Administração Pública

Santo André já tem pronto o
rascunho para futuro melhor

DANIEL LIMA - 05/01/2000

O desenvolvimento econômico de Santo André para os próximos 20 anos, que em muitos pontos se confunde com as prioridades do Grande ABC, está preliminarmente delineado e inclui, entre várias propostas, antigo sonho regional: a articulação de empreendedores e investidores para construção de um centro de feiras e eventos que incorpore serviços de hotelaria. Documento preliminar foi aprovado durante a Pré-Conferência do projeto Santo André Cidade Futuro, realizada no mês passado. O documento final, que reunirá estudos de outras atividades, será apresentado para debate e aprovação final em abril deste ano, quando o Município completará mais um aniversário de fundação. 

Além do grupo temático de Desenvolvimento Econômico, o mais importante do planejamento estratégico de Santo André com vistas aos próximos 2O anos, outros seis integram esse que é, historicamente, o maior exercício coletivo de construção do futuro do Município. Envolvem as áreas de Desenvolvimento Urbano, Qualidade Ambiental, Inclusão Social, Identidade Cultural, Educação e Reforma do Estado. São algo semelhante aos chamados eixos estruturantes que denominam os grupos temáticos da Câmara Regional, instância que está formulando a recuperação do Grande ABC. O grupo de Desenvolvimento Econômico do projeto Cidade Futuro é tão relevante que o próprio prefeito Celso Daniel assumiu o comando dos estudos.  


Densidade histórica -- O balanço do Cidade Futuro, divulgado pela coordenadora do projeto, Teresinha Santos, reflete inédito grau de participação popular. Foram realizadas 70 reuniões até o início de dezembro envolvendo integrantes da Executiva do projeto, do grupo coordenador e dos grupos de trabalho. Chegou a 358 o total de participantes entre integrantes do grupo coordenador, membros dos grupos de trabalho e monitores. Essa contabilidade aumenta quando se incluem os participantes de 99 reuniões nos bairros: foram 2,9 mil moradores de Santo André que elegeram 260 delegados à Pré-Conferência. Dessa forma, o total de participantes alcançou 3.518 pessoas.  "Recebemos 6.858 cupons contendo 31.205 propostas" -- explica Terezinha. "Sem contar que também houve interesse de proposições por meio da Internet. Foram exatamente 22 propostas" -- completa. 

Como se poderia esperar de uma região que sofre os efeitos do desemprego recorde de 22% da População Economicamente Ativa, o quesito segurança foi o que apresentou a maior quantidade de propostas. Foram 7.228 proposições, bem à frente de saúde, que chegou em segundo com 2.459 solicitações. Formulações voltadas para condições de acesso e permanência nas escolas ocuparam o terceiro lugar no ranking com 2.065 indicações, enquanto o tema emprego veio a seguir, com 2.065. Agradável surpresa ocupou a sexta posição, logo após as 1.562 propostas voltadas para a qualidade de ensino: foram as 1.353 sugestões direcionadas para a modernização da Administração Pública, fortaleza vista praticamente como inalcançável pelos contribuintes brasileiros. 


Sem surpresa -- O diagnóstico preliminar do grupo de Desenvolvimento Econômico não surpreende quem acompanha o declínio de Santo André, Município da região mais atingido pela desindustrialização e que nos últimos 23 anos perdeu dois terços da arrecadação de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), a maior fonte de receita dos cofres públicos municipais. Entre as vocações tradicionais de Santo André, afirma o documento preliminar, é destacada a importância do setor industrial de grande porte. "As transformações de nossa época mudaram o perfil da grande indústria, que incorporou inovações tecnológicas, passou a gerar empregos numa escala menor que no passado e necessita de mão-de-obra cada vez mais qualificada. Por outro lado, guerras fiscais, custo de terrenos e processos de descentralização industrial agravam o quadro de arrefecimento industrial. Adaptada às exigências da atualidade, a grande indústria continua a ser fator de dinamização da economia, fundamental para o desenvolvimento local" -- afirma o documento.

