Administração Pública

João Doria derrota defensores
de falso metrô e garante BRT

DANIEL LIMA - 21/05/2021

O governador João Doria passou por cima de caciques políticos e assemelhados instalados principalmente em Santo André ao substituir o monotrilho de maracutaias submersas e adotar como objetivo pragmático o sistema BRT de transporte, que ligará parte do Grande ABC a ramais do metrô da Capital. A vitória de Doria, como se verá adiante, é uma vitória dos consumidores e uma nova derrota à baixíssima competividade do Grande ABC.  

O mais interessante de tudo nessa nova rodada política é que os fundamentalistas em defesa do monotrilho (vendido ordinariamente, sistematicamente e despudoradamente como metrô, para enganar o distinto público) agora se perfilam em apoio ao governador do Estado.  

Como a sociedade consumidora de informações não se liga para valer nas entrelinhas, quando não nas manchetes de jornais, tudo o que está aí em forma de futuro em termos de mobilidade urbana parece combustão espontânea, mas não é.  

Trata-se de enxadrismo político, econômico e assemelhados. Doria quebrou as pernas da farra do boi de desapropriações milionárias demandadas pelas obras do monotrilho que virou metrô na subjetividade própria de quem pretende vender gato por lebre.   

Beija-mão 

Não tenho lá muita simpatia pelo governador do Estado, porque, entre outras razões, o considero excessivamente marqueteiro. Fosse menos programado para supostamente satisfazer a plateia, João Doria teria tudo para brilhar nas próximas eleições. Como os profissionais que costuram o modelo de político com as agulhas de certa arrogância, num ar de superioridade ostensivamente artificial, a imagem de João Doria se deteriorou em dissonância com mais acertos que erros na gestão do Estado mais poderoso do País, sobremodo na pandemia do Coronavírus.  

O que se viu ontem em Santo André quando da visita do vice-governador, neotucano e futuro candidato ao governo do Estado, Rodrigo Garcia, foi um beija-mão típico da política, mas com resultados palpáveis. Vem aí para valer o BRT para elevar acelerar a fuga de consumidores da região em direção à Capital.  

Quem acha que exagero ao caracterizar a obra como o que acabei de escrever (fuga de consumidores da região em direção à Capital), deveria ler atentamente o que já escrevi no passado, com base em conhecimento próprio e em estudos da Universidade Metodista. Mas não pretendo voltar àquela temática agora. Vou fazer essa retrospectiva não semana que vem. 

Mercadores imobiliários  

Hoje só quero tratar mesmo da imposição mais que saudável do BRT em substituição ao monotrilho vendido como metrô. Muita casa caiu no meio do caminho das mudanças decididas pelo governador do Estado. Principalmente casas de privilégios imobiliários, de gente que frequenta corredores palacianos e municipais para gozar de privilégios e outras coisas mais. Sempre a dano do erário público. São personagens que a Máfia do ISS da Capital identifica.  

Deu-se muito mal, portanto, quem comprou (e se comprou muito) áreas imobiliárias à base de informações privilegiadas tanto para lançar torres de apartamentos quanto para usufruir de desapropriações milionárias. Houve redução drástica dos valores a ser despendidos. E mesmo assim quem os pagará será a concessionária do projeto, do Grupo Metra, da empresária Bia Braga.  

O sistema BRT vai ser um reforço importante (mais uma aliás) de transporte de massa para quem enfrenta um Grande ABC de baixíssima mobilidade social, como mostrei ontem, mais uma vez, com dados sobre o empobrecimento regional neste século.  

E daí deriva o outro lado da moeda de complicações: quanto mais os consumidores ganharem força de compra ao desfrutarem de uma Capital muito mais atrativa e compensatória, com os nichos de mercado varejista muito conhecidos e explorados, mais o Grande ABC perderá economicamente.  

