Política

Bolsonaro será Lula das urnas de
2002: retaliação após esperança

DANIEL LIMA - 26/10/2018

Num jogo eleitoral de mútuos e múltiplos erros táticos e estratégicos, mais uma vez não fico em cima do muro e tampouco me lixo com a maledicência de alguns radicais que enxergam fantasmas de partidarismo onde existe apenas compromisso com observações práticas. Sou um liberal econômico (sem o fanatismo dos radicalmente pró-mercado com seus filhotes de bandidos sociais em vários campos) e um socialista no campo da cidadania (sem o viés marqueteiro de um socialismo avesso a tudo que signifique meritocracia). 

O resultado final do segundo turno deste domingo será semelhante aos números da primeira vitória petista, em 2002, quando Lula da Silva chegou ao Palácio do Planalto após três tentativas frustradas e dois mandatos sofríveis do tucano Fernando Henrique Cardoso. 

Sofríveis quando se leva em conta a região, bombardeada por uma abertura econômica destrambelhada que atingiu em cheio o setor industrial de pequenas e médias empresas. Em termos nacionais, há controvérsias sobre FHC, embora tenha sido muito melhor para os brasileiros em geral do que para os brasileiros daqui. 

Sem exagero, FHC fez da região um campo de experimentos destrutivos que, naquele período, marcharam em ordem unida com os estragos permanentes do viés socializante do sindicalismo do eixo São Bernardo-Diadema. 

Três dimensões de resultados 

Jair Bolsonaro ultrapassará levemente a faixa de 60% dos votos válidos (me deem dois pontos de margem de erro) e trafegará um pouco acima desse teto nesta região de sete municípios. Aqui, o capitão reformado terá por volta de 67% dos votos válidos. Algo semelhante ao que registrará no Estado de São Paulo. 

Essa tríplice projeção é arriscada, claro. Não se pode desprezar nas últimas horas novas incursões da tropa de choque da mídia tradicional contra a candidatura do representante da centro-direita. Mas o peso do PT de roubalheiras institucionalizadas é muito maior que qualquer argumento com alguma potencialidade de se tornar realidade, como o suposto flerte com o regime ditatorial do candidato do PSL. 

A votação de Jair Bolsonaro nesta região ultrapassará mesmo o resultado nacional, como Lula da Silva em 2002. Dezesseis anos atrás o petista alcançou 61,27% dos votos válidos num segundo turno disputado com o tucano José Serra, que ficou com 38,72%. Foi numericamente a maior vitória petista entre as quatro em nível nacional. Na região, em 2002, o PT alcançou 67,13% dos votos válidos. No Estado de São Paulo, Lula registrou 55,39% dos votos válidos, contra 44,61% de Serra. 

Ao desfilar esses números repito que corro riscos de os resultados extrapolarem a margem de erro de dois pontos, mas isso não me inibe. Vale mais pelo simbolismo a exposição de observações que levam em conta um conjunto extraordinário de informações e também a percepção retirada de pesquisas eleitorais nem sempre convergentes. 

O Datafolha não me seduz com os números divulgados ontem porque o instituto estaria contaminado pela campanha editorial desclassificatória ao candidato Jair Bolsonaro. A Folha de S. Paulo que tanto exala conceitos de democracia não faz uma cobertura jornalística que respeite os leitores, como este jornalista. 

A proporção de matérias tóxicas contra Jair Bolsonaro, muitas das quais fundamentadas, não combinada com o desprezo aos percalços do adversário. E, mais que isso, a Folha agride o critério de proporcionalidade de uso ocupacional de artigos e análises, quase que totalmente favoráveis ao petista. Montou-se um tribunal de fuzilamento, sem oferecer aos leitores uma porção mesmo que razoável de articulistas do campo de centro-direita. Diferentemente, portanto, do mais discreto e centro-direitista Estadão. 

Recomendaria aos jornalistas e editores da Folha de S. Paulo uma leitura atenta do editorial de hoje do jornal Valor Econômico. Está ali um texto retumbante que resume a patetice da campanha petista nesta temporada, subordinada a um presidiário. Perder para Jair Bolsonaro, até outro dia um desconhecido, é o castigo que o PT merece como corolário de um somatório de incompetências à frente do governo federal. Odorico Paraguaçu me contestaria. Preferiria ele, personagem história de um folhetim da Globo, “multiplicatório” em vez de “somatório”. 

Só para não deixar os leitores curiosos, reproduzo alguns parágrafos do editorial do Valor Econômico de hoje sob o título “Desorientado, PT subestima sua rejeição e a atração de Bolsonaro: 

 É mais que previsível que um partido que, no governo, participou do maior escândalo de corrupção da história do país e causou, com políticas desastradas, a mais profunda recessão em um século, seja derrotado nas eleições presidenciais. Desde que retirado do poder por um impeachment, o PT sequer fez qualquer esforço honesto e público de autocrítica sobre seus erros ou sequer cogitou punir corruptos em suas fileiras. Com uma rejeição brutal e crescente, colaborou, com uma sucessão de maus passos, para que um partido de direita inexistente, o PSL, e um político obscuro, Jair Bolsonaro, ganhassem o favoritismo na corrida ao Planalto. Uma virada agora, pelas pesquisas, é façanha pouco provável. 