O relatório parcial do grupo de Desenvolvimento Econômico do Cidade Futuro contrapõe também a queda do emprego industrial, de 53,2% entre 1988 e 1997, ao avanço de 27,3% da mão-de-obra formal nas áreas de comércio e serviços. "Assim sendo, é preciso unir as forças atuantes na cidade (Poder Público, empresários, trabalhadores e cidadãos) para manter dinâmica e pujante a nossa economia. São nossas tarefas manter as grandes indústrias na cidade, estimular a implantação da moderna produção, estimular setores de serviços de qualidade, diversificados, inovadores, que incorporem tecnologia; estimular o comércio e a formação de ambientes para implantação e preservação de negócios das micro, pequenas e médias empresas, com base na combinação entre competição e cooperação; e incentivar novas formas de produção, particularmente as de caráter cooperativo" -- detalha o trabalho.  


Outros pontos -- Além da construção de um centro de feiras e eventos, há outras chamadas metas e ações genéricas previstas no documento: 

 Articular a criação do Ponto da Indústria, Comércio e da Prestação de Serviços, que centralize diversos serviços institucionais para facilitar e agilizar ações necessárias à implantação e desenvolvimento de empreendimentos.

 Criar mecanismos para implantação de uma repetidora de TV aberta, objetivando agilidade, eficiência e abrangência na informação e a criação de novos empregos na área de comunicação.

 Desenvolver programa agressivo de estímulo à implantação de pequenas e médias empresas tecnológicas, considerando as vocações da cidade, vinculadas a um pólo tecnológico, em parceria com escolas técnicas, faculdades, universidades e centros de pesquisa.

 Trazer para o município uma agência regional do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para financiar equipamentos e máquinas às pequenas e médias empresas.

 Estimular a criação de empresas de reciclagem nos segmentos de pneus, plásticos, metais e veículos, gerando renda e agregando qualidade ambiental, inclusive com vistas ao Certificado ISO 14.000 para Santo André. 


Condomínios -- Há também espaço no relatório para metas e ações específicas. No setor industrial há propostas para implantar condomínios produtivos, para ampliar o Pólo Petroquímico de Capuava e para implementar o Pólo de Moldes do setor de indústria plástica. No comércio, pretende-se transformar a Nova Oliveira Lima em referência de valorização, com requalificação, implementação de código de posturas, de uso do leito da rua, estudo de fachadas, promoção de feiras temáticas e de artes, além de eventos culturais.

Também se pretende implantar pólos de negócios nos bairros, que seriam estimulados a formar administração condominial para torná-los mais competitivos, qualificados e diversificados. Também se projeta estimular modernização, regulamentação, qualificação, adequação e agregação do pequeno comércio. No setor de serviços, o projeto incentiva a participação de entidades de classe e sociedade civil em fóruns específicos e na fiscalização da qualidade de serviços prestados. Também estimula a criação de rede de turismo de negócios e gastronômico, com incentivo à implantação de cadeias hoteleira, de lazer e entretenimento. Constam ainda do projeto amplo calendário de eventos culturais, esportivos e de lazer, a criação de mecanismos para capacitação específica da mão-de-obra e a implementação de restaurante-escola. 

O diagnóstico do grupo de Desenvolvimento Urbano aborda as condições de segurança, a viabilização de novos centros como geradores de emprego e renda, a modernização da ferrovia como uma das grandes opções de transporte coletivo, a renovação da região do Eixo Tamanduatehy de modo a tornar-se atração de novos empreendimentos, a atualização de instrumentos reguladores de legalização, uso e ocupação do solo, a melhoria das condições de circulação e transporte, a valorização e ampliação das condições de oferta de equipamentos urbanos e a potencialização de políticas de acesso à moradia. 


Educação forte -- O grupo de Educação formulou denso diagnóstico, onde se destaca a necessidade de realização periódica de censos escolares para identificar a demanda por modalidade e nível de ensino, considerando idade, sexo, localização e outras variáveis. Também propõe a realização de avaliações quantitativas e qualitativas do atendimento prestado pelos setores público e privado, com mapeamento da localização do atendimento e os espaços ociosos. Sugere-se a criação de equipe integrada por funcionários públicos municipais e estaduais e também da livre iniciativa para trabalhar permanentemente na obtenção, atualização e análise de dados que subsidiarão o planejamento integrado do setor.

