Administração Pública

Paulinho Serra cria Secretaria
de Premiações e Indicadores

DANIEL LIMA - 28/03/2022

À falta de soluções ou encaminhamentos de soluções provisórias ou consistentes no campo do Desenvolvimento Econômico da cidade mais desindustrializada do Estado nos últimos 40 anos, o prefeito Paulinho Serra inova.  

Cuidado com a interpretação do significado de “inova”. Não é o que você estaria pensando. Esse texto carrega a ironia dos indignados.  

Ou você acha que em resposta a tudo o que ocorreu com Santo André desde muito tempo é possível não carregar no peito além do dístico da cidade uma carga pesada de inconformismo? 

Paulinho Serra criou sem que ninguém atentasse o que chamaria de Secretaria de Premiações e Indicadores. O compartimento burocrático não consta do organograma oficial. Por essas e outras deve ser atentamente observado. É uma secretaria invisível aos olhos puros e ingênuos.  

LÓGICA POLÍTICA  

É claro que, de acordo com os projetos políticos do prefeito de Santo André, é mais interessante criar a Secretaria de Premiações e Indicadores do que ceder à lógica de contratar uma consultoria especializada em competitividade econômica para formular planejamento estratégico cada vez mais urgente.  

Se o leitor tiver paciência para acompanhar esta análise (sei que há muitas atrações na praça, de todos os tipos, principalmente notícias fastfoodianas, que não levam a conhecimento algum), vai entender que a Secretaria de Premiações e Indicadores do prefeito Paulinho Serra é uma farsa administrativa muto bem-engendrada. Só faltou combinar com o bom-senso, parente muito próximo da lucidez e irmão siamês da sensatez.  

Os efeitos midiáticos da política de contar ostensivamente com o que não se tem oficialmente alcança credibilidade.  

Nem todo o mundo está preparado para entender que desconfiar de determinadas políticas de comunicação é a melhor terapia, é uma barreira à decepção. 

VELA ACESA  

Trata-se a Secretaria de Premiações e Indicadores de uma farsa incensada pela mídia chapa-branca. O desfecho, em forma de resultados práticos para a sociedade, não passaria de um sopro de vela de aniversário sem força suficiente para que que a fumacinha sobrevenha à chama ainda resiliente. É preciso assoprar mais para ter algum efeito -- mesmo que efêmero.  

Vamos, então, aos fatos. A começar pelo conceito-base que move a Secretaria de Premiações e Indicadores.  

A ordem emanada do prefeito e dos assessores diretos, secretários e entorno político, é industrializar a produção de prêmios e indicadores, filtrando-os de acordo com determinadas especificidades de interesse do grupo.   

Fez-se um alarde extraordinário à homenagem internacional realizada semana passada na Itália. Santo André recebeu o prêmio de Cidade Sul-Americana do Esporte de 2022, em Turim. Paulinho Serra chefiou uma comitiva barulhenta. O prêmio é oferecido pela Aces Europe, entidade ligada ao Parlamento Europeu. 

Agora vamos aos fatos. Escondeu-se no noticiário regional que além de Santo André, também Indaial, cidadezinha de 70 mil pessoas em Santa Catarina, recebeu a mesma homenagem. Igualmente festejada por um grupo chefiado pelo prefeito.  

BAIXA MERITOCRACIA  

Não se deu a informação relevante de que os dois municípios foram indicações políticas, costuradas no governo federal. Há informações seguras de que outros municípios foram convidados a participar da premiação, mas os custos seriam altos demais.  

Mais um aspecto: premiação no sentido qualitativo do verbete pressupõe disputa, concorrência, essas coisas do mundo real. Santo André e Indaial não disputaram a premiação. Negociaram a premiação. Pagaram pela premiação. Não há meritocracia endógena.  

O prefeito Paulinho Serra deveria esclarecer ao distinto público detalhes burocráticos dos custos aos cofres públicos de Santo André. Quem pagou a viagem da comitiva? Como foram as tratativas de bastidores para chegar à Itália? Quem foi o intermediário brasileiro das negociações? Coisas assim.   

SAUDADE DA PIRELLI  

O pior de tudo é que, embora o prefeito de Santo André enfeite o pavão e faça proselitismo em torno do prêmio, a estrutura do esporte de competição e também de lazer há muito está além do que se imaginaria de pior, depois de Santo André contar no passado com a sorte dos investimentos da Pirelli, os quais acompanhei muito de perto, sobretudo nas equipes de voleibol.  

Os tempos são outros, os custos esportivos se elevaram, é impossível contar com mais de duas ou três modalidades de competição, por melhores e mais atuantes que sejam os parceiros empresariais.  

Nos tempos da Pirelli praticamente se tinha todas as modalidades olímpicas. Isso acabou. Mas o prefeito esconde. Prefere a fantasia.  

ORÇAMENTO RAQUÍTICO  

Santo André não tem um case esportivo sequer que possa ser destaque nacional. Quanto mais internacional. E isso não é desonra. É realidade de um Município que se empobreceu e de novas configurações do esporte de competição, muito mais dispendiosos e valorizados.  

Santo André envelheceu tanto que não chega a 10% do orçamento os dinheiros para investimentos em geral. Nos tempos antigos, de Newton Brandão prefeito e Durval Daniel de secretário fiel, passavam de 50%. A máquina pública devora os recursos arrecadados.  

