Política

Eleições turbulentas e
calmas em dois anos?

DANIEL LIMA - 05/11/2006

Faltam ainda dois anos para as eleições municipais no Grande ABC, mas os resultados do mês passado estimulam horizonte de embates provavelmente dramáticos que dividiriam espaço com disputas mornas. Sempre com a ressalva de que projeções eleitorais são tão sólidas quanto um lodaçal, não é exagero acreditar que em São Caetano, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra os atuais prefeitos navegarão em águas plácidas rumo à reeleição. Bem diferente do cenário delineado para Santo André, São Bernardo, Mauá e Diadema, onde a possibilidade de escaramuças semelhantes às de finais de campeonatos é a melhor aposta. 

Em Santo André, a candidatura da vice-prefeita Ivete Garcia deverá passar pelo crivo do diretório petista depois que o deputado federal Luizinho Carlos da Silva soçobrou na tentativa de reeleger-se, vencido pelo peso do mensalão que reduziu a 20% a votação de quatro anos antes no Município. Embora o deputado estadual Vanderlei Siraque esteja na ponta da agulha, com relativa força moral da reeleição obtida, dificilmente Ivete Garcia, com forte inserção nas comunidades de bairro, perderá a corrida interna. Motivos sobram: é mulher de espécie de primeiro-ministro do Paço, o secretário de Governo Mário Maurici, muito próximo da cúpula brasiliense, e pode popularizar-se em outros estratos sociais com eventual substituição por afastamento de João Avamileno, numa operação semelhante à que envolveu Maurício Soares e William Dib em São Bernardo. 

O problema do PT, a quem está filiada Ivete Garcia, é o enclausuramento eleitoral. Não faltam sugestões no Paço Municipal à composição de uma chapa que tenha como candidato a vice-prefeito um representante das classes mais conservadoras, provavelmente um empresário que frequente rodas sociais e que, com isso, contribuiria para descongelar bastiões de preconceito e desconfiança a uma agremiação que surgiu da base operariada da região. Se em Santo André a presença de Celso Daniel, filho de família tradicional, amenizou essa ruptura, embora jamais a dissolvesse, a ausência do principal nome do PT na região restabelece discussões sobre a oportunidade de uma chapa menos ortodoxa. 

Salles em campo — Por enquanto, o principal adversário petista é o advogado Raimundo Salles. Mesmo sem conquistar vaga na Câmara Federal, apesar dos 56.195 votos, o agora mais uma vez secretário de Comunicação da Prefeitura de São Bernardo saiu das eleições com sabor ambíguo de vitória-derrota. Vitória porque conseguiu 29.219 votos em Santo André, superando todos os concorrentes na disputa por Brasília. Derrota porque o elevado quociente eleitoral do PFL o colocou na oitava suplência. Salles carrega para 2008 a vantagem de que já colocou o bloco na rua e já anunciou candidatura, fugindo da manjadíssima dissimulação da maioria dos políticos que negam de pés juntos interesse em concorrer quando todos sabem que praticamente não fazem outra coisa senão articularem-se para a disputa. Caso de Ivete Garcia, entre outros. 

Um lance que pode dar a Raimundo Salles maior enraizamento eleitoral em 2008 é a possível composição com Cícero Martinha da Silva, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. Está em fase de costura a possibilidade de Martinha constar da chapa de Salles como candidato a vice-prefeito. Liderança de metalúrgicos de pequenas e médias empresas de Santo André, Cícero Martinha é filiado ao PDT. O aporte da Força Sindical, entidade à qual o sindicato presidido por Martinha está associado, daria a Salles reforço suplementar aos ganhos eleitorais previstos. Ele repetiria uma fórmula que levou Celso Daniel a vencer as eleições municipais de 1996, quando o então sindicalista João Avamileno, da mesma base operária de Martinha, foi escolhido candidato a vice-prefeito. 

Também não está fora de cogitação uma aliança entre Salles e a vereadora Heleni de Paiva, petista que parece insatisfeita com a eventualidade de ser barrada no baile de concorrer à Prefeitura. Uma composição entre Salles e Heleni não está fora de cogitação. 

