O prefeito Paulinho Serra ganhou uma eleição, pode ganhar a segunda e, vejam só, mesmo assim, não passaria pelo teste das urnas para valer. Teste das urnas no sentido de competição, porque o que tivemos em 2016 foi a homologação de uma obviedade. O PT de Carlos Grana, abatido pela Operação Lava Jato em todo o País, notadamente em São Paulo, não ofereceu resistência no segundo turno porque chegou cambaleando ao fim do primeiro.
Agora, o mesmo PT parece ter fôlego curto, convalescente político-eleitoral que é da Operação Lava Jato. Restaria o quê, então? Ailton Lima, claro. O problema é saber qual Ailton Lima teríamos nas urnas. Isso faz uma diferença e tanto.
Antes de prosseguir e de pegar pelo chifre as eleições municipais de Santo André em novembro, devo dizer que até o último minuto do segundo tempo estava em dúvida se escrevia hoje sobre política ou sobre economia.
Tenho um entrecruzamento temático que envolve o Desenvolvimento Econômico do Grande ABC sobre o qual acho a abordagem quase emergencial.
Borrascas econômicas
Decidi deixar para amanhã o futuro das montadoras de veículos da região e condicionantes da reforma tributária que vão mexer com as finanças públicas municipais. Teremos, antecipo desde já, duas potenciais borrascas. Como se o comportamento da economia da região neste século não fosse um desastre adicional aos desastres das duas décadas finais do século passado.
A Volkswagen do Brasil está em todas as manchetes de hoje para não me deixar na mão de agenda obrigatória. Vem coisa bravíssima por aí.
O vírus chinês vai ter efeitos múltiplos na indústria de transformação, cuja participação relativa é o dobro na região em relação à média nacional.
Quando a Volkswagen sempre discreta na área de recursos humanos bota a mão na testa em sinal de preocupação, creiam que muitos bolsos se esvaziarão no operariado regional.
Quem acha que chegamos ao fundo do poço das montadoras locais com o fechamento da Ford no ano passado está muito enganado. Nossa competitividade automotiva está fazendo água desde antes da virada do século. Só os fanáticos não enxergam.
Destino ajuda
Feito o reparo, vou direto ao ponto mesmo sabendo que tem gente inescrupulosa, maldosa, mau-caráter e tantas outras coisas que confunde jornalismo com relações públicas.
Jornalista que mete na cabeça que a individualidade de pessoa física termina quando começa a dedilhar um texto é jornalista de verdade. Não faz média requentada. Não produz cada parágrafo para necessariamente agradar e arrumar uma boquinha mais adiante. Jornalismo exige sacrifícios e uma dose suplementar de paciência contra os detratores.
Pois o que quero dizer é que o destino está colocando diante do candidato Ailton Lima uma dupla oportunidade favorável para tornar-se candidato competitivo nas eleições em Santo André.
Primeiro, a possibilidade de trocar um incômodo e contraproducente companheiro de chapa, o ex-prefeito Aidan Ravin.
Segundo, contar com o reforço televisivo do candidato à Prefeitura de São Paulo, Márcio França, quase-governador nas eleições vencidas por um João Doria na garupa de Bolsonaro.
Revisando parceria
A parceria com Aidan Ravin precisa ser revista porque o ex-prefeito foi abatido politicamente por dois golpes sincrônicos: o vírus chinês o colocou a nocaute por mais de dois meses e vários meses seriam necessários para recompor a massa muscular e a saúde.
Além disso, ou sobreposto a isso, o escândalo do Semasa instalou Aidan Ravin numa lista de condenados em primeira instância a quase duas décadas de prisão. Qualquer condenação já seria bombástica. Mesmo em primeira instância. Eleições não respeitam gradualismo judicial.
Tanto uma situação quanto outra representam pesadíssimos contratempos à candidatura de Ailton Lima. O mundo da política não perdoa deslizes. Principalmente nestes tempos de redes sociais de voluntários, de cidadãos e também de profissionais em difamação, muitos dos quais a soldo dos poderosos de plantão. Gente que não se alista para combater o vírus chinês em forma de exército de comissionados nas ruas, mas que é boa de briga digital.
Gargalo eleitoral
O pior tipo de jornalismo que se pode praticar, entre outras razões porque impediria a sociedade de ser informada, é esconder os problemas do ainda parceiro eleitoral de Ailton Lima. Aidan Ravin é um gargalo ao sucesso eleitoral. Com ele tudo será mais difícil.
