Administração Pública

Em busca da
sociedade civil

WALTER VENTURINI - 05/05/2002

A batalha pela sucessão do prefeito Maurício Soares (PSDB) em São Bernardo começou com três anos de antecedência. Desde o início da terceira gestão à frente do Executivo, Maurício colocou sob responsabilidade de um de seus mais fiéis assessores, o ex-secretário e ex-vereador Ademir Silvestre, a Coordenadoria de Ações Comunitárias. A função do novo órgão, criado em março de 2001, é estabelecer ligação entre o movimento social e a máquina da administração pública. Mas a oposição, encabeçada pelo PT, considera a coordenadoria mistura de cabide de emprego e correia de transmissão da política governista nas entidades de base com vistas às eleições de 2004. Representantes da Prefeitura contra-argumentam que fizeram uma revolução na forma de relacionamento entre Poder Público e sociedade civil, organizada ou desorganizada.

A pesquisa de opinião pública representa para a política a união de um trabalho de base estatística com o chamado proselitismo -- a tarefa nada fácil de arrebanhar aliados. Para quem vive a política e suas disputas intermináveis, pesquisa não é somente espécie de corrida maluca até a vitória nas urnas. Muito pelo contrário. Quem sabe fazer bom uso do detalhamento dos dados estatísticos colhidos entre eleitores sabe que ali pode estar o mapa da mina não só para o sucesso eleitoral como para o dia-a-dia administrativo. 

Um dos que perceberam a importância das pesquisas é Ademir Silvestre. Nos últimos 20 anos, Silvestre se dedicou a atuar na política junto com Maurício Soares desde os períodos do PT (Ademir vereador e o prefeito em sua primeira gestão na Prefeitura, 1989-1992). Juntos deixaram o PT e foram para o PSDB, pelo qual Maurício se reelegeu. Naquela eleição, Ademir Silvestre se notabilizou por aplicar questionários e fazer estatísticas para colher informações sobre as tendências do eleitorado. Uma de suas inovações foi dividir a cidade em 19 regiões.  "Tinha tudo sobre cada um desses microlocais" -- conta o assessor de confiança do prefeito. Ademir Silvestre sabia em cada região quantas residências existiam, qual a distribuição da população por faixa etária, sexo e grau de instrução. Em resumo, tinha quantificado São Bernardo para que Maurício Soares pudesse conquistar votos sabendo cada tacada a ser dada no jogo eleitoral.


Mais comunicação -- Na eleição seguinte, com Maurício já no PPS, Ademir Silvestre voltou a fazer pesquisas de opinião, novamente com bons resultados. O mais notável dos quais foi a terceira vitória do prefeito. "Ao final do segundo governo de Maurício Soares descobrimos que, apesar de termos trabalhado muito, a população dizia que faltavam serviços que a Prefeitura já tinha realizado. Era um problema de comunicação" -- avalia. A partir dos resultados, o prefeito criou o Departamento de Comunicação e lançou um desafio ao aliado. "Ele me pediu que criasse uma forma de trabalhar junto com a sociedade civil organizada e achei um jeito" -- acredita o assessor Ademir, que aplicou a velha fórmula das 19 regiões para dividir a cidade, agora do ponto de vista da Administração. 

Cada região de São Bernardo passou a ser monitorada por um agente comunitário, que diariamente entra em contato com lideranças dos bairros e representantes do comércio e da indústria locais para recolher avaliações sobre os serviços públicos. "Já que não poderíamos gastar dinheiro, criamos uma estrutura que aproveitou gente de dentro da própria Administração" -- conta Ademir Silvestre. Em um ano, a partir das informações recolhidas pelos 19 agentes comunitários, foram realizadas 141 audiências entre entidades e representantes das comunidades com Ademir Silvestre. A equipe da Coordenadoria de Ação Comunitárias é completada com outros cinco assessores.

O caminho inverso também acontece; isto é, os agentes comunitários trabalham na orientação de campanhas educativas da Prefeitura e conscientizam os moradores sobre questões como o código de posturas e campanhas como a do combate à dengue. A coordenadoria também dispõe de local no Poupatempo, montado pelo governo do Estado junto ao Paço Municipal. É o Espaço Opinião Pública, que desde janeiro deste ano fez 500 atendimentos -- de solicitações a reclamações e sugestões sobre o funcionamento da máquina pública. "Temos um advogado e um contador que dão assessoria para mudança de estatutos de associações amigos de bairro e balancetes de entidades, exigências que surgiram agora como consequência da Lei de Responsabilidade Fiscal" -- conta. 

