administração Pública, assim como há para três gols a favor de um mesmo jogador numa partida, Paulinho Serra não escaparia do vexame. Transformar o patrimônio imobiliário de Santo André em Casa da Moeda é muito fácil. Desde que não se exagere. Paulinho Serra exagerou. 

Para não dizerem que sou engenheiro de obras feitas, passo às provas de que Paulinho Serra foi alertado neste espaço sobre os riscos fiscais que herdara dos antecessores – situação nada diferente, a bem da verdade, da maioria dos prefeitos que assumiram no ano passado. 

Foi na edição de 6 de novembro de 2016 (portanto, logo após a vitória eleitoral retumbante que o prefeito comemora até hoje sem levar em conta as circunstâncias que o lançarão a uma queda vertiginosa nas próximas eleições) que chamamos a atenção do tucano. Afinal, o que escrevi naquela oportunidade que comprovadamente revela o despreparo da Administração de Santo André para os dias nebulosos que viriam e que o levaram à patética tentativa de extorsão monetária em forma do Imposto Predial e Territorial Urbano? 

Acompanhem, sem se esquecer da data daquela análise, um dos alertas que fizemos sob o título “Santo André de Terceira Divisão está à espera de Paulinho”. Não preciso lembrar que a abordagem em questão é única no jornalismo regional, cada vez mais especializado em reproduzir declarações dos mandachuvas e mandachuvinhas como verdades intocáveis. Registre-se exceções de jornalistas profissionais que atuam na mídia digital. Portanto, longe das amarras corporativas da imprensa tradicional, abatido pelos tiros do empobrecimento regional. 

Primeiro trecho da crise anunciada 

 Não confundam as bolas, porque não estou falando de futebol e do Santo André, que está na Série A do Campeonato Paulista mas integra a Quinta Divisão do Campeonato Brasileiro. Estou me referindo à situação fiscal que espera pelo prefeito eleito Paulinho Serra. Por isso, o tucano que se prepare. Ao dizer como disse outro dia ao Diário do Grande ABC que Santo André não sofreu grandes mudanças econômicas nos últimos anos ele provavelmente está excluindo as condições dos cofres municipais. Os antecessores Aidan Ravin e Carlos Grana lhe deixaram um abacaxi e tanto. Por isso ainda outro dia escrevi que Paulinho Serra estava a falar demais. Duvido que o novo prefeito de Santo André tenha conhecimento da situação fiscal como este jornalista. Escrevi em agosto deste ano um artigo denso sobre a situação de Santo André, entre outros municípios da região e do G-22, o grupo dos 22 endereços mais importantes do Estado de São Paulo, exceto a Capital.

Mais trecho da crise anunciada 

 Ali retratei o estado degenerativo das finanças públicas da Prefeitura de Santo André. Acho que Paulinho Serra e assessores econômicos (será que os tem?) não acompanharam aquele trabalho. Se acompanharam, teria o prefeito eleito mais cautela na propagação da maravilha que pretende implantar no Município que já foi, segundo exalta o próprio hino, um celeiro industrial. Quem produz com dados oficiais e sistematizados o retrato mais sério e fiel do estado fiscal dos municípios brasileiros é a Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro). No chamado Índice Firjan de Gestão Fiscal meti a colher para organizar o que chamei de Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal. Santo André estava na Série A antes da chegada de Aidan Ravin, que entregou o Município na Série B ao sucessor Carlos Grana. É mais que provável que Paulinho Serra, quando forem conhecidos os dados desta temporada de nova queda do PIB (Produto Interno Bruto) terá um presente de grego na forma de rebaixamento à Série C do Brasileiro. 

