A Imprensa regional (sobretudo a Imprensa Impressa) continua a ser muito importante no jogo jogado dos caminhos que levam os candidatos aos paços municipais. Mas a Imprensa Impressa não é mais soberana, não dá as cartas como antigamente. E o antigamente no caso vira a esquina do até outro dia, quando a tecnologia portátil entrou na disputa pela consciência e impaciência dos leitores.
Exatamente isso: com o advento da tecnologia digital portátil. Os celulares recheadíssimos de aplicativos cada vez mais populares introduziram nova medida de valor do que se escreve nas plataformas convencionais.
Seria uma bobagem sem tamanho descartar ou minimizar às proximidades do desprezo a força da Imprensa Impressa no Grande ABC na disputa eleitoral de outubro próximo.
Sem retransmissoras locais de redes de televisão, o Grande ABC sempre viveu na escuridão midiática de massa. Mesmo nos tempos em que os jornais locais, sobretudo o Diário do Grande ABC, mais tradicional e estruturado veículo de comunicação local, contava com inserção abrangente na população. Jornalismo impresso não é mídia de massa em lugar algum do mundo. No Grande ABC de tempos já vividos a distância era menor.
Credibilidade e desconfiança
Tanto quanto o Diário, outros veículos impressos de circulação diária sucumbiram em importância política. Mas ainda respiram importância. Até porque, mais e mais se dão conta de que é preciso estar permanentemente em cartaz nas redes sociais.
A logomarca pode ajudar a fazer a diferença entre uma notícia repassada por terceiros sem origem de credibilidade histórica e uma notícia com as digitais do jornalismo profissional.
Tudo isso é verdade, mas não falta o outro lado da moeda de ameaça à credibilidade que muitos omitem ou reduzem o impacto porque não pretendem contrariar interesses.
Da mesma forma que o jornalismo impresso (no caso do Grande ABC órfão de mídias eletrônicas de peso) carrega tonelada de confiança de consumidores de informações, também sofre mais e mais dos efeitos de restrições. Jamais o jornalismo impresso sofreu tantas ressalvas dos consumidores de informações.
Fantasmas e especulações
Logomarcas já não são suficientes no âmbito impresso para assegurar que informações político-eleitorais (é disso que tratamos nesta série de análises) são intocáveis. Por mais habilidosos que sejam os veículos em ações que não coloquem em risco os interesses que supostamente os movem dentro de um arranjo de compensações ou simpatias, para não dizer programas compatíveis com os anseios das publicações, sempre haverá um grande risco a contestações.
Os leitores digitais são mais ávidos por contestação do que os leitores mais conservadores, de papel. Até porque o ambiente das redes sociais leva a um grau de confrontos políticos e ideológicos que afeta diretamente a percepção dos leitores. Da mesma forma que se vê um fantasma de manipulação de determinada publicação, também se vê imparcialidade a toda prova.
Quem acompanha assiduamente grupos de redes sociais no Grande ABC sabe que existe uma guerra nada surda e nada muda. A cacofonia está exposta. Verdades insofismáveis são questionadas por conta da ebulição em torno de candidatos que, em muitos casos, protegem guerrilheiros profissionais e os mantêm vivos e irritantemente manipuladores nas mensagens. Temos a todo instante nas redes sociais um jogo de gato e rato em torno da verdade geralmente assassinada.
Escrutínio editorial
O peso da Imprensa impressa e de desdobramentos digitais no Grande ABC, portanto, está seriamente escrutinado. Os editores de jornais de papel devem estar convivendo diariamente com alternativas de repercussões que tanto levam aos céus como ao inverno.
Uma sequência de manchetes e matérias questionando a atuação de determinado administrador público é comparada e duramente criticada quando vista sob a ótica de que não teria a mesma narrativa em relação a outro chefe de Executivo.
No caso, os dois prefeitos são do mesmo partido e disputam a reeleição. O que sobra de crítica a um poderia sobrar ao outro se determinadas questões fossem igualmente destrinchadas. Os leitores digitais já se aperceberam disso. Por isso, colocam em dúvida o conteúdo do jornalismo impresso.
