Administração Pública

Nosso governo eletrônico
tem o que mostrar

FERNANDO BELLA - 05/06/2003

Ter acesso a informações, solicitar serviços, fazer reclamações e até dar sugestões à administração pública no Brasil sempre foi algo com cara de burocracia e de filas intermináveis. O que poucos sabem é que a tecnologia está virando esse jogo a favor do contribuinte. Um novo modo de administrar o espaço e o dinheiro público começa a emergir sob o nome de governo eletrônico, através do qual as maravilhas da informática permitem conhecer, por exemplo, em que situação está uma reclamação contra o IPTU ou a solicitação de poda de uma árvore, ou ainda participar de compras públicas através de pregões eletrônicos imunes a eventuais fraudes. E que tal receber no mesmo dia certificação assinada pelo prefeito que está em viagem no Japão ou emitir cédula de identidade pela impressora de casa?

A tecnologia tornou-se verdadeiro achado do contribuinte e do cidadão, que podem desvendar vários dos caminhos públicos pelas telas do computador e subverter o clássico esconde-esconde quando o assunto é informação pública. A grande tacada dos governantes foi transformar a rede mundial de computadores em aliada e levar para dentro de casa, através da Internet, tudo o que acontece nos paços municipais, palácios de governos e no QG do governo federal, em Brasília. No Grande ABC, as sete cidades contam com sites na web, embora a interação com o usuário esteja em estágios diferenciados.

O fio da meada para um governo eletrônico democrático é a página na Internet e sua interlocução com o internauta. O grau de interação pode ser dividido em quatro etapas. Na primeira, o site coloca à disposição apenas informação. Na segunda etapa, já há espaço para reclamações e solicitações de serviços. Na terceira fase a página serve como verdadeiro balcão de atendimento virtual e oferece serviços urbanos como poda de árvores e iluminação de ruas, entre outros. A última e mais complexa etapa faz do computador um emissor de documentos, todos com autenticação digital. 

"Nessa última etapa, por exemplo, o munícipe pode retirar uma carteira de identidade pelo micro de sua casa" -- exemplifica a diretora de informática da Prefeitura de Santo André, Cristiane Vaz Domingues, que trabalha para colocar a cidade no quarto estágio o mais breve possível. O endereço eletrônico de Santo André está no ar desde de 1998 e no ano seguinte passou a oferecer serviços, enquadrando-se na terceira etapa de construção de páginas. Em todos os endereços eletrônicos da região existe o link (conexão) Fale Conosco. Por esse espaço é possível fazer qualquer tipo de solicitação ou sugestão -- o que coloca todas as prefeituras na segunda fase de interação.

Em São Caetano, o Cram on-line (Centro Rápido de Atendimento ao Munícipe) é um dos exemplos de canal de comunicação entre os departamentos da Prefeitura e o munícipe. "O Cram on-line é exatamente a cópia digitalizada do que o munícipe pode fazer nos balcões do Cram (postos de atendimentos) instalado dentro da Prefeitura" -- explica o supervisor de informática Marcelo Bueno, braço direito da diretora da Fazenda, Maria Carmen Reys Campos, quando o assunto é governo eletrônico. O Cram on-line pode ser acessado pelo site da Prefeitura 24 horas por dia ou pelo (0800) 772 77 05, de segunda a sexta, das 8h às 18h. "Estamos no ar desde fevereiro último e registramos mais de 800 solicitações de serviços urbanos e sugestões para a administração pública. A idéia é nos aproximar cada vez mais dos munícipes com serviços que têm relação direta com eles" -- promete Maria Carmen.

A Rede Fácil em Santo André segue o modelo do serviço de São Caetano. Com o Fone Fácil -- (0800) 19 19 44 -- e pela página na web é possível ter acesso direto à Prefeitura. O Fone Fácil recebe cerca de 800 chamadas diárias, quase sempre atreladas a problemas urbanos. O próximo passo deve colocar o governo eletrônico à disposição das empresas. Para isso, a Prefeitura de Santo André investe R$ 400 mil na atualização de softwares e segurança da rede.


