Administração Pública

Em que pé está a região na Lei
de Responsabilidade Fiscal?

DANIEL LIMA - 02/04/2019

Os prefeitos dos sete municípios da região deveriam organizar uma entrevista coletiva na sede do Clube dos Prefeitos para mostrar a situação fiscal quanto à aplicação dos instrumentos da Lei de Responsabilidade Fiscal. Sei que sei, por alguns indicadores, que os cofres públicos estão sofríveis.

A LRF estabelece como referência para as despesas com pessoal a Receita Corrente Líquida, que envolve de um modo geral receitas e transferências correntes. Tudo parece simples, mas não é. Os administradores municipais do Brasil repetiram os governadores e aplicaram o golpe dos terceirizados para estourar os limites. É nessa zona de sombra dos terceirizados que florescem manejos e remanejos.

O Observatório de Informações Municipais acaba de publicar um estudo denunciando que a contratação de serviços terceirizados está se refletindo na saúde financeira das prefeituras. Quase três quartos das cidades brasileiras terminaram 2017 em situação delicada ou crítica porque se acumulam despesas com pessoal, inativos e sobretudo com serviços de terceiros. Para dar o drible da vaca na LRF, os administradores públicos descartam da prestação de contas as despesas com terceirizados.

Monitorando números

Quem faz essa e outras revelações é o gestor do Observatório de Informação Municipal, François Bremaeker, que assina os estudos.

Com base em dados de 5.461 municípios, que representam 98% do universo brasileiro, o estudo aponta, segundo reportagem do Valor Econômico, a compulsória redução de investimentos em infraestrutura. “Quando se levam em conta as despesas com pessoal e encargos os gastos com aposentadoria e pensionistas, a maioria dos municípios apresenta situação boa e razoável”, disse François. Para completar: “O panorama financeiro muda drasticamente quando se adicionam os gastos com serviços de terceiros”, afirma. Tanto que somadas as três categorias de despesas (pessoal, inativo e terceirizados), apenas 2% apresentam boa situação; 62% se encontram em condições delicadas e 9,89% estão com as finanças em estado crítico.

Certamente o leitor quer saber onde está o Grande ABC nesse ranking de desespero, porque o critério de considerar as três modalidades de despesas é que deve ser prioritário em qualquer análise.

Em março do ano passado publiquei nesta revista digital um artigo que ajuda a entender o quadro regional. Sob o título “Vamos melhorar no Brasileiro de Gestão Fiscal? Esperamos”.

Situação complicada

Analisei naquele artigo do IFGF (Índice Firjan de Gestão Fiscal) da Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), com base nos dados do Tesouro Nacional.

Os dados daquela edição do IFGF referiam-se ao ano de 2016. Estou aguardando os dados de 2017. Uma demora e tanto.

O Índice Firjan de Gestão Fiscal leva em conta cinco indicadores com pesos relativos definidos pelos especialistas: Receita Própria, Custos com Pessoal, Investimento, Liquidez e Custo da Dívida. 

Para tornar mais didática a compreensão do IFGF, retirando o assunto da aridez técnica, tratei os dados como se tivéssemos uma espécie de Campeonato Brasileiro de Gestão Fiscal. Na classificação final ocupamos a Série B com São Bernardo, Diadema e São Caetano; a Série C com Santo André, Mauá e Ribeirão Pires e a Série D com Rio Grande da Serra. Os otimistas vão dizer que estamos melhores do que no Campeonato Brasileiro de Futebol, já que não temos representação em nenhuma divisão.

Mais esclarecedor que a própria classificação no ranking, que tem como âncora a média geral de cada Município, é o posicionamento de cada representante regional na classificação geral. São Bernardo, a mais bem posicionada, ocupava a posição 154. Diadema, em segundo, ficou na posição 358. São Caetano foi a 515, Mauá a 739, Santo André em 803, Ribeirão Pires a 2.461 e Rio Grande da Serra na distante 3.588 posição.

Não fossem as dificuldades encontradas no banco de dados do Tesouro Nacional, o Índice Firjan de Gestão Fiscal poderia ser mais elucidativo. Afinal, somente as despesas com pessoal estão contabilizadas. Os terceirizados, que explodiram entre os gestores públicos municipais e estaduais, surrupiaram o conceito da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Paradoxalmente, mais que isso: a criação da lei que, supostamente, colocaria um cabresto na gastança pública, referenciou o aumento de despesas e, em seguida, as manobras da terceirização.

Pauta empobrecida

Se a pauta jornalística regional não sofresse de um mal sistêmico e danoso, tudo poderia ser diferente. Temas mais relevantes poderiam pautar os agentes públicos.

Dá-se espaço excessivamente generoso a varejismos que não alteram o ritmo do jogo, quando não o comprometem ainda mais porque provocariam dispersões, e se esquece de levar aos consumidores de informações tudo aquilo que influencia a qualidade de vida.

Ou o leitor nem desconfia que o péssimo lugar de cada Município da região no ranking de cinco indicadores fiscais da Firjan é resultado da deterioração das finanças públicas por conta também dos malabarismos para contratar pessoal fora das regras do jogo ditadas pela Lei de Responsabilidade Social?

François Bremaeker, do Observatório Municipal de Informações, lembrou uma situação clássica na entrevista ao Valor Econômico, após amenizar que serviços terceirizados são necessários ao funcionamento da máquina pública: a correlação inversa entre essa modalidade de contratação e os gastos com pessoal determina que quanto mais alta seja a conta da terceirização, menor tende a ser a despesa de pessoal dos municípios”.

Redução de investimentos

Tanto é verdade que quando se consideram as três modalidades de despesas (pessoal, inativo e terceirizado) sobram apenas 2% dos municípios que apresentam boa situação fiscal, enquanto que o vetor que coloca como matriz de análise apenas o gasto com pessoal, 73,53% dos municípios brasileiros terminaram 2017 em boas condições financeiras e apenas 0,15% estavam em situação crítica. Quando se acrescentam os inativos, 60,97% dos municípios seguem em boa situação financeira. Ou seja: o desvirtuamento da LRF mascara os dados financeiros dos municípios brasileiros. Como também dos Estados.

A deterioração das contas públicas dos municípios brasileiros retroalimenta-se da própria escassez de recursos a cada temporada. Em 1972, segundo pesquisa da Confederação Nacional de Municípios, também incluída na reportagem do Valor Econômico, as despesas relacionadas à urbanização (serviços, infraestrutura e transporte) correspondiam a 27,4% dos recursos gastos pelas prefeituras do País. Quarenta anos depois, em 2012, o percentual havia caído para 11%. No mesmo período, os gastos com saúde e saneamento saltaram do patamar de 5,7% para o de 25,4%.

É claro que a Constituição Cidadã de 1988 e a incapacidade crônica, além das falcatruas, das lideranças da Nova República, estão na raiz desse descompasso. Um País cujo PIB médio dos últimos 40 anos não passa de crescimento de 2% não pode mesmo dar certo. Imaginem então as regiões periféricas das metrópoles, como o Grande ABC, que associa desindustrialização e demografia em transe.  

Por essas e tantas outras razões as prefeituras da região deveriam abrir os números à população. Inclusive como espécie de autodefesa, comparando-os com os tempos de glória.



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