Leitura obrigatória 

Ainda nesta semana fundamentei as razões que me levaram a optar pela candidatura de Jair Bolsonaro. Reproduzi os primeiros trechos de 14 matérias/análises, entre centenas que escrevi desde a eleição presidencial de 2002 para a revista LivreMercado e para CapitalSocial. Não precisei de cuidados especiais àquela coleção de textos. Bastou ir ao arquivo desta publicação, herdeira de LivreMercado, e quase que aleatoriamente pinçar o que pretendia para os leitores sérios entenderem o quanto de coerência e verdadeira havia naquela decisão. 

Aos leitores que não tenham tido acesso àquele material, vou dar nova oportunidade ao acrescentá-lo em forma de link no pé deste texto. 

Não retirei do nada, ou de simples chutometria, a perspectiva de que Jair Bolsonaro terá ao redor de 67% dos votos válidos na região. Além do referenciamento com a campanha de Lula da Silva em 2002, só que num processo de mão inversa, ou seja, de desencanto com o PT, como se confirmou na disputa municipal de 2016, há outros elementos de observação.

Caso dos números do primeiro turno desta temporada, quando cinco presidenciáveis obtiveram a maioria dos votos válidos nos sete municípios.  

Mauá e Diadema 

Resumindo o apanhado geral, possivelmente somente em Mauá e em Diadema Jair Bolsonaro não terá a mesma proporção de votos de Lula da Silva em 2002. Bolsonaro não faria 72,8% dos votos válidos daquela disputa, depois de somar 39,94% como o mais votado no primeiro turno deste ano. Fernando Haddad registrou 30,74% e deverá subir o suficiente neste segundo turno para impedir estrondosa votação do capitão reformado naquela que é a principal cidadela petista na região. 

Mauá, que também consta da lista de improvável repetição de votos em favor de Jair Bolsonaro no confronto com Lula da Silva de 2002, registrou nas urnas do primeiro turno deste ano 48,56% de preferência pelo concorrente do PSL. Haddad ficou em segundo com 21,05%. Como Mauá deu 72,8% dos votos válidos a Lula da Silva em 2002, acho pouco provável que se repita a votação, agora com sinal partidário e também ideológico oposto. 

Resumindo preliminarmente: quando se somarem os votos válidos deste embate final entre o PSL e o PT, Mauá e Diadema provavelmente não reproduzirão com Jair Bolsonaro o sucesso de votos válidos do primeiro mandato de Lula da Silva. 

Santo André e São Bernardo 

Santo André e São Bernardo são os maiores colégios eleitorais da região e praticamente definirão o alinhamento de votação final entre Lula da Silva do começo de século e o Jair Bolsonaro de agora. 

Em 2002, Santo André deu a Lula da Silva 65,6% dos votos válidos. Acho que Bolsonaro vai ultrapassar essa marca. Santo André é mais antipetista que São Bernardo por conta de composição socioeconômica e cultural sobre a qual escrevi fartamente, mas que pode ser resumida da seguinte forma: Santo André é menos metalúrgica que São Bernardo. A classe média de Santo André é acentuadamente mais empreendedora e liberal que a de São Bernardo. 

São Bernardo de 2002 deu um pouco mais de votos a Lula da Silva em relação a Santo André. Foram 68,6%. Acho que será uma façanha Jair Bolsonaro trafegar na margem de erro. Entendo que ficaria abaixo dessa linha. A gestão de oito anos do petista Luiz Marinho à frente da Prefeitura e a votação alcançada na disputa pelo governo do Estado no primeiro turno (25%) indicam que poderá haver resistência maior que em Santo André. Mesmo se considerando que o prefeito tucano Orlando Morando está empenhadíssimo na disputa do segundo turno em São Paulo, com apoio da João Doria em dobradinha com Jair Bolsonaro. 

Novo resumo parcial: na soma de votos válidos de Santo André e São Bernardo, teremos algo semelhante de vantagem a Jair Bolsonaro equivalente ao Lula da Silva de 16 anos atrás. 

Outros municípios 

Os outros três colégios eleitorais da região vão dar vitória a Jair Bolsonaro em proporção superior ao que deram a Lula da Silva em 2002. Principalmente São Caetano, que destinou 52,9% ao petista. Agora, o massacre de Jair Bolsonaro será escandaloso. Passaria de 80%. Ribeirão Pires (61,5%) e Rio Grande da Serra (60,9%) também se perfilaram na vitória de Lula da Silva na região naquela disputa. Neste domingo, darão dianteira mais expressiva a Jair Bolsonaro. 

Resumo geral da ópera: entendo que quando se contabilizarem todos os votos válidos do segundo turno na região, Jair Bolsonaro do presente e Lula da Silva do passado vão estar muito próximos. Qualquer resultado fora da margem de erro será surpreendente. 

O ambiente regional é mais acaloradamente contrário ao petismo, da mesma forma que o fora mais favoravelmente a Lula da Silva em 2002. Mas entre a esperança petista e a retaliação imposta uma década e meia depois, os números finais não seriam tão acentuadamente contrastantes. Os dois sentimentos dos eleitores têm praticamente a mesma calibragem e intensidade. 

Leiam também: 

23/10/2018 - Tucanos e petistas fracassam na região; E agora, Bolsonaro? 



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