On-line Cidadão -- Mas todo o trabalho feito para enriquecer os endereços eletrônicos com dados e serviços pode ir ralo abaixo se o acesso à Internet não for socializado. Dados de 2001 da Fundação Getúlio Vargas indicam que apenas 8,31% dos brasileiros têm web em casa. Pensando nisso, as prefeituras começaram a investir em projetos como o On-line Cidadão em parceria com o Senac-SP. O papel do Poder Público é oferecer os locais, a infra-estrutura básica para instalação e funcionamentos dos quiosques (eletrodutos), cadastramento e fornecimento dos cartões magnéticos. O Senac fornece tecnologia e suporte técnico e capta patrocinadores para a instalação dos quiosques. 

São Bernardo foi a primeira a implantar o projeto do Senac na região. A empresa que faz o intermédio com patrocinadores do On-line Cidadão no Município é a Best Solutions. São Bernardo soma mais de 350 cartões vendidos. Cada cartão custa R$ 2 e dá direito a 30 minutos de navegação por dia durante um ano. A venda ainda é restrita ao Poupatempo, mas o Senac está em negociação com a Acisbec (Associação Comercial e Industrial) para abranger outros pontos-de-vendas. "O ideal seria vender os cartões em bancas, casas lotéricas e outros estabelecimentos comercias" -- aconselha o secretário de Administração, Erival Daré, que coordenada o projeto representando o Poder Público.

O problema é que por enquanto apenas dois totens foram instalados no Paço Municipal. Nesse caso, a Prefeitura acaba não podendo interferir. Depende do Senac a conquista de patrocinadores e, assim, a viabilização de mais quiosques. "A Prefeitura já tem em mãos mapa com pontos de instalação por ordem de prioridade" -- explica Erival Daré.

O projeto já zarpou dos portos dos gabinetes, mas é preciso não deixar a âncora da falta de estrutura estancar a viagem. Os dois primeiros pontos em São Bernardo foram inaugurados no início de janeiro deste ano. A Prefeitura encontrou algumas dificuldades de funcionamento como problemas com a conexão. Além disso, o volume de interessados cadastrados para utilizar o serviço é muito superior ao número de computadores liberados para acesso à Internet. As filas passaram a ser o primeiro pesadelo. A espera de alguém que está a duas pessoas para utilizar o computador pode chegar a uma hora.

O Senac já está em negociação para colocar pelo menos mais três quiosques em São Bernardo: dois no Poupatempo e um no Crec (Centro Recreativo e Esportivo Comunitário) Odemir Furlan, no Bairro Baeta Neves. Já o convênio entre Senac e Prefeitura de Diadema está na boca do forno. A expectativa é que ainda neste primeiro semestre comecem as instalações dos totens nos pontos indicados pela administração pública para o On-Line Cidadão no Município.

Outra forma de as prefeituras aumentarem o número de usuários com acesso à Internet é através do programa do governo federal Gesac (Governo Eletrônico -- Serviço de Atendimento ao Cidadão), pelo qual as cidades passam a receber pontos de acesso gratuito à web financiados pela União. "A Prefeitura de São Bernardo está sendo presenteada com sete pontos de acesso à Internet. Já indicamos três lugares" -- revela o secretário Erival Daré. Os pontos eleitos são Poupatempo, Sub-Prefeitura de Riacho Grande e Biblioteca Pública Machado de Assis.


Exclusão digital -- O Mapa da Exclusão Digital divulgado recentemente pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) e CDI (Comitê para Democracia da Informática), do Rio de Janeiro, escancara o problema do acesso a computadores no Brasil. Pelos dados de 2003, apenas 15,1% dos brasileiros têm computador em casa. No Grande ABC, os números também são desconfortáveis, mas menos assustadores. A soma do Grande ABC em número de pessoas que têm computador é de 519.882, ou 22,6% dos 2,3 milhões de moradores. Rio Grande da Serra segura a lanterna regional no número de pessoas com computadores: o percentual da cidade é de apenas 7,1%. O líder é São Caetano, onde 41,1% têm micros em casa.