Raimundo Salles e Ivete Garcia se engalfinhariam por votos, mas há perspectiva de que outros concorrentes vão ingressar nessa arena. A lista da centro-direita é tão extensa quanto sujeita a desistências. Tem Newton Brandão, Ajan Marques, Wilson Bianchi, Aidan Ravin e outros nomes menos votados e igualmente derrotados nas eleições proporcionais de outubro. E pode ter também nova arremetida do deputado federal Celso Russomanno, superado em 1996 por um Celso Daniel imbatível mas que, mesmo assim, chegou a 80 mil votos. Celso Russomanno estaria formulando dobradinha com uma candidatura historicamente enraizada em Santo André que complementaria expectativa de votos populares por força da notoriedade televisiva como defensor dos lesados, imagem que o colocou entre os três deputados federais mais bem votados em outubro. 

É possível que outros nomes venham a ser lançados na bolsa de apostas em Santo André porque para quem quer ingressar ou já está na atividade há muito tempo resiste a impressão de que a liderança de Celso Daniel continua vaga. Até o empresário das chamadas quentinhas, Sérgio De Nadai, muito próximo dos governos tucanos a partir de aproximação com Mário Covas, segue insinuando interesse pelo Paço Municipal. O problema é que De Nadai encontra adversários em todos os flancos partidários próximos do PSDB, ao qual está filiado. Além disso, há quem tema que as relações com o poder estadual gere contratempos durante o período eleitoral. 

Maurício/Marinho — Em São Bernardo, o ex-prefeito Maurício Soares ressurge em cena. Eleito em 1996 e afastado em 2002 em circunstâncias oficialmente relacionadas à debilidade de saúde, ele deu lugar ao então vice-prefeito William Dib. Soares já é cantado em verso e prosa como redivivo político para suceder o ex-companheiro de chapa. Maurício Soares foi anunciado mês passado um dos três supersecretários do organograma do Paço Municipal. Ele ocupa o posto do enfermo Gilberto Frigo, cujo retorno à máquina é pouco provável pelo menos nos próximos tempos. O ex-petista agora acumula duas pastas e fortalece estacas de estrutura política que jamais foi abalada porque manteve o tempo todo a cabeça próxima de todos os escalões do funcionalismo público e as pernas em redutos populares. 

Os jovens Orlando Morando e Alex Manente, vitoriosos nas eleições proporcionais, provavelmente serão vítimas da própria juventude e deverão se engajar na campanha de Maurício Soares. Eles têm tempo de sobra para esperar e sabem que sem o aval da cúpula da Prefeitura terão limitado poder de vôo. Talvez eles se exasperem apenas no futuro mais distante, quando não está fora de foco o retorno de William Dib ao principal assento do Paço Municipal, substituindo um possivelmente reeleito Maurício Soares. 

O adversário de Maurício Soares em 2008 deverá ser o ministro do Trabalho Luiz Marinho, exceto alguma nova e improvável derrapagem do diretório municipal petista. O equívoco de convocar mais uma vez Vicentinho Paulo da Silva dificilmente se repetirá. A viabilidade eleitoral de Luiz Marinho vai depender de eventuais resultados do governo Lula da Silva nos dois próximos anos, especialmente da possibilidade de a reforma trabalhista e a reforma sindical saírem do casulo de idiossincrasias políticas e econômicas sem renegar o legado sindical do ministro. 

Dúvida petista — Em Diadema, o agora deputado estadual José Augusto da Silva Ramos vai tentar pela segunda vez consecutiva ocupar o cargo que exerceu quando ainda no PT, entre 1989 e 1992. Duas vezes derrotado pelo atual prefeito José de Filippi Júnior, provavelmente enfrentará o prefeito em exercício Joel Fonseca, vice-prefeito de José de Filippi Júnior nas duas vitórias consecutivas. Joel Fonseca tem bases sindicais e populares e revolucionou a Secretaria de Desenvolvimento Econômico. 