O diagnóstico do grupo de Identidade Cultural faz retrospectiva do movimento sindical e seus reflexos no cotidiano regional e aprofunda referência sobre os eventos voltados para as práticas esportivas a partir dos anos 50, com expressivos resultados nacionais e internacionais. Também o teatro e as artes plásticas são lembrados pelo papel de resistência cultural ao regime militar. Por fim, constata que nos anos 80 e 90 a falta de continuidade de políticas públicas de cultura, esporte e lazer aumentou o distanciamento entre as práticas e a ação pública, reduzindo e enfraquecendo a participação de grupos e entidades no compromisso de uma construção coletiva. "Sem o entendimento do papel das culturas e de valores dos diversos grupos sociais, ficaremos restritos a uma visão tecnicista e economicista de mundo. É preciso atuar nesses níveis simbólicos ao mesmo tempo em que lideramos com as práticas. Avançaremos para uma vivência mais cooperativa dos grupos e das pessoas assim que reorganizarmos as práticas da cultura e do ensino" -- afirma o relatório.


Problemas sociais -- O grupo de Inclusão Social apresenta como diagnóstico um conjunto de problemas que Santo André não consegue esconder. Como o fato de contar com 136 núcleos de favela, com aproximadamente 75 mil moradores. Aborda a carência e a má distribuição de áreas verdes, a segregação espacial que aprofunda a desigualdade de acesso aos serviços públicos entre regiões do Município, o déficit habitacional, a presença de população de rua adulta e infantil na região central, e a distribuição de renda, que reserva a 65% da população entre um e três salários mínimos mensais -- sem contar que 42,5 mil pessoas vivem com menos de R$ 65 por mês.

A lista de problemas só é menor que os itens de ações que se iniciam com a elaboração de um guia municipal de serviços prestados pela rede pública e privada e se encerram com a proposta de garantir incentivos fiscais às pessoas físicas e jurídicas que contribuírem voluntariamente para os fundos municipais.

 

Novos tempos -- O grupo de Reforma do Estado analisa o surgimento da sociedade globalizada e organizada em redes e o fato de as mudanças sociais enfatizarem a informação e o conhecimento e exigirem comunidade sintonizada com os novos tempos. O documento reconhece que o Estado tem cada vez menos instrumentos para realizar as ações demandadas pela nova situação, seja porque não pode mais tomar decisão isoladamente, sem consultar os demais atores interessados, seja pelas dificuldades de financiamento.

"Num primeiro plano, destaca-se a necessidade de se transformar internamente a máquina pública municipal, acompanhando os novos modelos de organização e tornando a Prefeitura leve e ágil na prestação de serviços de qualidade" -- afirma o documento. "A relação do Poder Público com o cidadão e com a comunidade é mais um foco importante de transformação. As mudanças em curso, que guardam forte relação com as tecnologias de informação, caminham no sentido da transparência e da facilidade de acesso a informações e serviços. O governo local deve, paralelamente, criar canais de participação através dos quais os cidadãos possam exercer o controle social sobre a gestão pública" -- reforça o estudo aprovado na Pré-Conferência. 

Entre as diretrizes e propostas estão a necessidade de assegurar condições de financiamento do desenvolvimento sustentável de Santo André, consolidar e ampliar a democratização da gestão pública com a chamada participação cidadã, modernizar e otimizar a capacidade administrativa do Poder Público e fortalecer o Poder Legislativo, reforçando sua autonomia e eficiência.

O grupo de Qualidade Ambiental fez ampla análise sobre abastecimento de água e esgoto sanitário, controle de enchentes, coleta e disposição de resíduos sólidos, controle de poluição, recuperação de áreas degradadas, áreas verdes, Paranapiacaba, oferta de serviços e uso do solo. Uma das propostas é a implantação de sistema de reúso de água para fins industriais. Seria uma forma de reduzir o alto custo da água que contribui para o refluxo industrial na região.  


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