Mais trecho da crise anunciada 

 Em 2008, quando o petista João Avamileno deixou o Paço Municipal de Santo André, o Índice Firjan registrava 0,8403 de pontuação classificatória, correspondente à Gestão de Excelência, ou Série A do Brasileiro. No final do ano passado, conforme dados mais atualizados, passados os quatro anos de Aidan Ravin e os três primeiros anos de Carlos Grana, Santo André caiu para a Série B com amplas possibilidades de, quando saírem os dados de dezembro deste ano, ingressar na Série C. O Índice Firjan de dezembro do ano passado, de 0,6286, está praticamente no limite da Série B. Menos que 0,6000 é rebaixamento sem dó nem piedade. 

Mais trecho da crise anunciada 

 No texto que preparei em agosto deste ano comparei o desempenho fiscal da gestão de Aidan Ravin, entre 2009 e 2012, e o que realizou em três anos o petista Carlos Grana. Com Aidan, Santo André caiu no Índice Firjan de 0,8403 para 0,7105. Um rebaixamento de 0,1298 ponto. Já com Carlos Grana o Índice Firjan caiu para 0,6286, um mergulho de 0,0819 ponto quando comparado a 2012. A quem acha que a queda não é suficientemente preocupante, não custa lembrar o tombo nacional de Santo André, o que em última análise significa o quanto se deterioraram os cofres da Prefeitura. No ranking nacional, a derrocada foi estonteante no período de sete anos: Santo André ocupava a 41ª posição no Brasileiro de Gestão Fiscal em 2008 e caiu para a 411a posição no ano passado. O ex-prefeito João Avamileno, que sucedeu Celso Daniel, deixou uma herança bendita que os sucessores dilapidaram.

Mais trecho da crise anunciada 

 Também expliquei naquela análise que Aidan Ravin contou com contexto macroeconômico mais interessante para realizar administração muito mais positiva do que Carlos Grana. Durante os quatro anos de mandato do então petebista o PIB brasileiro cresceu 13,1% -- média anual de 3,275%. Já com Carlos Grana e os desastres de Dilma Rousseff (não contabilizados este 2016 igualmente tenebroso em relação ao ano passado), o crescimento médio do PIB brasileiro deu para trás: entre 2013 e 2015 houve queda de 1,20%. Está mais que claro que Carlos Grana pegou o osso do governo petista, enquanto Aidan Ravin nadou de braçadas. 

Mais trecho da crise anunciada 

 Separar o comportamento do PIB Brasileiro da gestão fiscal dos municípios seria heresia. A economia nacional é movida pelos municípios e os municípios não podem prescindir de competitividade para suportarem a concorrência. Quando um Município descamba no ranking nacional, como se tem registrado na Província, os sinais de imprevidências administrativas são compulsórios. O Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal é ferramenta imprescindível a qualquer gestor público como um conjunto de insumos a minuciosas avaliações e também como ao estabelecimento de desafios que não se limitem a confrontos com os municípios igualmente na pindaíba como Santo André. Quesitos como Receita Própria, Gastos com Pessoal, Investimentos, Liquidez e Custo da Dívida, como escrevi em agosto ao explicar o que é o Índice Firjan, não são penduricalhos a merecerem quarto de despejo em qualquer circunstância, inclusive durante uma disputa eleitoral. 

Mais trecho da crise anunciada 

 Para reforçar precaução com o discurso ufanista de Paulinho Serra antes, durante e depois das eleições, convém reafirmar o que diagnostiquei sempre com base nos indicadores da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro: a maior ameaça a pairar sobre a gestão fiscal de Santo André é a baixíssima capacidade de investimento. Alertei sobre o risco de Santo André entrar numa ciranda financeira com obras que terão de sair do papel exclusivamente com aporte de terceiros, de bancos públicos especializados em infraestrutura física, como foi anunciado então pela administração de Carlos Grana, referindo-se ao BID. Sugeri que o caldo fiscal poderia entornar de vez. A mensagem segue válida para Paulinho Serra. 

