Fico horrorizado quando leio aqui ou ali gente experiente do jornalismo decididamente na trincheira inglória de tentar negar o inegável: a Imprensa, quase toda a grande Imprensa, impressa e eletrônica, fez gato e sapato das informações para derrotar a candidatura Lula da Silva.
Os exemplos da revista Veja e do jornal Estadão são os mais evidentes, mas outras mídias, menos descaradamente parciais, não ficam atrás.
A tentativa de alguns jornalistas endeusarem a cobertura da Imprensa, atribuindo-lhe, vejam só, suposta virtude de distanciamento, dando-lhe significados diferentes dos reais, não passa de prestidigitação semântica associada a corporativismo desavergonhado.
Cada um que responda pelas fantasias que constrói, mas, convenhamos, tentar atribuir à paranóia a má vontade contra o petista que emergiu do operariado de São Bernardo e foi, por essa mesma Imprensa que hoje o persegue, acriticamente levado ao panteão dos grandes líderes nacionais, ah!, convenhamos, é nos chamar de trouxas.
Felizmente há vozes sensatas no mercado jornalístico, principalmente de profissionais que não confundem pessoa física com pessoa jurídica, ou seja, gente que não está de olho num ou noutro novo negócio derivado dos conhecimentos que detém, gente que não fica presa ao tilintar de caixas registradoras de interpretações sob encomenda do mercantilismo dissimulado ou não.
Ou mesmo gente que não se deixa levar pela ideologia que, como escrevia Roberto Campos, congela a inteligência. Aliás, aquele que foi uma das mentes mais brilhantes deste País (independentemente de juízo de valor sobre matizes ideológicas) atribuía especificamente à esquerda burra e estatizante do passado aquela conceituação cortante de ideologia.
Poucos votos
Antes que me chamem de lulista, porque é assim que a direitona do jornalismo procura desclassificar a oposição de idéias, tanto quanto os esquerdistas que não suportam o contraditório sob bases de racionalidade prática, digo de antemão que votei bem menos vezes no presidente reeleito do que provavelmente deveria, já que lamento profundamente ter errado tanto na escolha de candidatos do espectro de centro em tempos passados, quando era mais jovem, todos sem compromisso de fato com os mais pobres e miseráveis.
Lamentavelmente, por duas vezes cometi o desatino de endereçar meu voto presidencial a Fernando Henrique Cardoso, uma das maiores aberrações administrativas que este País já produziu. Quem conhece minimamente os estragos que ele provocou no Grande ABC, particularmente, e no Brasil como um todo, sabe do que estou falando. A oligarquia deste País gosta da adular o sociólogo em encontros empresariais e acadêmicos porque tem cabeça vazia, bolso fundo e alma pequena.
Mas, voltando ao foco deste artigo, quero dizer o seguinte: desafio qualquer jornalista defensor da tese absurda e sofismadora de que a Imprensa se comportou olimpicamente no processo eleitoral desta temporada. Disponho de material jornalístico que prova e comprova os escorregões éticos de gente graduada que deixou a inteligência de lado e trabalhou com o fígado.
É claro que com relação à Veja nada é preciso, tão descarada e unilateral foi a cobertura. Não que a montanha de denúncias seja descabida, porque o fundamentalismo antipetista não pode solapar os cuidados jurídicos, mesmo que sob o guarda-chuva da liberdade de Imprensa se pratiquem especulações insanas. O problema de Veja não foi o que escreveu sobre Lula e seus aliados, mas o que deixou de escarafunchar sobre Geraldo Alckmin e sua turma de incompetentes na gestão do Estado de São Paulo. Gestão do Estado de São Paulo é força de expressão, evidentemente. Tanto que a primeira medida anunciada por José Serra para o governo paulista é criar uma secretaria de gestão estratégica. Algo que a Imprensa de centro-direita divulgou burocraticamente.
Aos fatos, senhores
Alinhar-me aos críticos da cobertura da mídia não significa que esteja igualmente perfilado na negação de fatos que envolveram o Partido dos Trabalhadores. Muito pelo contrário: o caixa dois petista é tão conhecido por quem vive o mundo de informações que negá-lo se rivaliza com a tese de imparcialidade da mídia na disputa presidencial.
Entretanto, o que determinadas mídias tentaram vender ao distinto público foi puro abuso, ou seja, a tese de que os petistas inauguraram neste País varonil as práticas de delituosidade eleitoral e administrativa, que incluem a contratação de companheiros para cargos comissionados. Tenham a santa paciência! Hipocrisia tem limites. O tão festejado peemedebista Ulysses Guimarães era um dos recordistas de contratação de militantes em forma de comissionados e jamais foi desmascarado por isso. A defesa enfática, corajosa e persistente da democracia o blindou de tal forma que a Constituição dos Miseráveis, como ele definiu a Carta Magna de 1988, responde em grande parte pelo esfacelamento do Estado nacional.
O jornalismo brasileiro, principalmente o jornalismo político, com honrosas exceções, não difere muito dos políticos que tanto critica. É improdutivo, impreciso, manipulador e falsificador da ética. Só não vê quem não quer. Ou tem interesses em afirmar o contrário. E, infelizmente, caiu na pior das armadilhas: está absorvendo um número cada vez maior de sofisticados idiotas radicais que adoram bajular os patrões e leitores igualmente imbecilizados.
Já passou da hora de a classe jornalística criar mecanismos para controlar o nível de qualidade do que leva aos leitores. É claro que isso não interessa à maioria dos patrões da mídia. Eles fazem de tudo para usar seus empregadinhos preferidos e cada vez menos dotados de conhecimentos em defesa de interesses nem sempre defensáveis.
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19/11/2024 PESQUISAS ELEITORAIS ALÉM DOS NÚMEROS (24)