Parabéns ao prefeito de Santo André. O tucano de olho em outra legenda me entregou de bandeja uma grande ideia, que vou explorar nos próximos tempos. Paulinho Serra disse hoje no Diário do Grande ABC uma frase que o coloca diretamente na disputa da Lorota do Século no Grande ABC. Os leitores mais pacientes vão entender do que se trata. É algo mais sério do que parece. Vai além do simples enunciado divorciado de fatos históricos.
A declaração de Paulinho Serra mostra, no fundo, a qualidade intelectual do titular de um dos principais endereços municipais do Estado de São Paulo.
Mais que isso: reforça a ideia de que não está preparado para qualquer tentativa de reorganizar o regionalismo em busca de superação dos problemas econômicos que vêm do passado.
As frases feitas que alguns assessores mais letrados economicamente lhe sopram aos ouvidos são repetidas automaticamente. O compromisso com os fatos e as urgências encontra o proselitismo político como barreira insuperável. O marketing a qualquer custo e principalmente a custo de suposta ignorância coletiva prevalece.
A declaração-lorota
Vamos à declaração de Paulinho Serra e, em seguida, às explicações sobre a disputa do título de Lorota do Século no Grande ABC. Transcrevo o trecho da reportagem publicada hoje pelo Diário do Grande ABC, na página de Economia, sob o título “Estado e Agência de Desenvolvimento Econômico regional fecham parceria”.
Vou me ater exclusivamente à declaração do prefeito de Santo André. O que a Agência vende como novidade não passa de mais um capítulo de politização requentada sem qualquer perspectiva de mudança de rota da economia regional.
Presidente do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC e prefeito de Santo André, Paulo Serra (PSDB) salientou a importância de incluir pautas de inovação para garantir o desenvolvimento regional; “Não só da competitividade, da redescoberta da vocação do Grande ABC, que continua sendo a melhor esquina do Brasil, com uma posição logística favorável, mas que também precisa se reinventar, e a Agência (de Desenvolvimento Econômico) pode ser esse condutor” – sugeriu Serra.
Interesse eleitoral
No interior da grande lorota da temporada dos gestores públicos do Grande ABC subsiste um jogo de intenções eleitorais que agrava a incapacidade de Paulinho Serra ser avaliado como liderança regional. De fato, nem mesmo o é no cenário municipal de infertilidade assustadora.
Paulinho Serra é o queridinho de determinadas mídias da região porque existe uma coalização gataborralheiresca de interesses. Gilberto Kassab, ex-prefeito de São Paulo, é o catalizador do projeto político-eleitoral do grupo de Paulinho Serra. Seu preposto, o superprefeito José Police Neto, é cotado inclusiva à sucessão de Paulinho Serra. Tudo dentro de uma engrenagem em que os interesses reais de Santo André ficam jogados às traças coletivas.
Talvez para os leigos em economia no Grande ABC, Paulinho Serra não tenha dito nada que chocasse. Talvez seja exatamente por isso que tenha dito. Ele imagina que a sociedade como um todo é uma reprodução do que é como agente público no campo da economia – ou seja, uma nulidade, uma mediocridade.
O trecho de uma das frases da entrevista de Paulinho Serra que entra obrigatoriamente no concurso que pretendo fazer para descobrir a lorota do século no Grande ABC é o seguinte, em maiúscula:
(...) DO GRANDE ABC, QUE CONTINUA A SER A MELHOR ESQUINA DO BRASI(...).
Há uma dupla camada na estupidez enunciada pelo prefeito de Santo André e que precisa ser devidamente ponderada.
Dupla jogada
Primeiro, entre todos os obstáculos que afloraram no Grande ABC neste século, embora tenham tido como nascedouro prático a última década do século passado, a logística ocupa a liderança absoluta. Nada é mais complexo e de resolutividade desafiadora à região senão abrandar os estragos que o desprezo ao planejamento do espaço territorial em pontos chaves.
Segundo, Paulinho Serra reproduz literalmente, como se papagaio fosse, uma frase historicamente delirante do então governador paulista, Geraldo Alckmin. A propósito da chegada do trecho sul do Rodoanel e em tom ufanista que tanto agrada a torcida organizada de lideranças regionais, Alckmin declarou aquele traçado uma obra de arte à competitividade regional. Ou seja: Paulinho Serra nem mesmo é original na destemperança intelectual.
Não existe coincidência na repetição da frase do então governador pelo prefeito de Santo André. Além do estilo vaselínico que fez sucesso eleitoral durante muito tempo no Estado, e que não está fora de possibilidades de ressurgimento na próxima disputa, segundo pesquisas eleitorais, pesa o jogo jogado pelo grupo de Paulinho Serra.
Parceria com Alckmin
Uma das composições futuras no sonho de que o titular do Paço de Santo André não fique fora da política efetiva quando o segundo mandato se esgotar é arrumar uma boquinha em eventual gestão de Alckmin.
Ou seja: Paulinho Serra está em plena campanha eleitoral de terceiros que espera que sejam primeiras opções a projetados novos voos políticos. Um direito legítimo, porque quem está na tempestade da atividade pública sabe que a tendência de trajetória sustentável passa por emaranhados de conjecturas. Entretanto, a liberdade de sonhar e de transformar sonhos em realidade não pode ser passaporte à impunidade discursiva, além de outras impunidades convencionais. Numa próxima edição vou submeter aos leitores uma lista das grandes lorotas deste século no Grande ABC. Cometi o desatino de não iniciar o apanhado de besteiragens quando o século começou. Vou me ater ao período mais recente, quando a safra de prefeitos da região contava com Luiz Marinho, Carlos Grana, Paulo Pinheiro, Gabriel Maranhão e os demais. Mais precisamente entre 2009 e 2012, quando criei o Observatório de Promessas e Lorotas.
Uma decepção completa, como se sabe: abundaram tanta uma quanto outra coisa e nada, absolutamente, de concretizações.
Disputa acirrada?
Não posso deixar de antecipar que a lorota de Paulinho Serra, retirada da alma bondosa de Geraldo Alckmin, é fortíssima concorrente ao título máximo. Enfatizar a logística como ponto forte do encalacrado Grande ABC, enfermidade agravada com a chegada do trecho sul do Rodoanel, sobretudo porque é a repetição da barbaridade de um então governador, não é pouca coisa.
Estamos trafegando por uma estrada esburacada de avaliação despudorada, na qual impõe-se o deboche e o desprezo à inteligência regional.
Quando a berço de uma estupidez é reproduzida tempos depois como berço próprio, tendo em vista indisfarçável proposição eleitoreira, qualquer lorota ganha nova tonalidade e dimensões.
Paulinho Serra chegou a um extremo que talvez reproduza o estado de espírito de grandiloquência, arrogância e indestrutibilidade. Está enfeitiçado pelo sucesso eleitoral do ano passado, quando amealhou 48% dos votos disponíveis em Santo André, concorrendo com um Exército de Brancaleones. Celso Daniel, incomparavelmente melhor, conseguiu mais em 2000 e nem por isso deixou de ganhar maturidade analítica.
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15/10/2024 SÃO BERNARDO DÁ UMA SURRA EM SANTO ANDRÉ