A pandemia retirou Aidan Ravin de cena por longa jornada e o impedirá de ir às ruas esbanjando o carisma que o catapultou à Prefeitura de Santo André num mandato mais que complicado.
E Marcio França representa elo importante com o eleitorado conservador de Santo André. Ao apoiar Jair Bolsonaro e ao já expor essa posição em todas as entrevistas (e o fará no programa eleitoral de televisão de forma mais contundente), Marcio França dá aval importante a Ailton Lima. Sobretudo, também, porque fará de João Doria (tucano como Paulinho Serra) alvo preferencial de críticas. Márcio França é aquele tipo de político que transmite credibilidade. É da velha escola de Mário Covas.
Mulher no páreo?
Não teria receio algum de dizer nestas alturas das eleições que Marcio França é muito mais reforço eleitoral do que Aidan Ravin. Aliás, a comparação chega a ser despropositada. O ex-prefeito carrega, como disse, dois ônus de vulnerabilidade e transmissibilidade a Ailton Lima.
Acredito que há nas hostes do prefeito Paulinho Serra uma torcida imensa para que Aidan Ravin seja homologado companheiro de chapa de Ailton Lima. O que os tucanos de Santo André menos querem é que o ex-prefeito seja substituído.
Como escrevi recentemente, Denise Ravin poderia encorpar a candidatura de Ailton Lima na medida em que, além da questão de gênero e de sobrenome menos suscetível a objeções, também transpira empatia. Bem articulada, afável, Denise Ravin é tudo que Paulinho Serra não quer como adversária na chapa de Ailton Lima. Atacar uma mulher pelo parentesco é politicamente pouco apreciável.
O que me pergunto é como a candidatura de Paulinho Serra vai se virar na reta final de campanha sabendo que de alguma forma e se fizer tudo direitinho, o adversário Ailton Lima terá o reforço televisivo de Márcio França na mensagem de que ele, Ailton Lima, está pronto para receber a maior parte dos votos dos eleitores de um Jair Bolsonaro em crescimento de aprovação?
Custo do governador
Mais que isso, porque isso é apenas a metade da laranja de complicações: como Paulinho Serra, que desfilou durante muito tempo João Doria como inspiração, vai fazer para se afastar de um governador muito mal avaliado pelo eleitorado, de modo a não contaminar Santo André?
Tudo isso significa que a disputa eleitoral em Santo André (que tem a participação complementar das esquerdas representadas pelas candidaturas da petista Bete Siraque e do psolista Bruno Daniel) é uma espécie de jogo de erros.
Quem cometer menos deslizes poderá ser beneficiado nas urnas. E cometer menos erros significa desvencilhar-se, de imediato e ao longo da jornada preparatória, de evidentes arestas.
Nesse ponto, Ailton Lima leva vantagem. Os equívocos estão tanto à mostra à eliminação. Paulinho Serra terá a imagem de João Doria como espantalho a afugentar eleitores menos municipalistas.
Ainda não tenho certeza de que estaria definida a sorte dos finalistas em Santo André. É certo que Paulinho Serra estará no segundo turno e que Ailton Lima seria o potencial concorrente.
Adversário poderoso
Entretanto, se o ex-secretário de Paulinho Serra deixar-se levar por qualquer tipo de sentimentalismo, poderá arriscar a própria passagem ao segundo turno. O que facilitaria tremendamente a vitória de Paulinho Serra no turno final contra um PT ainda convalescente. E que, junto com o PSOL, deverá aproximar-se de 30% dos votos válidos, espécie de teto na temporada. Cinquenta por cento acima do registrado há quatro anos.
No fundo, duvido que o afastamento diplomático de Aidan Ravin e a escolha de Denise Ravin para compor a chapa não sejam a solução já delineada para reforçar a candidatura de Ailton Lima. Até porque são medidas implícitas à competitividade.
Tudo indica que desta vez Paulinho Serra terá de enfrentar um candidato relativamente poderoso. O jogo não seria mais um amistoso em que, como o foi em 2016, o adversário entrou em campo com apenas sete jogadores, e, dessa forma, foi abatido sem dificuldade alguma.
Tanto que o apoio do mesmo Ailton Lima a Paulinho Serra no segundo turno tornou-se extravagância que nem mesmo garantiu a maior vitória de um concorrente à Prefeitura de Santo André na história, troféu ao que parece imbatível de Celso Daniel.
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19/11/2024 PESQUISAS ELEITORAIS ALÉM DOS NÚMEROS (24)