Administração Pública

MP veta Cicote e acaba com a
guerrilha na Fundação do ABC

DANIEL LIMA - 26/03/2021

Almir Cicote não pediu demissão voluntária do comando da Central de Convênios da Fundação do ABC, como alardeou ontem aos quatro cantos. O ex-vereador de Santo André, indicado pelo prefeito Paulinho Serra para comandar o caixa-forte da Fuabc, foi vetado pelo Ministério Público. Cicote, na avalição da Promotoria de Justiça de Fundações, não tem qualificações técnicas para ocupar um cargo de tamanha importância na área de saúde.  

A decisão do Ministério Público Estadual em Santo André acaba pelo menos temporariamente com a guerra de guerrilhas na Central de Convênios por conta de uma premissa que já não tem mais valor de face: o Diretor-Geral daquele departamento não conta mais com a mesma força político-administrativa da presidência. A hierarquia precisa ser respeitada.  

Se em outros tempos a farra do boi da equalização de poderes entre as prefeituras de Santo André, São Bernardo e São Caetano era a regra geral, independentemente da valoração organizacional dos cargos, com o MP na parada, supervisionando tudo, as regras são outras. Ou seja: as regras serão obedecidas.  

Caindo do andaime  

Almir Cicote caiu do andaime da impetuosidade com que ocupou o cargo na Central de Convênios por dois motivos que se cruzam: o ambiente de turbulência que levou à corporação, atuando com voluntarismo típico de quem se sentia intocável, indicado que fora pelo prefeito Paulinho Serra, e o respeito ao regramento estabelecido pela Promotoria de Justiça de Fundações em Santo André. 

CapitalSocial conta com cópia do documento expedido pela Promotora de Justiça Ana Carolina Fuliaro Bittencourt, em 19 de março. A demissão supostamente voluntária de Almir Cicote foi registrada ontem. Ele tentou uma saída honrosa. Desconsiderou a possibilidade de vazamento do documento do MP. Jogou um jogo de faz-de-contas para preservar a imagem. Poderia ter sido transparente. Não o foi porque o custo político de uma nomeação que deu com os burros nágua da legalidade é um ônus para o prefeito Paulinho Serra. Preservar a Administração de Santo André é uma questão de lealdade.  

TAC selecionador  

A barreira legal que retirou Almir Cicote da Central de Convênios da Fundação do ABC é o artigo sexto do TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado entre o Ministério Público do Estado em Santo André e a organização tripartite responsável pelo atendimento à saúde: 

 O corpo dirigente da FUABC, além do cumprimento das condições estabelecidas no artigo anterior, deverá apresentar experiencia comprovada em gestão, compatível com a natureza de função a ser exercida. Parágrafo 1º -- A seleção dos dirigentes da Fuabc será baseada, no mínimo, em critérios técnicos, comprovados por análise de currículo profissional e entrevista. Parágrafo 2º - o procedimento de seleção dos dirigentes da Fuabc deverá ser formalizado e conter, necessariamente, a motivação do ato da contratação. 

Quando o artigo sexto se refere “ao artigo anterior”, no caso o artigo 5º, o texto é o seguinte: 

 Não poderão integrar os órgãos de deliberação e direção da Fuabc as pessoas que foram condenadas, em segunda instância, pela prática de atos contra a Administração Pública, de improbidade administrativa ou corrupção. Parágrafo único: a condenação de que trata o caput refere-se às esferas administrativas, cível e criminal. 

O documento do MP também contempla outros artigos e parágrafos. 

 Artigo 7º -- Para fins de aferição das condições estabelecidas nos artigos 5º e 6º, deverá o profissional apresentar, no momento da contratação, todos os documentos comprobatórios. Artigo 8º -- Na composição dos órgãos de deliberação e direção da Fuabc serão observadas as regras que vedam o nepotismo, resguardada a ampla defesa. Parágrafo único: para efeitos deste instrumento, considera-se nepotismo a nomeação de cônjuge, companheiro, parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive de profissional com atribuições de deliberação e direção na Fuabc.  

Para o MP, “a nomeação ao cargo de Diretor-Geral da Central de Convênios, portanto, deve necessariamente pautar-se, dentro outros requisitos previstos no TAC, em critérios técnicos, comprovada a experiência em gestão e compatibilidade do currículo com a peculiar característica do cargo, voltado à gestão de inúmeros instrumentos de execução dos serviços de saúde pública (gestão do SUS).”. E prossegue: “No encerramento daquela manifestação ministerial, o Conselho Curador foi orientado a analisar o mérito da indicação do candidato, atentando-se aos termos do TAC e às circunstâncias de que, como qualquer ato administrativo, a decisão adotada pelo colegiado deveria ser motivada, com enfrentamento das ponderações trazidas pelo Ministério Público. 