Tradução: não temos capacidade de enfrentar as ofertas disponíveis na Capital na disputa pelo desembolso consumista. Sofreremos evasões de divisas, por assim dizer. Da mesma forma que, para superar a escassez de emprego de qualidade na região, a fuga de cérebros é constante na região.  

Mais de um terço da População Economicamente Ativa do Grande ABC trabalha na Capital. Não é pouca coisa. Muitos desses desertores vão encontrar à disposição mais uma opção à mobilidade urbana.  Quem manipula a bobagem de que teremos o reverso da medalha de competitividade comercial e econômica vende ilusões. São borralheiras metidas a cinderelas.  

Rodoanel urbano  

É possível que algum paspalho de redes sociais e mesmo profissionais de imprensa menos escrachados saiam por aí a dizer que este jornalista é contrário ao BRT ou a qualquer sistema de transporte que encurte a distância temporal e física em relação à Capital. Essa estultice não tem tamanho. Só pode ser caracterizada como fake news.  

O que mais uma vez ressalto é que o resultado de nova alternativa de transporte será prejudicial à regionalidade como um todo. Os comerciantes locais vão sentir o peso da debandada facilitada pelo adicional de transporte coletivo disponível. Somos uma periferia consolidada da Capital, um distrito por assim dizer. Empobrecido e alienado politicamente. Na penumbra da Grande Mídia. E tudo o mais que todos sabem.  

Lá atrás, quando se alertou nestas páginas e nas páginas da revista de papel LivreMercado que o trecho sul do Rodoanel seria um presente de grego para a região (por conta das características físico-ambientais) não faltaram apressados e detratores a nos açodar. Perderam feio, infelizmente. 

Como já retratamos em várias análises que levam em conta dados consolidados, os desfalques industriais foram profundos. A Grande Osasco, nada de braçadas com o traçado geral do Rodoanel Mario Covas. Inclusive ao agregar dezenas de empresas produtivas que deixaram o Grande ABC de logística interna abarrotadíssima de nós.  

Pretendia explorar essa vertente de perdas numa próxima edição, mas não custa adiantar alguma coisa para os leitores entenderem a situação. Reproduzo vários trechos da análise que produzi para a edição de 13 de janeiro do ano passado (mais uma sobre o tema) sob o título “Região come poeira da Grande Osasco com Rodoanel”. Leia:  

 Talvez uma metáfora seja a expressão mais didática para o leitor entender o tamanho do prejuízo de competitividade econômica e social que o Grande ABC sofre neste século, especialmente após a inauguração dos trechos Oeste, Sul e Leste do Rodoanel. Virou presente de grego a obra que supostamente, segundo alguns, e o senso comum, seria a libertação econômica da região. Essa é uma conclusão metricamente consolidada ao longo dos anos nesta revista digital, sucessora da revista impressa LivreMercado. O acompanhamento sistemático dos resultados é uma maneira de alertar as autoridades da região que, passa ano, entra não, nada fazem para buscar alternativa à reviravolta provocada pelo Rodoanel. Isso quer dizer que jamais ao longo dos anos houve qualquer preocupação institucional do Grande ABC em contrapor-se às desvantagens causadas pela obra do governo do Estado. 

Mais Rodoanel  

 O Grande ABC foi passado para trás em competitividade e jamais moveu uma palha sequer para exigir reanálise da situação. Nenhuma instituição regional também se deu ao trabalho de sugerir qualquer coisa que lembre ao governo do Estado o significado economicamente desastroso do Rodoanel. Os resultados do PIB dos Municípios, anunciados em dezembro último, alargaram a diferença entre os sete municípios da região e os sete municípios que giram em torno do eixo formado por Osasco e Barueri. 

