Administração Pública

Três tempos de uma crise
criada pelo prefeito Serra

DANIEL LIMA - 14/06/2019

O candidato Paulinho Serra complicou a vida do prefeito Paulinho Serra e pode comprometer a ambição do candidato Paulinho Serra na disputa pela reeleição em 2020. Talvez seja esse o melhor resumo da ópera após a violência que invadiu o Legislativo de Santo André.

Naquela noite tenebrosa, se aprovou com emendas de última hora o projeto de lei que coloca a estatalzinha Semasa nas mãos da Sabesp, também estatal de água e esgoto do Estado de São Paulo, embora com ações em bolsas de valores.

Nestes novos tempos de plataformas tecnológicos mais erráticas, mas também menos dóceis aos mandachuvas e mandachuvinhas de plantão -- tanto que elegem até presidente da República sem lastro -- o melhor mesmo é não subestimar o que se diz hoje, rezar para que não descubram o que foi dito ontem e tomar muito cuidado com o que vai se dizer amanhã.

Esse novo mundo em três tempos que se fundem num piscar de olhos ainda não mereceu o devido cuidado da classe política, obrigatoriamente exposta às vicissitudes da carreira.

Promessas comprometedoras

O prefeito Paulinho Serra e tantos outros prefeitos não se deram conta dessa transformação e quando menos esperam, quando um assunto polêmico chega às redes sociais, o estrago pode ser enorme.

O caso Semasa é emblemático. Paulinho Serra é um prefeito que coloca em risco a própria reputação porque o Paulinho Serra do passado andou a vender ilusões e demagogia que podem pesar na reta de chegada das eleições do ano que vem, quando vão se intensificar as ações desclassificatórias nas redes sociais.

O que fermentou e deu legitimidade à reação dos oposicionistas contra a transferência do Semasa em forma de água e esgoto foi sobretudo a promessa do candidato Paulinho Serra.

Os vídeos invadiram as redes sociais. Não há fraude, não há truque. Há sim clara vocação de cultivar bombas relógios em forma de entusiasmo juvenil a que se dedicam os políticos em geral.

A prática comum de adoçar a boca do eleitorado para obter votos tende cada vez mais a cavoucar o próprio túmulo da governabilidade e da governança. Os marqueteiros não enxergam essas nuances porque os marqueteiros só enxergam votos imediatos.  

A instabilidade política em Santo André tanto no capítulo de governança como de governabilidade é latente. Respira-se ambiente pesadíssimo em que o desânimo econômico funde-se à frustração institucional. Como se o ambiente macropolítico e macroeconômica já não fosse suficiente como invasores do território.

Paço comprometido

Tem-se, por exemplo, que o prefeito Paulinho Serra não contará mais uma maioria qualificada, até porque mesmo a maioria absoluta já estaria comprometida.  

Santo André respira por aparelhos quando o georreferenciador de sentimentos é o Paço Municipal.

Não é de hoje, aliás, que o Paço Municipal entrou num roteiro informal de atração turística sensorial masoquista para quem aprecia a degradação do Poder Público. Vem de longe.

É possível dimensionar o estrago histórico. Basta imaginar o que seria o resultado de uma pesquisa que colocasse à escolha única 10 alternativas de instituições públicas e privadas cujos valores foram impactados pela inoperância funcional nos últimos 20 anos. O edifício velho de guerra da Administração no Paço Municipal seria o preferido.

É claro que da lista também deveria constar a sede do Semasa, ali do lado, mais discreta. Quem sabe também o magnífico espaço ocupado pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), também no entorno do Paço Municipal. Nesse caso, basta dar uma verificada nas relações íntimas que une a entidade e o Paço Municipal, seja qual for o prefeito de plantão.

Nem a construção de um túnel secreto ludibriaria o distinto público que não faça parte da Sociedade Servil ou da Sociedade Imbecil.

Outras crises

A Administração de Paulinho Serra é relevante sim na construção dessa simbologia de baixo lustro. Não se pode esquecer que o aumento do IPTU também integra o cardápio de improvisos e despreparos da gestão tucana.

Tenho toda a autoridade do mundo para discorrer sobre o IPTU e o Semasa. E o faço mesmo que pareça cabotinismo.

Sobre o IPTU alertei pessoalmente o prefeito. Escrevi dezenas de artigos. Sobre o Semasa -- cujo escopo de uso patrimonial para sair do encalacramento dos precatórios milionários aprovo publicamente -- insisti no modus operandi ideal, desprezado pelo Paço Municipal.

Também pesa em desfavor do Paço Municipal – e que, portanto, enfeita o caminho da perdição de superar todos os concorrentes como símbolo de negatividade de Santo André nas duas últimas décadas – um triunfalismo econômico sem consistência alguma.

O viveiro industrial deu lugar a atividades de serviços rudimentares, por assim dizer. Nada de novo em dois anos e meio de mandato se cristalizou.

Riscos eleitorais

A crise do Semasa é consequência direta do passado eleitoral do então candidato Paulinho Serra. Ele afirmou categoricamente que não interromperia as atividades do Semasa como ente municipal. Reiterou enfaticamente que promoveria medidas para conhecer a fundo a raiz e os galhos da dívida enorme com a Sabesp. E que os servidores alocados na autarquia não correriam risco de demissão.

Das três medidas anunciadas na campanha eleitoral, só a última foi assegurada com uma emenda da oposição durante a votação do projeto de lei na noite de pancadarias.

Não houve durante a fase preparatória da incorporação do Semasa pela Sabesp nada que denunciasse planejamento estratégico da Administração de Paulinho Serra. Uma montanha de dúvidas se acumulou. Faltou transparência. Faltou didatismo. Levou-se a proposta ao Legislativo como se não houvesse uma voz sequer a discordar. Como se as redes sociais, insisto, fossem ficção, não um elemento, goste-se ou não, muito impactante nas novas relações sociais.

Tragédias anunciadas

Poderia apontar muitas outras inconformidades da Administração Paulinho Serra, como o fechamento abrupto e igualmente nada transparente e informativo de unidades de saúde.

Talvez o prefeito tenha vocação incontrolável de transformar a tragédia em porta de entrada de resoluções que, por advirem de tragédia, não têm o valor correspondente, por mais que eventualmente sejam alcançados.

Os estragos da Administração nos três casos mencionados acima – saúde, IPTU e agora o Semasa – sugerem que não existe fórmula milagrosa à recomposição da imagem.

O que poderia ser a reconstrução com valor agregado, torna-se remendo mal-ajambrado. Ou seja: por melhor que sejam as novas unidades de saúde, por mais que tenha ficado latente a humildade de retroceder no IPTU e por mais que o desencaixe do Semasa do organograma da Prefeitura seja medida inadiável, sobram mesmo no embate entre lucros e perdas um sentimento de frustração.

O resultado final obtido a fórceps causa danos colaterais maiores que os ganhos efetivos para a imagem da Administração.   

A pancadaria no Legislativo, portanto, tem nome e sobrenome. E muitos coadjuvantes que não podem ser considerados protagonistas.



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