Jornalismo em crise
Experiências internacionais no campo político-eleitoral indicam que o provinciano Grande ABC seguirá em linha com o perfil que se espalha: o jornalismo impresso precisará se esforçar muito, mas muito mesmo, para convencer o público em geral de que esse negócio de fake news é exclusividade dos usuários de aplicativos; de que o jornalismo impresso é um poço de confiança e exatidão nas informações; e de que o jornalismo impresso é intocável quando se refere à ressonância positiva junto ao eleitorado.
De maneira geral os dados que medem o tamanho da confiança do jornalismo profissional impresso no Brasil são inquietantes aos donos das publicações. Uma recente pesquisa internacional, que contou com milhares de entrevistados no Brasil, teve o cuidado de omitir o percentual que define até que ponto quem lê jornalismo impresso acredita no jornalismo impresso. Mas vazaram dados comprometedores. A confiança da sociedade nos meios de comunicação impressos compete bravamente com os sofríveis números dos legisladores federais.
Rebaixamento de nível
Não cabe, nessa altura do campeonato, discutir quem paga pelos pecadores ou se todos são pecadores. Certo mesmo é que o nível de qualidade do jornalismo impresso em geral flerta permanentemente com o rés do chão. Por mais que os custos de redação sejam cada vez menores por conta de corte de pessoal que se alastra há muito tempo, nada indica que haveria reversão do quadro.
Os custos relativos sobem mesmo quando descem porque as receitas dos jornais e revistas desabam. Grandes conglomerados de comunicação do País vivem situação gravíssima. No ambiente regional não é diferente. Nem aqui nem em Araraquara, São José dos Campos, São José do Rio Preto, onde for. A dependência de recursos públicos dos jornais do Interior de São Paulo, a economia mais forte do Estado mais rico da Federação, é extremamente elevada. E só se agravou com a chegada do mundo digital à mão.
Faço parte do jornalismo regional há meio século. Cinco anos a menos em relação ao dia em que me meti a escrever e a ocupar microfone de rádio, em Araçatuba, Interior do Estado. Vivi os melhores tempos do Grande ABC. Tempos em que uma manchete de primeira página do Diário do Grande ABC, que tratava de um jogo do Santo André no Estádio Bruno Daniel, fazia a diferença de ocupação das arquibancadas e numeradas. Brigava, por conta disso, com chefes de Redação (que um dia também fui) importados da Capital e que por isso mesmo não tinham a mesma sensibilidade e cultura da região.
É claro que tudo mudou. Os tempos são outros. A força de instituições locais esvai-se na medida em que a televisão aberta passou a controlar as atenções de uma área periférica, como é o Grande ABC. Os valores locais foram afetados. E continuam a ser.
Globo na parada
Talvez o que esteja mudando para quem ocupa prefeituras e pretende renovar mandatos é que existe no meio do caminho uma pedra chamada SP TV, da TV Globo, que dedica tempo e espaço a problemas metropolitanos”. Narrativas adocicadas pelo jornalismo impresso da região são desbaratadas pela Globo. Justamente na hora do almoço, em que a dona de casa, formadora de opinião familiar, está de olhos e ouvidos no que lhe interessa.
E nada mais interessa a quem mora numa determinada localidade do que o que se passa nessa mesma localidade. O crime envolvendo um casal homossexual chama a atenção em geral, mas particularmente em São Bernardo e no Grande ABC é alvo de atenção maior. Proximidade gera intimidade.
Está claro que os cuidados com o tratamento a determinadas administrações municipais requerem cada vez mais profissionalismo e engenharia de convencimento. A TV Globo e as redes sociais estão de tocaia. O que em outros tempos ficaria restrito à cobertura jornalística propriamente dita, virou febre de repercussão em plataformas digitais. O alcance da informação é mais profundo, amplo e devastador.
A imprensa de papel do Grande ABC está sob pressão. Quem não se aperceber disso pode aprofundar o abismo que ameaça diferenciar jornalismo impresso de credibilidade e jornalismo impresso de inventividade.
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19/11/2024 PESQUISAS ELEITORAIS ALÉM DOS NÚMEROS (24)