Vou fazer algumas perguntas aos leitores, as quais não serão respondidas porque os leitores não sabem das coisas e também porque não conheço jornalista que saiba do assunto sem correr risco de cometer enganos. Entre os jornalistas, claro, sou o primeiro da fila. Vamos às questões:
A) Quantas áreas públicas cada Município do Grande ABC tem disponível para transformar em dinheiro, ou seja, afinadíssimas à monetização?
B) Quantas áreas públicas estão identificadas em algum endereço físico ou digital das prefeituras de forma a permitir a democratização da informação?
C) Quantas áreas privadas existem nos estoques das respectivas prefeituras em situação de transferência de titularidade por causa de inadimplência fiscal?
Poderia fazer mais uma infinidade de questões, mas acho que o básico está aí.
FALTA REPRESENTATIVIDADE
E vou partir dos finalmentes para chegar aos inicialmentes: sou inteiramente favorável à desmobilização do chamado patrimônio público em formato de imóveis. Entre outras razões, não é admissível que uma esfera pública faça o papel de banco imobiliário e, mais que isso, atue sob a suspeita de que é um ramal da Americanas.
Houvesse no Grande ABC uma única entidade responsável socialmente a debruçar sobre a questão do banco imobiliário público, há muito o que prevalece de especulação e desconfiança de uso e abuso de favoritismos e privilégios teria a carga de safadeza reduzida.
Entretanto, o que esperar por exemplo da suposta entidade que representa o setor imobiliário na região, o Clube dos Construtores e Incorporadores (Acigabc) controlado desde quase sempre pela Família Bigucci, especialista em diplomacia com o setor público? Claro que nada, absolutamente nada.
PASSADO CONDENA
O noticiário pretérito e também atual dá conta de que aquela organização privada cuida dos interesses de um número reduzidíssimo de integrantes. Na maioria das vezes, não são interesses da sociedade.
Traduzindo; o Clube dos Construtores é uma organização dedicada ao lobby imobiliário desde sempre, não tem representatividade da classe que diz defender e não se dá ao trabalho de sequer disfarçar envolvimento social. Esperar do Clube dos Construtores profilaxias é demais.
Como de maneira geral e ao longo dos tempos os administradores públicos sempre deixaram o banco imobiliário municipal ao sabor de interesses nem sempre nobres, a constituição de algo que colocasse ordem na casa é projeção romântica.
E AÍ, MANENTE?
Gostaria de ver algum deputado federal do Grande ABC (que tal Alex Manente, que se diz representante da região, embora só apareça nas comunidades na reta de chegada de cada disputa?) disposto a comprar a ideia do Banco Imobiliário Público e Transparente.
Será que Manente teria a coragem e a liberdade funcional de apresentar na Câmara Federal uma proposta bem articulada para tornar a relação entre entes públicos e sociedade mais condizente com pressupostos de transparência e lisura na organização e operacionalidade de um programa que responda às questões acima e também a muitas outras?
A obscuridade informativa do acervo imobiliário na região (e no País como um todo) é o fertilizante a falcatruas.
TUDO DESCONHECIDO
Por isso, sempre que se coloca no noticiário algo a respeito de transferência de propriedade pública para agentes privados, apontam-se nos bastidores -- e de vez em quando no noticiário-- a possibilidade de os ingredientes das negociações não serem exatamente saudáveis.
Por conta dessa generalização de que há sempre caroço de vantagens indevidas no angu de legitimidade negocial, de vez em quando inocentes pagam pelos pecadores de sempre.
Não tenho a menor ideia da quantidade de metros quadrados do banco imobiliário do setor público disponível no Grande ABC. Tampouco imagino quantas negociações foram consumadas na temporada passada, só para ficar numa única temporada. E os valores envolvidos? E o destino dos dinheiros oficialmente envolvidos?
CAIXA-PRETA
Tudo isso é uma caixa preta no sentido clássico e pecaminoso da expressão. Tudo que deixa manchas de desconfiança deve ser mesmo catalogado como sujeito a incorreções.
É muito pouco provável que sendo a questão passível de ser resolvida no âmbito municipal, com legislação apropriada, o que dispensaria o desafio a Alex Manente, por exemplo, algum legislativo local decida mudar o enredo que vem de longe.
O mercado imobiliário é uma fonte de riquezas lícitas e ilícitas, como todos sabem. As empreiteiras urbanas agem semelhantemente às empreiteiras da Lava Jato.
Aliás, se investigassem detidamente o histórico de Minha Casa Minha Vida seria mais um estouro da boiada.
