Administração Pública

Nos trilhos, com
ou sem os trens

VERA GUAZZELLI - 05/05/2003

O ano de 2003 desponta como decisivo para o futuro turístico de Paranapiacaba. Apesar de a CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) estar irredutível na decisão de deixar a histórica vila ferroviária sem os trens de subúrbio, a Prefeitura trabalha em várias ações simultâneas para evitar o descarrilamento dos projetos de entretenimento. As iniciativas incluem os preparativos para o 3º Festival de Inverno, passam pelo início de obras de restauro, por cursos de capacitação da população local e trazem até a expectativa de angariar investimentos internacionais. Com ou sem trem, Paranapiacaba não tem mais como viver do passado e precisa definitivamente inserir-se em roteiro turístico comercial para encontrar auto-sustentabilidade. 

A importância do retorno dos trens para um local que nasceu e viveu em função da ferrovia é ponto pacífico para a Prefeitura de Santo André. O prefeito João Avamileno só aguarda uma vaga na agenda do governador Geraldo Alckmin para tratar exclusivamente do assunto que faz Paranapiacaba viver o paradoxo de ser um destino ferroviário sem acesso por trilhos. Por isso, o chefe do Executivo espera contar com a sensibilidade política para solucionar questão cujos argumentos técnico-operacionais parecem esgotados. A CPTM tirou os trens de Paranapiacaba no final de 2001 sob alegação de que a linha era deficitária no atendimento aos 2,1 mil moradores locais. Já a MRS Logística, concessionária da linha férrea naquele trecho, só opera transporte de carga e não manifestou interesse em conduzir passageiros.

“O trem é primordial para a Vila, mas não podemos deixar de tocar os projetos por conta desse impasse. A prioridade é viabilizar Paranapiacaba como um destino turístico sério” — enfatiza o subprefeito de Paranapiacaba e Parque Andreense, João Ricardo Caetano. Se o contato político não surtir o efeito desejado, a Prefeitura deve enveredar pelos caminhos da iniciativa privada. João Ricardo Caetano revela que já iniciou conversas preliminares com empresas privadas que poderiam explorar o trem turisticamente. Os contatos, no entanto, não passaram do terreno das sondagens porque Paranapiacaba ainda não pode oferecer o que mais interessaria a qualquer empreendedor: público suficiente para justificar o investimento. 

A média de visitantes à vila construída pelos ingleses no século XIX tem sido de mil frequentadores por final de semana. Em 2002, eram pelo menos 1,8 mil turistas aos sábados e domingos. A queda, no entanto, é analisada como normal por João Ricardo porque reflete o esvaziamento verificado historicamente entre dezembro e março, período em que o Litoral é o destino preferido dos viajantes. João Ricardo também não vincula a diminuição de turistas necessariamente à falta de trens. Garante que a maioria tem chegado a Paranapiacaba de carro, mesmo antes da suspensão total do transporte ferroviário. De qualquer forma, o número de potenciais consumidores ainda não acalenta o retorno financeiro de negócios mais vultosos. 

Não à toa, Paranapiacaba desdobra-se para atrair gente. Ainda este mês a Prefeitura abre chamamento público para exploração de um antiquário, dois restaurantes, dois ateliês artísticos e uma boutique cultural. Os interessados irão ocupar parte dos 20 imóveis que o Poder Público reservou para instalação de negócios de entretenimento por período experimental de quatro meses. Como o prazo vai coincidir com o 3º Festival de Inverno, em julho, a Prefeitura pretende oferecer aos futuros investidores oportunidade de testar a aceitação do negócio antes de tornar o empreendimento definitivo, além de mostrar aos visitantes que Paranapiacaba já é bem mais que trilhas, cachoeiras e réplicas do Big Ben e do fog londrino. “Esse processo é fundamental para alcançarmos a confiança de quem oferece serviço e de quem procura diversão com infra-estrutura” — acredita o subprefeito.

Se os novos negócios realmente forem concretizados, irão se juntar ao mix já empreendido pela população local. Por enquanto, Paranapiacaba contabiliza uma casa de chá, uma de pão-de-mel, 13 Portas-Abertas — residências que servem refeições caseiras —, oito pousadas em estilo bed and breakfast, sete ateliês-residências, um entreposto de arte e culinária com 17 expositores, além da Associação de Monitores Ambientais composta de 18 guias e a Associação de Guardadores de Veículos formada por 10 integrantes. 

São negócios ainda em estruturação como a casa do pão-de-mel de Vera Lucia Vegas Marques e o Porta Aberta de Edina Santos. Vera e Edina estão entre os moradores que aderiram ao projeto proposto pela Prefeitura como alternativa de trabalho e de inclusão na reconversão econômica de Paranapiacaba. A transformação da população em agente da própria história foi defendida pelo arquiteto inglês Brian Goodey como imprescindível à sobrevivência da Vila. O profissional é especializado em recuperação de sítios históricos e estaria interessado em investir no turismo cultural brasileiro. A visita de Brian Goodey e outros cinco pesquisadores a Paranapiacaba, em abril, foi feita por sugestão do consulado britânico.

Recentemente, a Prefeitura firmou parceria com a ETE Júlio de Mesquita, em Santo André, para elaboração de curso de Monitor Cultural com duração de 16 semanas para 35 moradores. Outros 200 habitantes da Vila também estão matriculados em cursos práticos de jardinagem, carpintaria e reparos domésticos. A intenção é preparar mão-de-obra local para a demanda anunciada de serviços de restauro. O mercado municipal será recuperado com verba pública de R$ 195 mil e o imóvel que abrigará o centro de documentação aguarda liberação de US$ 50 mil prometidos pelo WMF (World Monument Fund), instituição que catalogou Paranapiacaba entre os 100 monumentos mundiais passíveis de preservação. 

A confiança da comunidade internacional ganhou substância com o anúncio da criação do Parque de Paranapiacaba até o segundo semestre. Segundo a prefeitura, serão 4,2 mil quilômetros quadrados de área de preservação da Mata Atlântica desde a estação de trem de Campo Grande até a divisa com Mogi das Cruzes.


Festival de Inverno — Toda essa movimentação reforça também a vitrine da terceira edição do Festival de Inverno, principal evento cultural de Paranapiacaba. A Prefeitura já saiu a campo para angariar patrocinadores e contatou 89 empresas localizadas no Grande ABC e na Capital. Todas receberam kit composto por um cachecol de lã — peça símbolo do festival — e um pão-de-mel fabricado na Vila, além de informações socioeconômicas sobre o evento. A expectativa é estender as atrações para três finais de semana, juntar 30 mil visitantes — 50% a mais que no ano passado — e captar R$ 360 mil em recursos. “Se não alcançarmos esse montante, a Prefeitura vai custear o que faltar” — garante João Ricardo Caetano. A Prefeitura de Santo André comprou a Vila de Paranapiacaba em dezembro de 2001 e já investiu no local R$ 5,3 milhões em recursos próprios. 

Paralelamente ao Festival de Inverno, Paranapiacaba prepara-se para receber etapas de campeonatos esportivos radicais como treking, rapel e montain bike. O cronograma com atrações até o final do ano estará finalizado ainda este mês. Haverá ainda festival gastronômico programado para agosto com cardápio alicerçado no Concurso de Receitas Históricas de Paranapiacaba. Moradores submeteram a julgamento 25 pratos vinculados a histórias reais ou lendas como a de que o bandido Jack, o Estripador esteja enterrado no cemitério local. “Será que alguém terá coragem de degustar um picadinho à la Jack” — desafia em tom de brincadeira João Ricardo do Caetano.


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