Política

Morando versus Marinho: que
peso terá LulaLivre em 2020?

DANIEL LIMA - 25/06/2019

Fale a verdade: você ainda não tinha imaginado algo nesse sentido quando se trata da Eleição do Século no Grande ABC, prevista para o ano que vem, entre o prefeito tucano Orlando Morando e o ex-prefeito petista Luiz Marinho.

Sei que não pensou, mas os petistas que conheço já pensaram. E já pensaram porque a configuração está no horizonte de 2020. O que pergunto com A maior cara de pau do mundo, porque jornalista que não é cara de pau é cara de outra coisa, é o seguinte: qual será a influência de Lula da Silva na disputa, solto esteja. Eis algumas alternativas: 

 Não vai influenciar em absolutamente nada porque o desgaste da imagem do ex-presidente chegou ao fundo do poço e de lá não sairá jamais.

 O melhor é tomar alguns cuidados porque LulaLivre significa algum grau de recuperação da imagem do ex-presidente, porque o povão traduz alguém em liberdade como alguém que não tem culpa no cartório.

 O melhor mesmo é tomar todo o cuidado, porque com LulaLivre o jogo eleitoral do qual ele participar mesmo que indiretamente sempre terá a possibilidade de alguma porção de suspense e emoção.

 Com LulaLivre o prefeito Orlando Morando pode dar adeus à reeleição porque ninguém segura o gênio da política nos palanques e seus efeitos ressonantes na comunidade.

A resposta é de acordo com a preferência eleitoral e o juízo dos eleitores – e também dos leitores.

Jornada decisiva

Francamente, não descartaria a forte influência de LulaLivre nas eleições em São Bernardo. Ele iria para uma jornada exaustiva e potencialmente redentora. Praticamente apostaria o prestígio que lhe resta e o que pode reconquistar na vitória do primeiro-amigo Luiz Marinho, a quem fez ministro de duas pastas e o qual apoiou decisivamente nas duas conquistas no Paço de São Bernardo.

Os petistas que conheço já foram mais entusiásticos do poder miraculoso de Lula da Silva, mas com o LulaLivre é outra coisa, porque carrega o ônus da Lava Jato, goste-se ou não dos procuradores, do Judiciário e da Polícia Federal que atuaram nos casos. Por isso os petistas que conheço preferem uma certa cautela. Mas os olhos brilham.

No fundo, os petistas que conheço entendem que São Bernardo é a cidadela a ser reconquistada como símbolo da ressurreição do PT.

É claro que muita água de especulações, certezas e tudo o mais vai correr sob a ponte das eleições do ano que vem, mas sempre convém lembrar que Luiz Marinho, independentemente de LulaLivre, é um candidato fortíssimo.

Estoque respeitável

Os 25% de votos nas eleições ao governo do Estado mostraram que em São Bernardo há um naco considerável de esquerdistas inconformados. Quem não jogar na lata do lixo o resultado eleitoral de 2016, quando Tarcísio Secoli não chegou a 18% dos votos válidos, está fadado a cair do cavalo. Naquele outubro a Lava Jato estava no auge.

Não se pode esquecer que Orlando Morando tem a máquina à disposição e, também, um peso pesado da política nacional para vestir a camisa tucana até as últimas consequências.

Trata-se do governador João Doria, potencial concorrente às eleições presidenciais de 2022. Ele do sucesso de Orlando Morando um símbolo embora não tão eloquente de que a esquerda não tem vez eleitoral.

LulaLivre versus Doria

O que se pergunta, também, é quem vale mais nas urnas de outubro do ano que vem, um LulaLivre sob condicionantes judiciais ou um João Doria livre, leve e solto em pleno gozo de liberdade política?

O bom mesmo das eleições do ano que vem em São Bernardo será saber qual é a divisão atual do bolo ideológico na Capital Econômica do Grande ABC. A maioria é de direita, centro-direita e centro ou opta mesmo pela centro-esquerda e a esquerda?

Parece que isso ficará nítido quando as urnas se abrirem. Tanto LulaLivre como LulaPreso influenciarão o eleitorado à esquerda do espectro ideológico, enquanto Doria livre, leve e solto o fará à direita.

Tudo isso passará, também, pela conjuntura política e econômica nacional. A perspectiva é de que o PIB reagirá lentamente demais para influenciar o eleitorado. A recessão deixada pelo PT não virará fumaça num passe de mágica.

Identificar esse passivo como ônus petista faz muita diferença nas urnas. Refrescar a memória dos eleitores é importante. Os tucanos sabem disso e por isso mesmo preparariam arsenal de combate sem trégua.

O que quero dizer com isso é que provavelmente em São Bernardo teremos as eleições municipais mais influenciadas pelo ambiente estadual e, principalmente, nacional de todos os tempos.

A presença física ou metafísica de Lula da Silva já é suficientemente forte para deslocar em algum grau o eixo de pregação do estritamente local ou regional.

Tudo bem que a temática municipal, de obras e de zeladoria, vai seguir influenciando mais decisivamente o eleitorado, mas não se sustentaria a ponto de perder força na medida em que a provável introdução de LulaLivre no pedaço sair da teoria para a prática.

Prometi aos leitores que vou escrever muitas análises sobre a Eleição do Século no Grande ABC. E o farei de acordo com eventuais novos fragmentos de tendências.

No caso de LulaLivre, não se trata nem de fragmento. É uma bomba mesmo. Um estouro possível que estaria a tirar o sono do prefeito Orlando Morando. Só não tiraria se o tucano fosse imprevidente. E todos sabem que imprevidente Orlando Morando não é.

Resta saber também até que ponto a ressonância de LulaLivre em São Bernardo se espalhará no Grande ABC. Não adiante dizerem que São Bernardo seria uma ilha eleitoral porque isso não cola. O petismo é um fenômeno político orgânico cujos efeitos se manifestam além de qualquer referência convencional.

São Bernardo e Diadema são as cidadelas mais petistas da região, já comeram o pão que o diabo amassou nos últimos anos e nada indica que vão cavoucar ainda mais o solo para enterrar os chifres. Exceto ocorrências político-criminais estonteantes, fora do horizonte próximo, até porque o auge já parece ter castigado suficientemente o partido, não é improvável que aqui e ali o PT volte a comandar prefeituras na região.

Sem necessariamente me referir às duas cidades mencionadas, não posso contrariar e não devo contrariar o animal de contraditórios que existe em minha alma: da mesma forma que entendo que o surgimento de uma direita, mesmo que uma direita com certo pendor extremista, faz muito bem à democracia brasileira até então a serviço de um esquerdismo abusivo e sem controle, a multiplicidade de legendas antagônicas na direção das prefeituras da região sempre será bem-vinda. Melhor a concorrência do que a reserva de mercado.



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