Política

Bolsonaro tem mais bala na
agulha para mata-mata final

DANIEL LIMA - 01/10/2018

Vou dedicar neste mês muito mais espaço à disputa presidencial praticamente definida entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad. Entendam a série que se seguirá, com títulos específicos, como um processo. E justamente por ser um processo que vou emitir juízo de valor preliminar ou rumo ao definitivo. Querem um? Estou apostando que o capitão reformado ganhará o segundo turno como oito pontos de vantagem, com margem de erro de dois pontos percentuais. É claro que há condicionantes a essa projeção que muitos poderão chamar de lotérica. O resultado numérico é algo simbólico do que pretendo dizer na prática: o jogo não será tão acirrado assim, como são os clássicos de verdade. 

Jair Bolsonaro só será derrotado no chamado mata-mata se cometer equívocos que lhe retirariam ampla vantagem não identificada, pouco identificada ou escamoteada no primeiro turno. O PT é o melhor adversário para todos os concorrentes. Nada poderá ser mais vantajoso do que ir para um combate com uma agremiação com gigantesco passivo. Por isso, não parece justo eleger Bolsonaro em situação semelhante, mas à direita. Lembrem-se que ele tem arranjo argumentativo que os adversários temem: corrupção ou aproximação com fregueses de caderneta (ou de planilhas) da Operação Lava Jato. 

Vou elencar quesitos fundamentais ao resultado final do mata-mata. Há objetividades e subjetividades latentes na grade temática à análise. Disputa eleitoral não é ciência exata. Se fosse, tudo já estaria resolvido. Apontaria mais que oito pontos percentuais de favoritismo a Jair Bolsonaro. 

Combustível televisivo 

Vamos aos quesitos sobre os quais estarei de olhos, ouvidos e mente no transcorrer deste mês, sobretudo a partir da próxima e decisiva etapa. Não custa lembrar que esta semana entrante é a reta de chegada do primeiro turno, provavelmente protocolar. Muito do que se verá no turno final tem a ver com a consolidação de costuras de escolhas atuais, as quais não podem ser confundidas com projeção de resultados, cujo valor é pífio segundo especialistas dos próprios institutos de pesquisa. 

Essas projeções servem de combustível aos programas eleitorais de rádio e televisão, principalmente.  Vejam na sequência os pontos que, expostos e destrinchados, deverão pesar decisivamente no realinhamento de eleitores de candidatos derrotados no primeiro turno – e com margem escassa também a eleitores dos vencedores. Prevalecerá mesmo a massa que vai decidir a eleição, já que eleitores dos dois finalistas estão, em larga escala, consolidados a não mudar de voto.

1. Ativo econômico do PT. 

2. Passivo econômico do PT.

3. Ativo social do PT.

4. Passivo social do PT.

5. Legado de administrador público de Haddad.

6. Imagem de legislador de Bolsonaro.

7. Capacidade de manter equilíbrio emocional.

8. Objetividade e serenidade nos debates. 

9. Macroambiente de segurança pública. 

10. Ideologia estatizante do PT.

11. Ideologia privativista de Bolsonaro.

12. Uso complementar das redes sociais. 

13. Tratamento aos derrotados do primeiro turno.

14. Legado de corrupção.

15. Domínio da narrativa. 

Duvido que os leitores saibam qual é o peso relativo mais proeminente a determinar o rumo da disputa eleitoral no segundo turno. Duvido mesmo. Trata-se exatamente do último quesito listado: “Domínio da narrativa” tem o mesmo sentido de colocar o adversário na retaguarda, minando-o em seus pontos fracos. Um time pequeno que ganha de um time grande numa final de campeonato (lembram-se do Santo André campeão da Copa do Brasil em pleno Maracanã diante do Flamengo?) é fruto do que no futebol se chama controle tático do jogo. Na política, no caso do segundo turno que está chegando, prefiro a expressão “domínio da narrativa”. 

