Independentemente de quaisquer outras iniciativas e resultados, o desempenho do prefeito Luiz Marinho como candidato a Marinho Daniel passará pelo que de fato ocorrer no setor automotivo do Grande ABC.
Luiz Marinho é o coordenador do Grupo Automotivo do Clube dos Prefeitos. Dada a importância do setor à estabilidade econômica e social do Grande ABC, o cargo é muito mais importante que o de presidente do Clube dos Prefeitos, ocupado por José Auricchio Júnior, chefe do Executivo de São Caetano.
Resta saber se o Grupo Automotivo não será contaminado por problemas que a Administração Luiz Marinho vem enfrentando, seis meses depois de aportar no Paço de São Bernardo.
Seria Luiz Marinho apenas Luiz Marinho ao final do mandato ou de fato ele chegaria ao estágio de Marinho Daniel?
Estaria Luiz Marinho enredado de tal forma no varejismo administrativo de São Bernardo a ponto de deixar de enxergar macrossoluções?
Até que ponto o staff de influência institucional e administrativa da Prefeitura mais poderosa do Grande ABC atrapalharia a gestão de Luiz Marinho à frente do Grupo Automotivo?
Teria Luiz Marinho discernimento para entender que por mais que a Prefeitura de São Bernardo seja importante, ele não poderá prescindir de agenda automotiva prioritária no dia a dia de movimentos e ações de liderança política de peso no Grande ABC?
Ainda é cedo para conferir à gestão municipal de Luiz Marinho qualquer adjetivação definitiva ou quase definitiva. Seis meses são pouco tempo. Mesmo Celso Daniel teve dificuldades enormes para se consagrar porque a primeira gestão, de 1989 a 1992, não foi exatamente um primor.
A inexperiência gerencial e os solavancos ideológicos trançaram-lhes as pernas. Só a partir do segundo mandato, iniciado em janeiro de 1997, e já refeito de esquisitices esquerdistas, Celso Daniel marcou presença como gestor importante e, principalmente, como liderança regional de respeito. Não é com esse Celso Daniel que Marinho Daniel será confrontado, evidentemente.
Para Luiz Marinho chegar a Marinho Daniel vai ser preciso passar, queira ou não, pela batalha da ponte do Grupo Automotivo, instalado com pompa, circunstância e triunfalismo em março.
Trocando em miúdos: o Grupo Automotivo está para a consolidação política de Luiz Marinho assim como a integração regional esteve para Celso Daniel.
Celso Daniel não conseguiu a plenitude de resultados integracionistas. Mais que isso: encontrou sérias dificuldades políticas, ideológicas, institucionais e administrativas para colocar em prática grande parcela do que concebeu com esfuziante liderança. Entretanto, deixou mais que sementes que, infelizmente, poucos conseguiram fazer germinar. Celso Daniel inoculou no organismo municipalista do Grande ABC o conceito coletivista de Grande ABC. Depreciou a individualidade burra e egocêntrica. Jogou luzes sobre o conjunto. Luiz Marinho precisa fugir do rótulo de corporativismo sindical. O Grupo Automotivo pode ser a resposta de maturidade que todos esperam do titular da coordenação geral.
Ninguém no passado e ninguém no futuro, no âmbito público, exercitou tamanha vocação integracionista como Celso Daniel. Alguns antes e alguns depois o fizeram acentuadamente como objetivo individual, partidário e eleitoral, porções que em Celso Daniel jamais transpareceram prevalecentes.
Luiz Marinho não tem escapatória. Para ser mais que prefeito de São Bernardo, um bom prefeito ou um prefeito questionável, como está sendo atualmente, deverá jogar-se de corpo e alma nas águas da indústria automobilística que tão bem conhece, principalmente do outro lado da mesa de negociações.
Agora Luiz Marinho está sentado à cabeceira. O grau de responsabilidade que detém é muito maior do que, como no passado, lutar pelo salvamento da unidade da Volkswagen em São Bernardo.
A experiência sindical e ministerial, a proximidade com o governo Lula da Silva e a instalação do Grupo Automotivo são elementos inquestionáveis de que não terá desculpa se ao final do mandato como prefeito de São Bernardo a situação do Grande ABC continuar praticamente a mesma — ou, pior dos mundos, se se agravar.
A impressão que os primeiros tempos do Grupo Automotivo sugere é que Luiz Marinho ainda não atentou para uma realidade que os escapistas desconversam, os triunfalistas escondem, os mal-intencionados mistificam e os abusados sequer colocam na agenda regional: São Caetano corre em médio e longo prazos riscos enormes de complicações sociais e econômicas com possíveis consequências que se abaterão em princípio sobre a planta industrial da General Motors.
Mais que isso: os efeitos colaterais dessas complicações sobre o cromossomo regional não devem ser subestimados. Há estragos psicológicos que, ao se avolumarem, debilitam de fato e concretamente a vizinhança.
Tivesse Luiz Marinho detectado de fato a importância do setor automobilístico para o Grande ABC, sobretudo nestes tempos de crise financeira e econômica internacional, já teria anunciado medidas emergenciais para um bom combate. Poderia este jornalista listar pelo menos uma dúzia que, no mínimo, retiraria o estado de vacuidade que atinge o setor.
Os riscos não estão circunscritos a São Caetano da estressadíssima General Motors. São Bernardo também não está livre de tormentas. Muito pelo contrário: com a moeda valorizada e o mercado internacional mais competitivo e protegido, as exportações caíram drasticamente, o que abala, em última instância, o volume de Valor Adicionado, indicador de geração de riqueza. São Bernardo representa 43% de tudo que o Grande ABC produz ao longo de uma temporada.
São inúmeras as alternativas e as possibilidades de Luiz Marinho representar para o setor automotivo o que significou Celso Daniel como agente de integração regional. Resta saber até que ponto se sensibilizará a estabelecer prioridades e metas. Estará preparado para incorporar a atividade de liderança econômica regional à de gestor municipal controverso, principalmente nestes primeiros tempos de uma parte da imprensa que não lhe dá sossego enquanto outra parte o incensa e o glorifica?
Para chegar ao patamar de Marinho Daniel sugerido pelo título desta série que retomo depois de expor vários vetores em janeiro — textos disponíveis neste espaço a qualquer momento –, Luiz Marinho tem o desafio da indústria automotiva a lhe morder os calcanhares administrativos e políticos.
Teme-se que o núcleo duro do poder em São Bernardo, que faz de Luiz Marinho refém de informações geralmente adocicadas e muitas vezes blindadas ao contraditório, não consiga lhe transmitir a urgência temática das montadoras e das autopeças.
Por mais que eventualmente faça em outras áreas de atividades, principalmente no social, por mais que revolucione a administração pública de São Bernardo, Luiz Marinho terá de se destacar, de fato, como grande liderança automotiva do Grande ABC.
Sofremos de doença holandesa da indústria automotiva, tal a dependência da estrutura econômica e social dessa atividade agregadora de riqueza mas também multiplicadora de embaraços. Seria imperdoável que a conjunção de um sindicalista-ministro-prefeito não resultasse em iniciativas inéditas que reconfigurassem o futuro de uma região debilitada pela monocultura automotiva.
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15/10/2024 SÃO BERNARDO DÁ UMA SURRA EM SANTO ANDRÉ