NADA A FAZER
Fosse o Clube dos Construtores e Incorporadores o que deveria ser, ou seja, representante de classe, e, mais que isso, observasse o Grande ABC como espaço socialmente responsável, saindo portanto do corporativismo egoísta, o banco imobiliário do Grande ABC já estaria em debate há muito tempo.
Mais que isso: as prefeituras já teriam agido para colocar ordem na casa da ética e do compromisso social.
Há de vez em quando especulações contra determinados prefeitos por supostamente permitirem ou incentivarem (quando não se locupletarem) negócios imobiliários não só de áreas públicas mas de áreas privadas beneficiadas com medidas seletivas de elasticidade de uso de construção, entre outras.
A especificação de supostos delitos muitas vezes se traveste de perseguição política ou de interesses difusos, mas nada disso ocorreria com tanta profusão se houvesse um banco imobiliário a desestimular essas variáveis.
TUDO EXPLICADO
A Família Bigucci odeia este jornalista porque ao longo dos tempos e por mera obrigação profissional mantenho linha editorial que desmascara a falsa representatividade do Clube dos Construtores, de fato mequetrefe, além de alguns negócios fora dos parâmetros de normalidade ética, entre outros pontos.
Sem contar as irregularidades comprovadas que envolveram o empreendimento Marco Zero, construído em área pública arrematada na bacia das almas monetária porque invadiu a grande área de obscenidades legais.
Os leitores podem imaginar o que significa um jornalista sem proteção corporativa, como todos os jornalistas que estão fora das grandes empresas, lutando isoladamente contra milionários.
Os tentáculos judiciais são frondosos quando os milionários entram em ação. A hermenêutica é violada. A corda sempre arrebenta do lado mais fraco financeiramente. A verdade vira ofensa.
Faço a citação aos Bigucci porque eles já são milionários o suficiente para se tornarem mesmo que falsamente filantropos.
Poderiam sim, à frente que estão do Clube dos Construtores, tomar a iniciativa em favor do banco imobiliário. Quem acredita nisso?
Portanto, nesse alinhavado rápido a que me propus para tratar do banco imobiliário, já temos um desenho claro das pontas que também são o centro das medidas transformadoras: o legislador federal, os legisladores municipais, os administradores públicos e as chamadas lideranças de classe privada.
Como há muito tempo deixei de ser otário juramentado, porque agora sou um otário confessional e falsamente ingênuo, torço sem esperança por algum desdobramento que coloque ordem no mercado imobiliário público do Grande ABC.
MAIS LUCRATIVIDADE
Tudo isso que escrevi tem uma ligação estreita com a informação de que há um barraco envolvendo a Administração do prefeito Paulinho Serra e um grupo de moradores do Bairro Santa Terezinha.
Um enorme terreno, em formato de triângulo, ocupado por uma associação de moradores como estacionamento de veículos, estaria sendo objeto de escaramuças legais.
A Prefeitura estaria disposta a retirar o direito de uso do espaço por conta de não cumprimento do contrato de concessão. Especula-se, entretanto, que uma construtora famosa da região, tão famosa que não preciso identifica-la, estaria por trás de tudo porque pretenderia fazer daquela área especial um condomínio de classe média.
O Viaduto Castello Branco, em recuperação na Avenida dos Estados, seria o motor de ganhos espetaculares. Como se sabe, terreno adquirido em condições especiais é a garantia de empreendimento imobiliário vitorioso. O custo relativo do terreno faz a diferença no preço de venda e, principalmente, na lucratividade.
SAÍDA POSSIVEL
O prefeito Paulinho Serra refuta qualquer ilação que se desprenda da imperiosidade de adequar o uso da área às normas legais.
Fosse o prefeito Paulinho Serra (para tanto teria de, entre outros requisitos, suportar pressões de gente nem sempre razoavelmente decente) não teria dúvidas em estudar medidas que contemplassem os dois vértices da questão: ao mesmo tempo em que procuraria monetizar a área com transparência e efetiva participação de interessados, buscaria alternativa para acomodar os interesses daquela associação.
Administração Pública só deve ganhar a forma de banco imobiliário no sentido metafórico, ou seja, de ter sob controle tudo o que está em seu território físico em forma de áreas públicas para uso privado, e, a partir disso, reduzir drasticamente um ativo economicamente de baixo retorno social.
Um fundo específico para aplicações no campo social dos valores decorrentes de áreas públicas negociadas seria muito mais apropriado à sociedade, especialmente aos pobres e miseráveis.
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07/03/2025 PREVIDÊNCIA: DIADEMA E SANTO ANDRÉ VÃO MAL