Administração Pública

Klinger quer mais
que privatização

DA REDAÇÃO - 05/10/1997

Dois meses depois de privatizar a operação do sistema de transporte coletivo público de Santo André, a administração do prefeito Celso Daniel já contabiliza bons resultados. Pesquisa de avaliação da qualidade do sistema revela consistente melhoria. O secretário de Serviços Municipais, Klinger Luiz de Oliveira, vice-presidente do Fórum Paulista dos Gerenciadores de Transporte Urbano, entidade composta por executivos públicos dos principais Municípios do Estado, está tão entusiasmado com os resultados e com o relacionamento com empresários do setor que prevê, para o próximo ano, superar o que chama de ameaça de desregulamentação do transporte público.


Ele acredita que as empresas detentoras das linhas irão flexibilizar o conceito de prestação de serviços, incorporando modalidades que inibirão o funcionamento irregular do chamado transporte alternativo, mantido pelos perueiros.  


O Fórum Paulista vai realizar seu décimo encontro anual nos dias 9 e 10 deste mês no Teatro Municipal de Santo André e o transporte alternativo será tema obrigatório. Klinger afirma que a experiência do setor em Santo André e os debates que ganharam espaço na Câmara Técnica de Transportes da Câmara Regional, com a participação dos demais secretários do setor no Grande ABC, indicam que a região poderá ser pioneira na implementação de sistema alternativo regulamentado de transporte. 


Isto significaria um basta na avalanche de perueiros que trafegam à margem da estrutura organizada de transportes. Klinger lembra que o fenômeno é nacional e que os perueiros ofereceram de positivo um tapa na cara de empresários acomodados com o mercado cativo. "Eles descobriram um nicho importante, para o qual é preciso haver oferta de modo a atender aos usuários" -- lembra o secretário de Santo André. Mas pára por aí. Ele considera esse atendimento suplementar destrutivo para a ordem, a segurança e a salubridade do sistema de transportes. "Onde quer que o transporte alternativo se deu sem obedecer a regras, instalou-se o caos" -- diz, referindo à Inglaterra de Margareth Thatcher e ao Chile, entre outros. 


Klinger afirma que a invasão dos perueiros não pode ser tolerada a pretexto de amenizar os problemas sociais decorrentes do desemprego. "O usuário tem o sagrado direito de escolher o veículo, o itinerário e o modal que mais lhe interessa, mas não pode ser ludibriado em sua boa fé por um serviço que não corresponda às salvaguardas de segurança e conforto" -- afirma. Nove anos de experiência no setor lhe dão a certeza de que é possível avançar no processo de atendimento ao usuário de transporte. "O empresariado regional está entre os mais evoluídos quanto à responsabilidade social do sistema. Infelizmente, é uma minoria, porque a maior parte ainda encara o transporte coletivo não como operação de serviço público, mas cortina de fumaça para compra e venda de ônibus" -- desabafa. 


Numa retrospectiva histórica, Klinger de Oliveira afirma que a contribuição do Partido dos Trabalhadores ao amadurecimento do empresariado não pode ser negada. "Mesmo exagerando no dogmatismo, por entender que transporte coletivo é atividade exclusiva de governo, o PT acabou mexendo com uma estrutura viciada" -- diz. Um dos próximos passos da Secretaria de Transportes é extinguir o Departamento de Transportes Públicos. Klinger já faz estudos para concentrar na EPT, Empresa Pública de Transporte, todo o gerenciamento do sistema, o que envolveria, além da frota de 300 ônibus integralmente sob operação da livre iniciativa, peruas escolares, veículos de frete e táxis.


A proposta é racionalizar as ações, reduzir os custos administrativos e tornar mais ágeis as decisões. Essa estrutura, hoje dividida entre EPT e DTP, custa perto de R$ 150 mil por mês. A medida não seria inédita, mas providencial, porque já foi adotada pelo governo do Estado com a EMTU, Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos, pela Prefeitura de São Paulo, com a Transporte São Paulo, e também em vários pontos do País.  


A privatização das linhas operacionais da EPT há dois meses, segundo Klinger, já está repercutindo de forma positiva. A criação do consórcio Nova Santo André foi solução satisfatória -- segundo sua avaliação -- porque a iniciativa privada assumiu os 30% do mercado que estavam nas mãos públicas desde que Celso Daniel resolveu criar a EPT, em 1989, na primeira gestão como prefeito. Klinger conta que Celso não pretendia ter mais que 10% do universo de 300 ônibus. "Ele já à época tinha consciência das dificuldades que uma empresa pública encontra para competir no mercado, porque, entre outras desvantagens, a Lei de Licitações atrapalha a agilidade e exige corpo administrativo numeroso demais em relação à concorrência. Queria ter apenas uma pequena empresa que servisse como referência operacional e de gestão, mas foi obrigado a ficar com 30% ao intervir na Vila Alpina, cuja direção ameaçava promover locaute" -- relembra. 


