Política

Morando interdita as vias
eleitorais em São Bernardo

DANIEL LIMA - 24/06/2020

Nesta altura do campeonato de probabilidades eleitorais em São Bernardo é difícil aferir -- sem correr sério risco de dar com a cara na porta do equívoco -- quem é a segunda via e quem é a terceira via para a disputa deste final de ano, em 15 e 29 de novembro.  Pode ser que não exista nem uma nem outra alternativa. Ou seja: Orlando Morando pode reinar soberano rumo ao bicampeonato. E quem sabe a novos saltos. Sobremodo em direção à regionalidade que está a dever como principal liderança política do Grande ABC.

O que temos no presente, além do favoritismo de Orlando Morando, é o petista Luiz Marinho como mais provável concorrente à segunda via de baixa aderência, sobretudo depois da anunciada desistência do deputado federal Alex Manente.

O vereador Rafael Demarchi quer pegar carona no ativo conservador do presidente Jair Bolsonaro. Vai ter de competir com Orlando Morando. Com ampla desvantagem inicial.

Tanto Marinho quanto Demarchi parecem pouco competitivos para assediar Morando. Talvez juntos só transferiam o resultado final ao segundo turno. E em segundo turno o jogo só começa empatado em circunstâncias muito especiais. Que não parecem ser o caso de São Bernardo nesta temporada.

Jogando a toalha

Se Marinho e Demarchi já eram pouco competitivos nestes tempos de pandemia, imaginem depois de Alex Manente, adversário menos à esquerda de Orlando Morando, jogar a tolha. Mais que jogar a toalha, Manente abaixou-se para entregar o sabonete a Orlando Morando num ato consensual.

Não acredito muito em composição intensamente produtiva de Alex Manente com Orlando Morando, como foi sugerido, mas isso pouco importa. Composição é comprometimento mútuo.

Mesmo assim, só o fato de sair da disputa e as fotos protocolares ao lado de Morando direcionam o eleitorado de Manente em sentido contrário ao do petista Marinho, com o qual sempre flertou. Mais que isso: muitas vezes fez parcerias.

Seja qual for o ocupante de eventual segunda via precária (que mais pareceria acostamento) e também o ocupante da terceira via (que mais se assemelharia a estrada vicinal) na linha de chegada da disputa em São Bernardo, não restariam dúvidas de que seriam mesmo coadjuvantes se a medição levar em conta o potencial de vitória nas urnas.

Segundo turno

Talvez a maior façanha de Rafael Demarchi seja atrapalhar a vida de Morando, deslocando a disputa ao segundo turno em benefício do PT. É provável que tenha entrado na competição com esse sentido.

Rafael Demarchi repetiria Alex Manente em 2008, na primeira eleição de  Marinho, contra Orlando Morando. Manente fez um acordo que garantiu o triunfo do petista no segundo turno.

Na eleição seguinte, em 2016, com o PT fortíssimo, Orlando Morando nem concorreu. Manente virou adversário protocolar, com derrota mais que esperada no primeiro turno.

Tenho cá comigo sentimento de frustração com o deputado federal Alex Manente. Exceto se fez um acordo com Orlando Morando com vistas às eleições municipais seguintes, de 2026, quando o tucano não poderá concorrer, Manente teria sacramentado uma vocação parlamentar que, por mais esforço que faça, é pífia. Tão pífia quanto todos os demais representantes de fato da região, quer na Assembleia Legislativa, quer no Congresso Nacional.

Façam a lista

Façam uma lista completa de quem já passou pelas duas casas. O que constatarão vai ser algo como uma repetição de mesmices de intervenções subordinadas aos mandachuvas partidários de alto calibre. E olhem que entre os parlamentares da região está inclusive Celso Daniel, alvo de ciumeira quase doentia do também petista Eduardo Suplicy.

Nem mesmo se houvesse de fato a Bancada do ABC, como alguns ilusionistas ainda insistem, os resultados seriam menos decepcionantes. São quase 100 cadeiras que obedecem a cordéis do Palácio dos Bandeirantes. Há um domínio asfixiante do Centrão tão condenado na esfera federal. 

Talvez o deputado estadual da região que ao longo da história foi o mais vitorioso na Assembleia Legislativa seja mesmo Orlando Morando. Ele se aproximou da cúpula tucana com o atrevimento que ninguém pode negar. Tanto que na última reeleição para o cargo foi o terceiro mais votado no Estado de São Paulo.

Entre os mais votados

Com voto distrital puro ou com voto distrital misto, Morando teria garantido a vaga. Ou seja: teve votos suficientes dentro do reduto regional e também Interior afora. Mas, como os demais parlamentares eleitos pelo Grande ABC, jamais convergiu para a regionalidade no sentido mais amplo do tema.