O coordenador de Ações Comunitárias cita exemplos de resultados da interação entre Prefeitura e sociedade civil. "Sem participação das entidades da área, não conseguiríamos, por exemplo, fechar o Lixão do Alvarenga. Com ajuda dos moradores, conseguimos dar mais de 100 flagrantes de despejos irregulares de lixo nas imediações" -- relata.


Esgoto comunitário -- Outro fruto da atuação da coordenadoria, de acordo com Ademir Silvestre, é o acordo com o Ministério Público para instalar no Bairro Pinheirinho estação comunitária que irá tratar 360 mil litros de esgoto por dia e deixar a água usada por 816 famílias em condições de ser despejada na Represa Billings. "Conseguimos convencer o MP de que tratamento de esgoto é um ganho ambiental mais efetivo do que fazer a chamada compensação ambiental e destinar uma área para preservação. As áreas a serem compradas para fazer a compensação já estão na prática preservadas pela lei" -- explica Silvestre. 

Pelo acordo, cada família do Bairro Pinheirinho pagará R$ 28 por mês, durante 20 meses, para custear os equipamentos estimados em R$ 430 mil. A Prefeitura entra com a rede de coleta, guias e sarjetas e o asfalto ecológico. A previsão é de que a estação entre em funcionamento em setembro. Ademir Silvestre destaca que o convênio para fazer o tratamento de esgoto no Pinheirinho é o primeiro do gênero no Brasil. Trata-se também da primeira estação de tratamento de esgotos da Billings construída após a aprovação das primeiras leis de preservação dos mananciais, em 1975. 

A 3ª Companhia da Polícia Militar instalada no Parque dos Pássaros também foi fruto de intermediação da Coordenadoria de Ações Comunitárias. Moradores desse bairro de classe média-alta apontaram a questão da segurança como prioritária. "A Prefeitura cedeu o terreno e o projeto, e a população se cotizou para construir o prédio" -- conta o coordenador. A nova unidade da PM, para a qual os moradores arrecadaram R$ 300 mil, foi possível graças a acordo entre Prefeitura e Conselho Comunitário de Segurança do Parque dos Pássaros. Estará equipada inclusive com helicóptero para atender exclusivamente ocorrências na região.


Críticas -- Nem todos, porém, estão satisfeitos com a coordenadoria de Ademir Silvestre. "É um escândalo com o dinheiro público, usado para estimular eleições em associações amigos de bairro com objetivo de potencializar futuras campanhas" -- dispara o vereador Aldo Santos (PT), um dos mais combativos críticos da administração pública. O vereador petista enxerga na Coordenadoria de Ações Comunitárias uso da máquina pública para fazer campanha política e arrebanhar apoios a serem usados em anos eleitorais. 

Em um ano de trabalho, Ademir Silvestre conseguiu cadastrar na coordenadoria 282 entidades, 21 das quais criadas com ajuda da Prefeitura. Para os desconfiados petistas, é essa ajuda que caracteriza a instrumentalização das associações de bairro. Ademir Silvestre rebate: "Eles estão incomodados porque potencializamos, tiramos de quem tem e damos para quem não tem. Se ajudo alguém ligado à oposição na época da eleição, no mínimo esse alguém fica dividido entre me apoiar ou votar no PT".

O coordenador de Ações Comunitárias também não aceita a acusação de que só atende às reivindicações de entidades ligadas ao prefeito. "Tenho vistoriado obras na favela Divinéia, que tem influência do Toninho da Lanchonete e da Ana do Carmo, vereadores do PT. Recentemente fiz a sede do Estrela D, um clube ligado a petistas" -- argumenta Ademir Silvestre. "É um cabide de empregos" -- acusa o vereador Aldo dos Santos. A Coordenadoria de Ações Comunitárias nem orçamento tem. "Conto somente com 24 pessoas que fazem a ligação da Prefeitura com a comunidade" -- devolve Silvestre. O trabalho dos 24 assessores resultou em cerca de dois mil atendimentos, sendo 131 audiências com o coordenador, secretários ou o próprio prefeito. 

Aldo Santos não se rende e garante que a Coordenadoria de Ações Comunitárias acaba instrumentalizando entidades que deveriam ter posição neutra com relação ao Poder Público. "O movimento popular não pode ser tutelado pelo Executivo. Tem de ser independente em relação aos órgãos oficiais para poderem servir como meios de pressão. Caso contrário, perdem as funções originais de defender as reivindicações dos setores que representam" -- observa o parlamentar petista. Para Ademir Silvestre, são os petistas que costumam partidarizar as entidades. "Lá é que esse trabalho é feito partidariamente. Aqui fazem um trabalho de maneira profissional" -- assegura.


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