Política

São Bernardo terá o grande
clássico eleitoral em 2024?

DANIEL LIMA - 05/07/2022

Há tempo de sobra para postergar especulações eleitorais municipais, mas determinadas situações com tempo de sobra estimulam especulações imediatas. Acordei hoje de uma noite muito mal dormida com vontade de especular, especular e especular. Havia outras três pautas na linha de tiro. Todas bloqueariam automaticamente qualquer tentativa de especular. Decidi especular.  

O que vai acontecer em 2024 nas disputas eleitorais no Grande ABC poderá passar obrigatoriamente ou não pela eleição do governador do Estado e da presidência da República. O caso de São Bernardo é o mais potencialmente efervescente porque o ambiente doméstico é vulnerável demais ao quadro estadual e nacional. Os demais municípios são menos sensíveis a externalidades por razões diversas. São Bernardo é a boca faminta do leão eleitoral que transcende a municipalidade.  

O voto municipal em São Bernardo é menos municipal que nos demais municípios porque ali tem um estranho no ninho a permear as relações. O ex-presidente Lula da Silva, claro. Estranho no ninho porque jamais foi candidato a qualquer cargo local. Mas flutua insistentemente como divisor de águas entre azulados e avermelhados.  

VAREJO E ATACADO  

Alguns remelexos nos demais municípios são possíveis e até naturais. Mas sem grandes solavancos. Em São Bernardo seriam outros quinhentos. Quem será o sucessor de Orlando Morando, um prefeito que vai terminar dois mandatos. E no ritmo que está, a consagração é questão de tempo. Não estou exagerando. É o melhor prefeito dos prefeitos, mesmo que não pratique a regionalidade também refutada pelos demais. Por mais que Paulinho Serra tente vender abstrações. 

Afinal, quem cuida do varejo sempre importante no presente, mas também tem olhos e ações no atacado, que desenhe o futuro, precisa ser reconhecido. Orlando Morando está para a logística de São Bernardo assim como Celso Daniel para a regionalidade do Grande ABC.  

São Bernardo é a capital política e econômica do Grande ABC e, por isso, está mais suscetível aos sacolejos locais e externos. Mais que isso: São Bernardo conta com um prefeito linha-dura, que não se dobra a pressões midiáticas.  

JOGO JOGADO  

Avermelhados e azulados de São Bernardo jogam um jogo bem jogado há muito tempo, com vitórias e derrotas ao sabor dos acontecimentos.  

Quem acompanha a segunda temporada do gataborralheirismo regional sabe que avermelhados são os petistas, azulados os tucanos e os amarelados, bolsonaristas.  

Quem faz comparação entre os níveis de aprovação e de reprovação, ou mesmo de resultados envolvendo os prefeitos do Grande ABC não bate bem da cabeça ou é doente do pé.  

Comparar, por exemplo, um embate eleitoral para prefeito em São Bernardo de jogo duríssimo com Santo André de quase amistoso é como acreditar que o Corinthians é melhor que o Palmeiras porque ganhou do Atlético Goianiense e o Palmeiras empatou com o Flamengo. Não tem cabimento.  

SÉRIE A E SÉRIE D  

A disputa eleitoral em São Bernardo é um confronto de Série A. Em Santo André, no contexto das últimas disputas, é de Série C. Ou, para se encaixar na realidade futebolística atual, uma disputa de Série D. São Bernardo é um terreno minado mesmo para quem faz uma gestão de primeira linha.   

Santo André é uma moleza de dar pena a quem aprecia a democracia no sentido conflitivo do termo, ou seja, de embates que exigem dos governistas esmero e cuidados para não perder a batalha seguinte e dos oposicionistas responsabilidade para não vender Genésio de complicações futuras por Jesus de glória administrativa.  

São Caetano não terá um prefeito José Auricchio novamente candidato, exaurido o segundo mandato seguido como tetracampeão regional juntamente com José de Filipi Júnior em Diadema.  

Como não existe vermelho também em São Caetano, muito menos (por enquanto?) o amarelo de Bolsonaro, a turma do azul e suas variáveis vai continuar no poder.  

LADO REVERSO  

Desde muito tempo São Caetano convive com disputas sem maiores transformações no campo ideológico -- até porque o campo ideológico de São Caetano é o oposto de Diadema.  

Ou seja: tem navegabilidade garantida. Enquanto Lauro Michels furou a fila vermelha porque, entre outros pontos, os vermelhos de Diadema se dividiram e se hostilizaram e deram brecha de duas temporadas ao retorno da família conservadora, em São Caetano o prefeito Paulo Pinheiro rompeu o domínio Tortorello-Auricchio apenas numa temporada, eleito com muito dinheiro do PT Regional de 2013 e ataques contundentes à candidata à sucessão, Regina Maura Zetone. Paulo Pinheiro é tão vermelho quanto a bandeira do Santos. 

DIADEMA INVIOLÁVEL? 

Diadema da retomada do PT após oito anos de conservadorismo de um ramal da família Michels (que durante tanto tempo antes da chegada dos vermelhos dominava a política local) parece inviolável a surpresas. Não dependeria tanto do vermelho estadual e federal, portanto. Prova é que em 2020 resistiu aos rescaldos da Lava-Jato, da chegada de Bolsonaro e de João Doria governador. 

Em Mauá o bicho pega mais que em jogo de várzea sem policiamento e muita cachaça. Estará sim o Município menos dogmático na composição político-ideológica em relação a Diadema suscetível ao quadro estadual e nacional, mas nada que resvale no conteúdo bélico de São Bernardo.  

Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra contam com vontades próprias e limitações ilimitadas para tocar a sucessão sem grandes surpresas, quaisquer que sejam os novos prefeitos. Com 2% do PIB Regional, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra não influenciam praticamente nada movimento do navio político-administrativo-econômico doméstico e também do Grande ABC. Servem apenas para formar maioria na disputa pelo Clube dos Prefeitos.  

Posto isso, então ficamos assim: jogo jogado para valer mesmo, independentemente do quadro estadual e nacional, será em São Bernardo. Afinal, o prefeito Orlando Morando também não poderá concorrer mais ao cargo. Há cenários distintos que sugerem haver em São Bernardo a perspectiva de embates mais ou menos acalorados.  

MARCELO-MARINHO 

Orlando Morando deverá ter como candidato à sucessão o vice-prefeito e candidato a deputado federal Marcelo Lima. A possível eleição alçaria Marcelo Lima a uma condição especial na disputa municipal, mas ganharia mais tração se o ex-prefeito Luiz Marinho, candidato a deputado federal, não fosse eleito. Essa é uma heresia prospectiva. 

Contando-se que Marcelo Lima e Luiz Marinho sejam eleitos deputados federais, tudo vai depender do que virá de fora. Se der Fernando Haddad e Lula da Silva nas eleições de outubro, o sucessor de Orlando Morando poderá ser o petista Luiz Marinho com um pé nas costas.   

Se der Fernando Haddad e Jair Bolsonaro, Luiz Marinho continuará viável. Se der amarelo ou azul ao governo do Estado (Rodrigo Garcia ou Tarcísio de Freitas) e Bolsonaro em Brasília, Luiz Marinho enfrentaria Marcelo Lima em situação de desvantagem. Talvez nem concorra.  

MANENTE PENDULAR  

Quem sabe, Luiz Marinho ganharia alguma massa eleitoral em situação de dupla derrota petista caso conte com o apoio do deputado Alex Manente, ruim de voto para prefeito, mas com eleitorado suficiente para dar uma mãozinha ao freguês de ocasião.  

Alex Manente parece ter nascido para ser deputado federal entre outras razões porque não tem identidade ideológica definida num Município em que o contrapeso ao vermelho revolucionário exige personalidade política forte. E isso sobra a Orlando Morando.  

Manente é um estepe à direita ou à esquerda do concorrente mais forte de cada eleição em São Bernardo. Ele joga com o capital eleitoral de que dispõe, suficiente como empréstimo nada voluntário a quem concorre no segundo turno. Foi assim com Luiz Marinho e também foi assim com Orlando Morando. Manente sempre ganha para prefeito, mas nunca leva o que gostaria de levar. Manente sofre da síndrome de reserva absoluto.  

PT FORTE DE NOVO?  

Se der a dobradinha Haddad-Lula, o PT poderá voltar ao comando das principais prefeituras da região. Teria pelo menos quatro no bolso, casos de Diadema, São Bernardo, Mauá e Rio Grande da Serra. Não se descartaria Ribeirão Pires.  

Santo André é um caso parte, porque está fora de qualquer plano ajuizado. Não se tira alguma coisa de onde nada existe, quanto mais muita coisa de onde nada existe mesmo. Não se esculpe um Celso Daniel do dia para a noite.  

O que resta do legado petista em Santo André está em algumas centenas de cargos na Prefeitura. O tucano-petismo é a expressão pragmática municipal do que durante muito tempo foram petistas e tucanos em níveis estadual e federal, com fingimentos de escândalos autoprotetores.   

Geraldo Alckmin não é um acidente de percurso político na campanha eleitoral de Lula da Silva. É o próprio percurso.  

Tudo se deu depois da morte de Celso Daniel, cadáver político que continua explorado até estes dias. Aliás, como prova o boquirroto e ex-publicitário Marcos Valério. Até parece que o documentário produzido pelo estúdio Escarlate não retirou todas as interrogações e aberrações de narrativas fraudulentas. Inclusive de uma das maiores fake-News, a de sete assassinatos correlatos. O próprio Ministério Público, que incentivou a bobagem, entregou a rapadura da verdade.  

Até especialista em direito eleitoral que exibia carteirinha petista está agregado à cúpula do Paço Municipal como reforço sempre pronto para acertar as contas com oposicionistas que se metem a desafiar os desígnios dos mandachuvas locais.  

MUDANDO AOS POUCOS  

A repetição da operação petista nas eleições de São Caetano em 2012 também é possível, mas aí novamente não se caracterizaria formalmente uma vitória vermelha, mas sim de um cavalo de troia de qualquer outra cor sob a influência escamoteada dos petistas.  

Em São Caetano o PT é espécie de viúva mal-falada, que, quando no poder federal, é cortejada por todos. Mas sempre por debaixo dos panos da discrição.  

Resta saber, entretanto, se haveria bala disponível para dar tanto tiro quanto naquela disputa vitoriosa de Paulo Pinheiro.  

A situação mudou no ambiente político. As redes sociais são cada vez menos tolerantes. A mídia tradicional, especializada em fazer vistas grossas diante de determinados acertos partidários de bastidores, ganhou concorrência forte, embora pouco entranhada nas disputas municipais. Mas isso também sofrerá abalos.  

Cada vez mais tem mais gente com as maquininhas diabólicas à mão.



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