Administração Pública

Nova sobrevida
para a ETCD?

WALTER VENTURINI - 05/06/2002

Depois de um ano de fortes ajustes que reduziram o déficit mensal da ETCD (Empresa de Transportes Coletivos de Diadema) de R$ 770 mil para R$ 125 mil, o prefeito José de Filippi Júnior decidiu reformular integralmente o sistema. A mudança será efetivada com a criação da DTU (Diadema Transportes Urbanos), empresa pública de administração direta que ficará responsável pelo gerenciamento de todas as linhas municipais de ônibus. A DTU vai controlar as operações da ETCD e das empresas privadas que vencerem a licitação para as concessões das linhas, programada para o final deste ano. As mudanças podem representar a última oportunidade para a operadora estatal ETCD, que acumula trajetória de prejuízos e má gestão. Mais uma vez, como é rotina na administração pública brasileira, a parcela mais pesada da aventura administrativa da ETCD, a dívida de R$ 28 milhões, será assumida pelos cofres da Prefeitura no processo de reorganização do sistema. A cronologia de perdas contabiliza também R$ 30 milhões de dívida com o INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) que passaram a engordar o passivo da Prefeitura. 

A aposta definitiva da Prefeitura na manutenção da operadora ETCD está condicionada ao compromisso de a empresa deixar de produzir prejuízos, ritual dos 15 anos de criação da estatal. Assim que assumiu, em janeiro de 2001, o prefeito petista José de Filippi Júnior encontrou a ETCD com 554 funcionários e incontáveis problemas de ordem operacional e administrativa. Uma reforma operacional reestruturou as 20 linhas e procedimentos da garagem, além de ter feito espécie de pacto com os trabalhadores, que concordaram em abrir mão de reajuste salarial em 2001. As medidas possibilitaram redução de R$ 645 mil no déficit mensal. "A empresa foi estruturada quase totalmente do ponto de vista de gestão" -- avalia o secretário de Finanças da Prefeitura, Sérgio Trani. Ele espera que até outubro seja implementada a reorganização administrativa da ETCD. 

A segunda fase das mudanças lideradas pelo prefeito de Diadema começou no início de maio, com a demissão de 30 funcionários: nove da administração, 17 da manutenção e quatro comissionados. A partir de agora, a Prefeitura irá indicar somente o presidente da estatal e três gerentes, enquanto a empresa vai investir na operação, com a contratação de 72 motoristas e cobradores. "A empresa vai ter de pensar com o mercado na cabeça. Não sei, por exemplo, se haverá reajuste salarial" -- afirma Sérgio Trani, que durante dois meses assumiu interinamente a presidência da ETCD.

Quem não gostou das medidas foi o Sindicato dos Condutores Rodoviários do ABC, que negocia o dissídio salarial. No começo de maio, os trabalhadores rejeitaram a proposta da ETCD de redução de 25% da jornada de trabalho da equipe de manutenção e redução proporcional de salário. Para motoristas e cobradores, a empresa propôs aumento de 10% nos salários e igual ajuste na jornada. A ETCD paga piso de R$ 1.162 por jornada diária de seis horas e 40 minutos. "Se a empresa não tiver nova proposta, não teremos outro caminho senão o do Tribunal" -- ameaça Cleuber Ferreira de Moura, diretor do sindicato. Os trabalhadores também ingressaram na Justiça contra as 30 demissões. Sérgio Trani afirma que quer acabar com a inviabilidade administrativa da ETCD. Cita como exemplo os mecânicos encarregados da manutenção de 54 ônibus em operação, com salários de R$ 1,5 mil. "Numa situação de mercado, a ETCD deveria ter apenas 30 mecânicos" -- calcula o secretário de Finanças.


Sem fôlego -- Quando foi criada na gestão do então prefeito Gilson Menezes, a ETCD operava integralmente o sistema de transporte coletivo municipal. Ao longo do tempo, a diferença entre custos e faturamento ficou cada vez mais desfavorável à empresa. Sem fôlego para dar conta da demanda, duas empresas privadas passaram a atuar na cidade -- Viação Alpina e Viação Riacho Grande. Este ano a Riacho Grande comprou a Alpina. Para complicar ainda mais o transporte coletivo em Diadema, existe o passe escolar gratuito, que obriga a Prefeitura a pagar R$ 150 mil todo mês às empresas operadoras e bancar o benefício garantido por lei municipal.  