Trecho final da crise anunciada 

 Paulinho Serra precisa organizar um comitê de emergência fiscal para tomar pé e pulso de uma situação que poderá levar sua gestão ao descredenciamento como referência de credibilidade. A crise econômica de Santo André vem de um passado que já completou três décadas e é a pior entre todos os municípios brasileiros, porque persistente e sem perspectiva de estabilidade seguida de reversão. Paulinho Serra precisa ser informado de que se não bastassem farras de despesas de antecessores combinadas com o esgotamento desenvolvimentista de Santo André, é insustentável o crescimento vegetativo dos custos municipais com o funcionalismo público.  Santo André está na ponta da faca.

Um desastre confirmado

Gestão fiscal é uma das preocupações deste jornalista porque implica em detectar as potencialidades de discursos efusivos encontrarem respaldos nos cofres geralmente mirrados ou comprometidos. Na edição de agosto do ano passado, já com novos dados do ranking da Firjan, escrevi uma nova análise, sob o título “Província perde feio no Brasileiro de Gestão Fiscal”. Leiam os principais trechos e compreendam o quanto foi imprevidente a gestão de Paulinho Serra na detecção de um problema gravíssimo:

Primeiro trecho dos novos dados 

 Santo André e São Bernardo, comandadas pelos petistas Carlos Grana e Luiz Marinho, colecionaram resultados decepcionantes de gestão fiscal nos respectivos mandatos, o primeiro de quatro anos e o segundo de oito. Já o também petista Donisete Braga, que comandou Mauá, registrou números vistosos, os melhores da Província dos Sete Anões. Durante o mandato de Donisete Braga, Mauá subiu da Série D para a Série B do Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal.  Santo André de Carlos Grana foi rebaixada da Série B para a Série C. São Bernardo se manteve na Série B, mas com resultado bastante negativo entre a chegada e a saída de Luiz Marinho do Paço Municipal.  

Segundo trecho dos novos dados 

 O desempenho conjunto dos sete prefeitos eleitos em outubro de 2012 -- e que administraram as sete cidades da região entre janeiro de 2013 e dezembro do ano passado -- foi decepcionante no Brasileiro de Gestão Fiscal. Quando assumiram os postos, Donizete Braga, Carlos Grana, Lauro Michels, Gabriel Maranhão, Luiz Marinho, Saulo Benevides e Paulo Pinheiro contavam com média geral do Índice Firjan de 0,6552, correspondente à Série B do Brasileiro. Ao completarem mandatos em dezembro do ano passado (apenas Lauro Michels foi reeleito) a média regional caiu para 0,5635 – de Série C. (...) Os números gerais sofreram forte deterioração na temporada passada, por causa da recessão econômica. Além de Donisete Braga, apenas Paulo Pinheiro, em São Caetano, entregou a Prefeitura em situação fiscal melhor do que recebeu. No caso de Pinheiro, a diferença em relação aos oito anos anteriores de José Auricchio Júnior, que agora está de volta à Prefeitura, é mínima: Auricchio encerrou o segundo mandato em 2012 com IFGF de 0,6034, contra 0,6150 de Paulo Pinheiro quatro anos depois. Carlos Grana recebeu uma Santo André com 0,7105 no Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal. Representava a Série B, conforme definição metodológica da Firjan. Entregou a Prefeitura com 0,5811, na Série C.  

Terceiro trecho dos novos dados 

 No indicador de Receita Própria, os melhores resultados da região no Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal são compartilhados por Mauá, Santo André e São Caetano, que atingiram o máximo possível, de 1,000. Rio Grande da Serra registra o pior desempenho, com 0,4367. No quesito Custos de Pessoal, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra destoam das demais prefeituras que alcançaram média superior a 0,700. Já no quesito Investimentos, os melhores números são de Ribeirão Pires. Diadema, São Bernardo e Mauá. Os piores, de Santo André. Já na Liquidez, Santo André, São Bernardo e Rio Grande da Serra não passam de 0,000. O pior possível. O Custo da Dívida dos municípios da região mostra resultados favoráveis a Santo André e a São Caetano. E complicados para São Bernardo, Santo André e Ribeirão Pires. 



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