Administração Pública

Imposto complicadíssimo

DANIEL LIMA - 10/07/2009

Sabe o caro leitor, por acaso ou por conhecimento, o significado de IPTU?


Acertou tecnicamente quem disse que é Imposto Predial e Territorial Urbano.


Repito: acertou tecnicamente. Se fosse mesmo para ajeitar a bola semântica de acordo com o sarcasmo nacional, uma das modalidades mais praticadas no País, o entendimento seria outro.


Para quem paga, IPTU poderia ser traduzido como Imposto Pretensamente para Tratar de Urbanismo.


Para quem recolhe, no caso as prefeituras, a adaptação de IPTU seguiria na linha de Imposto Providencial para Todos Usufruírem.


Vamos lá, vamos lá, pode ser que nem uma nem outra versão do IPTU agrade, mas o espírito da questão é que deve ser avaliado. IPTU de fato é imposto complicadíssimo.


IPTU é o primo pobre dos impostos municipais, estaduais e federais, porque é o que menos pesa no bolso dos contribuintes, mas provoca uma chiadeira dos diabos.


É um primo pobre metido a novo rico.


Quer ver? O IPTU que o leitor paga é caro ou é barato?


O prefeito José Auricchio Júnior acaba de fazer aprovar na Câmara Municipal de São Caetano o que foi chamado de atualização do metro quadrado dos terrenos, um dos quesitos que sustentam a base de cálculo do tributo que representa na grade da carga fiscal do País não mais que 0,4% do PIB (Produto Interno Bruto). Algo quase inexpressivo, mas que faz barulho danado. Principalmente quando instrumentalizado politicamente.


O que chamam de atualização dos valores do metro quadrado no caso da administração José Auricchio Júnior foi rotulado de assalto ao bolso da classe média durante o governo Celso Daniel, primeiro Executivo da região com coragem de meter a mão na massa da reconstituição dos tecidos arrecadatórios municipais depois da quebra do ciclo inflacionário, logo após a instalação do Plano Real.


Como se sabe, a espiral inflacionária alimentava o dragão do desperdício público municipal e promovia a algazarra do desprezo arrecadatório de tributos locais. Com a estabilidade monetária, caiu a ficha do desprezo às receitas próprias. As receitas financeiras desabaram e as despesas deixaram de ser corroídas pelo desgaste excessivo da moeda.


Não quero sugerir, na comparação com Celso Daniel, que o prefeito de São Caetano está sendo beneficiado pela mídia. Nada disso. Pelo contrário: a modificação instaurada na Planta Genérica de Valores aprovada pelos legisladores deve mesmo ter carga de realidade pragmática.


Essa história de dizer que São Caetano conta com o metro quadrado imobiliário mais valorizado do Grande ABC é muito interessante quando se trata de creditar vantagem aos proprietários, porque especulação não tem limites. Entretanto, esses mesmos beneficiários se esquecem que a recíproca tributária também pode ser verdadeira.


Já escrevi tanto, mas tanto, sobre impostos municipais que quando me deparo com o noticiário voltado à decisão do prefeito José Auricchio Júnior, mais me convenço de que a imprensa de maneira geral tem dificuldade descomunal para tratar o IPTU com profundidade. Em parte, em larga parte, a responsabilidade não é dos repórteres. As prefeituras, sejam quais forem as prefeituras, não explicitam informações básicas para a produção de material jornalístico mais substantivo.


Provavelmente as próprias prefeituras não reúnem nem dados nem cruzamentos de dados monetários, geográficos e socioeconômicos para dar ao IPTU mais que a sensação de que se trata de uma roleta russa fiscal.
São tantos os riscos à avaliação do mapeamento do IPTU num Município que, quem tiver um mínimo de juízo não embarca nas críticas mais ácidas. A recomposição da Planta Genérica de Valores não sustenta o equilíbrio da metodologia introduzida à arrecadação. É preciso descer a detalhes específicos de cada família contributiva, bem como de padrão de imóveis, entre outros pontos. Viram como a operação se reveste de intrincadíssimo novelo?