A Secretaria de Premiações e Indicadores deveria se utilizar desse tipo de informação histórica, real, dimensionável, para justificar as dificuldades que encontra na condução do Município. Seria mais inteligente e honesto. 

A prova provada de que o prêmio internacional não passa mesmo de reciprocidade a quem abriu as portas aos vendedores de status está no contraponto de Santo André, a cidadezinha de Santa Catarina.  

ESCONDENDO PARCEIRO 

Não pensem em discriminação no termo “cidadezinha”. Nasci em Guararapes, Interior de São Paulo, que tem metade da população de Indaial.  

Quando se omite no noticiário local que Indaial também participou da festa restrita a quem aceitou negociar os termos da premiação, mais se escancaram as portas de uma engrenagem de marketing de baixo valor.  

Se na categoria de “Premiações” está posto como Santo André se faz de importante sob a administração de Paulinho Serra, no âmbito de “Indicadores” há dois exemplos recentes e, ao que tudo indica, novos casos vão apontar no horizonte. 

Também nos últimos dias deu-se no noticiário que Santo André se destaca em ranking de cidades do Ministério de Economia. Segundo o noticiário, Santo André é o melhor endereço da região e o sexto do Estado em listagem que mede a eficiência na atração de negócios e geração de empregos. Pura fantasia.  

TRIBUTOS E RIQUEZA  

Alguns aspectos pouco destacados merecem registro. Primeiro, o chamado Índice de Concorrência dos Municípios, é uma iniciativa recente do Ministério da Economia e está restrito aos territórios locais com mais de 500 mil habitantes. Nesta primeira temporada foram inscritas 61 cidades no País, entre as quais Santo André.  

A média geral de Santo André alcançou 503,40 pontos. O noticiário não dá conta o que isso significa. Pela lógica, entende-se que Santo André teria ultrapassado levemente metade do caminho máximo de qualificação. Sabe-se que a média nacional (ou seja, dos 61 municípios) é de 473,10 pontos. 

Traduzindo: é um indicador ainda em fase embrionária de definições, restrito a municípios que se inscreveram (a Secretaria de Premiações e Indicadores de Santo André está atenta a tudo que se refere a esse tipo de suposta disputa) e por isso mesmo pouco competitivo.  

COMO CÁGADOS  

Tem seu valor? Claro que tem, mas está a léguas de distâncias do que alardeou o departamento de marketing da Prefeitura.  

Os efeitos econômicos estão muito aquém dos apetrechos burocráticos. Não custa lembrar que nos primeiros quatro anos de Paulinho Serra à frente da Prefeitura o Valor Adicionado (geração de riqueza) se elevou em termos reais apenas 0,6% em média ao ano. Abaixo da média do então prefeito Aidan Ravin, que não foi lá essas coisas, mas foi positivo. Nem pensar comparar com os cinco anos de Celso Daniel. Um andar de cágados. Que o corretor automático não retire o acento diferenciador.  

O que a Prefeitura de Santo André se esmera com a iniciativa premiada é aumentar a arrecadação, longe de ser política de Desenvolvimento Econômico.  

Tanto arrecada mais com o aparelhamento técnico-burocrático que só no quesito de IPTU (custo de morar em Santo André) se elevou em 38,6%. A eficiência pública na maquinaria burocrática é o cerne do ranking do Ministério da Economia.  

ESCOLHENDO QUESITO  

Para completar a primeira fornada de resultados da Secretaria de Premiações e Indicadores, destacou-se na semana passada um dado parcial do Instituto Trata Brasil. Santo André (e São Bernardo) está entre as 20 primeiras colocadas (de 100 dos maiores municípios brasileiros) no ranking de coleta de esgoto, que avalia o percentual da população do município atendida peloS serviços.  

O noticiário omitiu que o quesito “coleta de esgoto” é apenas um dos 12 macroindicadores do ranking do Instituto Trata Brasil. É apenas uma das rodadas de um campeonato de 12 etapas. Não existe campeão de uma determinada rodada, mas do conjunto da obra. E no conjunto da obra Santo André ocupa a 32ª posição entre as 100 concorrentes.  

Na semana passada escrevi sobre o ranking do Instituto Trata Brasil. É um trabalho respeitável, dirigido por gente séria. Destaquei que Santo André ocupa a Segunda Divisão do Campeonato Nacional de Saneamento, enquanto São Bernardo, Mauá e Diadema estão na Terceira Divisão.  

CONEXÃO CRUEL 

Os resultados são bons quando se considera, como escrevi, a conexão dilacerante de dois movimentos inquietantes: a ocupação da periferia do Grande ABC por levas de migrantes (são mais de 300 mil novas residências neste século) e o rebaixamento econômico, com perda anual acumulada do PIB Per Capita e do PIB Geral.  

A turma da fuzarca midiática do Paço Municipal de Santo André, à frente da Secretaria de Premiações e Indicadores, não precisa dourar a pílula para destilar autoestima à sociedade.  

Primeiro porque a tática do encantamento não resiste aos fatos; segundo porque o dia a dia econômico ridiculariza a iniciativa.  

O que precisa funcionar em Santo André para valer é a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, que existe no organograma, mas inexiste na prática.



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