Também o deputado estadual Mário Reali, que superou José Augusto da Silva Ramos nas eleições proporcionais deste ano por escassa margem de votos, está credenciado a representar o PT. Há ponderações favoráveis e contrárias à escolha de Joel Fonseca e de Mário Reali. O primeiro se sentiria preparado para exercer a Prefeitura depois de seis anos na linha de frente. O segundo já foi submetido vitoriosamente duas vezes seguidas à prática do voto. Não é improvável que uma dobradinha Joel-Reali possa ganhar corpo, porque o PT tem consciência de que qualquer rompimento poderá levar José Augusto ao Paço. 

Ajuntamentos? — Se em Diadema e em São Bernardo tudo indica que serão duas candidaturas a medir forças e em Santo André a governista Ivete Garcia e o oposicionista Raimundo Salles podem ter novas companhias, em Mauá o espectro eleitoral é mais nítido e complicado: o prefeito Leonel Damo, o ex-prefeito Oswaldo Dias e o também ex-prefeito interino Diniz Lopes deverão mobilizar-se para assumir o Paço em janeiro de 2009. O petista Oswaldo Dias foi muito bem votado em outubro em Mauá, embora não conseguisse eleger-se deputado federal. Diniz Lopes foi mais discreto nas urnas para deputado estadual e Leonel Damo colocou a filha Vanessa Damo como espécie de laboratório bem-sucedido, porque a levou à Assembléia Legislativa. Composições podem determinar o vencedor em 2008. Um Chiquinho do Zaíra de impressionantes embora insuficientes votos a deputado federal pode desequilibrar a disputa em favor de Leonel Damo, de quem é mais próximo. Tanto que, passadas as eleições proporcionais, Chiquinho do Zaíra foi alçado a secretário de Governo de Leonel Damo. O lance foi interpretado como de mestre pela própria oposição, mas a resposta poderá ser a união entre Oswaldo Dias e Diniz Lopes. 

Tranquilidade? — O prefeito José Auricchio Júnior nadou de braçadas em São Caetano porque viu Marquinho Tortorello derrotado no projeto de reeleição a deputado estadual. Marquinho tem o espólio do pai falecido em dezembro de 2004 em medida supostamente insuficiente para quebrar a desconfiança dos eleitores de uma São Caetano cautelosa também quando vai às urnas. A derrota nas eleições proporcionais pode custar mudança de rumo da família Tortorello. Marta Tortorello, ex-secretária municipal da administração Auricchio, já é colocada como provável e promissora extensão política do pai, depois que se teria confirmado o esgotamento do repertório de Marquinho. Mesmo assim, Auricchio é avaliado como franco favorito entre outros motivos porque os resultados de outubro não revelaram sequer outra alternativa eleitoral em São Caetano, além dos possíveis rescaldos saudosistas de Luiz Tortorello. 

Em Ribeirão Pires, apesar de fracassar nas eleições proporcionais, quando teve menos votos que o candidato do Paço, Saulo Benevides, a petista Maria Inês Soares provavelmente não arrefecerá o ânimo para tentar reocupar o gabinete que comandou durante oito anos, até que Clóvis Volpi vencesse as eleições de 2004. A reeleição de Volpi é em princípio observada sem restrições, mas Ribeirão Pires conta com um terceiro vértice eleitoral fiel da balança em situação em que se disputa apenas um turno. Representado pela antiga liderança conservadora do ex-prefeito Valdírio Prisco, essa alternativa de poder parece não ter força necessária para reconquistar o Paço Municipal, mas ainda é relevante na colheita de votos da população mais tradicional. 

Já em Rio Grande da Serra, o prefeito Kiko Teixeira, muito próximo das lideranças antipetistas do Grande ABC e também do governo estadual, provavelmente repetirá a vitória de 2004, quando o ex-sindicalista Carlos Augusto Cafu se decepcionou diante da apuração das urnas eletrônicas que premiaram novamente um dos membros da família de frequentadores históricos do principal gabinete do Paço Municipal. 



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