A ETCD tem faturamento anual de R$ 18 milhões. Para a Prefeitura, não existe outro rumo senão a adequação da empresa ao mercado. "Tecnicamente, temos de fazer o que não foi feito em 20 anos, mas a privatização não está fora de cogitação" -- alerta o secretário de Finanças. A alternativa proposta pela Prefeitura é encaixar a ETCD num sistema operacional misto. Pela proposta, a ETCD ficará com 43% da operação e o restante com a iniciativa privada. A DTU, que gerenciará todo o sistema, terá poder de intervenção e aplicação de multas nas empresas que não cumprirem o contrato. 

O modelo a ser adotado em Diadema é o mesmo implantado em Porto Alegre, onde um órgão gestor controla as operações de empresas privadas e da Companhia Carris Porto-Alegrense, administrada pela Prefeitura também petista. Durante seis anos, com a reestruturação do sistema, o Poder Público assegura que a Carris superou as dificuldades financeiras e passou a ser rentável. A empresa gaúcha opera 21 linhas com frota de 315 veículos e é responsável por 21,4% do transporte diário de passageiros. A Carris tem certificado ISO 9002 e foi considerada em 2001 pela ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos) como a melhor operadora rodoviária do Brasil, entre empresas públicas e privadas. O modelo a ser adotado por Diadema é diferente do gerenciamento do transporte coletivo em São Bernardo e Santo André, onde as prefeituras montaram estrutura enxuta para fiscalizar a operação, feita exclusivamente por empresas particulares.

Diadema espera criar a DTU em agosto e iniciar em setembro a licitação das linhas, estabelecendo novos contratos para a operação privada. Será criado controle de operação e em planilhas de custos atualmente inexistentes. O secretário Sérgio Trani acredita que o controle permitirá igualdade de condições entre as empresas privadas e a ETCD, que passará a depender exclusivamente de seus próprios recursos. 

Além disso, a DTU vai fiscalizar outras formas de transporte como peruas escolares, táxis e movimentação de cargas, bem como a administração de todo o sistema viário do Município. A nova estrutura pública vai exigir 43 funcionários, quatro diretores, sete auxiliares administrativos, cinco engenheiros e arquitetos e 27 fiscais para controlar todo o sistema. A empresa gestora pretende ter como fonte de recursos a cobrança de taxa de gerenciamento das empresas de transporte coletivo e recursos da administração dos três terminais de ônibus, da exploração da publicidade em abrigos para usuários do sistema e das multas de trânsito implantadas este ano. 

Para operar os 57% restantes do sistema, as empresas particulares que vencerem a licitação devem apresentar as melhores ofertas de taxa de gerenciamento. Será a chamada concessão onerosa, com a condição de a iniciativa privada assumir o compromisso de custear quantia estimada entre R$ 6,5 milhões e R$ 7 milhões, suficiente para a ETCD comprar 54 novos ônibus. A concessão será por 15 anos, prorrogáveis em até cinco anos na dependência de pesquisas de avaliação junto aos usuários. 

A Prefeitura de Diadema aposta na atratividade das linhas municipais como chamariz à licitação. Cidade operária com predomínio das classes C e D, cerca de 45% dos moradores de Diadema fazem uso dos ônibus. O índice é semelhante ao de Curitiba, embora a demanda curitibana pelo transporte coletivo seja em razão da alta qualidade do sistema local. As condições em Diadema permitiriam média de faturamento mensal total de R$ 3 milhões. "A cidade é pequena, com linhas curtas, passageiros cativos e tarifa alta (R$ 1,40). O sistema tem rentabilidade perfeita" -- garante o secretário Sérgio Trani. Sinal de que a ETCD não pode reclamar do fracasso por causa do mercado. 


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