Decisão do MP  

Os trechos mais importantes da manifestação da promotora de Fundações do Ministério Público no documento enviado à direção da Fundação do ABC, que veta a indicação de Almir Cicote: 

 No entanto, a deliberação do Conselho Curador não comporta fundamentação condizente com o cumprimento do artigo 6º do TAC. Na verdade, a ata submetida à análise desta Promotoria de Justiça não traz qualquer debate sobre a compatibilidade do currículo e experiência profissional do candidato às funções do cargo de Diretor da Central de Convênios – unidade mantida pela Fuabc, responsável pela gestão de diversos equipamentos e serviços do SUS. Sobre esse assunto, cumpre esclarecer que experiência em gestão não se confunde com experiência em gestão de saúde pública. Há dificuldade, portanto, em compreender a decisão do Conselho Curador sob o prisma de uma escolha baseada em critérios técnicos, tal como exigido pelo TAC.  

Mais decisão do MP 

 Ainda que se adote o entendimento de que o candidato apresenta experiência em gestão pública, quer por sua atuação como presidente da Câmara de Vereadores quer como Superintendente do Semasa, não há qualquer atividade exercida por ele na área de gestão em saúde pública. O que se percebe da leitura da ata é que essa falta de experiência de gestão em saúde pública foi reconhecida pelo próprio candidato e por integrantes do Conselho Curador – circunstância que foi revelada pelo argumento de que tudo se pode aprender. De fato, o candidato tem inteligência e capacidade para aprender o que for de seu interesse, mas não se pode ignorar que, na área de gestão em saúde pública, não há tempo para aprender, principalmente quando estamos em meio a uma pandemia da Covid-19. A deliberação do Conselho Curador não pode estar desconectada com a realidade e deve ser contextualizada. O dirigente de qualquer unidade de saúde, nos dias atuais, tem, obrigatoriamente, que entender de gestão em saúde, sob pena de prejuízos incalculáveis na execução do serviço – trata-se de atenção ao direito à vida de usuários do SUS. Infelizmente, não há tempo para aprender gestão em saúde pública em meio ao caos pandêmico em que estamos inseridos.  

Mais MP 

 Pertinente esclarecer que não é demérito do candidato não ter experiência de gestão em saúde. É notória sua experiência em demais áreas de conhecimento e trabalho. Contudo, as funções exercidas pelo cargo de Diretor Geral da Central de Convênios – gestora de vários serviços e equipamentos de saúde pública – demanda currículo compatível. Em reforço, destaca-se que a área de gestão em saúde tem suas peculiaridades, lida com sucessivas urgências e qualquer falha de gestão pode comprometer a execução do serviço de atendimento à saúde dos usuários do SUS, notadamente, repita-se, nessa época de agravamento da pandemia. Pelo exposto, o Ministério Público entende que o artigo 6º do TAC não foi observado pelo Conselho Curador da Fuabc no caso em apreço. Considerando que o conteúdo da Ata 13/2021 da Reunião Extraordinária do Conselho de Curadores contraria o disposto no artigo 6º do Termo de Ajustamento de Conduta, ela não é aprovada por esta Promotoria de Justiça.  



Leia mais matérias desta seção: Administração Pública

Total de 813 matérias | Página 1

15/10/2024 SÃO BERNARDO DÁ UMA SURRA EM SANTO ANDRÉ
30/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (5)
27/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (4)
26/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (3)
25/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (2)
24/09/2024 Quem é o melhor entre prefeitos reeleitos? (1)
19/09/2024 Indicadores implacáveis de uma Santo André real
05/09/2024 Por que estamos tão mal no Ranking de Eficiência?
03/09/2024 São Caetano lidera em Gestão Social
27/08/2024 São Bernardo lidera em Gestão Fiscal na região
26/08/2024 Santo André ainda pior no Ranking Econômico
23/08/2024 Propaganda não segura fracasso de Santo André
22/08/2024 Santo André apanha de novo em competitividade
06/05/2024 Só viaduto é pouco na Avenida dos Estados
30/04/2024 Paulinho Serra, bom de voto e ruim de governo (14)
24/04/2024 Paulinho Serra segue com efeitos especiais
22/04/2024 Paulinho Serra, bom de voto e ruim de governo (13)
10/04/2024 Caso André do Viva: MP requer mais três prisões
08/04/2024 Marketing do atraso na festa de Santo André