Morando é um municipalista empedernido porque fala mais alto o pragmatismo ante uma farsa institucional chamada Grande ABC. Institucionalidade no caso vale em todos os vetores. Na Economia, então, é uma calamidade. Na pandemia, então, com o Clube dos Prefeitos exala improvisos e oportunismos de décadas.

Resta saber, portanto, se a vocação de legislador de Alex Manente não passou por metamorfose de intenções quando do anunciado acerto de ponteiros com Orlando Morando. Teria Morando e Manente chegado a um acordo de aproximação que vincularia as eleições deste ano ao apoio do tucano ao tradicional adversário quatro anos depois? Não me parece factível. Orlando Morando é mais favorito com Manente quase indiferente, mas o seria também com Manente combatente.

Talvez a perspectiva de ajuntamento circunstancial e estrutural seja uma alucinação. Orlando Morando não estaria interessado em abrir brecha a um concorrente no futuro a ponto de soterrar um sucessor de confiança e, portanto, de passado menos antagônico. 

Se realmente for uma alucinação, o que teria então levado Manente a abrir mão da Prefeitura este ano?

Peso da pandemia

Possivelmente porque reconheceu que não teria possibilidades de vitória. Seguramente porque teria pouco dinheiro para enfrentar a máquina de quem está no poder e também a máquina dos petistas de Luiz Marinho. Terceiro, e principalmente, porque pode ter acertado as armas para, como fez no passado com o PT, contar com o suporte logístico de Orlando Morando nas eleições parlamentares de 2022. Uma quarta alternativa seria chamar alguém que entenda de sabonete.

Ainda há muito terreno a ser capinado até a chegada das urnas com a possível confirmação da vitória de Orlando Morando. Não me parece ajuizado dizer que o tucano cometerá erros letais. Morando não é disso. Somente uma grande besteira o tornaria vulnerável demais junto ao eleitorado.

O desempenho de São Bernardo na pandemia é semelhante ao dos demais municípios do Grande ABC no campo de mortes. Empata com Santo André no número de vítimas fatais. Está um pouco abaixo de São Caetano e Diadema, as duras primeiras colocadas.  Sempre levo em conta a contabilidade correta, que é o total de mortes dividido pelo número de habitantes. Fora isso, é apelação da Grande Mídia, dos manipuladores e dos idiotas de plantão.

Nos braços da Cloroquina

Ainda falta muita coisa a ser aferida e muito se aferirá no futuro próximo, mas nada indica que Morando errou gravemente em nada durante a pandemia. E, a bem da verdade, acertou em cheio ao inaugurar um hospital de verdade, não um hospital de campanha.

Para ajudar ainda mais nas urnas, Orlando Morando se jogou nos braços dos conservadores ao, depois de impactado pelo vírus chinês, sair do hospital com mensagem de suporte cientifico a um coquetel de medicamentos no qual se ressaltavam os efeitos da ideológica Cloroquina. Digam-me quantos tucanos fariam o mesmo sem temer decapitação?

Talvez o que possa fazer da candidatura de Orlando Morando sucesso definidor no primeiro turno seja o afastamento estratégico do governador do Estado. Não há pesquisas disponíveis. Certamente João Doria tem percentual de eleitores que o faria, fosse concorrente municipal, candidato mais forte que os que de fato se apresentam a Orlando Morando nesta temporada. Mas são votos redundantes. Ou seja: Doria perto ou longe não faz diferença na soma. Mas Doria perto, faz diferente na diminuição.

Entregando a rapadura

Por que insisto nesse ponto (já escrevi sobre isso outras vezes), considerando-o bastante relevante?  Porque Morando sabe que não terá os votos da esquerda petista, mas nos demais espectros eleitorais o peso de que dispõe é maior do que qualquer outro adversário.

A centro-esquerda de Manente entregou a rapadura e o centro em direção aos conservadores também olha para o atual prefeito com maior grau de simpatia do que aos demais concorrentes.

Morando está reprovado como prefeito regional, mas como prefeito municipal é inegável que produziu coleção de obras e ações. E teria sido muito melhor se a Economia fosse mais valorizada. Terá provavelmente um segundo mandato para corrigir os dois desvios de rotas que separam prefeitos históricos de prefeitos convencionais.

Luiz Marinho tentou essa guinada no segundo mandato e deu com os burros nágua porque o PT degringolou no País, após a aprovação recorde de Lula da Silva ao sair do governo em 2010. E também porque aparelhou demais o Clube dos Prefeitos com gente que entende quase nada de Desenvolvimento Econômico, mas muito de ideologia vazia.



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