Somente um louco — como alguns idiotas ou covardes juramentados fazem alusão a este jornalista — teria a desfaçatez (que não passa de senso de responsabilidade social) de alçar à Reportagem de Capa, em maio de 2001, algo que desse suporte à implantação do sistema de radares. Vivíamos em plena efervescência de críticas ao modelo de gerenciamento de trânsito de Santo André, então sob o controle de Celso Daniel. Sim, os radares eram a face mais visível e controvertida do que parte da mídia interessadíssima em queimar o prestígio de Celso Daniel chamava de “indústria da multa”, uma meia-verdade que se pretendia verdade inteira.
Meia-verdade porque havia exageros, como há até hoje em qualquer um de mais de três centenas de municípios que adotaram sistemas semelhantes, mas o bem maior, a vida humana, estava acima de tudo.
A partidarização contaminava o ambiente em Santo André. Por isso, sair em defesa de um trânsito minimamente organizado era heresia para os conservadores. É por essas e outras razões semelhantes que há conservadores que querem me ver pelas costas. Eles jamais admitiram ser contrariados. É por essas e outras que se construiu minha fama de polêmico. Como se cumprir rigorosamente os bons fundamentos do jornalismo social fosse sinal de anomalia, inclusive de debilidade emocional.
Para os conservadores de direita ou para os supostos revolucionários de esquerda que não admitem o contraditório, bem-aventurados pela biologia são apenas os fazedores de média da mídia, é claro.
Volto ao passado porque assisti domingo a reportagem do Fantástico, da Globo, sobre as 100 mortes diárias contabilizadas no trânsito verde e amarelo. A montanha de vítimas não é novidade, até porque já foi bem maior, mas sempre choca, sobretudo quando se coloca o peso da competência de profissionais e da influência da melhor emissora de TV do País a serviço de um bem precioso, como a informação socialmente indispensável.
Não resisti à ideia de republicar neste veículo aquela matéria de capa que pautei e foi muito bem produzida por Vanilda de Oliveira, repórter de LivreMercado naquele maio de 2001 — portanto há quase 10 anos. Esse material espelha bem o que foram os 19 anos de LivreMercado, revista que morreu no ano passado, substituída por Livre Mercado, do contabilista Walter Sebastião dos Santos.
Competia-me a edição do material, ou seja, dar a embalagem editorial daquele texto. Não tive dúvida em instalar na capa o secretário de Serviços Urbanos de Santo André, Klinger de Souza, confortalmente debruçado sobre um equipamento de radar e um título provocativo: “Dói, mas salva”. Mal conhecia o secretário até então, segundo vereador mais votado no Grande ABC na temporada anterior, menino dos olhos de Celso Daniel para a sucessão municipal. E provável sucessor de Celso Daniel não fosse a pedra no caminho de Celso Daniel. Uma pedra no caminho que neste 18 de janeiro vai completar oito anos.
Sei muito bem o que ouvi de terceiros — porque diretamente a quase totalidade dos detratores não tem peito para ofensa porque sabe que terá troco — quando a revista começou a circular. Os embates entre esquerda e direita em Santo André sempre foram emblemáticos. Como sempre fiquei à margem de disputas eleitorais, sem jamais ter-me filiado a qualquer partido, senti-me plenamente à vontade para pautar aquela reportagem e, mais que isso, repassar o conceito que prevaleceria no texto sem torturar a verdade dos fatos: as virtudes da política de trânsito em Santo André seriam sempre mais importantes que os defeitos, embora estes não pudessem e não devessem ser, jamais, deslocados ao acostamento da responsabilidade informativa.
Aquela reportagem que assumidamente trataria da defesa da humanização no trânsito era a cara editorial deste jornalista que jamais fica em cima do muro — para desgosto dos pobres de espírito e dos manipuladores de fatos e versões; ou para os falseadores do jornalismo autêntico, que fazem da média requentada ou da denúncia seletiva espécie de salvo-conduto para continuar gerindo seus veículos de comunicação sob a estrita obediência de ditames negociais nada republicanos.
Uma década pode parecer pouco tempo para muitas coisas, mas para reformular o ambiente social na avaliação dos efeitos de políticas de trânsito é mais do que suficiente a reviravoltas. Mesmo com o continuado exagero em alguns pontos que não passam mesmo de pegadinhas, há conscientização geral de que veículo não pode ser ferramenta de abusos de motoristas desalmados ou descuidados.
Entretanto, naquele 2001, a barulheira orquestrada por uma minoria organizada que politizava a questão transmitia a sensação de que toda a população de Santo André estava em pé de guerra contra os radares. Uma tremenda bobagem, como mostram os números daquela reportagem sob o título que também está logo abaixo nesta página inicial de CapitalSocial: Dói no bolso, mas ajuda a salvar vidas.
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07/03/2025 PREVIDÊNCIA: DIADEMA E SANTO ANDRÉ VÃO MAL