Política

Qual será mesmo o peso do
vírus chinês nas eleições?

DANIEL LIMA - 21/10/2020

Tenho uma certeza absoluta sobre os efeitos do vírus chinês nas eleições municipais no Grande ABC no mês que vem. Estou convicto de que não tenho certeza alguma que possa ser catalogada como análise segura. Nove meses depois de estragos humanos e econômicos consideráveis, mas numa toada de refluxo, a pandemia deixa um saldo de muitas interrogações.  

A ideia central de que a pandemia poderia ser fator relevante parece descartada. A convicção de que o eleitorado não daria qualquer importância ao vírus chinês nas urnas também é pouco consistente.  

Tudo que escrever em seguida que deixe de considerar a fragilidade de eventuais ponderações deve ser visto pelo leitor e pelo eleitor com desconfiança.  

Considerem que houve erro de interpretação não-intencional. As premissas estão solidificadas em quatro grupos temáticos, mas os desdobramentos devem ser vistos com restrições. Há subjetividades latentes.  

É impossível não considerar pelo menos quatro dimensões do vírus chinês às próximas eleições municipais na região: 

 Geografia 

 Mídia 

 Economia 

 Sociedade  

Poderia citar mais um aspecto, talvez de relevância encaminhadora à retirada de muitas interrogações, mas como se trata de algo que foge à normalidade, é melhor não colocar na alça de mira.  

Trato especificamente do vetor criminal, de abusos financeiros cometidos durante a pandemia por agentes públicos e privados.  

Já há farta documentação a respeito, que pega a Fundação do ABC e a Prefeitura de Santo André no contrapé. Entretanto, como tudo parece bovinamente controlado para evitar maiores transtornos, não levo isso em conta.  

Prefiro, portanto, me ater aos quatro vetores listados. E vou ser breve em relação a cada um para sedimentar a convicção de que tudo é muito pouco luminoso sobre os efeitos eleitorais da pandemia na região.  

 Aspectos geográficos 

A intensa interação socioeconômica interna no Grande ABC e no conjunto metropolitano, sobretudo em relação à dominante Capital, com a qual mantemos relações culturalmente de servilismo expressas no que batizei de Complexo de Gata Borralheira, coloca as eleições municipais locais sob condicionantes sensoriais.  

Quero dizer que o ambiente municipal e o ambiente regional desse bicho de sete cabeças acusam o contágio específico da metropolização de fatores diversos. A percepção específica dos estragos ou dos acertos no combate ao vírus chinês perde sustentabilidade. As ações municipais sofrem desgaste avaliativo. O específico perde espaço crítico para o abrangente. 

 Aspectos midiáticos 

A profusão de endereços de papel e digitais dos meios de comunicação no Grande ABC não compensa o domínio avassalador dos meios de comunicação da Capital. Essa barafunda informativa que mistura as estações do local, do regional e do nacional, além do internacional, traça um jogo de imprecisões cumulativas à interpretação dos fatos. Inclusive com o carregamento político-partidário destes tempos de polarização.  

Não bastasse a proliferação de veículos de comunicação, as redes sociais estão também na linha de frente na condução a um estágio de conflitos informativos que edificam convicções e dúvidas.   

A subalternidade midiática do Grande ABC no ambiente proporcionado pelo Coronavírus é, portanto, fator de dispersão que compromete a avaliação geral do quadro por fontes tradicionalmente confiáveis, ou menos suspeitas.  

Não bastasse tudo isso, as mídias de papel e eletrônicas do Grande ABC perderam em larga escala a capacidade de observar com criticidade as ações da administração pública e dos agentes privados.  

Vivemos ambiente de oficialidade midiática que deriva a muita omissão. Alguém que não tenha conhecimento algum sobre a dinâmica social do Grande ABC e que se vê obrigado a detectar os efeitos do vírus chinês nos sete municípios, provavelmente se imaginará vítima de grande engodo.  

Basta que passe a mão na coleção de jornais de papel e virtuais que trataram do Grande ABC durante os últimos meses e despreze os gráficos de apontamentos dos casos fatais.  

A distância entre o noticiário e o que se vê nos números quase sempre escondidinhos é inversamente o tamanho das relações entre as partes. Uma região que se aproxima celeremente de 100 mortes para cada 100 mil moradores, um dos maiores índices mundiais, é tratada pela mídia regional com naturalidade estonteante. Aos desavisados, somos um oásis de competência no enfrentamento ao vírus.   

 Aspectos Econômicos 

O Grande ABC vive há tanto tempo ouvindo o batuque de mortalidade econômica em forma de deserções industriais e rebaixamento do universo de emprego formal do setor que por pior que seja, a andorinha do vírus chinês não faz verão de grandes impactos.  

É claro que as vísceras da pandemia estão em cada quarteirão em forma de estabelecimentos comerciais e de serviços fechados. Entretanto, sob o ponto de vista de custo à imagem do prefeito de plantão em cada Município, o efeito será praticamente nulo, por mais que tenham seguido – e em seguida rompido -- o ritmo camicase do governador do Estado.  

 Aspectos sociais  

O efeito do vírus chinês nas eleições municipais da região sob aspectos sociais está condicionado às repercussões midiáticas, geográficas e econômicas. É muito pouco provável que no conjunto da obra de percalços haja consenso sobre o prevalecimento do peso ponderado da pandemia nas urnas de 15 de novembro.  

O que quero dizer com isso é que, entre tantos vetores que influenciam o voto (partidarismo, economia, infraestrutura física, infraestrutura social, zeladoria, grandes obras, redes sociais) o impacto do vírus chinês isoladamente não teria prevalência na hora do vamos ver das urnas.  

Portanto, a hierarquização de fatores que determinam a escolha de candidato ao posto de prefeito não teria, provavelmente, o vírus chinês como elemento excepcional. Até porque, convenhamos, a queda sistemática de óbitos favorece a movimentação dos fatores relativos.  

Até recentemente, mesmo com condicionantes, o vírus chinês subia o elevador de influência eleitoral. Agora, parece descer intensamente numa região com as restrições mencionadas acima à captação da atmosfera de problemas gerados pelo intruso epidêmico.  

O ajuntamento de fatores geográficos, midiáticos, econômicos e sociais forma massa bruta do vírus chinês desafiadora a conjecturas que alterem significativamente o ambiente tradicional de projeções eleitorais num território com as especificidades da região, periferia da maior capital do País.   

Seria capaz de jurar por todos os juros, sempre com o cuidado de dizer que não tenho certeza sobre nada (ou seja, que me moveria num terreno pantanoso em termos de racionalidade) que o vírus chinês não afetará expressivamente a ordem das coisas em novembro.  

Teria, claro, alguma influência, como tantos outros quesitos do balaio de gatos que definem o candidato da preferência de cada morador. 

A exceção, repito, é que algum caso de farra com o dinheiro público destinado à pandemia seja levado à chamada Grande Mídia, como consequência de alguma operação da Polícia Federal que desemboque em prisões e tudo o mais quase rotineiro no País desde a Operação Lava Jato.  

Algo improvável no Grande ABC, área mais que protegida pela pouca importância política no cenário nacional. Estamos para o Brasil assim como Rio Grande da Serra está para o Grande ABC. Não somos quase nada junto à Grande Mídia e às autoridades legais.



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