Política

Vazamento do mensalinho põe
em xeque investigação do MP

DANIEL LIMA - 16/01/2019

Estourou mais um escândalo da política no Grande ABC. O chamado mensalinho do PT do prefeito Carlos Grana, como se identificaria o escândalo, é um caso raro em que o próprio Ministério Público Estadual de Santo André foi surpreendido com a notícia, divulgada inicialmente no site da Rádio CBN. 

Como se explica isso? Vazamento é o nome da indignação, da traição ou da emboscada. Escolha o leitor que tipo de rótulo utilizar para definir o caso. Teria o MP proporcionado um caso de fogo amigo? 

A essência do caso é o vazamento implícito no texto da jornalista Alana Ambrósio, da CBN. Matei a charada do vazamento porque tenho a mania de, mais que ler, refletir sobre o que leio. Para isso é preciso tempo, discernimento e tranquilidade. 

O jornalismo me impõe obrigações que, ao executar, até me surpreendo porque sou meio atabalhoado como pessoa física. O coração fala mais alto. 

É claro que há uma dose mesmo que pequena de especulação na opção que fiz ao interpretar o noticiário. Mas a margem de erro é escassa. Quase nula. 

Origem do vazamento 

Partiu de alguém do Ministério Público de Santo André, entre os profissionais que ali atuam, ou de uma fonte que abastece a apuração ainda preliminar do caso, o vazamento de que se instalara no Legislativo de Santo André a mais comum das empreitadas nas relações com o Executivo: vereadores e seus respectivos entornos beneficiaram-se de dinheiro de empresas fornecedora de produtos e serviços municipais para facilitar a vida do prefeito de plantão. Isso é quase tão antigo como a mais antiga das profissões.  

É claro que a jornalista da CBN não vai revelar a fonte que a abasteceu com os documentos e as informações que dão conta do mensalinho petista. Faz parte do jogo democrático da informação o segredo da fonte como elemento de segurança tanto para quem passa a bola para o jornalista quanto para quem transforma tudo em informação profissional.  Sou escravo do segredo da fonte, mesmo em casos em que o amigo informante de hoje passa a ser eventual adversário amanhã. 

O Mensalinho de Santo André, portanto, não é fake news, como se pretendeu vender o noticiário entre alguns diretamente envolvidos no caso. É muito mais que isso: é um desafio às autoridades envolvidas no sentido de que devem procurar esclarecer os motivos que as levaram ao atropelamento pelo jornalismo profissional. 

Pensem comigo e reflitam para a gravidade do caso. Como é possível que vazem provas seguramente plausíveis (embora a relação de beneficiários carregue sempre o risco de idiossincrasias) e igualmente um enredo que as expliquem como materialidade incontestável se o Ministério Público de Santo André nada expusera até então sobre as investigações em curso? 

O noticiário de hoje nas mídias da região não esclarece o ponto nevrálgico da questão: as investigações do Ministério Público seriam deflagradas somente agora, após o vazamento da operação irregular ao longo de meses no Legislativo de Santo André, ou já teriam sido iniciadas há mais tempo e estariam em ritmo pouco acelerado a ponto de provocar irritação de alguém que gostaria de ver o caso esclarecido rapidamente? 

Origem das planilhas

Uma outra questão desafia quem pretende avançar no caso: as planilhas que ganharam as mídias sociais foram retiradas da fidelidade de documentos que já constariam de eventual inquérito do Ministério Público de Santo André ou a origem seria de eventual fonte próxima inconformada com o ritmo da chuva do mensalinho? 

Entendo que a premissa de que a documentação integra o acervo já coletado pelo Ministério Público se encaixa com mais precisão no quebra-cabeça exposto. Aliás, a planilha tem todas as características visuais de algo que não estaria deslocado de um procedimento processual. Traduzindo: apresenta-se como recheio detalhado de investigações. 

Estava nesse ponto do texto quando um dos milhares de leitores de CapitalSocial me enviou pelo aplicativo Whatsapp uma notícia quentíssima sobre o caso. Sob o título “Mensalão de Santo André envolve empresas com contratos ainda vigentes”, o texto assinado hoje pela jornalista Alana Ambrósio diz exatamente o seguinte: 

 O esquema de pagamento de propina a vereadores de Santo André, investigado pelo Ministério Público, envolve empresas que ainda têm contrato com a Prefeitura da Região Metropolitana de São Paulo. A denúncia aponta que quase R$ 10 milhões foram movimentados em menos de um ano. Parte das empresas já é investigada por irregularidades em outros contratos com o poder público. A CBN teve acesso às planilhas, que detalham até quando os recursos sobravam ou faltavam para o pagamento de propinas. 

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 As planilhas investigadas pelo Ministério Público listam 27 empresas que prestavam serviços ou tinham contrato com a prefeitura em 2016 nas áreas de limpeza urbana, segurança, coleta de lixo, radares e semáforos, entre outros. A empresa Peralta, do conhecido empresário do ABC, Beto Peralta, recebeu cerca de R$ 200 milhões na gestão do ex-prefeito Carlos Grana para coleta de lixo e construção de moradias. As planilhas apontam que, em média, um terço da propina vinha do grupo. Em 2016, o Tribunal de Contas do Estado considerou que o contrato da empresa com a prefeitura, ainda na gestão de Aidan Ravin, do PSB, era ilegal. O contrato de coleta foi aditado por cinco anos.

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 Outra que aparece na lista é a Consladel, integrante do consórcio FM Rodrigues, investigado por pagamento de propina no bilionário contrato da PPP da Iluminação na capital paulista. A Consladel é acusada de ter desviado mais de R$ 100 milhões da prefeitura de Manaus.

Também há a Tejofran, responsável pela coleta de lixo, que foi denunciada por cartel nas compras de trens da CPTM. Há ainda a Sinal Ronda, dona do maior contrato da história com a CET, para implantação de semáforos. 

A Eicon, de radares, também aparece. Ela tem como diretor o empresário Luiz Alberto Rodriges, pivô do primeiro escândalo envolvendo o PT nos anos 1990, que prestou serviço para a prefeitura de Fortaleza sem contrato em 2012.

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 Também está na lista a Editora Melhoramentos, que firmou contrato de um milhão de reais com a prefeitura de Santo André sem licitação três anos atrás. Em oito meses, os documentos mostram que essas empresas movimentaram cerca de R$ 10 milhões para pagar propina no mensalão revelado pela CBN. Nem sempre as altas quantias eram suficientes: em janeiro, faltaram R$ 6 mil para pagar todas as despesas. Já em outros, sobrava dinheiro: 25, 50 e até 170 mil reais de caixa para alimentar o esquema. Ao menos cinco empresas ainda possuem contratos vigentes com a Prefeitura de Santo André: Consladel, Terwan, Eicon, Net Telecom e Versátil.

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A reportagem da CBN entrou em contato com todas as companhias citadas. Em nota, A Peralta Ambiental informou que "sempre cumpriu contratos sob o estrito rigor da legislação vigente". Já a Tejofran e a Construban preferiram não se manifestar. A Fundação Santo André esclareceu que "No período indicado não fez parte de nenhum processo em que houvesse participação institucional ou repasse de valores da Prefeitura". As demais não enviaram um posicionamento.



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