Ao reassumir a Prefeitura neste ano, Celso Daniel não teve escolha senão repassar as operações da EPT ao consórcio Expresso Nova Santo André, formado pelas empresas São Camilo, Padroeira, Parque das Nações (todas de Santo André) e ABC (de São Bernardo). Não havia outra alternativa lúcida. A qualidade dos serviços desabara durante os quatro anos de administração de Newton Brandão, prefeito que prometera privatizar a EPT mas que preferiu mantê-la sem conservá-la. Brandão substituiu a forma de remuneração das empresas privadas, então responsáveis por 70% do sistema. O pagamento por quilômetro rodado, introduzido por Celso Daniel em 1989, foi avaliado como dispendioso demais. A mudança de quilômetro rodado por número de passageiros registrado na catraca levou as empresas a retrair a circulação de ônibus. As oito linhas que garantiam atendimento diuturno foram desativadas.


Para Celso Daniel, investir na recuperação da EPT seria levar ao paroxismo o dogma da estatização que ele, da ala moderada do partido, não subscreve. Além disso, a Prefeitura vive momentos delicados e faz as contas de créditos e débitos para não entrar em colapso.  Teve até de recorrer à redução da folha de pagamentos com diminuição da carga horária de trabalho.


Além da recuperação do nível de qualidade de atendimento com a privatização, inclusive com a reinstalação das oito linhas diuturnas, a Prefeitura exorcizou déficit mensal de R$ 200 mil e parcelou dívida acumulada, principalmente com impostos atrasados, de R$ 10,3 milhões, a maior parte com o INSS.  As linhas da EPT foram repassadas à iniciativa privada através de regime de concessão onerosa. A transferência foi negociada por R$ 7 milhões, com amortização de R$ 75 mil por mês. Além disso, 0,01% do faturamento bruto da nova empresa é transferido à Prefeitura a título de taxa de permissão, o que dá R$ 1,5 mil por mês e se soma ao recolhimento de R$ 45 mil de Imposto Sobre Serviços e R$ 20 mil de aluguel da garagem operacional da EPT. Enfim, a Prefeitura passou a colher azul onde só enxergava vermelho. 


A perspectiva é de que no próximo vencimento da concessão das linhas a Prefeitura obtenha recursos que serão aplicados no aprimoramento técnico-operacional da EPT, agora restrita à gestão do sistema. A chamada concessão onerosa, que consiste numa espécie de pedágio pelos itinerários utilizados pelas empresas, é um conceito que avança no País e foi aplicado na transferência das linhas da EPT. Dentro de quatro anos vence a concessão de 70% do sistema renovado pelo ex-prefeito Newton Brandão, ano passado, e que não gerou qualquer receita financeira ao Município. 


Cético com relação à empresa pública de transporte de Diadema, onde prestou serviços -- "Está em estado mais que terminal; só resiste porque o Gilson (Menezes, prefeito) insiste" -- e torcendo para que a privatização da ETC, Empresa de Transporte Coletivo de São Bernardo, não seja prejudicada, Klinger de Oliveira defende o modelo em que o Estado, em suas várias formas, inclusive como Município, seja o disciplinador do mercado e as empresas sejam encaradas sem preconceito quanto à lógica do lucro. "Ainda temos passos a avançar em Santo André"-- afirma. 


Klinger quer dizer com isso que espera, no próximo ano, criar câmara de compensação tarifária em Santo André. A explicação é singela: há diversidade demais das linhas operadas pelas empresas, com evidentes vantagens e prejuízos. Ele espera, através de consenso, conseguir harmonizar os desequilíbrios. Isso implica em negociações às claras, explícitas. "Para nós o que realmente interessa é o empresariado capitalizado, pronto para novos investimentos" -- explica. 


A ocupação dos nichos de mercado pirateados pelos perueiros é tema obrigatório dos próximos encontros com o empresariado do setor. Klinger acredita que o reforço da frota com veículos menores e itinerários complementares aumentará as receitas das empresas, a importância estratégica da EPT e, principalmente, o bom humor dos dois milhões de usuários diários. Sem os riscos da anarquia. 


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