Administração Pública

Rodoanel é erro estratégico

CLÁUDIO RUBENS PEREIRA - 05/01/1998

Rodoanel é o nome atual de antigo projeto de abertura de estradas circundando a Capital paulista. Desde o início percebia-se que São Paulo está num importante entroncamento de rodovias por ser a principal geradora de tráfego para essas estradas. Com o passar dos anos as cidades mais próximas foram integrando-se e unindo-se à área da Capital, transformando a região metropolitana em uma só mancha urbana. Assim, o projeto foi inteiramente superado, além de ter os traçados originais ocupados por bairros na expansão urbana.

Faz-se necessário reestudo para o anel rodoviário, o qual deve envolver toda mancha urbana, ampliando o raio médio dessa estrada de contorno. O problema dessa nova fase é a atividade intensa dos defensores da ecologia, que procuram e vem conseguindo influir decididamente no projeto.

A idéia original era permitir expansão menos traumática dos centros urbanos, estimulando a instalação de empresas geradoras de tráfego em um eixo paralelo (como as marginais da Via Anchieta) ou nas proximidades do anel rodoviário. Nestas áreas sobrecarregadas, além dos veículos leves, só seria permitida a circulação de veículos médios de carga, inclusive com horários seletivos de entrega/retirada.

Com o adensamento e a ocupação cada vez maiores de toda Região Metropolitana de São Paulo, ocorreu desgaste da proposta original. Agora, para preservar as poucas áreas protegidas que nos circundam, pretende-se construir -- segundo as exposições públicas conjuntas da Secretaria de Transportes (via Dersa) com a participação das Secretarias de Transportes Metropolitanos e do Meio Ambiente -- um sistema de rodovias fechadas. Como fechada entenda-se que o projeto dessa estrada utiliza a mesma filosofia aplicada na construção da Rodovia dos Imigrantes, isto é: acessos restritos a pouquíssimos lugares. Uma série de medidas especiais vem sendo atendidas para o traçado que atravessar áreas de mananciais e parques florestais. Isso provavelmente quer dizer que no Rodoanel também deverão ser usadas pistas elevadas como na Imigrantes, para desestimular a ocupação de áreas de proteção ambiental, muitas em franco processo de invasão.

O Rodoanel terá total aproximado de 160 km e foi dividido em quatro etapas. A primeira já foi selecionada: é o Trecho Oeste, ligando Perus à Rodovia Régis Bittencourt (BR-116 para o Sul), com 32 km, e que terá outros cinco acessos: Rodovia dos Bandeirantes, Anhanguera, Castelo Branco e Raposo Tavares, além de pela Avenida dos Autonomistas (Osasco). O Trecho Norte interliga Perus à Via Dutra, com outros três acessos: Fernão Dias (para Belo Horizonte) e pelas avenidas Inajar de Souza e Hélio Smidt.

O Grande ABC é atingido e servido pelo Rodoanel através dos segmentos Sul e Leste, mas -- em todo o seu trajeto -- terá apenas dois acessos extras, só um a partir de uma avenida. O Trecho Sul liga a Régis Bittencourt à Anchieta, mas com apenas um acesso intermediário pela Rodovia dos Imigrantes. O Trecho Leste vai da Anchieta à Dutra, aceitando acesso da rodovia Ayrton Senna (ex-Trabalhadores) e pelas avenidas Humberto de Campos (em Ribeirão Pires, a única em todo o Grande ABC), Lucas Nogueira Garcez e Marechal Tito.

Tudo indica que a filosofia original do projeto de circundação da Capital foi afetada. Por isso, nos preocupam algumas tendências que notamos nas exposições públicas:

a) Temos que aceitar como plausível o início do Rodoanel pelo Trecho Oeste, pois é para aquela direção que estão sendo canalizados esforços e investimentos de crescimento econômico no Estado. Até porque lá não há áreas protegidas contra ocupação. Esta escolha irá prejudicar o Grande ABC, pois não dispomos de meios eficientes para fazer fluir o tráfego -- principalmente o pesado -- até atingir as rodovias, a não ser através das ruas e avenidas de nossas cidades, já fortemente sobrecarregadas pelo trânsito local. Situação agravada ao longo dos anos pela falta crônica de investimentos viários, principalmente pelo Estado e pela União na região.

b) Não se justifica que os trechos Sul e Leste do Rodoanel, que tanta importância têm para o Grande ABC, recebam ou entreguem tráfego apenas pelas rodovias Imigrantes, Anchieta e pela Avenida Humberto de Campos. E no caso desta última há o agravante de que o tráfego pesado passa a ser direcionado para uma estrutura viária urbana ainda inadequada para o volume da demanda que deverá ocorrer.

c) Se construído como apresentado, pelas distâncias a percorrer, poderá ser limitado o estímulo para que o tráfego pesado e mesmo o de veículos leves (como no anel de Belo Horizonte), com origem-destino na Grande São Paulo, passe a usá-lo. Essa premissa, que estimula fortemente o alívio do trânsito no miolo do Anel, estava garantida na filosofia original, que estimulava a instalação de geradores de cargas em eixos paralelos ou nas proximidades.

d) Será forte limitador em algumas cidades do Grande ABC, visivelmente tendendo a alterar a relação de influência entre estas cidades, levando a profunda mudança do perfil de desenvolvimento atual. Pela dificuldade de acesso futuro, os pólos de geração de empregos -- indústria e comércio principalmente -- irão preferir se instalar em Municípios (eventualmente no mesmo Grande ABC) buscando maior facilidade para o transporte e também de acesso de clientes e consumidores, no caso das grandes lojas, shoppings e centros de lazer. 

e) Em alguns trechos o Rodoanel terá cinco faixas de tráfego, mas sabe-se que uma parte só terá duas faixas disponíveis para os veículos, sugerindo desde já estrangulamento programado, prejudicando as cidades envolvidas e seu desenvolvimento. Estará o Grande ABC na classe das cidades que receberão apenas duas faixas de rolamento?

Cinco itens bastam para dar idéia da gravidade dos problemas que podem ser gerados pelo Rodoanel. População, Poder Público e todas as forças vivas da região precisam agir unidas. Não podemos permitir que se use como desculpa atender reivindicações de ecologistas e se construa um anel rodoviário que poderá comprometer irremediavelmente o futuro do Grande ABC.

Cláudio Rubens Ribeiro Pereira -- engenheiro, diretor do Departamento de Desenvolvimento Econômico de Santo André, membro do Conselho de Consultores de LIVRE MERCADO e presidente licenciado da Anapemei (Associação Nacional das Pequenas e Médias Empresas Industriais).



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