Algumas prefeituras como Santo André já instalaram há algum tempo computadores em escolas, bibliotecas e outros espaços públicos com acesso gratuito à Internet. Uma das falhas é a falta de divulgação dos pontos e como o cidadão pode fazer uso do benefício. Com verba do PMAT (Programa de Modernização da Administração Tributária), do BNDES, Santo André colocou três pontos de Internet gratuita na Biblioteca Central Nadir Lacerda. Até o final deste mês de junho, a expectativa é colocar pelo menos um ponto de Internet em cada uma das 13 bibliotecas do Município. "Temos ainda outros locais de acesso financiados pela própria Prefeitura em várias frentes administrativas. Na educação, por exemplo, contamos com 19 escolas, cada uma com oito pontos de Internet" -- enumera Cristiane Vaz Domingues. O projeto prevê que até o final do ano as 62 escolas públicas do Município devem contar com computadores com acesso à Internet.

Ainda em Santo André, a ONG italiana Crocevia patrocinou o programa Rede Cidadania de Inclusão Digital, que instalou 30 micros divididos entre a Casa da Palavra, o Centro de Acesso no Bairro Cata Preta e a Chácara Pignatari. "Em todos os locais o uso é liberado à comunidade" -- reforça a diretora de informática de Santo André. Dentro do programa da Crocevia também está em fase de conclusão uma sala multimídia no saguão do Teatro Municipal. Lá, entidades organizadas da sociedade e jornais de bairros, entre outros interessados, poderão utilizar equipamentos para qualquer tipo de trabalho ligado à Internet, como a construção de sites.


Modernização administrativa -- Uma parte do governo eletrônico que o cidadão não vê, mas sente na pele a diferença nos serviços públicos, está na modernização administrativa. As prefeituras sabem que este é o passo mais importante dentro da renovação administrativa e a inclusão definitiva do Poder Público no universo high tech. Não é à toa que os paços municipais ganharam novo departamento e até secretaria: a da Modernização Administrativa.

As prefeituras correm atrás de recursos externos e abrem os cofres para renovar a frota de microcomputadores, capacitar servidores públicos e conseguir interligar dados das secretarias. O objetivo final é conseguir o mapeamento da pluralidade da cidade, desde os pontos mais violentos até vias públicas não asfaltadas. Saúde, educação e segurança ainda são prioridades na hora da modernização.

Uma das metas no horizonte de São Bernardo é a criação do Cartão do Cidadão. O documento serviria como um RG e traria no conteúdo o histórico de cada cidadão. "No dia em que o Cartão do Cidadão virar realidade, o morador poderá ir de um posto de saúde a outro e mesmo assim não sofrer interferência no tratamento. Com a interligação dos dados, bastará digitar o número do cartão e saber o que o paciente tem e qual o tempo de tratamento, além dos medicamentos utilizados" -- projeta o secretário de Administração, Erival Daré.

Nos departamentos de modernização administrativa estão analistas de sistemas, técnicos em informática, programadores e cientistas da computação para dar suporte a tudo o que as prefeituras têm investido em tecnologia. No caso de São Caetano, todos esses profissionais estão no Graal (Gerenciamento Reunido de Análises e Aplicativos Lógicos), inaugurado em outubro de 2002. O visual também traz os traços da alta tecnologia. Ambientação térmica e centenas de monitores fazem do núcleo de modernização administrativa de São Caetano verdadeira réplica de cenários hollywoodianos.

No Graal estão departamentos como o da digitação e digitalização dos documentos da Prefeitura. São 17 funcionários que passam todos os dados de documentos em papel para dentro do computador. "Estamos fazendo duas frentes de digitadores. A primeira começou a digitar os documentos em ordem progressiva desde 1949 e já está no ano de 1977. O segundo grupo faz o trabalho de trás para frente. Começou em 2003 e está no ano de 1999. A idéia é que em mais seis meses as duas se encontrem e fechem o trabalho" -- explica o supervisor de informática de São Caetano, Marcelo Bueno. O Graal também abriga o setor de microfilmagem. Depois de digitalizado o documento passa pela microfilmagem e daqui alguns anos poderá ser dispensado. "Com a microfilmagem temos dois tipos de arquivo: o digital e o da imagem" -- expõe Marcelo.