Grande versus pequeno 

O time grande da final do Brasileiro Eleitoral desta temporada é Jair Bolsonaro. Os pontos fortes que ostenta são mais acentuados e demolidores que os pontos fracos. Fernando Haddad vive situação inversa: os pontos fortes estão aquém dos pontos fracos. Na soma do conjunto de fatores positivos e negativos listados, Jair Bolsonaro entra como favorito absoluto. É o time grande de melhores jogadores e de melhor retrospecto. 

Para chegar à conclusão que o potencial de vitória de Jair Bolsonaro é muito maior que o de Fernando Haddad tratei de definir os quesitos eleitorais mais sensíveis e enquadrá-los em subgrupos igualmente temáticos. Desta forma, cheguei ao resultado final de 6 a 1 a favor de Bolsonaro. Uma goleada e tanto, não é verdade? Calma, calma, porque nem tudo que parece goleada vitória é. 

A divisão de 14 quesitos em nove subgrupos encaminha uma grande vitória a Bolsonaro. Mas existe o ponto decisivo, interligado a todos os quesitos: o domínio da narrativa, ou seja, a estratégia a ser empregada para o uso tático em cada jornada. Tática é o hoje. Estratégia é a soma de cada hoje. É o amanhã de prazo definido. No caso, a disputa nas urnas do segundo turno. O mata-mata da temporada. 

Social é petista 

O petista Fernando Haddad sai em vantagem eleitoral no segundo turno quando se leva em conta o balanço entre ativo e passivo social, mas perde para o adversário no campo econômico. O jogo estaria parcialmente empatado em um a um, mas não é bem assim. O peso eleitoral do passivo petista no campo econômico é muito maior que o peso do ativo eleitoral no campo social. Em contraposição à inclusão social via socorro aos pobres e desvalidos e aos efeitos do consumismo, política que se esgotou e regride com o estouro dos custos fiscais, o PT sofre com o descarrilamento econômico plantado por Lula da Silva e sacramentado por Dilma Rousseff. 

Então, esse um a um não é bem assim, entenderam? Poderá ser em termos relativos uma goleada para um lado ou para o outro no cômputo final. A depender, claro, do “domínio da narrativa”. Ao PT cabe vender o ativo e esconder o passivo. A Bolsonaro é a inversão do discurso. Os tropeços da política econômicas são mais sensíveis, até porque permanentes em forma de desemprego e queda da renda. 

Imaginem menos corrosiva

No quesito de imagem de administrador público de Fernando Haddad e de imagem de legislador de Bolsonaro, o candidato do PSL ostenta nítida vantagem. Faz dois a um no placar formal. A exposição pública como deputado federal em sete legislaturas foi menos intensa, muito menos, que as ações de Haddad como ministro de Lula da Silva e, principalmente, prefeito de São Paulo. Nesse último caso, com ônus alarmantes, apesar do bônus de desmascarar à Máfia do ISS dos bandidos sociais do mercado imobiliário. A derrota para João Doria no primeiro turno e os apenas 16% dos votos válidos foram circunstanciais, sob o peso da Lava Jato no País, mas quando se trata de eleição vale muito mais o rótulo do que a essência.

Quesito vai para o VAR

Nos quesitos conjugados de “capacidade de manter equilíbrio emocional” e “objetividade e serenidade nos debates”, o mais indicado é aguardar para confirmar o vencedor. Potencialmente, o petista Fernando Haddad sai em vantagem. Muita vantagem. Por motivos óbvios. O passivo de Bolsonaro é imenso. 

No quesito “macroambiente de segurança pública”, Jair Bolsonaro é disparado muito mais identificado com o inconformismo oriundo da deterioração do tecido social. Esse vetor tem peso imenso na definição de votos, conforme revelaram pesquisas do primeiro turno. Agora está três a um para Bolsonaro. 

Mais um gol potencial de Bolsonaro – e os quatro a um -- consolida-se nos quesitos “ideologia estatizante do PT e ideologia privatista de Bolsonaro”. Talvez se dispensem explicações, mas se alguém insistir, basta citar e reiterar as roubalheiras nas estatais, campo de manobra da proliferação da corrupção que o Mensalão e o Petrolão comprovam.  