Mais Rodoanel  

 O PIB dos sete municípios do Grande ABC corria a 100 quilômetros por hora em 2002. A velocidade estava muito aquém de outros tempos. A região sofria os efeitos de uma desindustrialização ainda mais aguda durante os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso. O PIB dos sete municípios da Região Oeste da Grande São Paulo, que tem Osasco e Barueri como principais endereços, corria em velocidade inferior. A 72,37 quilômetros por hora. Ou seja: a vantagem do carro do Grande ABC era de 27,63%. Uma diferença que já fora muito maior até os anos 1990, quando a região de Osasco-Barueri começou a reagir. Principalmente porque já se anunciava a chegada do Rodoanel. Quando a obra começou justamente pela Região Oeste, o desastre do Grande ABC se acentuou. Com a inauguração, o desastre veio em forma de bólido. 

Mais Rodoanel  

 No mesmo 2002, quando os dois veículos corriam em velocidades diferentes, era inaugurado o Trecho Oeste do Rodoanel Mario Covas. A serpentina de mais de 170 quilômetros no entorno da Região Metropolitana de São Paulo segue inacabada. Só deverá fechar o circuito em dois anos. Falta o Trecho Norte. O Trecho Sul, principalmente, que abrange o Grande ABC, foi inaugurado apenas em 2010. Depois veio o Trecho Leste, menos importante logisticamente para a região, inaugurado em 2014. O que houve nos 15 anos subsequentes já medidos, ou seja, entre 2003 e 2017, tendo 2002 como referência de velocidade, comprova a tese de uma minoria sufocada que alertou sobre os riscos de o Rodoanel virar um bumerangue para a economia do Grande ABC. 

Mais Rodoanel  

 Os municípios ficariam mais expostos à competição logística assimétrica de outros endereços, notadamente no entorno da Capital, quer rumo à Baixada Santista, do Porto de Santos, quer rumo ao Interior do Estado. O Rodoanel do Grande ABC teria apenas três alças de acesso. E mesmo assim tangencialmente ao território regional. O Rodoanel de Osasco e vizinhança esticaria os braços rumo a 13 alternativas de acessibilidade. Uma versatilidade e tanto. E com traçado mais ao centro dos municípios. O chamado Custo ABC, expressão cunhada pelo empresário e líder empresarial Fausto Cestari, poderia desnudar as deficiências locais de forma contundente na disputa por espaços de produção e de produtividade contra o traçado da Região Oeste. Os triunfalistas de plantão não admitiram a advertência. Como disse Fausto Cestari, nem tudo que é bom para o Brasil e para o Estado de São Paulo é necessariamente bom para o Grande ABC. 

Mais Rodoanel 

 O Rodoanel é um caso clássico de tiro que sai pela culatra. O passivo do pioneirismo industrial da região, com as especificidades conhecidas, entre as quais o movimento sindical de viés socialista, acrescentava dificuldades. Os custos trabalhistas e do valor do metro quadrado de terreno também. A Região Oeste de Osasco e tantos outros municípios agradece a disputa desigual que se estabeleceu. Uma nova era de desindustrialização do Grande ABC iniciara-se ou aumentava o volume com o trecho Oeste tão próximo. O PIB dos Municípios de 2017, que acabou de sair do forno do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) é mais uma vez cruel com o Grande ABC. Numa comparação ponta a ponta, de janeiro de 2003 a dezembro de 2017, o PIB Geral do Grande ABC avançou em termos nominais apenas 202,23%. Já o PIB Geral da Região Oeste (Barueri, Osasco, Itapevi, Jandira, Pirapora do Bom Jesus, Santana do Parnaíba e Carapicuíba) avançou 447,72%. Isso mesmo: mais que o dobro no confronto com o Grande ABC. Resultado: o veículo do Grande ABC que trafegava a 100 quilômetros por hora ante 72,37 quilômetros por hora dos concorrentes à Oeste da Capital, agora, em 2017, foi ultrapassado há várias temporadas: o carro da Região Oeste trafega a 100 quilômetros por hora, enquanto o veículo do Grande ABC não passa de 76,25. Ou seja: o que era uma vantagem de 27,63% passou a ser desvantagem de 23,75%. 



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