Outra Prefeitura que tira as cifras do próprio bolso é a de Diadema. Em quase dois anos foram investidos R$ 3 milhões para colocar tecnologia na veia da administração pública. Uma das novidades está no processo interno de certificação. O prefeito pode liberar documentos à distância através da Internet. "A certificação pode ser feita mesmo se o prefeito estiver no Exterior, com economia de tempo e dinheiro. Não será mais preciso papel, carimbo e assinatura" -- expõe o diretor de Departamento de Informática de Diadema, Nyedson Santos.

Algumas prefeituras buscam recursos externos tanto pelo PMAT quanto pelo PNAFM (Programa Nacional de Apoio à Gestão Administrativa e Fiscal dos Municípios) para conseguir turbinar a modernização. No PNAFM o dinheiro vem da Caixa Econômica Federal e é repassado aos fornecedores escolhidos pelas prefeituras. Ribeirão Pires foi a primeira cidade da região a conseguir recursos em torno de R$ 2,4 milhões do PNAFM. Em São Bernardo representantes do programa de financiamento estiveram na cidade para conhecer os planos de modernização fiscal e administrativa, que englobam Prefeitura 24 horas, Banco de Dados Municipal Unificado, Internet, Cartão do Cidadão, atualização da base cartográfica do Município e capacitação de profissionais, entre outras ações. Foram liberados pela CEF R$ 10 milhões e a Prefeitura entrará com mais R$ 6 milhões para conseguir tirar tudo do papel.

Exemplo de como a modernização administrativa com uso de novas tecnologias pode influenciar na segurança do cidadão está em Mauá. Um programa de computador virou a principal arma contra o crime. A Secretaria Municipal de Segurança Comunitária e da Cidadania cruza dados da Guarda Municipal e das Polícias Militar e Civil. O resultado é ter rapidamente em mãos a identificação da ocorrência e saber quais são os pontos com maior índice de violência. A comunicação entre Guarda Municipal e Polícia Militar também foi alterada. Antes a Guarda Municipal tinha que se utilizar do telefone 190 para registrar a ocorrência. Agora, a informação é passada via rádio.


Pregão eletrônico -- Outra sensação dos negócios que envolvem o governo eletrônico chama-se pregão eletrônico. A nova modalidade substitui os pregões presenciais, o que significa menos burocracia e custos menores. Na primeira compra realizada pela Prefeitura de São Bernardo através do Secom (Sistema Eletrônico de Compras) a economia chegou a R$ 9,2 mil reais. O prefeito William Dib calcula que a Prefeitura conseguirá reduzir os custos entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões por ano. A implantação do sistema custou R$ 900 mil e foi financiada pelo Santander-Banespa, que ganhou licitação para gerenciar todas as operações financeiras da Prefeitura. Ao todo, quatro servidores banda larga foram instalados na central dentro da Secretaria de Finanças.

Santo André aproveitou as comemorações dos 450 anos de fundação, em abril, para colocar em prática seu pregão eletrônico. Com os pregões presenciais, em que a convocação era feita pela web, a Prefeitura já havia diminuído o tempo médio das licitações em 32 dias. Os gastos com publicação também haviam caído, de R$ 1.455 para R$ 241. Agora, o gasto com publicação será zero com o sistema eletrônico, que fará automaticamente o cadastro e aviso aos fornecedores. O processo para integrar o pool de fornecedores é simples: basta entrar nos sites das prefeituras que fazem esse tipo de pregão e se cadastrar gratuitamente colocando a natureza jurídica e documentação. O sistema avisa dois dias antes da data de cada pregão para que haja tempo de o interessado analisar o negócio e fazer o lance. São Bernardo tem endereço específico para o pregão eletrônico: www.secom.saobernardo.sp.gov.br.

Governos municipais e estaduais ganharam mais motivos para não ficar de fora da moda do governo eletrônico: o eGov do governo federal. Esse site oferecia até dezembro último mais de 1,7 mil serviços com 22 mil links de acesso a diferentes informações governamentais. O portal havia recebido 35 milhões de visitantes por mês. Já haviam sido realizados mais de seis mil pregões eletrônicos, que somaram R$ 1,6 bilhão em aquisições e geraram economia estimada em R$ 500 milhões. Será difícil sobreviver daqui em diante sem estar no hall dos governos da Internet.


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