Vitória nas redes sociais 

De novo o candidato do PSL faz gol, agora cinco a um, quando se observa o quesito “uso complementar das redes sociais”. Se numa operação solteira, sem tempo de televisão, a campanha de Jair Bolsonaro nas redes sociais lhe deu retaguarda consistente, o que imaginar num segundo turno em que terá igualdade de 10 minutos de exposição no rádio e na televisão? Aí é que entra, mais uma vez e sempre, o fator “domínio da narrativa”. Tempo sem tática é tempo perdido. Geraldo Alckmin está aí para provar. Até porque, convenhamos, o governador do Estado acumula passivos demais para encetar reviravolta no placar. 

Tratar bem os derrotados no primeiro turno é o outro quesito dessa exposição, e como no caso da capacidade de manutenção do equilíbrio emocional em conjugação com objetividade e serenidade nos debates, vai depender de medidas a serem adotadas. A campanha de Jair Bolsonaro parte inicialmente com uma carga maior de favoritismo de sucesso no quesito, porque tem munição suficiente para centralizar fogo nos pontos fracos do petista. Não seria necessário incorporar como alvos dos ataques os aliados petistas ao longo de 13 anos de governo. Amigos de um adversário eleitoral que já estão fora da disputa podem ser aliados importantes. Eleitores mais à direita do espectro político são mais propensos a votar em Jair Bolsonaro. Mais à esquerda em Fernando Haddad. O que pode definir caudais mais volumosos pró-Bolsonaro são outros quesitos que teriam peso relativo muito maior que simpatias ideológicas menos consistentes. Esse quesito também vai para o VAR. 

Legado complicado 

O legado de corrupção do PT de Fernando Haddad é um oceano de possibilidades exploratórias da campanha de Jair Bolsonaro. Combinar roubalheiras com o caos econômico e cruzar os dados com o declínio do saldo cada vez mais agonizantes ganhos sociais configuraria o tiro de misericórdia a neutralizar eventuais efeitos retardatários no campo de costumes, calcanhar de Aquiles do capitão reformado. 

Pronto, está desenhado o placar numérico convencional de seis a um. Um resultado que ganha elasticidade incomum. É praticamente impossível perder o jogo da opinião pública mais doutrinada a flexibilizar o voto quando se oferece um cardápio tão indigesto quanto a associação de degringolada econômica e podridão administrativa.

Jogo preliminarmente encerrado com vantagem potencial de seis a dois para Jair Bolsonaro e dois lances que vão ser decididos pelo VAR (no caso os eleitores) e, muito mais que tudo isso, a bala de prata do controle tático do jogo. Se Jair Bolsonaro levar o jogo para o campo econômico e da moralidade pública, não haverá escapatória senão a derrota do PT. Se prevalecer o confronto de ganhos sociais e das relações humanas que estão na moda, embora muitas das quais contestáveis, a possibilidade de vitória petista aumentará. 

Terei a oportunidade de acompanhar esse jogo a cada novo dia, com pontos e contrapontos. A disputa será emocionante. Não cheguei a oito pontos de diferença para Jair Bolsonaro por qualquer razão que não fosse o arbitramento cauteloso dos vetores expostos. 

Pode ser que o resultado se encaminhe a outro patamar, mais alargado ou mais tenso. Possivelmente durante essa etapa final que se aproxima farei eventuais reconsiderações. 

Como no futebol, uma disputa eleitoral tão encardida oferece diferentes cenários ao longo de três semanas de finalistas. Mas sempre prevalecerá a capacidade de interpretação das tendências que se afigurarão. Essa flexibilidade é indispensável. Algo que, francamente, ranços ideológicos não captam. Por isso que um pós-doutorado em Oxford escreveu na Folha de S. Paulo, três dias após o atentado, que o incidente não influenciaria praticamente nada no eleitorado. Sem a facada Bolsonaro teria muitas dificuldades de ir ao segundo turno. Todos sabem disso. 



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