E o tratamento ao IPTU de áreas de serviços, comércio e indústria então, o que dizer? Quais seriam os critérios mais sensíveis ao equilíbrio empresarial? Alíquotas iguais para atividades econômicas diferentes são a melhor receita? Uma atividade econômica de rentabilidade mais confortável deveria contribuir com IPTU relativamente maior? Ou está certo o IPTU que não distingue quem está ganhando mais, ganhando menos ou mesmo perdendo dinheiro com negócios?


O que seria o IPTU justo de um Município? É correto utilizar-se de política compensatória que desobrigam de pagamento contribuintes de classes sociais populares e, em contrapartida, acrescentar a diferença de valores na conta dos demais moradores de áreas de classe média?


Particularmente acho que sim. Mais ainda quando se sabe que são os pobres e remediados que mais pagam relativamente impostos no País. Quem, entretanto, garante que em bairros de classe média não residam também famílias de orçamentos populares? Principalmente quando se conhece o grau de desmobilidade social do Grande ABC pós-desindustrialização. Ou a quebra do padrão de renda de casais de idosos que viram os filhos formando novos lares.


Os incomodados pelo IPTU mais elevado que se mudem, dirão os pragmáticos.


Viram como é complicadíssimo invadir a grande área analítica do IPTU sem correr enorme risco de chutar a bola da investida completamente longe daquele retângulo de justiça informativa?


O IPTU de qualquer Município brasileiro, sempre tratado com monolítica opacidade informativa pelo Poder Público e com abusada ignorância da mídia, é tremenda roubada para quem se meter em teorias arrecadatórias. Casos esparsos podem ser colhidos aqui e ali para demonstrar supostas injustiças, mas tornar essas situações regra geral não é a melhor solução, ou pelo menos a solução a salvo de contestações.


Independentemente das especificidades que deveriam compor o tabuleiro da baiana do IPTU de cada Município, qual seria de fato a melhor metodologia para medir a aplicabilidade tecnicamente mais justa do imposto, levando-se em conta, sempre, os contribuintes? Que vatapá tributário sugeriria o leitor?


O ranking entre municípios envolvendo a divisão do valor geral arrecadado do IPTU pelo total de residências é a segurança de gestão inteligente de uma administração pública? Ou seria melhor a divisão pura e simples do valor geral arrecadado pela população, chegando-se ao valor per capita?


Nada disso de fato assegura critério de razoabilidade. Um Município pode apresentar receita de IPTU por habitante muito menor que outro mas nem assim se garantiria competência de gestão pública, porque o que pode estar de fato nas entrelinhas é o populismo eleitoral num horizonte próximo, com sacrifício dos recursos públicos potencial e justamente amealhados. O contrário, de receita de IPTU por habitante maior que outros municípios, pode confundir excessos fiscais com eficiência gerencial.


Em matéria de espetáculo para a platéia, o IPTU sempre foi uma arma poderosíssima nos tempos inflacionários. Não é por outra razão, aliás, que médios e grandes municípios recuperam o tempo perdido e nos últimos 15 anos empreenderam fabulosas corridas atualizatórias, elevando substancialmente a arrecadação.


O Grande ABC não foge ao figurino. A pandemia fiscalista que se deu pós-Plano Real atingiu pequenos, médios e grandes municípios. Apenas Rio Grande da Serra (118,81%) perdeu a corrida de correção da arrecadação do IPTU no Grande ABC no período de dezembro de 2007, quando comparado a 1996. O IGP-M (Índice Geral de Preços do Mercado) da Fundação Getúlio Vargas entre janeiro de 1998 a dezembro de 2007 registrou 157,21% de evolução. A arrecadação de IPTU de Diadema foi a segunda que menos avançou no período, e mesmo assim chegou a 225,84%. Os demais foram bem mais acentuados: Mauá (494,65%), São Caetano (433,66%), Santo André (374,03%), São Bernardo (438,92%) e Ribeirão Pires (404,35%).


Quem julgar os administradores públicos que passaram ou estão ocupando a chefia desses municípios levando em conta apenas os percentuais de aumentos entre parênteses incidirá em reducionismo perigoso. Afinal, a base de cálculo de quem mais cresceu, no caso o ano de 1996, talvez seja a mais defasada ao longo dos anos inflacionários.


Viram como é complicado mexer nesse vespeiro?


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